RECURSO ESPECIAL Nº 1.807.180 - PR (2019/0093736-8)
RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES
1ª SEÇÃO; UNÂNIME
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O RITO DOS
RECURSOS REPETITIVOS. INSCRIÇÃO DO DEVEDOR EM
CADASTROS DE INADIMPLENTES POR DECISÃO JUDICIAL.
EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE. ART. 5º, INC. LXXVIII, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ARTS. 4º, 6º, 139, INC. IV, 782, §§3º A 5º, E
805 DO CPC/2015. PRINCÍPIOS DA EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO, DA
ECONOMICIDADE, DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E DA
MENOR ONEROSIDADE PARA O DEVEDOR. ART. 1º DA LEI Nº
6.830/80. EXECUÇÃO FISCAL. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CPC.
SERASAJUD. DESNECESSIDADE DE ESGOTAMENTO PRÉVIO DE
OUTRAS MEDIDAS EXECUTIVAS. DEFERIMENTO DO
REQUERIMENTO DE NEGATIVAÇÃO, SALVO DÚVIDA RAZOÁVEL
QUANTO À EXISTÊNCIA DO DIREITO AO CRÉDITO PREVISTO NA
CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA - CDA. CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS
DA DECISÃO JUDICIAL PARA A PRECISÃO E QUALIDADE DOS
BANCOS DE DADOS DOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO E
PARA A ECONOMIA DO PAÍS. ART. 20 DO DECRETO-LEI Nº
4.657/1942 (ACRESCENTADO PELA LEI Nº 13.655/2018, NOVA
LINDB). RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. RECURSO
JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO
CPC/2015 C/C ART. 256-N E SEGUINTES DO REGIMENTO INTERNO
DO STJ.
1. O objeto da presente demanda é definir se o art. 782, §3º do CPC é
aplicável apenas às execuções de título judicial ou também às de título
extrajudicial, mais especificamente, às execuções fiscais.
2. O art. 782, §3º do CPC está inserido no Capítulo III ("Da competência"),
do Título I ("Da execução em geral"), do Livro II (Do processo de
execução") do CPC, sendo que o art. 771 dispõe que "este Livro regula o procedimento da execução fundada em título extrajudicial".
3. Não há dúvidas, portanto, de que o art. 782, §3º, ao determinar que "A
requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do
executado em cadastros de inadimplentes.", dirige-se às execuções
fundadas em títulos extrajudiciais.
4. O art. 782, §5º, ao prever que "O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à
execução definitiva de título judicial.", possui dupla função: 1) estender às
execuções de títulos judiciais a possibilidade de inclusão do nome do
executado em cadastros de inadimplentes; 2) excluir a incidência do
instituto nas execuções provisórias, restringindo-o às execuções
definitivas.
5. Nos termos do art. 1º da Lei nº 6.830/80, o CPC tem aplicação
subsidiária às execuções fiscais, caso não haja regulamentação própria
sobre determinado tema na legislação especial, nem se configure alguma
incompatibilidade com o sistema. É justamente o caso do art. 782, §3º do
CPC, que se aplica subsidiariamente às execuções fiscais pois: 1) não há
norma em sentido contrário na Lei nº 6.830/1980; 2) a inclusão em
cadastros de inadimplência é medida coercitiva que promove no
subsistema os valores da efetividade da execução, da economicidade, da
razoável duração do processo e da menor onerosidade para o devedor
(arts. 4º, 6º, 139, inc. IV, e 805 do CPC). Precedentes do STJ.
6. O Poder Judiciário determina a inclusão nos cadastros de
inadimplentes com base no art. 782, §3º, por meio do SERASAJUD,
sistema gratuito e totalmente virtual, regulamentado pelo Termo de
Cooperação Técnica nº 020/2014 firmado entre CNJ e SERASA. O ente
público, por sua vez, tem a opção de promover a inclusão sem
interferência ou necessidade de autorização do magistrado, mas isso
pode lhe acarretar despesas a serem negociadas em convênio próprio.
7. A situação ideal a ser buscada é que os entes públicos firmem
convênios mais vantajosos com os órgãos de proteção ao crédito, de
forma a conseguir a quitação das dívidas com o mínimo de gastos e o
máximo de eficiência. Isso permitirá que, antes de ajuizar execuções
fiscais que abarrotarão as prateleiras (físicas ou virtuais) do Judiciário,
com baixo percentual de êxito (conforme demonstrado ano após ano no
"Justiça em Números" do CNJ), os entes públicos se valham do protesto
da CDA ou da negativação dos devedores, com uma maior perspectiva
de sucesso.
8. Porém, no momento atual, em se tratando de execuções fiscais
ajuizadas, não há justificativa legal para o magistrado negar, de forma
abstrata, o requerimento da parte de inclusão do executado em cadastros
de inadimplentes, baseando-se em argumentos como: 1) o art. 782, § 3º,
do CPC apenas incidiria em execução definitiva de título judicial; 2) em se
tratando de título executivo extrajudicial, não haveria qualquer óbice a que
o próprio credor providenciasse a efetivação da medida; 3) a intervenção
judicial só caberá se eventualmente for comprovada dificuldade
significativa ou impossibilidade de o credor fazê-lo por seus próprios meios; 4) ausência de adesão do tribunal ao convênio SERASAJUD ou a
indisponibilidade do sistema. Como visto, tais requisitos não estão
previstos em lei.
9. Em suma, tramitando uma execução fiscal e sendo requerida a
negativação do executado com base no art. 782, § 3º, do CPC, o
magistrado deverá deferi-la, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à
existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa - CDA, a exemplo da prescrição, da ilegitimidade passiva ad causam, ou
outra questão identificada no caso concreto.
10. Outro ponto importante a ser fixado é que, sendo medida menos
onerosa, a anotação do nome da parte executada em cadastro de
inadimplentes pode ser determinada antes de exaurida a busca por bens
penhoráveis. Atende-se, assim, ao princípio da menor onerosidade da
execução, positivado no art. 805 do CPC. Precedentes do STJ.
11. Por fim, sob um prisma da análise econômica do Direito, e
considerando as consequências práticas da decisão – nos termos do art.
20 do Decreto-Lei nº 4.657/1942 (acrescentado pela Lei nº 13.655/2018,
que deu nova configuração à Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro - LINDB) –, não se pode deixar de registrar a relevância para a
economia do país e para a diminuição do "Custo Brasil" de que a
atualização dos bancos de dados dos birôs de crédito seja feita por meio
dos procedimentos menos burocráticos e dispendiosos, tais como os
utilizados no SERASAJUD, a fim de manter a qualidade e precisão das
informações prestadas. Postura que se coaduna com a previsão do art. 5º,
inc. XXXIII, da CF/88 ("todos têm direito a receber dos órgãos públicos
informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou
geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de
responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à
segurança da sociedade e do Estado").
12. Com base no art. 927, §3º, do CPC, rejeito a modulação dos efeitos
proposta pela Associação Norte-Nordeste de Professores de Processo - ANNEP, uma vez que o entendimento firmado no presente recurso
repetitivo é predominante no STJ há bastante tempo.
13. Tese jurídica firmada: "O art. 782, §3º do CPC é aplicável às
execuções fiscais, devendo o magistrado deferir o requerimento de
inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes,
preferencialmente pelo sistema SERASAJUD, independentemente
do esgotamento prévio de outras medidas executivas, salvo se
vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito
previsto na Certidão de Dívida Ativa - CDA.".
14. Recurso especial conhecido e provido, nos termos da fundamentação.
15. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do
CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno deste STJ.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade de votos, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques,
Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria e Herman
Benjamin votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.
Dra. ADRIANA CRISTINA DULLIUS, pela parte RECORRENTE:
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS
RENOVAVEIS-IBAMA, e o Dr. FREDIE SOUZA DIDIER JUNIOR, pela parte:
INTERES.: ASSOCIAÇÃO NORTE E NORDESTE DE PROFESSORES DE
PROCESSO- ANNEP
Brasília (DF), 24 de fevereiro de 2021(Data do Julgamento)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO OG FERNANDES (Relator): Trata-se de
recurso especial interposto pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E
DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA, nos autos de demanda na qual
contende com COLOMBELLI & PASINI LTDA E OUTROS, em face de aresto prolatado
pelo e. TRF-4ª Região, assim ementado (e-STJ, fl. 12):
TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL.
SERASAJUD.
Em execução fiscal, a inclusão do nome do executado em cadastros de
inadimplentes deve ser realizada pelo próprio exequente. Precedentes
desta Corte.
Alega a parte recorrente, que o aresto recorrido deve ser reformado,
argumentando com base no art. 139 c/c art. 782, §§3º e 5º do CPC, pois da "A medida
coercitiva pretendida é aplicável à execução de títulos extrajudiciais, tal como a
Certidão de Dívida Ativa, cujo processo de execução rege-se pela Lei 6.830/80.
Importante ressaltar que o artigo 782, §3º, do CPC, que dispõe “a requerimento da
parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de
inadimplentes”, está previsto na Parte Especial, Livro II, Título I, que tratou “da
execução em geral”, enquanto as regras sobre “o cumprimento de sentença, estão
estabelecidas na parte Especial, Livro I, Título II, do CPC. Em assim sendo, o §5º do artigo 782, ao determinar que “o disposto nos §§3º e 4º aplica-se à execução
definitiva de título judicial”, o fez com o objetivo de possibilitar a inclusão do nome do
executado em cadastros de inadimplentes, também nos casos de cumprimento de
sentença, uma vez que não houve essa previsão expressa na parte específica do
Código que tratou do tema, e não com o propósito de excluir essa alternativa das
execuções de título extrajudicial.".
O Ministro Presidente da Comissão Gestora de Precedentes assinalou a
indicação deste feito como representativo de controvérsia, determinando a intimação
das partes para que "se entenderem pertinente, apresentem, em prazo comum ao do
Ministério Público Federal, manifestações escritas sobre a possível seleção deste
recurso como representativo da controvérsia, candidato à afetação ao rito dos
repetitivos." (e-STJ, fls. 34-36).
O Ministério Público Federal manifestou ciência da decisão do Ministro
Presidente da Comissão Gestora de Precedentes, ofertando parecer pela admissão
do caso como feito repetitivo, e, no mérito, pelo provimento do recurso (e-STJ, fls.
41-46).
O presente feito foi afetado pela Primeira Seção para ser julgado sob a
sistemática dos recursos especiais repetitivos (e-STJ, fls. 58-71), a fim de definir tese
vinculante sobre a "Possibilidade ou não de inscrição em cadastros de inadimplentes,
por decisão judicial, do devedor que figura no polo passivo de execução fiscal"
(afetação conjunta dos dos REsps 1.809.010, 1.807.180, 1.807.923, 1.812.449 e
1.814.310).
Admitidos como amici curiae no feito, a Associação Norte e Nordeste de
Professores de Processo – ANNEP e a União apresentaram manifestações,
respectivamente colacionadas às e-STJ fls. 98-123 e e-STJ fls. 135-152.
À e-STJ, fls. 157-160, novo parecer ofertado pelo MPF, corroborando o
parecer anteriormente ofertado em que opinou pelo provimento do recurso especial
(e-STJ, fls. 41-46).
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO OG FERNANDES (Relator): No caso em
exame, quando da afetação deste feito à sistemática dos recursos especiais
repetitivos, a questão representativa da controvérsia ficou delimitada nos seguintes
termos:
Possibilidade ou não de inscrição em cadastros de inadimplentes, por
decisão judicial, do devedor que figura no polo passivo de execução fiscal.
1. FUNDAMENTOS RELEVANTES DA QUESTÃO JURÍDICA DISCUTIDA (art. 984,
§ 2º, c/c o art. 1.038 do CPC/2015 e art. 104-A, I, do RISTJ)
O INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS
NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA, parte recorrente, afirma como fundamentos
relevantes da questão debatida neste feito os seguintes pontos:
a) "O TRF/4 negou provimento ao recurso ao fundamento de que a
inclusão do devedor junto ao SERASAJUD restringe-se às hipóteses de execução
definitiva de título judicial, nos termos do § 5º do artigo 782 do CPC. Salvo melhor
juízo, entende a autarquia que a medida coercitiva pretendida é aplicável no âmbito
da execução fiscal como medida válida, útil e legalmente prevista, conforme o
disposto nos artigos 139 e §3º do artigo 782 do CPC, abaixo reproduzidos:";
b) "Importante ressaltar que o artigo 782, §3º, do CPC, que dispõe “a
requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em
cadastros de inadimplentes”, está previsto na Parte Especial, Livro II, Título I, que
tratou “da execução em geral”, enquanto as regras sobre “o cumprimento de
sentença, estão estabelecidas na parte Especial, Livro I, Título II, do CPC. Em assim
sendo, o §5º do artigo 782, ao determinar que “o disposto nos §§3º e 4º aplica-se à
execução definitiva de título judicial”, o fez com o objetivo de possibilitar a inclusão do
nome do executado em cadastros de inadimplentes, também nos casos de cumprimento de sentença, uma vez que não houve essa previsão expressa na parte
específica do Código que tratou do tema, e não com o propósito de excluir essa
alternativa das execuções de título extrajudicial.";
c) "(...) a decisão ora combatida deve ser reformada para que seja
utilizado o sistema SERASAJUD, justamente porque a expedição de ofícios
desprestigia o avanço tecnológico instituído pelo CNJ, indo de encontro à celeridade
do processo e onera ainda mais o executivo fiscal.".
Às e-STJ fls. 135-152, a UNIÃO manifestou-se como amicus curiae, alegando:
a) "(...) o tema não é novo: na doutrina ou no Poder Judiciário, é trivial o
reconhecimento da possibilidade de inscrição, em cadastro de inadimplentes, do
devedor que figura no polo passivo de Execução Fiscal. O Livro II do Código de
Processo Civil trata do “Processo de Execução”. O Título I desse Livro: “Da Execução
em geral”. E no art. 771, abre-alas do Livro e do Título, lê-se: “Este Livro regula o
procedimento da execução fundada em TÍTULO EXTRAJUDICIAL, e suas
disposições aplicam-se, também, no que couber, aos procedimentos especiais de
execução, aos atos executivos realizados no procedimento de cumprimento de
sentença, bem como aos efeitos de atos ou fatos processuais a que a lei atribuir força
executiva”. (...). Notem, Excelências, o § 5° desse art. 782 buscou estender aquilo que
seria típico da Execução de Título Extrajudicial também às Execuções de Título
Judicial.";
b) "A interpretação daquele art. 782 e seus parágrafos soara tão pacífica,
que o Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) teve de ressalvar o
contrário: o quanto o próprio credor público também poderia atuar, sem a
intermediação do Juízo. Por isso o Enunciado n. 190 da Carta de Florianópolis: “O art.
782, § 3º, CPC não veda a inclusão extrajudicial do nome do executado em
cadastros de inadimplentes, pelo credor ou diretamente pelo órgão de proteção ao
crédito”.";
c) "(...) considerando que o art. 1º da LEF permite a aplicação subsidiária do CPC, conclui-se pela possibilidade de inscrição do nome do devedor nos
cadastros de proteção ao crédito, mesmo nas dívidas oriundas de Execução Fiscal,
sendo o § 3º do art. 782, CPC, dispositivo inserto no Livro II do Código, aplicável à
“execução em geral” (Título I). De sorte que não são necessárias delongas para
reconhecer que a expedição de Ofícios aos cadastros restritivos (BACENJUD,
RENAJUD e SERASAJUD, por exemplo) é permitida pelo CPC e pela LEF, visando
a auxiliar os magistrados a dar agilidade e concretude aos processos judiciais que
envolvem dívidas (principalmente, dívidas públicas).";
d) "(...) o SERASAJUD é um sistema exclusivo de atendimento ao Poder
Judiciário. A Administração Fazendária ou qualquer outro credor público não tem
acesso e, tampouco, gerencia o SERASAJUD. A diligência de inclusão do nome do
executado em cadastros de inadimplentes não pode ser realizada pelo próprio
exequente. Exigir que os credores enviem Ofícios e paguem por esses serviços,
mesmo existindo um convênio específico em vigor, mais tecnológico e mais efetivo,
data venia, não se coaduna com os princípios da razoável duração do processo e da
satisfação dos créditos, contidos no CPC.".
Às e-STJ fls. 98-123, a ASSOCIAÇÃO NORTE E NORDESTE DE
PROFESSORES DE PROCESSO - ANNEP manifestou-se como amicus curiae, alegando:
a) "A doutrina majoritária, por sua vez, acertadamente, caminha no
sentido de estender a aplicabilidade da medida executiva típica em debate para além
das execuções de títulos judiciais, abrangendo-se aqui as execuções fiscais. Trata-se
de um posicionamento que se mostra compatível com uma interpretação sistemáticateleológica da legislação processual vigente. Também é nesse sentido o
entendimento da ANNEP.";
b) "Quanto à execução fiscal - uma das execuções de títulos executivos
extrajudiciais, esta é regida pela Lei 6.830/1980, incidindo sobre ela,
subsidiariamente o Código de Processo Civil, conforme dispõe o seu primeiro artigo.
(...). Dito isso, seria contraditório admitir que medidas executivas que buscam reduzir o percurso até a satisfação do crédito tributário fossem rechaçadas por somente
constarem na legislação processual geral - neste particular, o CPC. Afinal, é a
efetividade da execução o propósito existencial da legislação específica. (...). Além
disso, essa conclusão mostra-se também em consonância com o art. 771, caput, do
CPC, que estabelece a aplicação subsidiária das regras relativas ao processo de
execução de título extrajudicial aos procedimentos especiais de execução, no que for
cabível.";
c) "(...) admitir uma interpretação restritiva do 782, §3º, somente com
base em sua literalidade (haja vista que só há menção à execução definitiva de título
judicial no parágrafo 5º do art. 782 do CPC) é não somente ato contrário à base
principiológica da legislação processual, mas também contrário ao próprio propósito
da execução.";
d) "Pergunta-se: deve o exequente necessariamente aguardar o
exaurimento de outras medidas executivas, sob pena de indeferimento de seu pedido
de inclusão do devedor em cadastro de inadimplentes? Essa análise (do momento
para utilização da ferramenta serasajud ou mediante expedição de ofício), assim
como em relação à utilização de outras ferramentas como Bacenjud, Renajud e
Infojud, também já foi realizada por esta Egrégia Corte. Nestes episódios, ficou
estabelecido que não é necessário o exaurimento de outras diligências para que se
possa requer a efetivação da medida em comento. Para esta Associação, ora
Interveniente, este posicionamento se mostra acertado.";
e) "(...) Caso a posição adotada pelo STJ seja a de aplicação do art. 782,
§ 3º do CPC às execuções de títulos extrajudiciais em geral, entre elas a fiscal,
problema poderia surgir para aqueles exequentes que tiveram, no passado, o
requerimento indeferido. Nesses casos, essa associação entende como razoável a
modulação dos efeitos da decisão a ser dada no julgamento do presente Recurso
Especial, de modo a não serem considerados preclusos novos requerimentos,
visando a negativação do executado. Com isso, os exequentes outrora prejudicados
poderão requerer, novamente, a efetivação da medida executiva em debate, cujo deferimento não poderá ter como óbice a necessidade de esgotamento prévio de
outras medidas executivas.".
O Ministério Público Federal, às e-STJ fls. 157-160 reiterou os
termos do parecer oferecido às fls. 41-46, em que trouxe os seguintes argumentos:
a) "A jurisprudência atual do STF corretamente indica a possibili- dade
de a medida do art. 782, § 3º, do CPC ser aplicada nas execu- ções fiscais, por ato do
juízo, em atendimento ao pedido do interes- sado: eventual possibilidade de a parte
interessada obter, por si, a inscrição do devedor em cadastros de inadimplentes não
exime o juízo de atender-lhe o pedido, se satisfeitos os demais requisitos le- gais da
medida.".
2. FUNDAMENTOS DETERMINANTES DO JULGADO (art. 984, § 2º, c/c o art.
1.038, do CPC/2015 e art. 104-A, II, do RISTJ)
Como explicitado no relatório, o presente julgamento visa a definir, sob a
sistemática dos recursos repetitivos, se o art. 782, §3º do CPC é aplicável apenas às
execuções de título judicial ou também às de título extrajudicial, mais especificamente,
às execuções fiscais.
O art. 782 do CPC prescreve:
Art. 782. Não dispondo a lei de modo diverso, o juiz determinará os atos
executivos, e o oficial de justiça os cumprirá.
§ 1º O oficial de justiça poderá cumprir os atos executivos determinados
pelo juiz também nas comarcas contíguas, de fácil comunicação, e nas
que se situem na mesma região metropolitana.
§ 2º Sempre que, para efetivar a execução, for necessário o emprego de
força policial, o juiz a requisitará.
§ 3º A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome
do executado em cadastros de inadimplentes.
§ 4º A inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o
pagamento, se for garantida a execução ou se a execução for extinta por
qualquer outro motivo. § 5º O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título
judicial.
A norma sob análise está inserida no Capítulo III ("Da competência"), do
Título I ("Da execução em geral"), do Livro II (Do processo de execução") do CPC.
O art. 771 do CPC, que dá início ao referido Livro II, dispõe:
Art. 771. Este Livro regula o procedimento da execução fundada em
título extrajudicial, e suas disposições aplicam-se, também, no que
couber, aos procedimentos especiais de execução, aos atos executivos
realizados no procedimento de cumprimento de sentença, bem como aos
efeitos de atos ou fatos processuais a que a lei atribuir força executiva.
(grifou-se)
Não há dúvidas, portanto, de que o art. 782, §3º, ao determinar que "A
requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em
cadastros de inadimplentes.", dirige-se às execuções fundadas em títulos
extrajudiciais.
Já tive a oportunidade de defender tal posicionamento em sede
doutrinária, que peço vênia para transcrever (SOUZA, Artur César de; FERNANDES,
Geraldo Og Nicéas. Execução e cumprimento de sentença. São Paulo: Almedina,
2018, p. 121.):
Se o exequente requerer, o juiz poderá determinar a inclusão do nome do
devedor nos cadastros de inadimplentes, como, por exemplo, SPC,
SERASA etc. A inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o
pagamento, garantida a execução ou se a execução for extinta por
qualquer outro motivo. Trata-se de uma medida coativa permitida pela
legislação processual para estimular o executado ao cumprimento da
obrigação, uma vez que a inclusão de seu nome em cadastros de
inadimplentes poderá ensejar inúmeros dissabores, como, por exemplo,
restrição ao crédito. O juiz poderá determinar a inscrição do nome do
executado em cadastros de inadimplentes tanto em execução de
título executivo extrajudicial quanto no cumprimento de título
executivo judicial. (grifou-se)
Na mesma trilha, colhe-se a doutrina de Aluísio de Castro Mendes e
Larissa Pochmann Silva (MENDES, Aluísio Gonçalves de Castro; SILVA, Larissa Clare Pochmann. Da efetivação do crédito e os cadastros de inadimplentes no novo Código
de Processo Civil: breves notas. In: NETO, Francisco Antônio de Barros e Silva Neto;
KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; CUNHA, Leonardo Carneiro da; JÚNIOR,
Roberto Paulino de Albuquerque; COSTA FILHO, Venceslau Tavares. Relações e
Influências Recíprocas entre Direito Material e Direito Processual: Estudos em
homenagem ao Professor Torquato Castro. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 82.):
Destaque-se, por oportuno, que a positivação do cadastro, tanto para
títulos judiciais como para titulos extrajudiciais, vem, ainda,
corroborar a previsão do artigo 139, inciso IV, do novo diploma, que dispõe
como uma das funções do juiz a determinação de medidas indutivas,
coercitivas, mandamentais ou subrogatórias necessárias para assegurar
o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por
objeto prestação pecuniária, valendo-se a nova legislação de mais um
instrumento para a busca da satisfação do crédito. (grifou-se)
O art. 782, §5º, ao prever que "O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à
execução definitiva de título judicial.", possui dupla função: 1) estender às execuções
de títulos judiciais a possibilidade de inclusão do nome do executado em cadastros de
inadimplentes; 2) excluir a incidência do instituto nas execuções provisórias,
restringindo-o às execuções definitivas.
Corroborando o afirmado, colhe-se o Enunciado nº 99 da I Jornada de
Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF: “A inclusão do nome do
executado em cadastros de inadimplentes poder-se-á dar na execução definitiva de
título judicial ou extrajudicial.”.
Antônio Mota traz a seguinte lição sobre o ponto (In: FLUMIGNAN, Silvano
José Gomes; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; PEIXOTO, Marco Aurélio
Ventura (Coords.). Enunciados das Jornadas de Direito Processual Civil do
Conselho da Justiça Federal - CJF: organizados por assunto, anotados e
comentados. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 304.):
Não seria aceitável admitir a inscrição no cadastro de inadimplentes tendo
como esteio a obrigação cobrada em sede de execução definitiva de título
judicial e não diante da ação de execução de título extrajudicial. As duas
carregam o traço da definitividade.
O Enunciado nº 190 do Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC, por sua vez, doutrina: "O art. 782, § 3°, não veda a inclusão extrajudicial do
nome do executado em cadastros de inadimplentes, pelo credor ou diretamente pelo
órgão de proteção ao crédito.''.
Nesse tema, trago a doutrina de Edilson Vitorelli (In: FLUMIGNAN, Silvano
José Gomes; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; PEIXOTO, Marco Aurélio
Ventura (Coords.). Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC: organizados por assunto, anotados e comentados. 2. ed. Salvador: Juspodivm,
2019, p. 603.):
O propósito do enunciado é apenas esclarecer que a possibilidade de o
juiz determinar a inclusão de pessoas nesses cadastros não significa que
tal determinação seja requisito para o ato. Assim, se o credor for
conveniado aos serviços de proteção ao crédito e, por essa razão, tiver
condições de remeter, por si mesmo, o nome do devedor para inclusão,
poderá fazê-lo livremente. A ordem judicial não foi convertida em requisito
para o ato. Ela é útil apenas para os credores não conveniados ao
serviço.
Há que ser rejeitada, portanto, por desconformidade com a legislação, a
argumentação de que o art. 782, §5º teria como intuito restringir as inclusões em
cadastros de inadimplentes às execuções de títulos judiciais.
Fixada a premissa de aplicabilidade do art. 782, §3º do CPC à execução
de título extrajudicial, resta examinar se o âmbito de incidência da norma se estende às
execuções fiscais. Vejamos.
A Lei nº 6.830/1980, em seu art. 1º, prescreve:
Art. 1º - A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos
Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias
será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de
Processo Civil. (grifou-se)
O CPC tem aplicação subsidiária às execuções fiscais, caso não haja
regulamentação própria sobre determinado tema na legislação especial, nem se configure alguma incompatibilidade com o sistema.
É justamente o caso do art. 782, §3º do CPC, que se aplica
subsidiariamente às execuções fiscais pois: 1) não há norma em sentido contrário na
Lei nº 6.830/1980; 2) a inclusão em cadastros de inadimplência é medida coercitiva
que promove no subsistema os valores da efetividade da execução, da economicidade,
da razoável duração do processo e da menor onerosidade para o devedor (art. 5º, inc.
LXXVIII, da Constituição Federal; arts. 4º, 6º, 139, inc. IV, e 805 do CPC).
De fato, já vigora há alguns anos a utilização, nas execuções fiscais, das
ferramentas do protesto de título em cartório e de inclusão em cadastros de
inadimplência.
Embora se trate de instituto que não se confunde com a negativação em
cadastros de inadimplência, é importante tecer algumas considerações sobre o
protesto de títulos em cartório, devido às similaridades entre os dois instrumentos de
recuperação de créditos.
A Lei nº 12.767/2012 incluiu um parágrafo único no art. 1º da Lei nº
9.492/1997, com a seguinte alteração:
Art. 1º. (...).
Parágrafo único. Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as
certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas.
Assim, não há dúvidas de que o exequente, por seus próprios meios, pode
promover tanto o protesto da CDA em cartório quanto a inscrição do executado em
cadastros de inadimplentes. O CPC inovou ao incorporar a possibilidade de protesto
(art. 517) e de inclusão em cadastros de inadimplentes (art. 782) de decisão judicial
transitada em julgado.
De fato, é usual que as Procuradorias da Fazenda em todo o país
promovam o protesto de CDA's, bem como a inscrição de devedores em cadastros de
inadimplentes. O que se discute neste feito é a possibilidade de tal inscrição ser
determinada por ordem judicial, em sede de execução fiscal.
A propósito, o STF fixou a seguinte tese, no julgamento da ADI nº 5.135-DF: “O protesto das Certidões de Dívida Ativa constitui mecanismo
constitucional e legítimo, por não restringir de forma desproporcional quaisquer
direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção
política.” (ADI 5135, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em
09/11/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-022 DIVULG 06-02-2018 PUBLIC
07-02-2018).
O Provimento nº 86 do CNJ, de 29 de agosto de 2019, dispõe "sobre a
possibilidade de pagamento postergado de emolumentos, acréscimos legais e
demais despesas, devidos pela apresentação de títulos ou outros documentos de
dívida para protesto".
Consoante o art. 2º da norma referida, o pagamento dos emolumentos do
protesto foi postecipado, ou seja, é realizado ao final pelo devedor, se quitar a dívida. O
credor será responsável pelo pagamento apenas se desistir ou houver cancelamento
do protesto. O art. 2º, §1º esclarece que isso se aplica também às certidões de dívida
ativa da União Federal, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas
respectivas Autarquias e Fundações Públicas.
O protesto de títulos tem sido feito de forma 100% online, por um sistema
virtual intitulado Central de Remessa de Arquivos - CRA.
No caso do cadastro nos órgãos de proteção ao crédito, os custos e a
forma de envio dos dados dependem dos termos de eventual convênio firmado com o
ente interessado.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN, por exemplo, tem
convênio com o SERASA, com utilização de sistema virtual, cabendo à Procuradoria
arcar apenas com o custo das correspondências (envio de cartas aos devedores, por
exemplo). Há notícias de outros entes públicos com convênios com o SERASA, com
diferentes graus de onerosidade. A título exemplificativo, existe convênio em que se
ajusta um quantitativo mensal de negativações que está dentro do valor acordado,
sendo pago um valor extra para inclusões adicionais.
É bastante comum que os Cartórios de Protestos também enviem
relatórios dos títulos protestados aos órgãos de proteção ao crédito, como SERASA e SPC. Assim, o protesto da CDA, que é gratuito, já implicaria a inclusão nos cadastros
de inadimplência, sem qualquer custo adicional para o ente público interessado.
O menor custo e o funcionamento totalmente eletrônico do sistema
explicam o motivo de estar havendo uma certa predileção dos entes públicos pelo
protesto da CDA, em vez da negativação do nome do devedor nos cadastros de
inadimplentes. E também explica a preferência dos entes públicos, em alguns casos,
por requerer a referida negativação ao juiz, em vez de promovê-la pelos seus próprios
meios.
O Poder Judiciário determina a inclusão com base no art. 782, §3º, por
meio do SERASAJUD, sistema gratuito e totalmente virtual, regulamentado pelo Termo
de Cooperação Técnica nº 020/2014 firmado entre CNJ e SERASA. O ente público,
por sua vez, tem a opção de promover a inclusão sem interferência ou necessidade de
autorização do magistrado, mas isso pode lhe acarretar despesas a serem negociadas
em convênio próprio.
A situação ideal a ser buscada é que os entes públicos firmem convênios
mais vantajosos com os órgãos de proteção ao crédito, de forma a conseguir a
quitação das dívidas com o mínimo de gastos e o máximo de eficiência. Isso permitirá
que, antes de ajuizar execuções fiscais que abarrotarão as prateleiras (físicas ou
virtuais) do Judiciário, com baixo percentual de êxito (conforme demonstrado ano após
ano no "Justiça em Números" do CNJ), os entes públicos se valham do protesto da
CDA ou da negativação dos devedores, com uma maior perspectiva de sucesso.
Nota-se, a propósito, uma tendência de desjudicialização dos
procedimentos executivos, a exemplo dos Projetos de Lei nº 6.204/2019 (execução
cível) e 4.257/2019 (execução fiscal), em trâmite no Senado Federal, que propõem a
propositura e o andamento da execução perante os tabelionatos de protesto.
Porém, no momento atual, em se tratando de execuções fiscais ajuizadas,
não há justificativa legal para o magistrado negar, de forma abstrata, o requerimento da
parte de inclusão do executado em cadastros de inadimplentes, baseando-se em
argumentos como: 1) o art. 782, § 3º, do CPC apenas incidiria em execução definitiva
de título judicial; 2) em se tratando de título executivo extrajudicial, não haveria qualquer
óbice a que o próprio credor providenciasse a efetivação da medida; 3) a intervenção judicial só caberá se eventualmente for comprovada dificuldade significativa ou
impossibilidade de o credor fazê-lo por seus próprios meios; 4) ausência de adesão do
tribunal ao convênio SERASAJUD ou a indisponibilidade do sistema. Como visto, tais
requisitos não estão previstos em lei.
Em suma, tramitando uma execução fiscal e sendo requerida a
negativação do executado com base no art. 782, § 3º, do CPC, o magistrado deverá
deferi-la, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito
previsto na Certidão de Dívida Ativa - CDA, a exemplo da prescrição, da ilegitimidade
passiva ad causam, ou outra questão identificada no caso concreto.
No mesmo sentido, trago a lição de Carlos Alberto Carmona (CARMONA,
Carlos Alberto. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo. AASP, 2015,
p. 1203-1204):
A comunicação aos órgãos que se encarregam de apontar os devedores
inadimplentes deve ser requerida pelo credor (não pode ser decretada de
ofício pelo juiz) e, portanto, acarreta responsabilização do exequente caso
a execução mostre-se infundada. A anotação, junto aos órgãos de
proteção ao crédito, sabem todos, acarreta uma série de entraves à vida
civil, com possível bloqueio de crédito e de acesso a serviços bancários
diversos.
Por isso mesmo, deve o juiz verificar, diante do pedido do credor, se
é efetivamente caso de fazer a comunicação. Em outros termos, não
basta o pedido do credor para que o juiz proceda à inclusão do
nome do devedor no rol dos inadimplentes: é preciso que o juiz
pondere se existe dúvida razoável acerca da existência do direito
do credor. Se existir algum receio do magistrado de que a execução
possa ser abusiva, ilícita ou indevida, o pleito será indeferido. Este
o sentido da utilização do verbo poder no § 3º do art. 782 do
CPC/2015 (e não do verbo dever). (grifou-se)
Outro ponto importante a ser fixado é que, sendo medida menos onerosa,
a anotação do nome da parte executada em cadastro de inadimplentes pode ser
determinada antes de exaurida a busca por bens penhoráveis. Atende-se, assim, ao
princípio da menor onerosidade da execução, positivado no art. 805 do CPC. Nesse
prisma, transcrevo trecho da opinião manifestada pela Associação Norte-Nordeste de
Professores de Processo - ANNEP como amicus curiae:
Essa análise (do momento para utilização da ferramenta serasajud ou
mediante expedição de ofício), assim como em relação à utilização de
outras ferramentas como Bacenjud, Renajud e Infojud, também já foi
realizada por esta Egrégia Corte. Nestes episódios, ficou estabelecido
que não é necessário o exaurimento de outras diligências para que
se possa requer a efetivação da medida em comento.
(...).
Não fosse isso, o Código de Processo Civil, em seu artigo 139, inciso IV,
estabelece como poder-dever do juiz a determinação de todas medidas
executivas que se fizerem necessárias à satisfação da prestação
pecuniária objeto, não estabelecendo cronologia entre tais medidas
(sendo indiferente, portanto, se são indutivas, coercitivas - como é o caso
da negativação do nome, mandamentais ou sub-rogatórias).
Por fim, a negativação do nome é medida pouco gravosa para o
executado, se comparada às outras medidas executivas, tais como
penhoras (online, por renajud e de bens, por oficial de justiça) que
podem vir a recair sobre o executado. É, portanto, medida
compatível com o princípio da menor onerosidade da execução
previsto no art. 805 do Código de Processo Civil (cláusula geral de
proteção ao executado que versa sobre a necessidade e adequação
da medida executiva pleiteada). (grifou-se)
Por fim, colaciono precedentes das Turmas que compõem a 1ª Seção do
STJ, a fim de demonstrar o entendimento predominante na Corte sobre a matéria, em
consonância com o voto ora proferido:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
EXECUÇÃO FISCAL. ART. 782, § 3o. DO CÓDIGO FUX. INCLUSÃO DO
NOME DO DEVEDOR EM CADASTRO DE INADIMPLENTES.
POSSIBILIDADE. AGRAVO INTERNO DO PARTICULAR DESPROVIDO.
1. Esta Corte Superior de Justiça entende que o pedido de inclusão
do nome do executado em cadastros de inadimplentes, tal como o
SerasaJUD, nos termos do art. 782, § 3º. do Código Fux, não pode
ser recusado pelo Poder Judiciário sob o argumento de que tal
medida é inviável em via de execução fiscal. Precedentes: REsp.
1.826.084/SC, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 23.8.2019 e REsp.
1.799.572/SC, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJe 14.5.2019.
2. Agravo Interno do Particular desprovido.
(AgInt no REsp 1814906/PE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe 24/09/2020)
(grifou-se)
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO
EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. SERASAJUD. ART. 782 DO
CPC/2015. POSSIBILIDADE. FACULDADE DO JUIZ. RECUSA POR AUSÊNCIA DE CONVÊNIO OU INDISPONIBILIDADE DO SISTEMA.
IMPOSSIBILIDADE.
1. É possível a utilização do sistema Serasajud nos processos de
Execução Fiscal. Não há qualquer óbice ao seu emprego em relação a
devedores inscritos em Dívida Ativa que, demandados em juízo, não
cumpram a obrigação em cobrança.
2. A previsão do § 5º do art. 782 do CPC/2015 de que o disposto
nos §§ 3º e 4º do mesmo dispositivo legal aplica-se à execução
definitiva de título judicial não constitui vedação à utilização nos
executivos fiscais. A norma não prevê tal restrição e deve ser
interpretada de forma a dar ampla efetividade à tutela executiva,
especialmente quando o credor é o Estado e, em última análise, a
própria sociedade. Inteligência dos arts. 1º da Lei 6.830/1980 e 771
do CPC/2015.
3. Como bem ressaltado pelo Min. Francisco Falcão, no REsp
1.799.572/SC, "tal medida concretiza o princípio da efetividade do
processo, possuindo respaldo basilar nas Normas Fundamentais do
Processo Civil, considerando que 'as partes têm o direito de obter em
prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa'
(art. 4º do CPC/2015) e o dever de cooperação processual, direcionado
igualmente ao Poder Judiciário, 'para que se obtenha, em tempo razoável,
decisão de mérito justa e efetiva' (art. 6º do CPC/2015)" (Segunda Turma,
DJe 14.5.2019).
4. O STJ possui compreensão firmada de que é legal a realização de
pesquisas nos sistemas Bacenjud, Renajud e Infojud, porquanto são
meios colocados à disposição da parte exequente para agilizar a
satisfação de seus créditos, não sendo necessário o esgotamento das
buscas por outros bens do executado. Precedentes: REsp 1.778.360/RS,
Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 14.2.2019; AgInt no
AREsp 1.398.071/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda
Turma, DJe 15.3.2019; AREsp 1.376.209/RJ, Rel. Min. Francisco Falcão,
Segunda Turma, DJe 13.12.2018; AgInt no AREsp 1.293.757/ES, Rel. Min.
Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 14.8.2018; AgInt no REsp
1.678.675/RS, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 13.3.2018.
5. Sendo medida menos onerosa à parte executada, a anotação do
nome em cadastro de inadimplentes pode ser determinada antes de
que seja esgotada a busca por bens penhoráveis.
6. O uso da expressão verbal "pode" no art. 782, § 3º, do CPC/2015, torna
claro que se trata de uma faculdade atribuída ao juiz, a ser por ele
exercida ou não, a depender das circunstâncias do caso concreto.
7. Interpretação que encontra amparo no art. 139, IV, do CPC/2015,
segundo o qual, no exercício do poder de direção do processo,
incumbe ao juiz "determinar todas as medidas indutivas,
coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações
que tenham por objeto prestação pecuniária". Precedentes da
Segunda Turma: REsp 1.794.447/AL, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe
22.4.2019; REsp 1.762.254/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 16.11.2018.
8. O magistrado não pode se recusar a incluir o nome do devedor
em cadastro de inadimplentes, por inexistência de convênio para
negativação pela via eletrônica.
9. A Segunda Turma já se pronunciou que "o pedido de inclusão do nome
do executado em cadastros de inadimplentes, tal como o SerasaJUD, nos
termos do art. 782, § 3º, do CPC/2015, não pode ser recusado pelo Poder
Judiciário sob o argumento de que tal medida é inviável em via de
execução fiscal" (REsp 1.799.572/SC, Rel. Min. Francisco Falcão,
Segunda Turma, DJe 14.5.2019).
10. Eventuais adversidades momentâneas no sistema eletrônico
igualmente não representam óbice à adoção dessa medida processual,
haja vista a possibilidade de expedição de ofício ao Serasa, por meio
físico (REsp 1.736.217/SC, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma,
DJe 1º.3.2019).
11. Se compete ao juiz da execução efetivar as medidas executivas
tendentes à satisfação do crédito, a ausência de convênio ou a
indisponibilidade do sistema não são motivos suficientes à negativa
judicial de aplicação do art. 782, § 3º, do CPC/2015. A possibilidade de
expedição de ofício ao banco de dados restritivo, por si só, afasta a
razoabilidade da recusa.
12. Em síntese: a) é possível a utilização do sistema Serasajud nos
processos de Execução Fiscal; b) é legal a realização de pesquisas
nos sistemas Bacenjud, Renajud e Infojud, porquanto são meios
colocados à disposição da parte executada para agilizar a satisfação de
seus créditos, não sendo necessário o esgotamento das buscas por
outros bens do executado; c) sendo medida menos onerosa à parte
executada, a anotação do nome em cadastro de inadimplentes pode
ser determinada antes de esgotada a busca por bens penhoráveis;
d) o uso da expressão verbal "pode", no art. 782, § 3º, do CPC/2015,
demonstra que cuidar-se de uma faculdade atribuída ao juiz, a ser
por ele exercida ou não, a depender das circunstâncias do caso
concreto; e) o magistrado não pode recusar o pedido de inclusão do
nome do executado em cadastros de inadimplentes, tais como o
Serasajud, argumentando apenas a ausência de convênio ou a
indisponibilidade do sistema.
(...).
15. Recurso Especial não provido.
(REsp 1827340/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 11/10/2019) (grifou-se)
Por fim, sob um prisma da análise econômica do Direito, e considerando
as consequências práticas da decisão – nos termos do art. 20 do Decreto-Lei nº
4.657/1942 (acrescentado pela Lei nº 13.655/2018, que deu nova configuração à Lei
de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB) –, não se pode deixar de registrar a relevância para a economia do país e para a diminuição do "Custo Brasil"
de que a atualização dos bancos de dados dos birôs de crédito seja feita por meio dos
procedimentos menos burocráticos e dispendiosos, tais como os utilizados no
SERASAJUD, a fim de manter a qualidade e precisão das informações prestadas.
Tal postura se coaduna com a previsão do art. 5º, inc. XXXIII, da CF/88
("todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse
particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob
pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à
segurança da sociedade e do Estado").
3. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DO JULGADO (art. 927, § 3º, do CPC/2015)
Rejeito a modulação dos efeitos proposta pela Associação
Norte-Nordeste de Professores de Processo - ANNEP, uma vez que o entendimento
firmado no presente recurso repetitivo é predominante no STJ há bastante tempo.
O art. 927, § 3º do CPC prevê que "Na hipótese de alteração de
jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou
daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos
efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.".
No mesmo sentido, o Enunciado nº 76, aprovado na I Jornada de
Processo Civil do CJF, dispõe:
É considerada omissa, para efeitos do cabimento dos embargos de
declaração, a decisão que, na superação de precedente, não se
manifesta sobre a modulação de efeitos. (grifou-se)
O Enunciado nº 55 do Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC, por sua vez, explicita que:
Pelos pressupostos do § 3º do art. 927, a modificação do precedente
tem, como regra, eficácia temporal prospectiva. No entanto, pode haver
modulação temporal, no caso concreto. (grifou-se)
Ravi Peixoto traz a seguinte lição sobre o ponto (In: FLUMIGNAN, Silvano
José Gomes; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; PEIXOTO, Marco Aurélio
Ventura (Coords.). Enunciados das Jornadas de Direito Processual Civil do
Conselho da Justiça Federal - CJF: organizados por assunto, anotados e
comentados. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 398-399.):
No caso da superação de precedentes, a quebra da estabilidade é
gerada pelo próprio Poder Judiciário, ao modificar, de forma
surpreendente, um posicionamento consolidado, podendo surgir,
nessa situação, a necessidade da utilização da modulação de
efeitos. Tanto a segurança jurídica como a confiança legítima exigem
uma tutela adequada, quando violadas e, uma de suas formas, estudada
nesse trabalho, é a modulação de efeitos, sendo um dever do referido
órgão jurisdicional ao menos conhecer da matéria. (grifou-se)
Assim, não se configura presente a necessidade de modulação dos
efeitos do julgado, tendo em vista que tal instituto visa a assegurar a efetivação do
princípio da segurança jurídica, impedindo que o jurisdicionado de boa-fé seja
prejudicado por seguir entendimento dominante que terminou sendo superado em
momento posterior, o que, como se vê claramente, não ocorreu no caso concreto.
4. TESE JURÍDICA FIRMADA (art. 104-A, inc. III, do RISTJ):
Para efeito de cumprimento do requisito legal e regimental, firma-se a
seguinte tese: "O art. 782, §3º do CPC é aplicável às execuções fiscais, devendo
o magistrado deferir o requerimento de inclusão do nome do executado em
cadastros de inadimplentes, preferencialmente pelo sistema SERASAJUD,
independentemente do esgotamento prévio de outras medidas executivas,
salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito
previsto na Certidão de Dívida Ativa - CDA.".
5. SOLUÇÃO DADA AO CASO CONCRETO (art. 104-A, inc. IV, do RISTJ):
Ante o exposto, conheço do recurso especial e lhe dou provimento, a fim de reformar o acórdão recorrido, reconhecendo o cabimento do pleito de inclusão de
devedor no cadastro de inadimplentes (Sistema SERASAJUD) em executivo fiscal,
com base no art. 782, §3º, do CPC, impondo-se o retorno dos autos ao juízo de
primeira instância, a fim de que examine a viabilidade do petitório no caso concreto,
nos termos da fundamentação.
Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015
e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno do STJ.
É como voto.