15 de novembro de 2021

É inconstitucional lei estadual que permita a criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios sem a edição prévia das leis federais previstas no art. 18, § 4º, da CF/88

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-1028-stf.pdf


ORGANIZAÇÃO DO ESTADO É inconstitucional lei estadual que permita a criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios sem a edição prévia das leis federais previstas no art. 18, § 4º, da CF/88 

Pendente a legislação federal prevista na redação atual do art. 18, § 4º, da Constituição Federal, são inadmissíveis os regramentos estaduais que possibilitem o surgimento de novos municípios e que invadam a competência da União para disciplinar o tema. É inconstitucional lei estadual que permita a criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios sem a edição prévia das leis federais previstas no art. 18, § 4º, da CF/88, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 15/96. STF. Plenário. ADI 4711/RS, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 3/9/2021 (Info 1028). 

A situação concreta foi a seguinte: 

O Estado do Rio Grande do Sul editou a Lei Complementar nº 13.587/2010, que dispõe sobre a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de municípios. O PGR ajuizou ADI contra essa lei afirmando que ela invade a competência da União para dispor sobre a matéria, nos termos do art. 18, § 4º, da CF/88. 

O STF concordou com os argumentos do PGR? Essa lei é inconstitucional? SIM. 

Novos municípios e o art. 18, § 4º da CF/88 

O art. 18, § 4º da CF/88 estabelece quatro requisitos para que Municípios sejam criados, incorporados, fundidos ou desmembrados: a) Lei Complementar Federal: o Congresso Nacional deverá editar uma Lei Complementar estabelecendo o procedimento e o período no qual os Municípios poderão ser criados, incorporados, fundidos ou desmembrados; b) Estudos de Viabilidade Municipal: serão realizados Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei; c) Plebiscito: a população dos Municípios envolvidos deverá ser consultada previamente por meio de um plebiscito; d) Lei estadual: uma vez realizado o estudo de viabilidade municipal e tendo a população aprovado a formação do novo Município, será editada uma lei estadual criando, incorporando, fundindo ou desmembrando os Municípios. Veja a redação do § 4º do art. 18: 

Art. 18 (...) 

§ 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 15, de 1996) 

A Lei Complementar Federal exigida pelo § 4º do art. 18 já foi editada? 

NÃO. Logo, atualmente, todos os Municípios que forem formados serão inconstitucionais, porque inexiste a LC exigida pelo § 4º do art. 18, primeiro requisito para a criação, incorporação, fusão ou desmembramento de Municípios. 

ADI por omissão 3.682 

A exigência de que a formação de novos Municípios dependa de Lei Complementar Federal foi imposta pela EC 15/96. Pela redação originária da CF/88, bastava Lei Complementar estadual. Como o Congresso Nacional não editou essa LC Federal, foi proposta uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADI 3.682). O STF, ao julgar essa ADI, fez um apelo para que o legislador elaborasse a LC e fixou um prazo de 18 meses para tanto: 

(...) Ação julgada procedente para declarar o estado de mora em que se encontra o Congresso Nacional, a fim de que, em prazo razoável de 18 (dezoito) meses, adote ele todas as providências legislativas necessárias ao cumprimento do dever constitucional imposto pelo art. 18, § 4º, da Constituição, devendo ser contempladas as situações imperfeitas decorrentes do estado de inconstitucionalidade gerado pela omissão. Não se trata de impor um prazo para a atuação legislativa do Congresso Nacional, mas apenas da fixação de um parâmetro temporal razoável, tendo em vista o prazo de 24 meses determinado pelo Tribunal nas ADI n°s 2.240, 3.316, 3.489 e 3.689 para que as leis estaduais que criam municípios ou alteram seus limites territoriais continuem vigendo, até que a lei complementar federal seja promulgada contemplando as realidades desses municípios. STF. Plenário. ADI 3682, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 09/05/2007. 

A despeito disso, essa LC federal ainda não foi editada. 

EC 57/2008 

A fim de regularizar a situação de muitos Municípios criados sem o advento de Lei Complementar mesmo após a EC 15/96, o Congresso editou a EC 57/2008, acrescentando o art. 96 ao ADCT e prevendo a convalidação desses Municípios. Veja a redação: 

Art. 96. Ficam convalidados os atos de criação, fusão, incorporação e desmembramento de Municípios, cuja lei tenha sido publicada até 31 de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do respectivo Estado à época de sua criação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 57/2008) 

Assim, os Municípios criados até 2006, mesmo sem a existência de LC federal, foram convalidados. 

Veto ao Projeto de Lei aprovado para regulamentar o § 4º do art. 18 da CF/88

Em novembro de 2013, o Congresso Nacional aprovou um projeto de lei complementar (PLP 416/08) com o objetivo de regulamentar o § 4º do art. 18 da CF/88, autorizando a criação, a fusão e o desmembramento de Municípios. Ocorre que a Presidente da República vetou integralmente a proposta, de forma que continua não existindo a LC exigida pela CF/88 para a criação de novos Municípios. Em agosto de 2014, o Congresso Nacional mais uma vez aprovou outro projeto de lei complementar sobre o tema, porém novamente foi vetado pela Presidência da República. 

Em resumo: 

• A partir da EC 15/1996, nenhum Município pode ser criado, incorporado, fundido ou desmembrado, considerando-se que não existe ainda a Lei Complementar Federal de que trata o § 4º do art. 18 da CF/88, sendo esse dispositivo norma constitucional de eficácia limitada (depende de lei para produzir todos os seus efeitos); 

• os Municípios criados, incorporados, fundidos ou desmembrados até 31/12/2006, mesmo sendo contrários ao § 4º do art. 18 da CF/88, foram “convalidados” (confirmados, ratificados, regularizados) por força da EC 57/2008; 

• as leis estaduais que criarem, incorporarem, fundirem ou desmembrarem Municípios após 31/12/2006 devem ser consideradas inconstitucionais; 

• os dois Projetos de Lei Complementar que regulamentariam o § 4º do art. 18 da CF/88, autorizando a criação, a fusão e o desmembramento de Municípios foram vetados pela Presidente da República em 2013 e 2014. Logo, por enquanto, todos os novos Municípios que forem formados serão inconstitucionais. 

Voltando ao nosso caso concreto: o que decidiu o STF? A tese do PGR foi acolhida? 

SIM. Pendente a legislação federal prevista na redação atual do art. 18, § 4º, da Constituição Federal, são inadmissíveis os regramentos estaduais que possibilitem o surgimento de novos municípios e que invadam a competência da União para disciplinar o tema. A dicção do aludido dispositivo constitucional — na redação dada pela EC 15/96 — impõe a aprovação prévia de leis federais para que os estados-membros da Federação sejam autorizados a iniciar novos processos de emancipação municipal. Até que isso ocorra, leis estaduais que versem sobre o tema são inconstitucionais. 

Confira a tese fixada pelo STF: 

É inconstitucional lei estadual que permita a criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios sem a edição prévia das leis federais previstas no art. 18, § 4º, da CF/1988, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 15/96. STF. Plenário. ADI 4711/RS, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 3/9/2021 (Info 1028)

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