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29 de abril de 2021

O terceiro de boa-fé, endossatário, em operação de endosso-caução, não perde seu crédito de natureza cambial em vista da quitação feita ao endossante (credor originário), sem resgate da cártula

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-691-stj.pdf


DUPLICATA - O terceiro de boa-fé, endossatário, em operação de endosso-caução, não perde seu crédito de natureza cambial em vista da quitação feita ao endossante (credor originário), sem resgate da cártula 

Nas operações de endosso-caução – nas quais a parte endossante transmite um título ao endossatário como forma de garantia da dívida, mas sem a transferência da titularidade da cártula –, o endossatário de boa-fé não tem seu direito de crédito abalado no caso de eventual quitação realizada ao endossante (credor originário), sem resgate do título. STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1.635.968/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 06/04/2021 (Info 691). 

Endosso 

Ocorre o endosso quando o credor do título de crédito transmite seus direitos a outra pessoa. O credor que transmite seus direitos sobre o título é chamado de endossante (aquele que faz o endosso). A pessoa que recebe os direitos sobre o título é denominada de endossatário (aquele que é beneficiado com o endosso). O endosso pode ser dividido em: a) endosso próprio; b) endosso impróprio. 

Endosso próprio 

É aquele que produz os dois efeitos próprios do endosso, que são: a) transferir a titularidade do crédito do endossante para o endossatário; b) transformar o endossante em codevedor do título (se o devedor principal não pagar o título, o endossatário poderá cobrar o valor do endossante). 

Endosso impróprio 

O endosso impróprio não transfere o crédito para o endossatário, mas apenas permite que este (o endossatário) tenha a posse do título para: 

• agir em nome do endossante (endosso-mandato); ou 

• como garantia de uma dívida que o endossante tenha com o endossatário (endosso-caução). 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

João emitiu um título de crédito (duplicata) em favor de Pedro, no valor de R$ 100 mil. Pedro estava devendo R$ 90 mil a Carlos. Pedro (endossante) fez o endosso-caução da duplicata em favor de Carlos (endossatário), como garantia da dívida. João pagou os R$ 100 mil que estava devendo para Pedro. Ocorre que João não pediu de volta a duplicata. Pedro sumiu e Carlos não conseguiu cobrar dele os R$ 90 mil devidos. Diante disso, Carlos ajuizou execução de título extrajudicial contra João cobrando o valor contido na duplicata. João apresentou embargos à execução argumentando que já pagou a dívida e que a execução deveria ser extinta. 

O argumento de João deverá ser acolhido? NÃO. 

Nas operações de endosso-caução – nas quais a parte endossante transmite um título ao endossatário como forma de garantia da dívida, mas sem a transferência da titularidade da cártula –, o endossatário de boa-fé não tem seu direito de crédito abalado no caso de eventual quitação realizada ao endossante (credor originário), sem resgate do título. STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1.635.968/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 06/04/2021 (Info 691). 

Lei Uniforme de Genebra 

O art. 19 da Lei Uniforme de Genebra (Decreto nº 57.663/66) estabelece que, quando o endosso contém qualquer menção que implique uma caução, o portador pode exercer todos os direitos emergentes do título. O mesmo dispositivo prevê que os coobrigados (ex: João) não podem invocar contra o portador (ex: Carlos) as exceções fundadas nas relações pessoais com o endossante (ex: Pedro), a menos que o portador, ao receber a letra cambiária, tenha praticado ato consciente em detrimento do devedor. 

Incentivo à ampla circulação 

Existe um interesse social no sentido de que haja a ampla circulação dos títulos de crédito, permitindo aos terceiros de boa-fé a plena garantia e a segurança na sua aquisição. A inoponibilidade das exceções fundadas em direito pessoal do devedor é, portanto, uma importante garantia em favor da segurança da circulação e da negociabilidade dos títulos de crédito. O título de crédito nasce para circular, não para ficar restrito à relação entre o devedor principal e o credor originário. 

Abstração 

O art. 15, I, da Lei das Duplicatas (Lei nº 5.474/68) estabelece que a cobrança judicial de duplicata será efetuada conforme processo aplicável aos títulos executivos extrajudiciais, não havendo necessidade de qualquer outro documento além do título. Apesar de a duplicata possuir natureza causal – ou seja, depende da prestação de um serviço para ser constituída –, essa característica não lhe retira o caráter de abstração: uma vez que o título tenha Informativo comentado circulado, não podem ser opostas exceções pessoais a terceiros de boa-fé, como a ausência da entrega das mercadorias compradas. Pretender discutir o negócio subjacente para admitir oposição de exceções pessoais em face do endossatário terceiro de boa-fé de duplicata aceita representaria significativa mudança na jurisprudência desde sempre pacífica acerca do tema, ferindo de morte a circulabilidade dos títulos de crédito, o princípio da abstração e o relevante instituto cambiário do aceite. 

Aceite 

O caso não discute o instituto de direito civil da cessão do crédito, mas as obrigações cambiárias autônomas do endosso e, de forma específica, o aceite dado no título. Uma vez aceito o título, o sacado vincula-se a ele como devedor principal, e a falta de entrega da mercadoria ou da prestação do serviço, ou mesmo a quitação referente à relação fundamental ao credor originário, só são oponíveis ao sacador, como exceção pessoal, mas não ao endossatário de boa-fé. Desse modo, é temerário para a circulação dos títulos de crédito que se admita a quitação de crédito cambial sem a exigência do resgate da cártula, especialmente se essa situação gerar prejuízo a terceiro de boa-fé. 

Endosso-caução 

Como vimos no início da explicação, o endosso-caução tem por finalidade garantir, mediante o penhor do título, uma obrigação assumida pelo endossante perante o endossatário. Assim, o endossatário assume a condição de credor pignoratício do endossante. Se o endossante cumpre sua obrigação (ex: paga os R$ 90 mil), o título deve ser-lhe restituído pelo endossatário, razão pela qual a doutrina afirma que, em regra, o endosso-caução não gera a transferência do crédito representado pelo título. No entanto, é preciso ressaltar que o endossatário pignoratício é detentor dos direitos emergentes do título, não podendo os coobrigados (ex: João) invocar contra ele exceções fundadas sobre relações pessoais com o endossante. O endossante, apesar de, em tese, ainda ser o proprietário do título, transmitiu os direitos emergentes desse título ao endossatário, como acontece no endosso comum. 

Art. 905 do Código Civil 

O art. 905 do CC, caput, estabelece que o possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante a sua simples apresentação ao devedor, e o parágrafo único estipula que a prestação é devida ainda que o título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente: 

Art. 905. O possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante a sua simples apresentação ao devedor. 

Parágrafo único. A prestação é devida ainda que o título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente. 

 (Juiz TJ/MT 2018 VUNESP) O possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante a sua simples apresentação ao devedor, exceto se o título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente. (errado) 

Portanto, é temerário para o direito cambial, para a circulação dos títulos de crédito, que se admita a quitação de crédito cambial, sem a exigência do resgate da cártula, notadamente se ensejar prejuízo a terceiro de boa-fé.