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1 de maio de 2021

A afetação de feitos a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal é atribuição discricionária do relator

 DIREITO PROCESSUAL PENAL – NULIDADE

 

“Operação Lava Jato”: ausência de conexão e nulidade de atos decisórios - HC 193726 AgR/PR e HC 193726 AgR-AgR/PR 

 

Resumo:

A afetação de feitos a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal é atribuição discricionária do relator (1).

Com efeito, essa afetação é possível por força do que dispõem os arts. 21, I, e 22, ambos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), pronunciamento que, a teor do art. 305 do RISTF, afigura-se irrecorrível.

Pela afetação, o julgamento do feito é submetido à deliberação do Tribunal Pleno, ao qual a Constituição Federal (CF) atribui legitimidade à prestação jurisdicional sobre quaisquer causas inseridas na competência do Supremo Tribunal Federal (STF).

Especificamente no que concerne ao habeas corpus, tal proceder também é autorizado a partir da inteligência dos arts. 6º, II, c e 21, XI, do RISTF (2).

O Ministério Público Federal, quando atua perante o STF, por intermédio da Procuradoria-Geral da República, mesmo na qualidade de “custos legis”, detém legitimidade para a interposição de agravo regimental contra decisões monocráticas proferidas pelos ministros relatores.

Nos termos do caput do art. 127 da CF (3), incumbe ao Ministério Público, como instituição permanente e essencial à jurisdição, a defesa da ordem jurídica, encontrando-se na legislação infraconstitucional, interpretada de forma sistemática, os fundamentos de sua legitimidade recursal. Com efeito, o art. 179, II, do Código de Processo Civil (CPC) (4), aplicável à hipótese pela norma integrativa que se extrai do art. 3º do Código de Processo Penal (CPP) (5), estabelece que o Ministério Público, quando intervém nos autos na qualidade de fiscal da ordem jurídica, “poderá produzir provas, requerer as medidas processuais pertinentes e recorrer”. Ademais, essa legitimidade é reforçada no art. 996 do mesmo diploma legal (6).

Não obstante o art. 317 do RISTF (7) faça alusão às partes, a interpretação restritiva não encontra amparo em inúmeros precedentes do Corte (8), nos quais, em sede de habeas corpus, o Ministério Público foi considerado parte legítima à interposição de agravo regimental contra decisões monocráticas.

No âmbito da “Operação Lava Jato”, a competência da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba é restrita aos crimes praticados de forma direta em detrimento apenas da Petrobras S/A.

Nesse sentido tem se firmado a jurisprudência do STF (9). Na hipótese, restou demonstrado que as condutas atribuídas ao paciente não foram diretamente direcionadas a contratos específicos celebrados entre o Grupo OAS e a Petrobras S/A, constatação que, em cotejo com precedentes do Plenário e da Segunda Turma do STF, permite a conclusão pela não configuração da conexão que autorizaria, no caso concreto, a modificação da competência jurisdicional.

O caso, portanto, não se amolda ao que se tem decidido, majoritariamente, no âmbito do Plenário e da Segunda Turma, a partir de 2015, a respeito da competência da 13ª Vara Federal de Curitiba, delimitada exclusivamente aos ilícitos praticados em detrimento da Petrobras S/A.

As mesmas circunstâncias fáticas, ou seja, a ausência de condutas praticadas de forma direta em detrimento da Petrobras S/A, são encontradas nas demais ações penais deflagradas em desfavor do paciente perante a 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba, tornando-se imperiosa a extensão da ordem concedida, nos termos do art. 654, § 2º, do CPP (10).

A superveniência de circunstâncias fáticas aptas a alterar a competência da autoridade judicial, até então desconhecidas, autoriza a preservação dos atos praticados por juízo aparentemente competente em razão do quadro fático subjacente no momento em que requerida a prestação jurisdicional.

No caso, no entanto, à época do ajuizamento da denúncia, datada de 14.9.2016, já era do conhecimento do Ministério Público Federal, bem como do Juízo da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba, que os fatos denunciados não diziam respeito a delitos praticados direta e exclusivamente em detrimento da Petrobras S/A, sendo certo que o primeiro precedente a reduzir a competência daquele juízo foi proferido em 23.9.2015 (Inq 4.130 QO), motivo pelo qual a “teoria do juízo aparente” não se aplica à hipótese.

Nada obstante a Procuradoria-Geral da República pugne pela aplicação ao caso da norma extraída do art. 64, § 4º, do CPC (11), é certo que o Direito Processual Penal vem dotado de regra própria que estabelece a sanção de nulidade aos atos decisórios praticados por juízo incompetente, nos termos do art. 567 do CPP (12), em plena vigência no ordenamento jurídico pátrio.

Trata-se de agravos regimentais interpostos contra decisão monocrática do relator de habeas corpus que: a) assentou a incompetência do Juízo da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba e anulou os atos decisórios praticados nas ações penais ali julgadas contra o ex-Presidente da República Luís Inácio Lula da Silva; e b) afetou os referidos recursos ao Plenário.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, negou provimento ao agravo regimental em agravo regimental em habeas corpus, relativo à afetação, pelo relator, do julgamento dos recursos interpostos ao Plenário. Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio.

O Plenário, também, por maioria, em complemento ao julgamento da sessão do dia 15.4.2021, negou provimento ao agravo regimental em habeas corpus, concernente à competência do juízo, para assentar a competência da Justiça Federal do Distrito Federal para julgamento das ações penais. Vencidos, parcialmente, os ministros Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski, que entendiam ser competente a Justiça Federal de São Paulo, e, integralmente, os ministros Nunes Marques, Marco Aurélio e Luiz Fux (Presidente), que davam provimento ao recurso.

(1) Precedentes citados: HC 143.333/PR, relator Min. Edson Fachin (DJe de 21.3.2019); Ext 1.574 ED/DF, relatora Min. Cármen Lúcia (DJe de 21.11.2019).

(2) RISTF: “Art. 6º Também compete ao Plenário: (...) II - julgar: (...) c) os habeas corpus remetidos ao seu julgamento pelo Relator; (...) Art. 21. São atribuições do Relator: (...) XI - remeter habeas corpus ou recurso de habeas corpus ao julgamento do Plenário;”

(3) CF: “Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”

(4) CPC: “Art. 179. Nos casos de intervenção como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público: (...) II - poderá produzir provas, requerer as medidas processuais pertinentes e recorrer.”

(5) CPP: “Art. 3º A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.”

(6) CPC: “Art. 996. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica.”

(7) RISTF: “Art. 317. Ressalvadas as exceções previstas neste Regimento, caberá agravo regimental, no prazo de cinco dias de decisão do Presidente do Tribunal, de Presidente de Turma ou do Relator, que causar prejuízo ao direito da parte.”

(8) Precedentes citados: HC 195.367 AgR/SP, relatora Min. Cármen Lúcia (DJe de 26.2.2021); HC 192.532 AgR/GO, relator Min. Gilmar Mendes (DJe de 2.3.2021); HC 195.681 AgR/SP, relator Min. Ricardo Lewandowski (DJe de 3.3.2021); RHC 145.417 AgR/SP, relator Min. Dias Toffoli (DJe de 30.7.2020); HC 190.851 AgR/SP , relator Min. Edson Fachin (DJe de 24.2.2021); HC 193.398 AgR/RS, relator Min. Alexandre de Moraes (DJe de 12.1.2021); RHC 170.533 AgR/MS , relatora Min. Rosa Weber (DJe de 7.12.2020); HC 183.620 AgR/MG, relator Min. Roberto Barroso (DJe de 26.8.2020); RHC 124.137 AgR/BA, relator Min. Luiz Fux (DJe de 1.6.2016).

(9) Precedentes citados: Inq 4.130 QO/PR, relatora Min. Cármen Lúcia (DJe de 3.2.2016); Inq 4.327 AgR-Segundo/DF, relator Min. Edson Fachin (DJe de 5.3.2018); Inq 4.483 AgR-Segundo/DF, relator Min. Edson Fachin (DJe de 5.3.2018); Pet 7.790 AgR/DF, relator Min. Edson Fachin (DJe de 23.11.2018); Pet 7.792 AgR/DF, relator Min. Edson Fachin (DJe de 23.11.2018); Inq 3.989 AgR-Terceiro/DF (DJe de 4.10.2018); Pet 8.144 AgR/DF, relator Min. Edson Fachin (DJe de 1.8.2019); Pet 6.780 AgR-Quarto-ED/DF, relator Min., Edson Fachin, redator do acórdão Min. Dias Toffoli (DJe de 20.6.2018); Pet 6.664 AgR-AgR/DF, relator Min., Edson Fachin, redator do acórdão Min. Dias Toffoli (DJe de 4.12.2018); Pet 6.820 AgR-ED/DF, relator Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Ricardo Lewandowski (DJe de 26.3.2018); Inq 4.435 AgR-Quarto/DF, relator Min. Marco Aurélio (DJe de 21.8.2019);  Inq 4.428 QO/DF, relator Min. Gilmar Mendes (DJe de 12.8.2018); Pet 7.832 AgR/DF, relator Min. Edson Fachin (DJe de 28.3.2019); Pet 8.054 AgR/DF, relator Min. Edson Fachin (DJe de 27.9.2019); Pet 8.090 AgR/DF, relator Min. Edson Fachin (DJe de 11.12.2020).

(10) CPP: “Art. 654.  O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.(...) § 2º  Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.”

(11) CPC: “Art. 64. A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação. (...) § 4º Salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente.”

(12) CPP: “Art. 567.  A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente.”

HC 193726 AgR-AgR/PR, relator Min. Edson Fachin, julgamento em 14.4.2021

HC 193726 AgR/PR, relator Min. Edson Fachin, julgamento em 22.4.2021