15 de novembro de 2021

De quem é a legitimidade para a execução de crédito decorrente de multa aplicada por Tribunal de Contas estadual a agente público municipal?

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-1029-stf.pdf


TRIBUNAL DE CONTAS De quem é a legitimidade para a execução de crédito decorrente de multa aplicada por Tribunal de Contas estadual a agente público municipal? 

Os Estados não têm legitimidade ativa para a execução de multas aplicadas, por Tribunais de Contas estaduais, em face de agentes públicos municipais, que, por seus atos, tenham causado prejuízos a municípios. Tese fixada pelo STF: “O Município prejudicado é o legitimado para a execução de crédito decorrente de multa aplicada por Tribunal de Contas estadual a agente público municipal, em razão de danos causados ao erário municipal”. STF. Plenário. RE 1003433/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 14/9/2021 (Repercussão Geral – Tema 642) (Info 1029). 

O Tribunal de Contas da União é disciplinado pelos arts. 70 a 75 da CF/88 (Seção IX). Os Tribunais de Contas dos Estados, por sua vez, são organizados pelas Constituições estaduais. Contudo, por força do princípio da simetria, as regras do TCU também são aplicadas, no que couber, aos TCE’s, conforme determina o art. 75 da CF/88: 

Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios. Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros. 

No art. 71 da CF/88 estão elencadas as competências do TCU (que podem ser aplicadas também aos TCE’s). De acordo com o inciso VIII do art. 71, o TCU (assim como os TCE’s) pode aplicar multas aos administradores e demais responsáveis: 

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: (...) VIII – aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário; 

Assim, o Tribunal de Contas poderá aplicar multas ou determinar que o gestor faça o ressarcimento de valores ao erário. Esta decisão da Corte de Contas materializa-se por meio de um acórdão. 

Caso o condenado não cumpra espontaneamente o acórdão do Tribunal de Contas e deixe de pagar os valores devidos, esta decisão poderá ser executada? 

SIM. As decisões do Tribunal de Contas que determinem a imputação de débito (ressarcimento ao erário) ou apliquem multa terão eficácia de título executivo extrajudicial, nos termos do § 3º do art. 71 da CF/88. Logo, podem ser executadas por meio de uma ação de execução de título extrajudicial. Vale ressaltar que a decisão do Tribunal de Contas deverá declarar, de forma precisa, o agente responsável e o valor da condenação, a fim de que goze dos atributos da certeza e liquidez. 

A decisão do Tribunal de Contas precisa ser inscrita em dívida ativa? 

NÃO. A finalidade de se inscrever o débito na dívida ativa é gerar uma certidão de dívida ativa (CDA), que é um título executivo indispensável para o ajuizamento da execução. Ocorre que o acórdão do Tribunal de Contas já é um título executivo extrajudicial por força do art. 71, § 3º da CF/88 c/c o art. 585, VIII do CPC. Desse modo, não há necessidade de esse débito ser inscrito em dívida ativa. 

A execução da decisão do Tribunal de Contas é feita mediante o procedimento da execução fiscal (Lei nº 6.830/80)? 

NÃO. O que se executa é o próprio acórdão do Tribunal de Contas (e não uma CDA). Assim, trata-se de execução civil de título extrajudicial, seguindo as regras do CPC. Somente haverá execução fiscal se o título executivo for uma CDA. Nesse sentido, assim decidiu o STJ: 

Não se aplica a Lei nº 6.830/80 à execução de decisão condenatória do Tribunal de Contas da União quando não houver inscrição em dívida ativa. Tais decisões já são títulos executivos extrajudiciais, de modo que prescindem da emissão de Certidão de Dívida Ativa – CDA, o que determina a adoção do rito do CPC quando o administrador discricionariamente opta pela não inscrição. STJ. 2ª Turma. REsp 1390993/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10/09/2013 (Info 530). 

Quem tem legitimidade para propor esta execução? 

POSIÇÃO DO STJ: A legitimidade irá variar caso o acórdão do Tribunal de Contas tenha determinado o ressarcimento ao erário ou, então, apenas uma multa (AgRg no REsp 1181122/RS, Rel. p/ Acórdão Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 06/05/2010). Veja: 

Imputação de débito (ressarcimento ao erário) 

A imputação de débito (ressarcimento ao erário) é imposta quando o Tribunal de Contas detecta que houve uma despesa indevida, que gerou prejuízo ao erário, devendo, portanto, haver a recomposição do dano sofrido pelo ente público. Ex: quando o gestor não consegue comprovar determinada despesa realizada, ele deverá ressarcir tais valores aos cofres públicos.

O credor da imputação de débito é o ente público de onde saiu o dinheiro, ou seja, o ente lesado.

A execução deverá ser proposta pelo ente beneficiado com a decisão do Tribunal de Contas. Se o valor a ser ressarcido pertencer à União, quem executa é a AGU; se for do Estado, a execução é proposta pela PGE; se for do Município, trata-se de atribuição da PGM. Assim, o acórdão deverá ser executado pelo ente credor da quantia a ser ressarcida, por meio de sua procuradoria. 


Multa 

 A multa, por sua vez, consiste em uma sanção aplicada por conta de um comportamento ilegal da pessoa fiscalizada. Exs: administrador que teve suas contas julgadas irregulares sem resultar débito; gestor que descumpriu alguma determinação do Tribunal de Contas; agente público que criou embaraço a uma inspeção efetuada pelo TC; servidor que sonegou processo, documento ou informação. A finalidade da multa é a de fortalecer a fiscalização desempenhada pelo Tribunal de Contas, que certamente perderia em sua efetividade caso não houvesse a previsão de tal instrumento sancionador. 

Em se tratando de multa, esta deverá se reverter em favor do ente que mantém o Tribunal de Contas (ex: União, no caso do TCU; Estado, no caso do TCE). 

A execução deverá ser proposta pelo ente ao qual está vinculado o Tribunal de Contas. Assim, se o TCU aplicou uma multa ao prefeito do RJ, quem deverá executar o acórdão é a AGU. Se o TCE/MG aplicou uma multa ao prefeito de Uberlândia, será a PGE/MG a legitimada para executar. Se o TCM/SP aplicou uma multa ao prefeito de SP, será a PGM/SP a legitimada para executar. Não importa qual a entidade que estava sendo fiscalizada pelo TC. O que interessa é se quem aplicou a multa foi o TCU, o TCE ou o TCM. 

POSIÇÃO DO STF: 

O STF não adota a distinção acima feita. Para a Corte, somente o ente da Administração Pública prejudicado com a atuação do gestor possui legitimidade para executar o acórdão do Tribunal de Contas, seja ele de imputação de débito ou de multa. O Estado-membro não tem legitimidade para promover execução judicial para cobrança de multa imposta por Tribunal de Contas estadual à autoridade municipal, uma vez que a titularidade do crédito é do próprio ente público prejudicado, a quem compete a cobrança, por meio de seus representantes judiciais (no caso, o Município). Se a multa aplicada pelo Tribunal de Contas decorre da prática de atos que causaram prejuízo ao erário municipal, o legitimado ativo para a execução do crédito fiscal é o município lesado, e não o Estado. Aplica-se aqui o princípio basilar do direito no sentido de que o acessório segue a sorte do principal. A multa foi aplicada em razão de uma ação do agente público em detrimento do ente federativo ao qual serve, qual seja, o Município. Logo, não há nenhum sentido em que tal valor reverta para os cofres do Estado-membro a que vinculado o Tribunal de Contas. 

Tome-se o seguinte exemplo: O TCE/AM aplica uma multa ao prefeito de Manaus. Quem executa? 

• Posição do STJ: o Estado do Amazonas, por intermédio da PGE. A multa tem caráter punitivo e se reverte em favor do Estado. 

• Posição do STF: o Município de Manaus, por intermédio da PGM. O estado-membro não tem legitimidade para promover execução judicial para cobrança de multa imposta por Tribunal de Contas estadual à autoridade municipal, uma vez que a titularidade do crédito é do próprio ente público prejudicado, a quem compete a cobrança, por meio de seus representantes judiciais (no caso, o Município). 

Tese fixada pelo STF: 

O Município prejudicado é o legitimado para a execução de crédito decorrente de multa aplicada por Tribunal de Contas estadual a agente público municipal, em razão de danos causados ao erário municipal. STF. Plenário. RE 1003433/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 14/9/2021 (Repercussão Geral – Tema 642) (Info 1029). 

Obs: como o STF julgou o tema agora sob a sistemática da repercussão geral, é provável que o STJ se adeque ao entendimento da Corte. 

DOD PLUS – INFORMAÇÕES EXTRAS 

O Ministério Público possui legitimidade para ajuizar a execução para ressarcimento ao erário? 

NÃO. A legitimidade para a propositura da ação executiva é apenas do ente público beneficiário. O Ministério Público, atuante ou não junto às Cortes de Contas, seja federal, seja estadual, é parte ilegítima. STF. Plenário. ARE 823347 RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 02/10/2014 (Repercussão geral). STF. REsp 1257583/MG, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 08/11/2018. 

O próprio Tribunal de Contas poderá propor a execução de seu acórdão? 

NÃO. O art. 71, § 3º, da CF/88 não outorgou ao TCU legitimidade para executar suas decisões das quais resulte imputação de débito ou multa. A competência para isso é do titular do crédito constituído a partir da decisão, ou seja, o ente público prejudicado (AI 826676 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 08/02/2011).

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