RECURSO ESPECIAL Nº 1.819.956 - SP (2019/0031552-3)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL.
HONORÁRIOS FIXADOS NO DESPACHO INICIAL. ACORDO HOMOLOGADO NO DIA
SUBSEQUENTE À DESTITUIÇÃO DOS PATRONOS. SUCUMBÊNCIA. EXISTÊNCIA.
EXECUÇÃO DA VERBA HONORÁRIA NOS PRÓPRIOS AUTOS. POSSIBILIDADE. RECURSO
ESPECIAL PROVIDO.
1. O propósito recursal reside em saber se, revogado o mandato dos patronos da parte no
curso da ação, é necessário o ajuizamento de ação autônoma para arbitramento de
honorários sucumbenciais ou se é possível a execução da verba honorária nos próprios
autos da demanda extinta em decorrência da sentença homologatória de transação firmada
entre as partes, a qual não dispôs sobre os honorários.
2. É indiscutível o fato de que a jurisprudência desta Corte Superior entende que os
honorários fixados no despacho inicial da execução possuem caráter provisório. Contudo,
percebe-se que a legislação de regência prevê apenas a majoração desses honorários, não
havendo previsão legal para que a aludida verba seja reduzida, salvo no caso de pagamento
do débito no prazo de 3 (três) dias, o que não se verifica na espécie.
2.1. Por conseguinte, ao fixá-los no mínimo de 10% sobre a dívida, o Magistrado de primeiro
grau garantiu o recebimento desse valor, no mínimo, exceto se o próprio escritório de
advogados tivesse transacionado sobre seu direito, o que não ocorreu, de modo que a
referida decisão deve ser considerada um título executivo.
2.2. Ademais, a transação extrajudicial ocorrida na hipótese se deu para reconhecimento do
débito e parcelamento do débito, de maneira que houve sucumbência por parte da devedora,
que reconheceu sua dívida e se comprometeu a adimpli-la nos termos do acordo firmado.
2.3. O pedido de homologação da transação extrajudicial foi protocolado exatamente no dia
posterior à revogação do mandato outorgado ao escritório recorrente, e não existiu nenhuma
disposição acerca dos honorários no acordo entabulado.
2.4. Portanto, a decisão inicial que arbitrou os honorários advocatícios pode ser considerada
como um título executivo, até mesmo em homenagem ao princípio da instrumentalidade das
formas, pois as partes não seriam prejudicadas e o processo atingiria sua finalidade sem o
indesejável e excessivo apego ao formalismo.
3. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, dar provimento
ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze, que lavrará o
acórdão.
Vencidos os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Nancy Andrighi.
Votaram com o Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze os Srs. Ministros Moura Ribeiro
(Presidente) e Paulo de Tarso Sanseverino.
Brasília, 10 de dezembro de 2019 (data do julgamento).
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA:
Trata-se de recurso especial interposto por BICHARA ADVOGADOS, com
fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão
do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim ementado:
"EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL.
Formalização de acordo e suspensão do curso do processo executivo. Hipótese
em que, em momento precedente à protocolização da petição de acordo, ocorreu
a revogação do mandato conferido à banca de advocacia agravante. Sentença
homologatória que não deliberou sobre a verba honorária sucumbencial, porque
dela não cogitou a transação alcançada pelas partes. Consideração de que,
tendo sido revogada a procuração outorgada à agravante em momento
precedente à celebração de acordo ou à prolação de sentença que tenha
definido a verba honorária sucumbencial, não se viabiliza a execução, por direito
autônomo, de seus honorários [cujo arbitramento deverá ser perseguido por meio
de ação autônoma] no feito em que se operou a revogação, sob pena de se
estabelecer indevida lide paralela entre os diversos advogados que
sucessivamente possam ter atuado no feito. Decisão mantida. Recurso improvido"
(e-STJ fl. 1.363).
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados.
Em suas razões (e-STJ fls. 1.375/1.397), a parte recorrente alega violação dos
seguintes dispositivos legais com as respectivas teses:
(a) artigos 23 e 24, §§ 1º e 4º, da Lei nº 8.906/94 – ao fundamento de que o
acórdão recorrido retirou a "natureza autônoma" dos honorários sucumbenciais, ao não permitir
a execução da referida verba por parte dos antigos patronos (cujo mandato foi anteriormente
revogado) nos próprios autos do feito executivo que foi extinto em decorrência da transação
efetivada pelas partes;
(b) artigos 85, caput e §§ 1º e 2º, e 827, § 2º, do Código de Processo Civil de
2015 – porque a decisão homologatória da transação não fixou a verba sucumbencial previstas
na legislação processual, e ao fundamento de que o julgamento monocrático da apelação feriu
asgarantias processuais dos recorrentes, porquanto não observados os requisitos previstos no
referido dispositivo legal, e
(c) artigos 489, § 1º e 1.022, II, do Código de Processo Civil de 2015
(subsidiariamente) – postulando a nulidade do aresto impugnado, pois o Tribunal de origem,
mesmo após ter sido provocado pela oposição de embargos declaratórios, teria deixado de
analisar questão reputada obscura pela recorrente.
Apresentadas as contrarrazões (e-STJ fls. 1.442/1.457), e inadmitido o recurso na
origem, determinou-se a conversão do agravo (AREsp nº 1.444.160/SP) em recurso especial
para melhor exame da matéria (e-STJ fls. 1.551/1.552).
É o relatório.
VOTO-VENCIDO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA:
O recurso não merece prosperar.
O julgamento do recurso especial é realizado com base nas normas do Código de
Processo Civil de 2015 por ser a lei processual vigente na data de publicação da decisão ora
impugnada (cf. Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
A controvérsia a ser dirimida reside em verificar (i) se a sociedade de advogados
que patrocinou os interesses da exequente no curso da execução e teve seu mandato revogado
antes da sentença homologatória da transação firmada entre as partes sem disposição acerca
de verba honorária pode prosseguir com a execução dos honorários que entende devidos nos
próprios autos do feito executivo, e não necessariamente em ação autônoma, e (ii) se houve
negativa de prestação jurisdicional.
1. Histórico
Extrai-se dos autos que POSTALIS - Instituto de Seguridade Social dos Correios e
Telégrafos ajuizou, sob o patrocínio da ora recorrente (Bichara Advogados), execução de título
extrajudicial (cédula de crédito imobiliário) contra União das Instituições Educacionais do Estado
de São Paulo - UNIESP, ASSOCIAÇÃO FACULDADE DE RIBEIRÃO PRETO LTDA., CLÁUDIA
APARECIDA PEREIRA e JOSÉ FERNANDO PINTO DA COSTA.
No curso da demanda, a exequente revogou o mandato outorgado à ora
recorrente e, um dia após, formalizou transação judicial para suspender o feito executivo,
assistida agora por novo escritório de advocacia (Balera Advogados).
Homologado o acordo sem nenhuma disposição acerca da verba sucumbencial, a
recorrente postulou a execução do valor que julga ter direito no bojo da própria demanda
executiva, o que foi indeferido pelo magistrado de piso ante a revogação do respectivo
mandato, remetendo a questão a ação própria.
Interposto agravo de instrumento, o Tribunal de origem, por maioria, negou-lhe
provimento nos seguintes termos:
"(...)
O recurso não comporta provimento.
De início, impende considerar que, numa análise perfunctória da
situação retratada nestes autos [a matéria deverá ser objeto de ação autônoma],
afigura-se realmente justificável a indignação dos integrantes da banca de
advocacia o agravante, ante a inusitada postura adotada pelo exequente e pelos
advogados constituídos em momento imediatamente subsequente à revogação do
mandato outorgado aos patronos que atuaram inicialmente no feito em defesa
dos interesses do credor, circunstância que, no entanto, considerada a
inexistência de disposição sobre honorários advocatícios sucumbenciais no
acordo entabulado pelas partes e judicialmente homologado (fls. 25 e
106/110), inviabiliza nesta causa que a agravante possa aqui alvitrar a
adjudicação em seu prol de verba honorária sucumbencial [tal natureza não
têm os honorários inicialmente arbitrados], haja vista que, como assinalado,
sendo omisso o acordo a respeito de tal encargo, a sentença homologatória
da transação, que, conquanto tenha determinado apenas a suspensão da
execução, nos termos do artigo 922, do Código de Processo Civil, do tema
não cuidou. Aliás, releva destacar que dispõe o artigo 23, da Lei n. 8.906/94
(Estatuto da Advocacia), que 'os honorários incluídos na condenação, por
arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito
autônomo para executar a sentença nesta parte,...', do que resulta claro que,
tendo sido o mandato revogado em momento em que não havia fixação por
sentença de honorários advocatícios (fls. 501/502), não há se cogitar do
direito ao arbitramento da verba honorária nestes próprios autos, nem
mesmo ao direito autônomo à execução da sentença neste caso, porque a
decisão proferida não contempla deliberação acerca do tema, inexistindo,
portanto, título judicial no particular. É preciso deixar bem assentado que, em absoluto, preconiza-se
aqui que a banca de advocacia agravante não faça jus a honorários que importem
em justa e digna retribuição ao trabalho desenvolvido por seus integrantes no
feito, ao longo de alguns anos, na defesa dos interesses de seu constituinte, mas,
em contrapartida, não há se olvidar que, na hipótese em apreço, não incide a
regra a que alude o artigo 23, do Estatuto da Advocacia, cumprindo-lhe
então postular o arbitramento de seus merecidos honorários pelos meios
próprios. Deveras, diversa seria a situação se o acordo tivesse sido
celebrado pelas partes em momento subsequente à definição por sentença
dos honorários cabentes à sociedade agravante, dúvida não remanescendo
no sentido de que descabe ao advogado cujo mandato foi revogado postular
nos mesmos autos da ação que patrocinava seu cliente o recebimento de
honorários que não tenham sido anteriormente fixados por sentença, por
isso que, como assentado com correção na r. decisão agravada, tal direito
somente poderá ser exercido por meio de ação autônoma.
Ora, revogado o mandato que lhe foi conferido em momento
precedente à celebração de acordo ou à prolação de sentença que tenha
definido a verba honorária sucumbencial, como se deu na espécie, não fará
o advogado jus à execução, por direito autônomo, de seus honorários (cujo
arbitramento, repita-se, deverá ser perseguido pelo meio adequado) no feito
em que se operou a revogação, sob pena de se estabelecer indevida lide
paralela entre os diversos advogados que sucessivamente possam ter atuado no
feito" (e-STJ fls. 1.364/.1365 - grifou-se).
A sociedade de advogados interpôs, então, o presente recurso especial, no qual
as teses apontadas no agravo de instrumento manejado na origem.
Alega, em resumo que, na linha do voto vencido, para se exigir o arbitramento em
ação autônoma é preciso que o novo patrono também reclame litigiosamente sua participação
proporcional na verba sucumbencial, o que não ocorreu no caso dos autos.
No ponto, afirma que o acórdão recorrido sujeitou o direito do advogado ao
alvedrio das partes, pois,
"(...) assim como fizeram o Postalis e a UNIESP, bastaria às partes
desinteressadas em arcar com a verba sucumbencial (que sem sombra de dúvida
onera o acordo), ajustarem a revogação unilateral do mandato dos seus
causídicos. Pronto, todo o trabalho do advogado passa a estar sob o julgo do
cliente, em clara violação ao EOAB, premiando um comportamento nitidamente
desleal e de má-fé, em clara violação aos preceitos processuais e civis mais
comezinhos.
Admitir que a simples revogação unilateral do mandato, antes da
sentença e sem que haja acordo com as partes, pode afastar o direito à execução
da verba sucumbencial nos próprios autos é o mesmo que transferir à parte, de
forma quase que potestativa, o poder de dispor, por via indireta, da verba
sucumbencial, sabidamente de natureza autônoma, violando, por conseguinte, o
art. 23 do EOAB e, também, os §§ 1º e 4º do art. 24 da mesma lei, os quais
consagram expressamente a autonomia dos honorários e vedam que o acordo
das partes lhes prejudique, resguardando o direito de execução nos próprios
autos independentemente do que as partes convencionarem entre si" (e-STJ fl.
1.384).
Requer, assim, a reforma do acórdão recorrido para autorizar a execução da
verba honorária sucumbencial nos autos do próprio feito executivo que foi objeto da transação,
com a consequente fixação do percentual mínimo de 10% (dez por cento) previsto no § 2º do
art. 85 do CPC/2015.
2. Do mérito
De início, impende ressaltar que esta Corte tem entendimento consolidado no
sentido de que os honorários fixados no despacho inicial da execução possuem caráter
provisório, podendo ser majorados, reduzidos ou até excluídos, só sendo possível, assim, aferir
a correta sucumbência ao final do processo.
Nesse sentido:
"AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL.
HONORÁRIOS FIXADOS POR DESPACHO INICIAL EM EXECUÇÃO. FEITO EXTINTO POR INICIATIVA DAS PARTES. TRANSAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE
SUCUMBÊNCIA.
1. Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, os honorários
fixados no despacho inicial da execução possuem caráter provisório,
podendo ser majorados, reduzidos ou até mesmo excluídos, só se
conhecendo da sucumbência ao final do processo quando o magistrado
considerará todo o trabalho dos advogados. 2. Desse modo, havendo composição entre as partes no tocante ao débito objeto
da execução, dispondo inclusive acerca dos honorários advocatícios, não mais
subsistem os honorários fixados no despacho que recebe a execução, não
havendo que se falar em sucumbência, especialmente porque não houve
vencedor nem vencido.
3. Agravo interno a que se nega provimento."
(AgInt no REsp 1.487.433/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA,
julgado em 28/03/2019, DJe 11/04/2019 - grifou-se)
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA FIXADOS NOS EMBARGOS DO
DEVEDOR. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA
DA LIDE. SÚMULA 7 DO STJ. INCIDÊNCIA.
1. Os honorários fixados no despacho inicial da execução podem ter caráter
provisório e ser substituídos na oportunidade de arbitramento de honorários
nos embargos à execução, em que o magistrado considerará todo o trabalho
dos advogados até aquele momento.
2. A reforma do valor dos honorários demanda o reexame do conjunto fático e
probatório dos autos, vedado pelo enunciado 7 da Súmula do STJ.
3. Agravo regimental a que se nega provimento."
(AgRg no AREsp 616.452/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA
TURMA, julgado em 1º/03/2016, DJe de 04/03/2016 - grifou-se)
"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. TÍTULO EXTRAJUDICIAL.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO PROVISÓRIA. ACORDO
HOMOLOGADO. EXECUÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
PROVISÓRIOS. DESCABIMENTO. OMISSÃO INEXISTENTE. REEXAME DE
PROVAS. SÚMULA Nº 7/STJ. DISSÍDIO NÃO CONFIGURADO. FALTA DE
SIMILITUDE. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA Nº 282/STF.
1. Cinge-se a controvérsia a saber se os advogados da exequente mantêm o
direito à percepção dos honorários fixados no despacho que recebe a execução,
a qual foi posteriormente extinta em virtude de homologação de acordo entre as
partes, em que se estabeleceu que cada parte arcaria com os honorários de seus
respectivos patronos.
2. Os honorários fixados no início da execução são provisórios, pois só se
conhecerá a sucumbência final quando do julgamento dos embargos.
Precedentes do STJ. 3. Havendo composição entre as partes quanto à dívida principal, dispondo
expressamente sobre os honorários advocatícios, não subsistem os honorários
fixados no despacho que recebe a execução. Não há falar em sucumbência
quando não existe vencedor nem vencido, cabendo às partes dispor sobre o ônus
do pagamento da verba.
4. Ressalva-se o direito dos advogados que se reputarem prejudicados o
ajuizamento de ação autônoma para pleitear a percepção da verba honorária,
bem como o respectivo valor, tudo conforme a extensão de sua atuação no processo.
5. Rever as conclusões do Tribunal de origem - para entender que os recorrentes
atuaram em defesa dos direitos da exequente em diversos feitos - demandaria o
reexame de todo o acervo documental carreado aos autos de processo distinto, o
que é inviável em sede de recurso especial, no termos da Súmula nº 7/STJ.
6. Recurso especial conhecido em parte e não provido."
(REsp 1.414.394/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA
TURMA, julgado em 22/09/2015, DJe 30/09/2015 - grifou-se)
Assim, ao receber a execução, o juiz arbitra honorários apenas
provisoriamente, para a hipótese de pagamento, pelo executado, no prazo fixado no
art. 829 do CPC/2015. A continuidade da ação, por qualquer motivo, implica a
possibilidade de revisão da verba, que poderá ser majorada, reduzida, invertida ou
até mesmo suprimida.
Afasta-se, portanto, eventual alegação de que a fixação provisória de honorários
no despacho inicial do feito executivo pode constituir título hábil a aparelhar sua execução nos
próprios autos.
Da mesma forma, havendo composição amigável, como na hipótese dos
autos, não subsistem os honorários fixados no despacho que recebe a execução,
tampouco se pode falar em sucumbência, visto que não há vencedor ou vencido.
Com efeito, a transação é negócio jurídico bilateral, realizado entre as partes,
caracterizado por concessões mútuas a fim de pôr fim ao litígio.
Conforme Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, em seus
comentários, "pode ser celebrado dentro (por exemplo, na audiência) ou fora do processo"
(Código de Processo Civil comentado. 12. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, pág.
288), a teor do que dispõe o artigo 840 do Código Civil: "É lícito aos interessados prevenirem ou
terminarem o litígio mediante concessões mútuas."
Na espécie, consoante se extrai do voto condutor do acórdão recorrido, no
acordo celebrado e homologado judicialmente não há nenhuma disposição acerca de
verba honorária.
Tal circunstância afasta o direito da sociedade de advogados ora
recorrente de perseguir seu crédito advocatício no bojo da própria execução
originária diante da inexistência de decisão condenatória ao pagamento de honorários. Em
outras palavras, nos termos dos arts. 85 do CPC/2015 e 23 da Lei nº 8.906/1994, não há
nenhum título executivo hábil a amparar a pretensão da recorrente.
É possível que a conduta das partes litigantes e, principalmente, dos novos
patronos da exequente (Postalis) venha a merecer eventual censura. A revogação do mandato outorgado à recorrente no dia anterior à formalização do acordo, após o patrocínio dos
interesses da exequente ao longo de toda execução, inclusive com a realização de todas as
tratativas para consolidar os termos da transação, configura proceder no mínimo reprovável,
não usual.
Entretanto, como concluiu o acórdão recorrido, cabe à sociedade de
advogados recorrente, que se considera prejudicada, o ajuizamento de ação
autônoma para o recebimento do crédito advocatício que entende devido, meio
processual no qual será fixado o respectivo valor da verba, nos termos de sua
atuação no processo e da complexidade do trabalho desenvolvido.
A decisão do Tribunal de origem, portanto, não representa ofensa alguma aos
arts. 23 e 24 da Lei nº 8.906/1994.
A propósito, eis o seguinte precedente desta Terceira Turma que bem elucida a
questão:
"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. TÍTULO EXTRAJUDICIAL.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO PROVISÓRIA. ACORDO
HOMOLOGADO. EXECUÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
PROVISÓRIOS. DESCABIMENTO. OMISSÃO INEXISTENTE.. REEXAME DE
PROVAS. SÚMULA Nº 7/STJ. DISSÍDIO NÃO CONFIGURADO. FALTA DE
SIMILITUDE. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA.SÚMULA Nº 282/STF.
1. Cinge-se a controvérsia a saber se os advogados da exequente mantêm o
direito à percepção dos honorários fixados no despacho que recebe a execução,
a qual foi posteriormente extinta em virtude de homologação de acordo entre as
partes, em que se estabeleceu que cada parte arcaria com os honorários de seus
respectivos patronos.
2. Os honorários fixados no início da execução são provisórios, pois só se
conhecerá a sucumbência final quando do julgamento dos embargos.
Precedentes do STJ.
3. Havendo composição entre as partes quanto à dívida principal, dispondo
expressamente sobre os honorários advocatícios, não subsistem os
honorários fixados no despacho que recebe a execução. Não há falar em
sucumbência quando não existe vencedor nem vencido, cabendo às partes
dispor sobre o ônus do pagamento da verba.
4. Ressalva-se o direito dos advogados que se reputarem prejudicados o
ajuizamento de ação autônoma para pleitear a percepção da verba
honorária, bem como o respectivo valor, tudo conforme a extensão de sua
atuação no processo. 5. Rever as conclusões do Tribunal de origem - para entender que os recorrentes
atuaram em defesa dos direitos da exequente em diversos feitos - demandaria o
reexame de todo o acervo documental carreado aos autos de processo distinto, o
que é inviável em sede de recurso especial, no termos da Súmula nº 7/STJ.
6. Recurso especial conhecido em parte e não provido."
(REsp 1.414.394/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA
TURMA, julgado em 22/09/2015, DJe 30/09/2015 - grifou-se)
Por fim, não se desconhece precedente deste colegiado (AgRg no REsp nº 1.432.325/RJ, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze) que possibilitou a execução da
verba honorária sucumbencial no bojo da própria execução originária:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
EXECUÇÃO. TÍTULO EXTRAJUDICIAL. HONORÁRIOS. ACORDO ENTRE AS
PARTES. LEGITIMIDADE PASSIVA. EXECUTADO. VERIFICAÇÃO. AGRAVO
REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. Subjaz íntegra a legitimidade passiva do recorrente para figurar no polo
passivo da execução, pois não abarcada a sua exclusão pela decisão que
homologou a transação e determinou o rateio da verba honorária relativamente
aos advogados que participaram da transação.
2. Agravo regimental a que se nega provimento."
(AgRg no REsp 1.432.325/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE,
TERCEIRA TURMA, julgado em 07/04/2016, DJe 15/04/2016)
Contudo, a base fática do citado precedente é diversa da hipótese ora em exame.
Naquele caso, a sentença homologatória da transação no feito executivo fixou a verba
sucumbencial devida, baseando-se o relator nessa circunstância para permitir o
prosseguimento da execução relativa aos honorários nos mesmos autos. No presente caso, não
houve, no acordo, alusão a verba honorária, motivo pelo qual, como já mencionado, não existe
título a embasar a execução dos honorários sucumbenciais nos autos da própria execução.
3. Da prejudicialidade da alegação de violação dos arts. 498 e 1.022 do
CPC/2015
Por fim, no tocante à alegada negativa de prestação jurisdicional, quanto à
suposta omissão no julgado impugnado, observa-se que as questões invocadas nos embargos
declaratórios opostos na origem foram decididas no presente recurso, motivo por que a
irresignação, neste particular, encontra-se prejudicada.
4. Do dispositivo
Ante o exposto, conheço do recurso especial para negar-lhe provimento.
É o voto.
VOTO-VENCEDOR
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:
A controvérsia submetida ao exame do colegiado está em saber se,
revogado o mandato dos patronos da parte no curso da ação, é necessário o ajuizamento
de ação autônoma para arbitramento de honorários sucumbenciais ou se é possível a
execução da verba honorária nos próprios autos da demanda extinta em decorrência da
sentença homologatória de transação firmada entre as partes, a qual não dispôs sobre os
honorários.
O Ministro Relator bem delineou a moldura fática dos autos, segundo a qual
a Postalis - Instituto de Previdência Complementar ajuizou ação de execução de título
extrajudicial, patrocinada pela sociedade Bichara Advogados, em desfavor de Sociedade
Administradora e Gestão Patrimonial Ltda. e outros.
Durante a marcha processual, houve a revogação do mandato outorgado à
sociedade advocatícia recorrente, com a nomeação de novo escritório, o Balera
Advogados, sendo que, no dia subsequente à revogação, houve a formalização da
composição amigável.
Ressalta-se que o acordo homologado nada dispôs acerca da verba
sucumbencial, o que ensejou o pedido da recorrente, no bojo da própria execução, de
pagamento dos honorários sucumbenciais a que teria direito. O Magistrado de primeiro
grau, contudo, indeferiu o pleito, ao argumento de que o mandato teria sido revogado,
devendo ser requerido em ação autônoma.
Contra a aludida decisão foi interposto agravo de instrumento, o qual, por
maioria, foi desprovido pela Décima Nona Câmara de Direito Privado do Tribunal de
Justiça de São Paulo.
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.
Em seu recurso especial, a banca de advogados alega, a pretexto de
violação aos arts. 85, §§ 1º e 2º, 489, § 1º, 827, § 2º, e 1.022, I, do CPC/2015; e 23 e 24, §§
1º e 4º, do Estatuto da OAB, a negativa de prestação jurisdicional e possibilidade de execução da verba sucumbencial na própria demanda extinta pela homologação do
acordo.
O voto do relator, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, conclui pelo
desprovimento do recurso especial, ao argumento de que os honorários fixados no
despacho inicial da execução possuem caráter provisório, pois podem ser majorados,
reduzidos e até excluídos, de modo que não haveria título hábil a subsidiar a execução da
verba nos próprios autos.
Assevera, ainda, que a composição amigável dispensa os honorários
arbitrados no despacho inicial da execução, pois a transação afastaria a sucumbência,
visto que não há vencedor ou vencido, tornando necessário, portanto, que a sociedade de
advogados recorrente busque seu crédito em ação autônoma.
Em razão da importância do tema, pedi vista dos autos para maior reflexão
e, após profunda análise dos autos, entendo, contudo, que o caso em julgamento
comporta solução diversa, haja vista suas peculiaridades.
Acerca do tema, relembre-se que o art. 23 da Lei n. 8.906/1994 (Estatuto da
OAB) determina que os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou
sucumbência, pertencem ao advogado. Por sua vez, o caput do art. 24 do mesmo diploma
prevê que a decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os
estipular são títulos executivos, enquanto o seu § 1º possibilita que a execução dos
honorários seja promovida nos mesmos autos da ação em que tenha atuado o advogado,
se assim lhe convier.
Ademais, é incontroverso que a jurisprudência desta Corte Superior entende
que os honorários fixados no despacho inicial da execução possuem caráter provisório, ou
seja, poderão ser majorados, reduzidos ou excluídos, conforme o resultado final do
processo, como bem destacou o voto do Ministro Relator.
Esse entendimento decorre da interpretação do art. 827, caput e § 2º, do
CPC/2015, o qual dispõe que o Magistrado, ao despachar a inicial da execução, fixará os
honorários advocatícios em 10% sobre o valor do débito, sendo possível a majoração de
tal verba para até 20%, caso rejeitados os embargos à execução.
Por outro lado, interpretando-se a referida regra conjuntamente com o § 1º
daquele mesmo dispositivo, percebe-se que a legislação de regência prevê apenas a majoração dos honorários fixados na decisão que recebe a ação de execução, não
havendo previsão legal para que a aludida verba seja reduzida, salvo no caso de
pagamento do débito no prazo de 3 (três) dias - exceção essa que não se concretizou no
caso vertente.
Portanto, como os honorários foram fixados pelo Magistrado a quo em 10%
sobre o valor do débito, o mínimo que os patronos da exequente receberiam seria este
valor, já que a dívida não foi adimplida dentro do prazo de 3 (três) dias, de modo que, com
a mais respeitosa vênia, é possível a postulação dos honorários advocatícios na própria
ação de execução.
Deve-se consignar, também, o fato de serem sucumbenciais os honorários
que ora se buscam receber, e não os contratuais. Por conseguinte, ao fixá-los no mínimo
de 10% sobre a dívida, o Magistrado de primeiro grau garantiu o recebimento desse valor,
no mínimo, exceto se o próprio escritório de advogados tivesse transacionado sobre seu
direito, o que não ocorreu, de modo que a referida decisão deve ser considerada um título
executivo.
A Quarta Turma do STJ já se posicionou nesse sentido ao analisar caso
semelhante:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO
EXTRAJUDICIAL. HONORÁRIOS PARA PRONTO PAGAMENTO
FIXADOS EM 10% DO VALOR DA EXECUÇÃO. ADIMPLEMENTO
POSTERIOR MEDIANTE TRANSAÇÃO. RECONHECIMENTO DO
PEDIDO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS DEVIDOS. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO.
1. De acordo com a iterativa jurisprudência desta Corte, o acordo
firmado entre as partes, sem a concordância do advogado, não afasta
seu direito ao recebimento dos honorários advocatícios convencionais
e dos advindos de sentença judicial (Lei 8.906/94, art. 24, § 4º).
2. Realizada a transação entre as partes antes de haver
pronunciamento judicial fixando honorários, entende-se não haver
prejuízo ao causídico constituído, que tinha mera expectativa de
direito em relação aos honorários sucumbenciais. Precedente.
3. Na espécie, não houve sentença judicial fixando honorários
advocatícios, mas tem-se fixação inicial provisória de honorários na
execução. Não foram opostos embargos à execução, nem houve
pronto pagamento propriamente, mas transação entre as partes
pondo fim à execução de título extrajudicial, com fundamento no art.
794, II, do Código de Processo Civil.
4. O reconhecimento pelo executado de que a transação importou o
pagamento do montante total do débito executado, com todos os
acréscimos legais decorrentes, equivale ao reconhecimento do pedido (CPC, art. 26) e, na execução, a pronto pagamento, autorizando a
execução dos honorários sucumbenciais fixados para tal hipótese.
5. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 729021/RS, Rel. Min.
Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 03/02/2015, DJe 06/02/2015)
Ressalte-se, ainda, que a transação extrajudicial ocorrida na hipótese se deu
para reconhecimento do débito e parcelamento do débito, de maneira que, a meu ver,
houve sucumbência por parte da devedora, que reconheceu sua dívida e se comprometeu
a adimpli-la nos termos do acordo firmado.
Pontue-se, ademais, que o acordo firmado pelo constituinte do advogado e a
parte contrária não prejudica os honorários advocatícios, salvo aquiescência do
profissional, consoante prevê o art. 24, § 4º, do Estatuto da OAB.
Diante dessa consideração, vê-se que o caso em apreço possui uma
questão muito específica, que é o fato de ter o pedido de homologação da transação
extrajudicial sido protocolado exatamente no dia posterior à revogação do mandato
outorgado ao escritório recorrente, assim como não existir nenhuma disposição acerca
dos honorários no acordo entabulado.
Como asseverado pelo voto vencido do acórdão a quo, em razão dessa
particularidade, o que se nota é a atuação das partes no sentido de se esquivar,
aparentemente de forma indevida, do pagamento dos honorários devidos à banca de
advogados que até então representava a exequente.
Por conseguinte, o negócio jurídico firmado pelas litigantes não pode ser
oponível ao patrono que não participou da transação e foi diretamente afetado pelos seus
efeitos, a ponto de ter excluído um direito que lhe era próprio.
Outro ponto singular à presente demanda é a circunstância de que o
escritório de advogados que sucedeu a ora recorrente não postula o recebimento de
honorários sucumbenciais, mesmo não tendo havido nenhuma disposição sobre a matéria
na composição, de forma que, se for afastada a possibilidade de execução dos honorários
nos presentes autos, restaria caracterizada uma demanda em que não houve condenação
ao pagamento da sucumbência, mesmo tendo havido parte sucumbente, como já
assinalado anteriormente.
Nesse contexto, a decisão inicial que arbitrou os honorários advocatícios pode ser considerada como um título executivo, até mesmo em homenagem ao princípio
da instrumentalidade das formas, pois as partes não seriam prejudicadas e o processo
atingiria sua finalidade sem o indesejável e excessivo apego ao formalismo.
Ante o exposto, rogando as mais respeitosas vênias ao Ministro Relator, voto
no sentido de dar provimento ao recurso especial de Bichara Advogados a fim de permitir o
prosseguimento da ação de execução para cobrança dos honorários sucumbenciais.
É como voto.