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9 de abril de 2021

Relator mantém ação por crime ambiental a partir de exame de corpo de delito indireto feito por especialistas de outras áreas

 O ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou pedido para trancar ação penal contra um homem denunciado por crimes contra a flora e a administração ambiental que teriam sido cometidos em uma fazenda de Minas Gerais. O magistrado reconheceu a validade do exame de corpo de delito indireto feito por peritos com diploma em curso superior de áreas não relacionadas à natureza da perícia.

De acordo com o processo, seis homens que estariam a serviço de uma empresa sucroalcooleira foram surpreendidos pela Polícia Militar enquanto desmatavam vegetação nativa. A denúncia narra que os acusados também fizeram intervenção ilegal em área de preservação permanente em ambas as margens de um curso d'água, com supressão da vegetação nativa.

O recurso em habeas corpus analisado pelo ministro Ribeiro Dantas, relator, foi interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), sob a alegação de suposta irregularidade na perícia e inaptidão dos peritos.

A defesa sustentou que os profissionais que assinaram o laudo – bacharéis em biomedicina e direito – não teriam competência, pois não possuíam habilitação técnica relacionada com a natureza do exame. Acrescentou que, como o crime imputado ao réu é material e deixa vestígios, haveria a necessidade do exame de corpo de delito direto.

Além disso, alegou que a denúncia imputou o crime ao recorrente e à empresa, afirmando "genericamente" que houve o funcionamento de atividade potencialmente danosa ao meio ambiente sem autorização, mas não descreveu de forma completa e individualizada a conduta de cada réu, o que dificultaria o exercício da defesa.

Laudo

Em relação à validade do laudo pericial, Ribeiro Dantas lembrou que, segundo o artigo 158 do Código de Processo Penal (CPP), quando a infração penal deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto.

Citando a doutrina, ele explicou que o corpo de delito corresponde à prova da materialidade do crime, e a inspeção técnica dessa prova – o chamado exame de corpo de delito – tanto pode ser de forma direta, pela verificação pessoal do perito, ou indireta, caso o perito se valha de outros meios de prova. Assim, concluiu o ministro, o exame indireto é cabível no caso.

O relator observou ainda que a realização da perícia pelos bacharéis em direito e biomedicina supre a exigência legal, já que, segundo o artigo 159 do CPP, a habilitação técnica do perito deve ser preferencialmente – mas não obrigatoriamente – relacionada com a natureza do exame.

Denúncia válida

O ministro verificou também que a descrição dos fatos na denúncia é clara o suficiente quanto a cada um dos acusados. Segundo ele, nos crimes societários, a denúncia é válida mesmo quando não traz a descrição minuciosa da atuação de cada réu, bastando demonstrar a relação entre o agir e o delito, pois isso já permite o exercício da ampla defesa.

Ribeiro Dantas afirmou que, diante dos indícios de autoria e materialidade do crime, e estando devidamente caracterizado o enquadramento da conduta no tipo penal indicado na denúncia, "faz-se necessário o prosseguimento da persecução penal". Para o relator, o reconhecimento de eventual inexistência de justa causa para a ação penal ou da atipicidade da conduta exige profundo exame das provas do processo – o que não é cabível nos limites do habeas corpus.

Leia a decisão.​

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):RHC 141331

2 de abril de 2021

RELEVANTE: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. SEGURO DPVAT. LEI 6.194/74. COMPLEMENTAÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PRINCÍPIOS DA ADSTRIÇÃO E DA CONGRUÊNCIA. SENTENÇA ALÉM DO PEDIDO (ULTRA PETITA). GRAU DE INVALIDEZ. PERÍCIA. IML. INDISPENSABILIDADE. PEDIDO. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. ART. 322, § 2º, DO CPC/15. FATO CONSTITUTIVO SUPERVENIENTE. CONSIDERAÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 493 DO CPC/15.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.793.637 - PR (2019/0019483-5) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

3ª TURMA

UNANIMIDADE

1. Cuida-se de ação de cobrança de complementação de indenização securitária do DPVAT por invalidez permanente. 

2. Recurso especial interposto em: 18/06/2018; conclusos ao gabinete em: 05/02/2019; aplicação do CPC/15. 

3. O propósito recursal consiste em determinar se configura julgamento para além do pedido (ultra petita) a sentença que concede à vítima de acidente automobilístico o valor da indenização pelo DPVAT condizente com o grau de sua invalidez, segundo apurado em perícia do IML superveniente ao ajuizamento da ação e em valores diversos dos constantes no final da petição inicial. 

4. Agindo o juiz fora dos limites definidos pelas partes e sem estar amparado em permissão legal que o autorize examinar questões de ofício, haverá violação ao princípio da congruência, haja vista que o pedido delimita a atividade do juiz, que não pode dar ao autor mais do que ele pediu, julgando ultra petita (além do pedido). 

5. O CPC/15 contém, contudo, expressa ressalva aos limites do pedido, permitindo ao juiz considerar fatos supervenientes que constituam o direito envolvido na lide, na forma do art. 493 do CPC/15. 

6. Cabe ao julgador, ademais, a interpretação lógico-sistemática do pedido formulado na petição inicial a partir da análise dos fatos e da causa de pedir, o que atende à necessidade conceder à parte o que foi efetivamente requerido por ela, interpretando o pedido a partir de um exame completo da petição inicial, e não apenas da parte da petição destinada aos requerimentos finais, sem que isso implique decisão extra ou ultra petita. Precedentes. 

7. É indispensável a realização de perícia para verificar o grau de invalidez do segurado a fim de estabelecer o valor da indenização por invalidez permanente do seguro obrigatório DPVAT, pois o valor da referida indenização somente pode ser aferido de acordo com a quantificação da extensão das lesões sofridas pela vítima. Precedentes. 

8. O seguro obrigatório DPVAT é seguro de nítido caráter social cuja indenização deve ser paga pelas seguradoras sem qualquer margem de discricionariedade e sempre que atendidos os requisitos da Lei 6.194/74. Precedente. 

9. Assim, o pedido de complementação da indenização paga a menor deve ser interpretado sistematicamente, a fim de garantir à vítima o valor correspondente à lesão por ela sofrida, segundo o grau de sua invalidez, ainda que o pedido específico, formulado ao final da peça inicial, tenha sido formulado equivocadamente, com a fixação de valor definido; e, não o suficiente, a eventual realização de laudo pericial pelo Instituto Médico Legal (IML) no curso do processo deve ser considerado fato superveniente constitutivo do direito do autor, na forma do art. 493 do CPC/15. 

10. Na hipótese concreta, por aplicação da norma constante no art. 493 do CPC/15, o acórdão que concede ao recorrente a indenização conforme a posterior perícia médica do IML não pode ser considerada para além do pedido (ultra petita), razão pela qual não havia motivos para a limitação da complementação da indenização aos valores numéricos referidos à inicial. 

11. Recurso especial provido.


O propósito recursal consiste em determinar se configura julgamento para além do pedido (ultra petita) a sentença que concede à vítima de acidente automobilístico o valor da indenização pelo DPVAT condizente com o grau de sua invalidez, segundo apurado em perícia do IML superveniente ao ajuizamento da ação e em valores diversos dos constantes no final da petição inicial. 

Recurso especial interposto em: 18/06/2018; 

Conclusos ao gabinete em: 05/02/2019; 

Aplicação do CPC/15. 


1. DO PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA OU ADSTRIÇÃO E DA SENTENÇA ALÉM DO PEDIDO (ULTRA PETITA) 

Um dos mais importantes princípios que instruem o Direito Processual Civil é o dispositivo, ou da inércia da jurisdição, segundo o qual o direito de ação pertence às partes ou interessados, sendo o processo instaurado somente mediante sua provocação, conforme previsto, de forma expressa, no art. 2º do CPC/15. 

O princípio da congruência ou adstrição entre o pedido e a sentença é, por sua vez, manifestação necessária do princípio dispositivo, “daí por que, sendo o objeto da causa o pedido do autor, não pode o juiz decidir fora dele” (THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, vol. I, 55ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2014, pág. 559). 

O princípio da congruência se encontra previsto no art. 141 do CPC/15, e pode ser decomposto em pelo menos duas regras: a) “o conflito de interesses que surgir entre duas pessoas será decidido pelo juiz não totalmente, mas apenas nos limites que elas o levarem ao processo” (BARBI. Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. 1, 14ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2010, pág. 403); e b) o juiz não pode “conhecer de questões não suscitadas, a cujo respeito a lei exige iniciativa das partes” (Idem, ibidem, pág. 404). 

As ressalvas a essas duas regras, que correspondem à atuação de ofício do magistrado, são excepcionais e estão previstas de forma expressa no texto legal. 

1.1. DA SENTENÇA ALÉM DO PEDIDO (ULTRA PETITA) 

Agindo o juiz fora dos limites definidos pelas partes e sem estar amparado em permissão legal que o autorize examinar questões de ofício, haverá violação ao princípio da congruência, haja vista que “o pedido delimita a atividade do juiz (CPC, arts. 2º, 128, 459, 1º parte, e 460), que naÞo pode dar ao autor mais do que ele pediu, julgando ultra petita (aleìm do pedido), nem conceder ao autor coisa diversa da pedida, julgando extra petita (fora do pedido), como naÞo pode deixar de se pronunciar sobre todo o pedido, julgando, neste uìltimo caso, citra petita (aqueìm do pedido)” (BERMUDES, Sergio. Introdução ao Processo Civil. 5ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2010, pág. 44, sem destaque no original). 

As sentenças extra petita e ultra petita representam a atuação jurisdicional para mais do que fora delimitado pelas partes com a propositura da ação, mas, na sentença extra petita, o juiz decide para fora do que estava em causa (prestação jurisdicional mal executada, porque se presta o que não estava para ser prestado, se resolve o que não se tinha de resolver), e na ultra petita, decide além do pedido (prestando às partes mais do que se tinha de prestar). 

O julgamento além do pedido (ultra petita) se refere estritamente ao pedido mediato, isto é, ao bem da vida objeto da tutela jurisdicional, pois, conforme ressalta a doutrina “o juiz está condicionado a ele para a prolação de sua sentença, ou seja, indicada a quantidade de bem da vida que se pretende obter no caso concreto, o juiz não poderá ir além dessa quantificação, concedendo ao autor a mais do que foi pedido” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Volume único, 8ª ed., Salvador: JusPodivum, 2016, livro digital, sem destaque no original). 

De fato, no julgamento para além do pedido, o juiz decide o pedido relativo ao bem da vida que foi formulado na causa, mas vai além dele, dando às partes mais do que fora pleiteado na inicial, conforme prevê a segunda parte do art. 492 do CPC/15. 

1.2. DA RESSALVA AO JULGAMENTO ULTRA PETITA E DA POSSIBILIDADE DE O JUIZ, DE OFÍCIO, TOMAR EM CONSIDERAÇÃO FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO QUE INFLUENCIE NO JULGAMENTO DO MÉRITO (ART. 493 DO CPC/15) 

A previsão do art. 492 do CPC/15, que proíbe o julgamento diverso do pedido (extra petita) e o para além do pedido (ultra petita), é objeto de expressa ressalva no próprio texto legal. 

Com efeito, à luz do disposto no art. 493 do CPC/15, é dever do julgador tomar em consideração, mesmo de ofício, fatos supervenientes que influam no julgamento da lide, constituindo, modificando ou extinguindo o direito material alegado, sob pena de a prestação jurisdicional se tornar desprovida de eficácia ou inapta à justa composição da lide. 

Esse dispositivo se alinha à a jurisprudência desta Corte segundo a qual “a prestação jurisdicional há de compor a lide como esta se apresenta no momento da entrega” (REsp 156.752/RS, 4ª Turma, DJ de 08/06/1999, sem destaque no original), sob pena de se tornar contraditória aos fatos revelados e inapta à justa composição do conflito de interesses. 

De fato, por força da previsão do art. 493 do CPC/15, “o julgador deve sentenciar o processo tomando por base o estado em que o mesmo se encontra, recepcionando, se for o caso, fato constitutivo que se implementou supervenientemente ao ajuizamento da ação” (REsp 1720288/RS, Terceira Turma, DJe 29/05/2020, sem destaque no original), o que é realizado com o objetivo de “de evitar decisões contraditórias e prestigiar os princípios da economia processual e da segurança jurídica” (AgInt no REsp 1387812/PR, Quarta Turma, DJe 13/03/2020). 

O art. 492 deve, pois, ser interpretado sistematicamente com a previsão do art. 493 do CPC/15, de forma a se extrair a norma de que esse reconhecimento de fatos supervenientes que interfiram no julgamento justo da lide respeita integralmente os princípios da adstrição e da congruência, sobretudo porque não pode implicar alteração da causa de pedir ou do pedido. 

Realmente, o fato novo levado em consideração no julgamento não modifica a causa de pedir e/ou o pedido, haja vista que o fato superveniente que deve ser considerado no decidir é aquele estreitamente vinculado a lide posta à apreciação, levando em conta a causa de pedir já deduzida. 

Portanto, consoante lição de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR: 

"A proibição de mudar o pedido e aquela que impede o juiz de julgar ultra ou extra petita não excluem a possibilidade de o juiz levar em conta fato superveniente à propositura da ação. A tanto autoriza o art. 493, desde que o fato novo tenha influência no julgamento da lide, se refira, obviamente, ao mesmo fato jurídico que já constitui o objeto da demanda e possa ser tido, em frente a ele, como fato constitutivo, modificativo ou extintivo. (Curso de Direito Processual Civil, Vol. 1, 56ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2015, livro digital, sem destaque no original)"

1.3. DA INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO PEDIDO DA INICIAL 

Seguindo essa mesma linha de justa composição da lide e de preservação da economia processual e da segurança jurídica, o CPC/15 previu expressamente em seu art. 322, § 2º, que a interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé. 

Conforme ressalta a doutrina, o objetivo dessa previsão é impor ao julgador uma visão mais ampla, de forma a observar que “a leitura do pedido não pode limitar-se à sua literalidade, devendo ser feita sistematicamente, ou seja, dentro da visão total do conjunto da postulação” (THEODORO JÚNIOR. Humberto. Curso de Direito Processual Civil, Vol. 1, 56ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2015, livro digital, sem destaque no original). 

A orientação sedimentada no citado dispositivo legal se coaduna com a jurisprudência desta Corte, que firmou entendimento no sentido de que cabe ao julgador a interpretação lógico-sistemática do pedido formulado na petição inicial a partir da análise dos fatos e da causa de pedir, considerados em todo o seu conteúdo. Nesse sentido: REsp 1.255.398/SP, 3ª Turma, DJe de 30/05/2014; AgInt no AREsp 667.492/MS, DJe de 30/04/2018. 

Esta posição consolidada do STJ atende à necessidade conceder à parte o que foi efetivamente requerido por ela, interpretando o pedido a partir de um exame completo da petição inicial, e não apenas da parte da petição destinada aos requerimentos finais, sem que isso implique decisão extra ou ultra petita. Nesse sentido: REsp 1.639.016/RJ, 3ª Turma, DJe de 04/04/2017; EDcl no REsp 1.331.100/BA, 4ª Turma, DJe de 10/08/2016; AgRg no Ag 886.219/RS, 3ª Turma, DJe de 07/05/2008 e REsp 440.221/ES, 4ª Turma, DJ de 11/10/2004. 

2. DA INDENIZAÇÃO DO DPVAT POR INVALIDEZ PERMANENTE E DA AFERIÇÃO DA GRAVIDADE DAS LESÕES POR PERÍCIA PELO INSTITUTO MÉDICO LEGAL 

As previsões de interpretação sistemática do pedido e a possibilidade expressa de o juiz levar em consideração os fatos supervenientes constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que influam no julgamento da causa, na forma dos arts. 322, § 2º, e 493 do CPC/15, encontram completa adequação nas ações de complementação de valor indenizatório do DPVAT. 

Em primeiro lugar, porque a jurisprudência da e. Segunda Seção reconhece o caráter social do seguro obrigatório DPVAT, aduzindo que as “seguradoras, [...] não possuem qualquer margem discricionária para efetivação do pagamento da indenização securitária, sempre que presentes os requisitos estabelecidos na lei”, porquanto “a Lei n. 6.194/74, em atendimento a sua finalidade social, é absolutamente protetiva à vítima do acidente” (REsp 1091756/MG, Segunda Seção, DJe 05/02/2018, sem destaque no original). 

Em segundo, porque a leitura conjugada dos artigos 3º e 5º da Lei 6.194/74 permite inferir que o legislador estabeleceu apenas o limite máximo do valor da indenização por invalidez permanente, correspondente a até R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais), na redação dada pela Lei 11.482/2007, o que justifica a necessidade de que as lesões sejam quantificadas pelo instituto médico legal competente para que se possa apurar o grau de incapacidade do segurado, fixando-se, em razão da extensão das lesões por ele sofridas, a respectiva compensação indenizatória. 

É, assim, indispensável a realização de perícia para verificar o grau de invalidez do segurado a fim estabelecer o valor da indenização por invalidez permanente do seguro obrigatório DPVAT, pois o valor da referida indenização somente pode ser aferido de acordo com a quantificação da extensão das lesões sofridas pela vítima. 

A doutrina salienta que, mesmo nas hipóteses em que a gravidade das lesões impliquem uma evidente e imediata invalidez permanente, é “necessária a obtenção de laudo do Instituto Médico-Legal da jurisdição do acidente ou da residência da vítima para 'verificação da existência e quantificação das lesões permanentes, totais ou parciais' [...]"(BERMUDES, Sérgio e FERREIRA, Frederico. Termo inicial da prescrição do Seguro DPVAT. in: DPVAT: um seguro em evolução. Rio de Janeiro: Renovar, 2013, p. 262, sem destaque no original). 

Nesse mesmo sentido da indispensabilidade do laudo pericial do IML se posiciona a jurisprudência desta Corte, que, ao examinar os Temas 668 e 875 do STJ, que se referiam à “discussão sobre o termo inicial da prescrição nas demandas por indenização do seguro DPVAT nos casos de invalidez permanente da vítima”, firmou a tese de que “exceto nos casos de invalidez permanente notória, ou naqueles em que o conhecimento anterior resulte comprovado na fase de instrução, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez depende de laudo médico” (REsp 1388030/MG, Segunda Seção, julgado em 11/06/2014, DJe 01/08/2014). 

Essa orientação jurisprudencial é reiterada e aprofundada em julgados recentes, que consignam que “quando, porém, referida pretensão estiver fundada na natureza permanente da invalidez, o termo inicial da prescrição será a data da ciência inequívoca dessa condição clínica, o que, salvo nas hipóteses de invalidez notória, se dá com a elaboração do laudo médico” (AgInt no REsp 1804683/MT, Rel. Terceira Turma, DJe 14/05/2020). 

2.1. DA INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO PEDIDO DE COMPLEMENTAÇÃO DE INDENIZAÇÃO E DA PERÍCIA MÉDICA COMO FATO SUPERVENIENTE CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR QUE DEVE SER TOMADO EM CONSIDERAÇÃO PELO JUIZ (ART. 493 DO CPC/15) 

Nesse contexto, como o seguro obrigatório DPVAT é seguro de nítido caráter social cuja indenização deve ser paga pelas seguradoras sem qualquer margem de discricionariedade e sempre que atendidos os requisitos da Lei 6.194/74, (REsp 1091756/MG, Segunda Seção, DJe 05/02/2018), o pedido de complementação da indenização paga a menor administrativamente deve ser interpretado sistematicamente, a fim de garantir à vítima o valor correspondente à lesão por ela efetivamente sofrida, segundo o grau de sua invalidez, ainda que o pedido específico, formulado ao final da peça inicial, tenha sido formulado equivocadamente, com a fixação de valor definido, mas inadequado à previsão legal. 

Não o suficiente, a eventual realização de laudo pericial pelo Instituto Médico Legal (IML) no curso do processo deve ser considerada fato superveniente constitutivo do direito do autor, na forma do art. 493 do CPC/15. 

Sob esta perspectiva, a fixação da indenização segundo os parâmetros legais efetiva e concretamente apurados na hipótese concreta não acarretará a configuração de sentença para além do pedido (ultra petita). 

3. DA HIPÓTESE CONCRETA 

Na hipótese concreta, o recorrente ajuizou ação de complementação da indenização securitária do DPVAT, aduzindo que o valor recebido administrativamente, de R$ 843,75 (oitocentos e quarenta e três reais e setenta e cinco centavos) não condizia com a gravidade da lesão por ele sofrida. 

Para tanto, apresentou apenas os seus “documentos pessoais, prontuário hospitalar e boletim de ocorrência, deixando de exigir o Laudo de Exames de Lesões Corporais confeccionado pelo Instituto Médico Legal – IML, uma vez que os documentos apresentados foram suficientes, por si só, para a configuração do fato social (acidente), o dano (óbito/invalidez) e o liame de causalidade entre o acidente e as lesões permanentes” (e-STJ, fl. 5, sem destaque no original). 

Consoante se infere da sentença, a própria seguradora recorrida teria sustentado a “necessidade de prova pericial a ser realizada pelo IML, tendo em vista que o laudo médico particular não é meio idôneo para fundamentar a condenação” (e-STJ, fl. 288). 

O referido laudo foi juntado aos autos às fls. 266-267 (e-STJ), tendo sido a recorrida intimada para se manifestar sobre a citada documentação. 

Na oportunidade, a recorrida ressaltou que “em caso de eventual condenação, o que não se espera, deve ser o valor indenizatório fixado nos termos previsto em lei, ou seja, de acordo com o grau da lesão sofrida e dentro do valor estipulado na tabela constante em lei” (e-STJ, fl. 279). 

No primeiro grau de jurisdição, o pedido foi julgado parcialmente procedente, para condenar a seguradora recorrida ao pagamento da diferença de indenização no valor de R$ 506,25 (quinhentos e seis reais e vinte e cinco centavos), ao fundamento de que “o laudo pericial elaborado pelo IML constatou a impotência funcional do membro inferior direito do autor na proporção de 50%” e de que “conforme a tabela de indenizações do seguro DPVAT, a anquilose total de um dos tornozelos admite indenização equivalente a 20% da importância assegurada (R$ 13.500,00), o que corresponde ao valor máximo de R$ 2.700,00” (e-STJ, fls. 289-290, sem destaque no original). 

Ambas as partes apelaram, tendo sido a apelação da seguradora parcialmente provida, para modificar os critérios de correção monetária da diferença indenizatória, e o apelo do recorrente provido, para “condenar a seguradora ao pagamento de R$3.881,25 (três mil, oitocentos e oitenta e um reais e vinte e cinco centavos) à título de complementação indenizatória do seguro obrigatório DPVAT” (e-STJ, fl. 403). 

Em sua apelação, o recorrente alegava que foi submetido “a perícia médica oficial do Estado pelo Instituto Médico Legal – IML, de Maringá-PR, onde constatou que o acidente automobilístico em questão acarretou a perda de 50% (cinquenta por cento) do membro inferior direito” (e-STJ, fl, 344). Aduziu que o laudo do IML deveria prevalecer para a apuração do percentual de invalidez que lhe havia acometido (e-STJ, fl. 345). 

O Tribunal de origem considerou que “a perícia confeccionada pelo IML (fls. 266/267) atestou que o autor apresenta 'déficit funcional moderado em 50% do membro inferior direito, conforme art. 3° da Lei 11.945/2009'”, concluindo que, “assim, deveria ser pago R$4.725,00 (quatro mil, setecentos e vinte e cinco reais), vez que a indenização deve ser 70% (setenta por cento) de R$13.500,00 (que é o previsto na tabela anexa à Lei 6.194/74 para a perda anatômica e/ou funcional completa de um dos membros inferiores), multiplicado por 50% (cinquenta por cento), tendo em vista a natureza moderada da lesão” (e-STJ, fl. 401, sem destaque no original). 

No entanto, em vista da oposição de embargos de declaração pela seguradora recorrida, foram atribuídos efeitos modificativos ao referido recurso, restringindo o valor da complementação da indenização ao montante expresso na petição inicial, de R$ 2.859,53 (dois mil, oitocentos e cinquenta e nove reais e cinquenta e três centavos), por se ter reconhecido ofensa ao princípio da congruência e julgamento para além do pedido (ultra petita), desbordando do ao pedido inicial. 

As conclusões do acórdão recorrido, de que teria ficado configurado o julgamento para além do pedido (ultra petita), não encontram respaldo na lei e tampouco na jurisprudência desta Corte. 

Como se observa, na hipótese dos autos, supervenientemente ao ajuizamento da ação, foi elaborado laudo pericial pelo IML (e-STJ, fls. 266-267) que constatou que a lesão sofrida pelo recorrente foi mais grave do que se imaginou a princípio a própria vítima no momento de elaboração de sua petição inicial. 

Esse fator, essencial para a justa composição da lide, com a fixação do valor da complementação da indenização segundo os parâmetros expressamente definidos no art. 3º da Lei 6.194/74, é portanto, fato constitutivo do direito do autor posterior ao ajuizamento da ação que deve ser levado em consideração pelo juiz ao proferir a sentença. 

A manutenção do entendimento adotado pelo Tribunal de origem implicaria em ofensa aos princípios da segurança jurídica e da celeridade processual, haja vista que imporia à vítima a necessidade de ingressar com novo pedido de complementação da indenização, a fim de que seu valor alcançasse o montante efetivamente devido pela seguradora, segundo a gravidade da lesão por si sofrida, nos termos da gradação legal. 

Nessa linha, por aplicação da norma constante no art. 493 do CPC/15, a sentença que concede ao recorrente a indenização conforme esse fato posterior não pode ser considerada para além do pedido (ultra petita), razão pela qual não havia motivos para a limitação da complementação da indenização aos valores numéricos referidos à inicial. 

4. CONCLUSÃO 

Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial para, reformando o acórdão recorrido, restabelecer a condenação fixada pelo acórdão que apreciou deu provimento à apelação do recorrente, inclusive quanto aos ônus da sucumbência.