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6 de junho de 2021

O simples fato de o condutor responsável pelo acidente de trânsito ter fugido sem prestar socorro à vítima não configura dano moral in re ipsa; logo, o dano moral terá que ser demonstrado para que haja indenização

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-694-stj-1.pdf


RESPONSABILIDADE CIVIL - O simples fato de o condutor responsável pelo acidente de trânsito ter fugido sem prestar socorro à vítima não configura dano moral in re ipsa; logo, o dano moral terá que ser demonstrado para que haja indenização 

A omissão de socorro à vítima de acidente de trânsito, por si, não configura hipótese de dano moral in re ipsa. A evasão do réu do local do acidente pode, a depender do caso concreto, causar ofensa à integridade física e psicológica da vítima, no entanto, para isso, deverão ser analisadas as particularidades envolvidas. Haverá circunstâncias em que a fuga do réu, sem previamente verificar se há necessidade de auxílio aos demais envolvidos no acidente, superará os limites do mero aborrecimento e, por consequência, importará na devida compensação pecuniária do sofrimento gerado. Por outro lado, é possível conceber situação hipotética em que a evasão do réu do local do sinistro não causará transtorno emocional ou psicológico à vítima. Logo, o simples fato de ter havido omissão de socorro não significa, por si só, que houve dano moral. Não se trata de hipótese de dano moral presumido. STJ. 4ª Turma. REsp 1.512.001-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 27/04/2021 (Info 694). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

André dirigia sua moto, quando foi atingido, por trás, pelo veículo conduzido por João. O motociclista caiu ferido, mas João não parou para prestar socorro à vítima. Um pedestre, contudo, anotou a placa do carro. Algum tempo depois, André ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais contra João. O juiz julgou parcialmente procedente o pedido e condenou João a pagar indenização pelos prejuízos materiais que a vítima demonstrou. Por outro lado, o magistrado negou o pedido de indenização por danos morais, sob o argumento de que não ficaram comprovados. A vítima recorreu alegando que a evasão do motorista do local dos fatos, lá deixando a outra parte envolvida sem a devida prestação de socorro, caracteriza, por si só, dano moral, em razão do abandono a que a vítima foi submetida. 

A tese de André foi acolhida pelo STJ? O simples fato de ter havido omissão de socorro significa, por si só, que houve dano moral? Trata-se de dano moral in re ipsa? NÃO. 

O que é dano moral in re ipsa? 

Em algumas situações, a doutrina e a jurisprudência afirmam que a demonstração do dano moral não é necessária, bastando se demonstrar que houve a prática do ato. Nesse caso, fala-se em damnun in re ipsa, também conhecido como dano moral in re ipsa. Quando dizemos que algo gera dano moral in re ipsa, significa que aquele ato ilícito acarreta, como consequência lógica e inafastável, um abalo moral na vítima, sendo, portanto, desnecessário que se prove um abalo psicológico suportado pela vítima. Trata-se de uma presunção judicial. Assim, “demonstrada a prova do fato lesivo, não há a necessidade de se comprovar o dano moral, porque ele é tido como lesão à personalidade, à honra da pessoa, revelandose, muitas vezes, de difícil demonstração, por atingir reflexos estritamente íntimos” (CAMBI, Eduardo. HELLMAN, Renê Francisco. O dano moral in re ipsa e sua dimensão probatória na jurisprudência do STJ. Revista de Processo. Vol. 291. Ano 44. São Paulo: Ed. RT. 2019, p. 317). 

Dessa forma, determinados atos ilícitos sempre ocasionam dor e sofrimento, dispensando, por conseguinte, a produção de prova desse dano moral. 

Exemplos de dano moral in re ipsa 

• morte de parente (STJ. 4ª Turma. AgInt no REsp 1165102/RJ, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 17/11/2016); 

• recusa indevida do plano de saúde de realizar tratamento prescrito por médico (STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1573618/GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/06/2020); 

• publicação não autorizada de imagem (STJ. 3ª Turma. AgInt no AgInt no AREsp 1546407/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/05/2020); 

• falha da prestação de serviço essencial (STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 771.013/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 13/10/2020); 

• agressão verbal ou física praticada por adulto contra criança ou adolescente (STJ. 3ª Turma. REsp 1642318-MS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 7/2/2017). 

Esse tema já foi cobrado em prova: 

 (Promotor MP/MS 2018) A conduta de agressão verbal de um adulto contra um adolescente configura elemento caracterizador da espécie do dano moral in re ipsa. (certo) 

No momento da sentença, qual dispositivo pode ser invocado pelo juiz para dispensar a produção da prova em caso de dano moral in re ipsa? O art. 375 do CPC/2015: 

Art. 375. O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial. 

Interpretação não pode ser elastecida 

A caracterização do dano moral in re ipsa não pode ser elastecida a ponto de afastar a necessidade de sua efetiva demonstração em qualquer situação. Isso porque ao proceder assim, se estaria a percorrer o caminho diametralmente oposto ao sentido da despatrimonialização do direito civil, transformando em caráter meramente patrimonial os danos extrapatrimoniais e fomentando a já bastante conhecida “indústria do dano moral”. Além disso, no dano moral in re ipsa ocorre uma presunção judicial que dificulta a defesa do réu. Diante disso, essas situações devem ficar restritas a casos muito específicos de ofensa a direitos da personalidade. 

A fuga do local do acidente não acarreta violação a direito da personalidade 

A evasão do réu do local do acidente pode, a depender do caso concreto, causar ofensa à integridade física e psicológica da vítima, no entanto, para isso, deverão ser analisadas as particularidades envolvidas. Haverá circunstâncias em que a fuga do réu, sem previamente verificar se há necessidade de auxílio aos demais envolvidos no acidente, superará os limites do mero aborrecimento e, por consequência, importará na devida compensação pecuniária do sofrimento gerado. Por outro lado, é possível conceber situação hipotética em que a evasão do réu do local do sinistro não causará transtorno emocional ou psicológico à vítima. Algumas circunstâncias que devem ser analisadas para saber se haverá, ou não, dano moral: a) alguém se feriu gravemente? b) houve pronto socorro por terceiros? c) a pessoa ferida estava consciente após o acidente? d) em decorrência do atraso do socorro, houve alguma sequela? e) a vítima possuía condição física e emocional de conseguir sozinha ajuda?

Essas circunstâncias precisam, portanto, ser examinadas no caso concreto, por intermédio das alegações das partes e das provas produzidas, atendendo aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 

Em suma: A omissão de socorro à vítima de acidente de trânsito, por si, não configura hipótese de dano moral in re ipsa. STJ. 4ª Turma. REsp 1.512.001-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 27/04/2021 (Info 694).  



4 de maio de 2021

Informativo 694, STJ: A omissão de socorro à vítima de acidente de trânsito, por si, não configura hipótese de dano moral in re ipsa.

 REsp 1.512.001-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 27/04/2021

Acidente de trânsito. Evasão do local. Dano moral in re ipsa. Inexistência. Produção probatória. Necessidade


A omissão de socorro à vítima de acidente de trânsito, por si, não configura hipótese de dano moral in re ipsa.

Informações do Inteiro Teor

A omissão de socorro incontestavelmente possui elevada gravidade social, tanto que constitui o crime omissivo tipificado no art. 135 do Código Penal, ou, ainda, pode configurar conduta criminosa prevista no Código de Trânsito Brasileiro (arts. 304 e 305).

De fato, considerando a solidariedade um imperativo de ordem moral, de sua ausência pode decorrer um dever jurídico, como na omissão de socorro. Assim, todos são obrigados a agir para ajudar alguém que se encontre em estado de perigo, na medida de suas possibilidades, ou seja, sem risco pessoal.

No entanto, relevante ressaltar que, por afastar a necessidade da demonstração do dano moral, a presunção judicial dificulta a defesa do réu. Diante disso, a dedução lógica da ocorrência do dano deve ser restrita a casos muito específicos de ofensa a direitos da personalidade.

Segundo dispõe o art. 944 do CC/2002, a indenização deve somente reparar o dano daquele que foi atingido, na correta medida do prejuízo suportado.

Importa destacar que, para ser caracterizado o dano moral, deve-se previamente traçar o limite entre os meros incômodos da vida em sociedade e os fatos ensejadores da indenização.

Conquanto reconhecer que a evasão do réu do local do acidente pode, de fato, causar ofensa à integridade física e psicológica da vítima, verifica-se também a possibilidade de, dependendo do contexto fático, não existir violação a direito da personalidade, razão pela qual há relevância em avaliar as particularidades envolvidas em cada caso concreto.

Realmente, haverá circunstâncias em que a fuga do réu, sem previamente verificar se há necessidade de auxílio aos demais envolvidos no acidente, superará os limites do mero aborrecimento e, por consequência, importará na devida compensação pecuniária do sofrimento gerado. Por outro lado, é possível conceber situação hipotética em que a evasão do réu do local do sinistro não causará transtorno emocional ou psicológico à vítima.

É prudente, portanto, averiguar as peculiaridades que envolvem o caso concreto para constatação do dano moral, tais como: I) se alguém se feriu gravemente; II) se houve pronto socorro por terceiros; III) se a pessoa ferida estava consciente após o acidente; IV) se, em decorrência do atraso do socorro, houve alguma sequela e qual sua extensão; e v) se a vítima possuía condição física e emocional de conseguir sozinha ajuda, entre outros fatores.

Sob esse prisma, o contexto do ato ilícito e suas consequências danosas, assim como o nexo causal, devem ser devidamente examinados pelo julgador por intermédio das alegações das partes e das provas produzidas, atendendo aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Feitas essas considerações, a omissão de socorro, por si, não configura hipótese de dano moral in re ipsa, sob pena de negar vigência ao disposto nos arts. 186 e 927 do CC/2002.