Fonte: Dizer o Direito
Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-1026-stf.pdf
EDUCAÇÃO - É inconstitucional lei estadual que inclui o pagamento de pessoal inativo nas despesas
consideradas como de manutenção e desenvolvimento do ensino
O art. 212 da CF/88 prevê o dever de aplicação de percentual mínimo para investimentos na
manutenção e desenvolvimento do ensino.
A definição de quais despesas podem ou não ser consideradas como manutenção e
desenvolvimento de ensino é feita por meio de lei editada pela União.
A Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), em seus arts. 70 e 71,
definiu quais despesas podem ser consideradas como sendo destinadas à manutenção e
desenvolvimento do ensino.
As despesas com encargos previdenciários de servidores inativos e os repasses efetuados pelo
Estado para cobrir o déficit no regime próprio de previdência não podem ser computados
como aplicação de recursos na manutenção e desenvolvimento de ensino, para os fins do art.
212 da CF/88. Logo, é inconstitucional lei estadual que faça essa previsão.
STF. Plenário. ADI 6049/GO, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/8/2021 (Info 1026).
Obs: a EC 108/2020 incluiu o § 7º no art. 212 da CF/88 e passou a vedar expressamente o uso dos
recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino para o pagamento de
aposentadorias e pensões:
Art. 212 (...) § 7º É vedado o uso dos recursos referidos no caput e nos §§ 5º e 6º deste artigo para
pagamento de aposentadorias e de pensões.
Percentual mínimo aplicável em ensino
A Constituição prevê que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão destinar um
percentual mínimo do que for arrecadado com impostos para a manutenção e o desenvolvimento do
ensino. Veja:
Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos,
compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.
Lei complementar do Estado de Goiás
O Estado de Goiás editou a Lei Complementar 147/2018, que alterou o art. 99 da Lei Complementar
estadual 26/1998, para incluir o pagamento de pessoal inativo nas despesas com manutenção e
desenvolvimento do ensino.
Essa previsão é constitucional?
NÃO.
É inconstitucional lei estadual que inclui o pagamento de pessoal inativo nas despesas consideradas
como de manutenção e desenvolvimento do ensino.
STF. Plenário. ADI 6049/GO, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/8/2021 (Info 1026).
As despesas com encargos previdenciários não podem ser computadas como aplicação de recursos na
manutenção e desenvolvimento de ensino, para os fins do art. 212 da CF/88.
O art. 22, XXIV, da C/88 estabelece que a União possui competência privativa para fixar as diretrizes e
bases da educação nacional:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
(...)
XXIV - diretrizes e bases da educação nacional;
(...)
Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões
específicas das matérias relacionadas neste artigo.
Em complemento, a Constituição também conferiu primazia à União ao imputar-lhe a competência para
estabelecer normas gerais sobre educação e ensino, reservando aos Estados e ao Distrito Federal um
espaço de competência suplementar:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
(...)
IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e
inovação;
No exercício desta competência legislativa, foi promulgada a Lei nº 9.394/96. Esta lei geral – aplicada de
forma equânime a todo o território nacional – prevê quais despesas podem ser consideradas como
realizadas na manutenção e desenvolvimento do ensino. Veja:
Art. 70. Considerar-se-ão como de manutenção e desenvolvimento do ensino as despesas
realizadas com vistas à consecução dos objetivos básicos das instituições educacionais de todos
os níveis, compreendendo as que se destinam a:
I - remuneração e aperfeiçoamento do pessoal docente e demais profissionais da educação;
II - aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos necessários
ao ensino;
III – uso e manutenção de bens e serviços vinculados ao ensino;
IV - levantamentos estatísticos, estudos e pesquisas visando precipuamente ao aprimoramento
da qualidade e à expansão do ensino;
V - realização de atividades-meio necessárias ao funcionamento dos sistemas de ensino;
VI - concessão de bolsas de estudo a alunos de escolas públicas e privadas;
VII - amortização e custeio de operações de crédito destinadas a atender ao disposto nos incisos
deste artigo;
VIII - aquisição de material didático-escolar e manutenção de programas de transporte escolar.
Art. 71. Não constituirão despesas de manutenção e desenvolvimento do ensino aquelas
realizadas com: I - pesquisa, quando não vinculada às instituições de ensino, ou, quando efetivada fora dos
sistemas de ensino, que não vise, precipuamente, ao aprimoramento de sua qualidade ou à sua
expansão;
II - subvenção a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial, desportivo ou cultural;
III - formação de quadros especiais para a administração pública, sejam militares ou civis, inclusive
diplomáticos;
IV - programas suplementares de alimentação, assistência médico-odontológica, farmacêutica e
psicológica, e outras formas de assistência social;
V - obras de infra-estrutura, ainda que realizadas para beneficiar direta ou indiretamente a rede
escolar;
VI - pessoal docente e demais trabalhadores da educação, quando em desvio de função ou em
atividade alheia à manutenção e desenvolvimento do ensino.
Assim, não há como se considerar válida lei estadual que inclua no conceito de “manutenção e
desenvolvimento do ensino” o pagamento dos servidores inativos da área da educação, em arrepio às
disposições da Lei de Diretrizes e Bases, que consiste em legítimo exercício da competência legislativa da
União, constitucionalmente assegurado.
Emenda Constitucional 108/2020
Além disso, é importante saber que, após o ajuizamento desta ação e o deferimento da cautelar, foi
promulgada a EC 108, de 26 de agosto de 2020, que incluiu o § 7º no art. 212 da CF/88 e passou a vedar
expressamente o uso dos recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino para o
pagamento de aposentadorias e pensões:
Art. 212 (...)
§ 7º É vedado o uso dos recursos referidos no caput e nos §§ 5º e 6º deste artigo para pagamento
de aposentadorias e de pensões.
Vinculação de receitas
A lei complementar impugnada afronta, ainda, os arts. 167, IV, e 212, caput, da CF/88, porquanto vincula
parte das receitas provenientes de impostos ao pagamento de despesas com inativos, os quais deveriam
ser, em princípio, custeados pelas receitas do regime previdenciário.
Com esses entendimentos, o Plenário, confirmando a medida liminar deferida, julgou procedente pedido
formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei Complementar 147/2018, que
acrescentou o inciso VIII no art. 99 da LC 26/1998, ambas do estado de Goiás.