Fonte: Dizer o Direito
Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-693-stj.pdf
DIREITO PROCESSUAL PENAL - CITAÇÃO POR EDITAL E SUSPENSÃO DO PROCESSO: Citado o réu por edital, nos termos do art. 366 do CPP, o processo deve permanecer suspenso enquanto o réu não for localizado ou até que seja extinta a punibilidade pela prescrição
O art. 366 do CPP estabelece que se o acusado for citado por edital e não comparecer ao processo nem constituir advogado o processo e o curso da prescrição ficarão suspensos. Enquanto o réu não for localizado, o curso processual não pode ser retomado. STJ. 6ª Turma. RHC 135.970/RS, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, julgado em 20/04/2021 (Info 693).
Se o acusado é citado por edital, mesmo assim o processo continua normalmente?
O art. 366 do CPP estabelece que: - se o acusado for citado por edital e - não comparecer ao processo nem constituir advogado - o processo e o curso da prescrição ficarão suspensos.
Se o réu comparecer ao processo ou constituir advogado, o processo e o prazo prescricional voltam a correr normalmente. O objetivo do art. 366 é garantir que o acusado que não foi pessoalmente citado não seja julgado à revelia.
Produção antecipada de provas urgentes e prisão preventiva
O art. 366 do CPP afirma que se o acusado, citado por edital, não comparecer nem constituir advogado, o juiz poderá determinar: a) a produção antecipada de provas consideradas urgentes e b) decretar prisão preventiva do acusado se estiverem presentes os requisitos do art. 312 do CPP (o simples fato do acusado não ter sido encontrado não é motivo suficiente para decretar sua prisão preventiva).
Produção antecipada das provas consideradas urgentes
No caso do art. 366 do CPP, o juiz poderá determinar a produção antecipada de provas consideradas urgentes. Para que o magistrado realize a colheita antecipada das provas, exige-se que seja demonstrada a real necessidade da medida. Assim, toda produção antecipada de provas realizada nos termos do art. 366 do CPP está adstrita à sua necessidade concreta, devidamente fundamentada. Nesse sentido é o teor da Súmula 455-STJ:
Súmula 455-STJ: A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no artigo 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo.
A oitiva de testemunhas pode ser considerada prova urgente para os fins do art. 366 do CPP?
Sim, desde que as circunstâncias do caso concreto revelem a possibilidade concreta de perecimento. Ex: a testemunha possui idade avançada e se encontra enferma, com possibilidade concreta de morte.
Existe um argumento no sentido de que se as testemunhas forem policiais, deverá ser autorizada a sua oitiva como prova antecipada, considerando que os policiais lidam diariamente com inúmeras ocorrências e, se houvesse o decurso do tempo, eles poderiam esquecer dos fatos. Esse argumento é aceito pela jurisprudência? A oitiva das testemunhas que são policiais é considerada como prova urgente para os fins do art. 366 do CPP?
SIM. É a posição do STJ. O fato de o agente de segurança pública atuar constantemente no combate à criminalidade faz com que ele presencie crimes diariamente. Em virtude disso, os detalhes de cada uma das ocorrências acabam se perdendo em sua memória. Essa peculiaridade justifica que os policiais sejam ouvidos como produção antecipada da prova testemunhal, pois além da proximidade temporal com a ocorrência dos fatos proporcionar uma maior fidelidade das declarações, possibilita ainda o registro oficial da versão dos fatos vivenciados por ele, o que terá grande relevância para a garantia da ampla defesa do acusado, caso a defesa técnica repute necessária a repetição do seu depoimento por ocasião da retomada do curso da ação penal. Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. RHC 128.325/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 08/09/2020.
O STF não tem uma posição consolidada sobre o tema, havendo decisões em ambos os sentidos. Exemplos:
• não admitindo: STF. 2ª Turma. HC 130038/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 3/11/2015;
• admitindo: STF. 2ª Turma. HC 135386, Rel. Ricardo Lewandowski, Relator(a) p/ Acórdão: Gilmar Mendes, julgado em 13/12/2016.
Por quanto tempo o prazo prescricional poderá ficar suspenso?
Pelo tempo de prescrição da pena máxima em abstrato cominada ao crime. É o entendimento do STJ e do STF:
Súmula 415-STJ: O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada.
Em caso de inatividade processual decorrente de citação por edital, ressalvados os crimes previstos na Constituição Federal como imprescritíveis, é constitucional limitar o período de suspensão do prazo prescricional ao tempo de prescrição da pena máxima em abstrato cominada ao crime, a despeito de o processo permanecer suspenso. STF. Plenário. RE 600851, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 04/12/2020 (Repercussão Geral – Tema 438) (Info 1001).
Para entender melhor isso, imagine a seguinte situação hipotética:
João foi acusado de estelionato (art. 171 do CP). O juiz recebeu a denúncia e determinou sua citação. Como João não foi encontrado, realizou-se sua citação por edital. Citado por edital, João não compareceu ao processo nem constituiu advogado. Logo, o juiz determinou a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional (art. 366 do CPP). Por quanto tempo o prazo prescricional poderá ficar suspenso? A pena do estelionato é de 1 a 5 anos. O prazo prescricional do estelionato, considerando o máximo da pena cominada (imposta), é de 12 anos (art. 109, III, do CP). Assim, o prazo prescricional neste processo de João ficará suspenso aguardando ele ser encontrado pelo prazo de 12 anos. Se, passados os 12 anos, ele não for localizado, o prazo prescricional volta a correr (o que é bom para João). Depois de 12 anos contados do dia em que o prazo prescricional voltou a tramitar, o juiz deverá declarar a prescrição da pretensão punitiva. Em suma, neste exemplo, para que ocorra a prescrição, deverão ser passados 24 anos: 12 anos em que o prazo prescricional ficará suspenso e mais 12 anos que correspondem ao prazo para que a prescrição ocorra.
Principais argumentos para essa conclusão
A regra geral prevista na Constituição Federal é a de que as pretensões penais são prescritíveis. Excepcionalmente, a CF/88 estabeleceu determinados crimes que são imprescritíveis:
Art. 5º (...) XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
Não é permitido que o legislador ordinário crie hipóteses de imprescritibilidade não previstas no texto constitucional. A imprescritibilidade é opção somente da CF. Assim, ressalvados os crimes de racismo e as ações de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático, a regra é a prescritibilidade. Diante disso, é compatível com a Constituição a interpretação conjunta do art. 366 do CPP com o art. 109, caput, do Código Penal, limitando o prazo de suspensão da prescrição ao tempo de prescrição do máximo da pena em abstrato prevista para o delito. De um lado, a própria lógica da prescrição é que as pretensões sejam exercidas em prazo previamente delimitado no tempo. Ela visa trazer segurança jurídica. Caso essa limitação não exista, o que se tem, ao fim, é a imprescritibilidade. De outro, o legislador ordinário não está autorizado a criar outras hipóteses de imprescritibilidade penal. Além disso, regular o prazo de suspensão da prescrição com o tempo de prescrição da pena máxima em abstrato cominada ao delito mostra-se condizente com o princípio da proporcionalidade e com a própria noção de individualização da pena.
Considerando que a prescrição voltará a correr, é possível que o processo também volte a tramitar?
NÃO. Isso contraria o próprio sentido da alteração promovida no art. 366 pela Lei nº 9.271/96. Por ser a citação por edital uma ficção jurídica, pretendeu-se com a alteração legislativa obstar que alguém fosse processado e julgado sem que se tivesse a certeza de que tomara conhecimento do processo, em prejuízo à ampla defesa, ao contraditório e ao devido processo legal. Além de não prestigiar as garantias inerentes ao devido processo legal, a retomada do processo coloca o réu em situação mais gravosa do que a suspensão do processo e da prescrição ad aeternum. Igualmente, não está em harmonia com diplomas internacionais, que, à luz da cláusula de abertura prevista no texto constitucional, têm força normativa interna e natureza supralegal. STF. Plenário. RE 600851, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 04/12/2020 (Repercussão Geral – Tema 438) (Info 1001). O STJ acompanhou essa conclusão do STF:
Citado o réu por edital, nos termos do art. 366 do CPP, o processo deve permanecer suspenso enquanto perdurar a não localização do réu ou até que sobrevenha o transcurso do prazo prescricional. STJ. 6ª Turma. RHC 135.970/RS, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, julgado em 20/04/2021 (Info 693).
Vale ressaltar que se trata de mudança de entendimento do STJ porque este Tribunal entendia, antes da decisão do STF no RE 600851, que esgotado o prazo máximo de suspensão processual, nos termos do art. 366 do CPP, feito deveria voltar a tramitar mesmo com a ausência do réu, mediante a constituição de defesa técnica (STJ. 6ª Turma. RHC 112.703/RS, Min. Nefi Cordeiro, DJe de 22/11/2019).
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