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19 de novembro de 2021

O candidato que possua qualificação superior àquela exigida para o cargo, no edital, tem direito de a ele concorrer

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-710-stj-2.pdf 


CONCURSO PÚBLICO O candidato que possua qualificação superior àquela exigida para o cargo, no edital, tem direito de a ele concorrer 

O candidato aprovado em concurso público pode assumir cargo que, segundo o edital, exige título de Ensino Médio profissionalizante ou completo com curso técnico em área específica, caso não seja portador desse título mas detenha diploma de nível superior na mesma área profissional. 

Caso concreto: candidato foi aprovado no concurso para o cargo de Técnico de Laboratório – Área Química. O edital exigia, como qualificação para o exercício do cargo, “ensino médio profissionalizante na área, ou ensino médio completo com curso técnico na área (Área Química)”. O candidato não possui ensino médio profissionalizante nem curso técnico na área química. No entanto, ele possui uma qualificação superior e relacionada com a área: ele é formado em Química (possui bacharelado em Química), além de ter concluído Mestrado em Química. STJ. 1ª Seção. REsp 1.888.049-CE, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 22/09/2021 (Recurso Repetitivo – Tema 1094) (Info 710). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João foi aprovado no concurso para o cargo público federal de Técnico de Laboratório – Área Química. O edital do certame exigia, como qualificação para o exercício do cargo, “ensino médio profissionalizante na área, ou ensino médio completo com curso técnico na área (Área Química)”. João não possui ensino médio profissionalizante nem curso técnico na área Química. Ocorre que ele possui uma qualificação superior e relacionada com a área: João é formado em Química (possui bacharelado em Química), além de ter concluído Mestrado em Química. A despeito disso, a Administração Pública não permitiu a sua posse, obrigando que ele tivesse que impetrar mandado de segurança. 

João possui direito de ser empossado? 

SIM. O art. 5º, IV, e o art. 10, parágrafo único, da Lei nº 8.112/90 (Estatuto dos Servidores Públicos Federais) prevê que a investidura no cargo público somente ocorrerá se o candidato tiver o nível de escolaridade exigido para o exercício do cargo, conforme estiver previsto no edital do certame. O edital do concurso, por sua vez, exige a qualificação que é prevista na lei da carreira. Veja: 

Art. 5º São requisitos básicos para investidura em cargo público: (...) IV - o nível de escolaridade exigido para o exercício do cargo; 

Art. 10 (...) Parágrafo único. Os demais requisitos para o ingresso e o desenvolvimento do servidor na carreira, mediante promoção, serão estabelecidos pela lei que fixar as diretrizes do sistema de carreira na Administração Pública Federal e seus regulamentos. 

No caso concreto, a lei da carreira e o edital exigiam “ensino médio profissionalizante na área, ou ensino médio completo com curso técnico na área (Área Química)”. Como o candidato possui diploma de nível superior na mesma área profissional (bacharelado em Química), deve-se entender que ele cumpriu o requisito do edital. A partir de uma análise econômica do Direito, e considerando as consequências práticas da decisão - nos termos do art. 20 da LINDB, deve-se considerar que a aceitação de titulação superior à exigida traz efeitos benéficos para o serviço público e, consequentemente, para a sociedade brasileira. Ao se fazer essa interpretação ampliativa, a Administração Pública experimenta dois benefícios: 1) o leque de candidatos postulantes ao cargo é ampliado, permitindo uma seleção mais abrangente e mais competitiva no certame; 2) a própria prestação do serviço público é aperfeiçoada com a investidura de servidores mais qualificados e aptos para o exercício da função pública. Registre-se que tal postura se coaduna com a previsão do art. 37 da Constituição Federal, que erige o princípio da eficiência dentre os vetores da administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Convém transcrever trecho da manifestação do Ministério Público nos autos: 

“13. Afigura-se correto e legítimo este entendimento sobre o tema. A titulação superior àquela exigida no edital, na mesma área profissional, satisfaz inteiramente o requisito de escolaridade para a posse no cargo público almejado. O candidato aprovado que apresenta nível mais alto de escolaridade para a função certamente terá desempenho superior, aportará mais conhecimento para a instituição de ensino, para os alunos e para a sociedade. Benefício para todos. 14. Em sentido oposto, indeferir o ingresso do profissional nestas condições confronta com o próprio interesse público, de selecionar de forma objetiva os mais bem preparados para exercer o múnus público, com o propósito de excelência na prestação de serviços públicos. Trata-se, portanto, de privilegiar os princípios da razoabilidade e da eficiência, porquanto o concurso público é o sistema adotado pela Administração Pública para selecionar o candidato mais capacitado ao cargo.” 

Em suma: O candidato aprovado em concurso público pode assumir cargo que, segundo o edital, exige título de Ensino Médio profissionalizante ou completo com curso técnico em área específica, caso não seja portador desse título mas detenha diploma de nível superior na mesma área profissional. STJ. 1ª Seção. REsp 1.888.049-CE, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 22/09/2021 (Recurso Repetitivo – Tema 1094) (Info 710).

15 de novembro de 2021

Para a recusa à nomeação de aprovados dentro do número de vagas em concurso público devem ficar comprovadas as situações excepcionais elencadas pelo Supremo Tribunal Federal no RE 598.099/MS, não sendo suficiente a alegação de estado das coisas - pandemia, crise econômica, limite prudencial atingido para despesas com pessoal -, tampouco o alerta da Corte de Contas acerca do chamado limite prudencial

Processo

RMS 66.316-SP, Rel. Min. Manoel Erhardt (Desembargador convocado do TRF da 5ª Região), Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 19/10/2021.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Concurso público. Candidato aprovado dentro do número de vagas. Restrições financeiras impeditivas. Situações excepcionais. RE 598.099/MS. Inocorrência. Não nomeação dos aprovados. Ilegalidade.

 

DESTAQUE

Para a recusa à nomeação de aprovados dentro do número de vagas em concurso público devem ficar comprovadas as situações excepcionais elencadas pelo Supremo Tribunal Federal no RE 598.099/MS, não sendo suficiente a alegação de estado das coisas - pandemia, crise econômica, limite prudencial atingido para despesas com pessoal -, tampouco o alerta da Corte de Contas acerca do chamado limite prudencial.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Inicialmente, pontua-se que tem aportado nesta Corte Superior recursos interpostos por candidatos aprovados em concursos públicos, insurgências dirigidas contra a denegação da segurança pelo Tribunal de Justiça de origem, este que, em sua fundamentação, tem albergado a tese da autoridade coatora de que, por restrições financeiras diversas - atinentes a leis orçamentárias, pandemia, crise econômica no país - estaria o Poder Público com a chancela factual para não nomear aqueles que obtiveram, dentro do número de vagas, o êxito no certame.

Discute-se se a espécie comportaria a aplicação das chamadas situações excepcionais elencadas pela Corte Suprema no RE 598.099/MS, alusivas aos critérios de superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade, que constituiriam o alicerce para a não nomeação dos aprovados pelo Poder Público.

Acerca do tema, esta Corte Superior tem a diretriz de que a recusa à nomeação dos aprovados dentro do número de vagas deve ser a última das oportunidades, quando realmente já não houver saída para a Administração Pública (RMS 57.565/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 20/08/2018).

Contudo, muito embora venha a brandir o estado das coisas - pandemia, crise econômica, limite prudencial atingido para despesas com pessoal -, que teria resultado em situação financeira impeditiva às nomeações, o fato é que não se verifica a existência dos reais elementos orçamentários que venham a embasar o não chamamento dos candidatos aprovados dentro do número de vagas.

Um aspecto que deve ser ressaltado é que, se foram oferecidas vagas de concurso pelo Poder Público, sem que houvesse a segurança orçamentária devidamente blindada para o certame, indene, portanto, a vicissitudes econômico-sociais, se está diante de ato de gestor público que pode até mesmo ser elencado como ilícito administrativo. Assim, a recusa à nomeação deve ser a última das oportunidades, quando realmente já não houver saída, consoante já noticiou esta Corte Superior (RMS 57.565/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 20/08/2018).

No caso concreto, a situação não é cifrada exclusivamente ao cerne da pandemia, razão pela qual não há evidências de que o órgão está diante das situações excepcionalíssimas anotadas pelo excelso STF, justificadoras do afastamento das nomeações, não sendo suficiente o alerta da Corte de Contas acerca do chamado limite prudencial.


É inconstitucional ato normativo que exclui o direito dos candidatos com deficiência à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-1028-stf.pdf


CONCURSO PÚBLICO É inconstitucional ato normativo que exclui o direito dos candidatos com deficiência à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos 

A exclusão da previsão de adaptação das provas físicas para candidatos com deficiência viola o bloco de constitucionalidade composto pela Constituição Federal e pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – CDPD (Decreto Legislativo 186/2008), incorporada à ordem jurídica brasileira com o “status” de Emenda Constitucional, na forma do art. 5º, § 3º, da CF/88. Duas teses fixadas pelo STF para o tema: 1) É inconstitucional a interpretação que exclui o direito de candidatos com deficiência à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos. 2) É inconstitucional a submissão genérica de candidatos com e sem deficiência aos mesmos critérios em provas físicas, sem a demonstração da sua necessidade para o exercício da função pública. STF. Plenário. ADI 6476/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 3/9/2021 (Info 1028). 

O caso concreto foi o seguinte: 

O Decreto nº 9.508/2018, de 25/09/2018, tratou sobre a participação de pessoas com deficiência em concursos públicos e em processos seletivos no âmbito da administração pública federal direta e indireta. Um ponto interessante do Decreto nº 9.508/2018 foi que ele trouxe a previsão no sentido de que as provas físicas deveriam ser adaptadas para candidatos com deficiência. Ocorre que, pouco tempo depois, em 30/10/2018, foi editado o Decreto nº 9.546/2018, excluindo a previsão de adaptação das provas físicas para candidatos com deficiência e estabelecendo que os critérios de aprovação dessas provas poderiam seguir os mesmos critérios aplicados aos demais candidatos. Vamos comparar a redação original e as modificações promovidas: 

Redação original do Decreto 9.508/2018 

Art. 3º Para os fins do disposto neste Decreto, os editais dos concursos públicos e dos processos seletivos de que trata a Lei nº 8.745, de 1993, indicarão: (...) III - a previsão de adaptação das provas escritas, físicas e práticas, do curso de formação, se houver, e do estágio probatório ou do período de experiência, estipuladas as condições de realização de cada evento e respeitados os impedimentos ou as limitações do candidato com deficiência; (...) Não havia inciso VI 

Não havia § 4º no art. 4º. 


Redação do Decreto 9.508/2018 após as alterações promovidas pelo Decreto 9.546/2018 

Art. 3º Para os fins do disposto neste Decreto, os editais dos concursos públicos e dos processos seletivos de que trata a Lei nº 8.745, de 1993, indicarão: (...) III - a previsão de adaptação das provas escritas e práticas, inclusive durante o curso de formação, se houver, e do estágio probatório ou do período de experiência, estipuladas as condições de realização de cada evento e respeitados os impedimentos ou as limitações do candidato com deficiência; (...) VI - a previsão da possibilidade de uso, nas provas físicas, de tecnologias assistivas que o candidato com deficiência já utilize, sem a necessidade de adaptações adicionais, inclusive durante o curso de formação, se houver, e no estágio probatório ou no período de experiência. 

Art. 4º (...) § 4º Os critérios de aprovação nas provas físicas para os candidatos com deficiência, inclusive durante o curso de formação, se houver, e no estágio probatório ou no período de experiência, poderão ser os mesmos critérios aplicados aos demais candidatos, conforme previsto no edital. 

ADI 

O Partido Socialista Brasileiro – PSB ajuizou ADI contra o Decreto nº 9.546/2018 (segundo decreto) alegando que ele seria inconstitucional, dentre outros motivos, por violar a previsão constitucional que determina a proteção da pessoa com deficiência. No mérito, requer a declaração de inconstitucionalidade total do Decreto nº 9.546/2018 ou, subsidiariamente, que lhe seja conferida interpretação conforme a Constituição, a fim de que se declare a inconstitucionalidade de qualquer interpretação que cause prejuízos a candidatos com deficiência. 

O STF concordou com os argumentos do autor da ADI? 

SIM. O Decreto nº 9.546/2018, ao excluir a previsão de adaptação das provas físicas para candidatos com deficiência violou o bloco de constitucionalidade composto pela Constituição Federal e pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – CDPD (Decreto Legislativo nº 186/2008), incorporada à ordem jurídica brasileira com o “status” de Emenda Constitucional, na forma do art. 5º, § 3º, da CF/88. 

Proteção constitucional às pessoas com deficiência 

No tocante ao trabalho, a Constituição Federal de 1988 assegurou às pessoas com deficiência: • a proibição de que o trabalhador com deficiência sofra qualquer discriminação relativa a salário e a critérios de admissão (art. 7º, XXXI); • a previsão de reserva de um percentual de vagas dos cargos e empregos públicos (art. 37, VIII). 

Além dessa proteção acima exposta, é muito importante lembrar da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Convenção de Nova York), assinada em 30/03/2007, aprovada no Congresso Nacional pelo Decreto Legislativo 186/2008 e promulgada pelo Decreto n. 6.949/2009. A Convenção de Nova York possui status de emenda constitucional em nosso país, considerando que se trata de convenção internacional sobre direitos humanos que foi aprovada, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, conforme previsto no § 3º do art. 5º da CF/88: 

Art. 5º (...) § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. 

Desse modo, a Convenção compõe o chamado “bloco de constitucionalidade” e constitui parâmetro para o controle de constitucionalidade. De forma bem simplificada, bloco de constitucionalidade significa que a Constituição pode ser formada não apenas pelos dispositivos que estão ali expressamente escritos, mas também por outras normas não presentes no texto, como, por exemplo, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. A Convenção tem como uma de suas principais preocupações a proibição de qualquer tipo de discriminação em razão da deficiência que tenha “o propósito ou efeito de impedir ou impossibilitar o reconhecimento, o desfrute ou o exercício, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais”. Como se vê, ela veda não apenas a conduta com o propósito, mas também aquela com o efeito de diferenciar com base na deficiência. Nesse último caso tem-se a proibição da discriminação indireta, que ocorre quando práticas aparentemente neutras geram empecilhos a que as pessoas com deficiência possam exercer os seus direitos. Conforme explica André de Carvalho Ramos: 

“A discriminação pode ser direta ou indireta: a discriminação direta assume um dos critérios de diferenciação vistos acima para gerar desvantagem de modo desigual e injusto; a discriminação indireta adota critério aparentemente neutro, mas que implica em desvantagem maior para os que pertencem a determinado grupo. (...) A discriminação indireta é mais sutil: consiste na adoção de critério aparentemente neutro (e, então, justificável), mas que, na situação analisada, possui impacto negativo desproporcional em relação a determinado segmento vulnerável. A discriminação indireta levou à consolidação da teoria do impacto desproporcional, pela qual é vedada toda e qualquer conduta (inclusive legislativa) que, ainda que não possua intenção de discriminação, gere, na prática, efeitos negativos sobre determinados grupos ou indivíduos. Na discussão sobre a Emenda Constitucional n. 20/98, que limitou os benefícios previdenciários a R$ 1.200,00, discutiu-se a quem caberia pagar a licença-maternidade no caso da mulher trabalhadora receber salário superior a tal valor. Caso a interpretação concluísse que o excedente seria pago pelo empregador, a regra aparentemente neutra (limite a todos os benefícios) teria um efeito discriminatório no mercado de trabalho e um impacto desproporcional sobre a empregabilidade da mulher, pois aumentariam os custos para o patrão. Com isso, a regra teria um efeito de discriminação indireta, contrariando a regra constitucional proibitiva da discriminação, em matéria de emprego, por motivo de sexo. Nesse sentido, o STF decidiu que “na verdade, se se entender que a Previdência Social, doravante, responderá apenas por R$ 1.200,00 (hum mil e duzentos reais) por mês, durante a licença da gestante, e que o empregador responderá, sozinho, pelo restante, ficará sobremaneira facilitada e estimulada a opção deste pelo trabalhador masculino, ao invés da mulher trabalhadora. Estará, então, propiciada a discriminação que a Constituição buscou combater, quando proibiu diferença de salários, de exercício de funções e de critérios de admissão, por motivo de sexo (art. 7º, XXX, da CF/1988), proibição que, em substância, é um desdobramento do princípio da igualdade de direitos entre homens e mulheres, previsto no inciso I do art. 5º da CF. (...) Ação direta de inconstitucionalidade é julgada procedente, em parte, para se dar ao art. 14 da EC 20, de 15-12-1998, interpretação conforme à Constituição, excluindose sua aplicação ao salário da licença gestante, a que se refere o art. 7º, XVIII, da CF” (ADI 1.946, rel. Min. Sydney Sanches, j. 3-4-2003, Plenário, DJ de 16-5-2003).” (Curso de Direitos Humanos. 8ª ed., São Paulo: Saraiva). 

Observada a proporcionalidade, é preciso combater tais condutas, permitindo que a pessoa com deficiência possa exercer a sua liberdade de escolha na condução de sua vida – inclusive quanto ao trabalho –, tal como as outras pessoas, e que possa participar efetivamente na vida política, pública e cultural. Conforme explicou o Min. Roberto Barroso, “não basta que o meio não seja discriminatório, é preciso que seja antidiscriminatório”. Bruno Galindo define o direito antidiscriminatório como sendo: 

“(...) um conjunto de medidas jurídicas em âmbito constitucional e infraconstitucional que almeja reduzir a situação de vulnerabilidade de cidadãos e grupos sociais específicos através da proibição de condutas discriminatórias pejorativas, a exemplo da criação e manutenção de privilégios injustificáveis à luz das contemporâneas teorias da justiça, e, por outro lado, da implementação, quando necessário, de políticas públicas de discriminação reversa ou positiva, sempre no sentido de promover tais grupos e cidadãos a uma situação de potencial igualdade substancial/material, políticas estas normalmente transitórias até que se atinja uma redução significativa ou mesmo extinção da vulnerabilidade em questão.” (GALINDO, Bruno. O direito antidiscriminatório entre a forma e a substância: igualdade material e proteção de grupos vulneráveis pelo reconhecimento da diferença, in: Direito à diversidade (orgs.: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, Glauber Salomão). São Paulo: Atlas, 2015, p. 51. 

Adaptação razoável 

Outro instituto que merece destaque é o da adaptação razoável. Nos termos do artigo 2 da Convenção: 

“Adaptação razoável” significa as modificações e os ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais; 

Em outras palavras, significa que as pessoas com deficiência fazem jus às adaptações do meio social e essa adaptação pode ser exigida desde que não imponha um ônus desproporcional. Essa análise de proporcionalidade deve considerar, de um lado, o estigma social a que essas pessoas estão submetidas como parte dos custos e, de outro lado, o fato de que a eliminação da discriminação é, em si, um benefício para toda a sociedade. Desse modo, pode-se dizer que o Decreto nº 9.546/2018 violou o dever que o Brasil possui de garantir a adaptação razoável em favor das pessoas com deficiência. Nesse sentido, confira o artigo 5 da Convenção: 

Artigo 5 (...) 3. A fim de promover a igualdade e eliminar a discriminação, os Estados Partes adotarão todas as medidas apropriadas para garantir que a adaptação razoável seja oferecida. 

Interpretação conforme a Constituição 

Como vimos acima, o art. 3º, VI, do Decreto prevê a possibilidade de o candidato com deficiência utilizar nas provas físicas suas próprias tecnologias assistivas, sem a necessidade de adaptações adicionais. O STF afirmou que só existe uma forma de interpretar esse dispositivo a fim de que ele possa ser considerado constitucional. Que forma é essa? Deve-se entender que esse inciso VI prevê uma faculdade em favor do candidato com deficiência. Em outras palavras, se a pessoa com deficiência quiser utilizar suas próprias tecnologias assistivas, ele tem essa faculdade. Isso não significa, contudo, que a única forma de adaptação é a tecnologia assistiva. Assim, é inconstitucional a interpretação que exclua o direito à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos. O § 4º do art. 4º do Decreto, por sua vez, estabelece que os critérios de aprovação nas provas físicas poderão ser os mesmos para candidatos com e sem deficiência. A única leitura constitucionalmente adequada desse dispositivo é aquela de acordo com a qual a pessoa com deficiência somente poderá ser submetida aos mesmos critérios de avaliação física em concursos públicos quando essa exigência for indispensável ao exercício das funções de um cargo público específico, não se aplicando indiscriminadamente a todo e qualquer processo seletivo. A previsão genérica de submissão de pessoas com e sem deficiência aos mesmos critérios em provas físicas pode, na prática, resultar em burla à garantia de reserva de vagas prevista no art. 37, VIII, CF/88. 

Teses fixada pelo STF: 

É inconstitucional a interpretação que exclui o direito de candidatos com deficiência à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos. É inconstitucional a submissão genérica de candidatos com e sem deficiência aos mesmos critérios em provas físicas, sem a demonstração da sua necessidade para o exercício da função pública. STF. Plenário. ADI 6476/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 3/9/2021 (Info 1028). 

Conclusão 

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade, para fixar interpretação conforme a Constituição, no sentido de que: (i) o art. 3º, VI, do Decreto nº 9.508/2018, com redação dada pelo Decreto nº 9.546/2018, estabelece uma faculdade em favor do candidato com deficiência, que pode fazer uso de suas próprias tecnologias assistivas e de adaptações adicionais, se assim preferir; e (ii) o art. 4º, § 4º, do Decreto 9.508/2018, acrescentado pelo Decreto nº 9.546/2018, que estabelece que os critérios de aprovação nas provas físicas poderão ser os mesmos para candidatos com e sem deficiência — somente é aplicável às hipóteses em que essa exigência for indispensável ao exercício das funções próprias de um cargo público específico. 

DOD DICA 

Muita atenção com essas três expressões: bloco de constitucionalidade, discriminação indireta e adaptação razoável.


9 de outubro de 2021

O candidato aprovado em concurso público pode assumir cargo que, segundo o edital, exige título de Ensino Médio profissionalizante ou completo com curso técnico em área específica, caso não seja portador desse título mas detenha diploma de nível superior na mesma área profissional.

Processo

REsp 1.888.049-CE, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 22/09/2021. (Tema 1094)

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

Tema

Concurso público. Exigência de título de Ensino Médio profissionalizante ou completo com curso técnico em área específica. Candidato portador de diploma de nível superior na mesma área profissional. Qualificação superior a exigida. Investidura no Cargo. Possibilidade. Tema 1094.

 

DESTAQUE

O candidato aprovado em concurso público pode assumir cargo que, segundo o edital, exige título de Ensino Médio profissionalizante ou completo com curso técnico em área específica, caso não seja portador desse título mas detenha diploma de nível superior na mesma área profissional.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Os arts. 5º, IV, e 10 da Lei n. 8.112/1990, e o art. 9º, § 2º, da Lei n. 11.091/2005 determinam que a investidura em cargo público apenas ocorrerá se o candidato tiver o nível de escolaridade exigido para o exercício do cargo, conforme estiver previsto no edital do certame.

A questão que se coloca apresenta uma nota distintiva, qual seja, saber se atende à exigência do edital o candidato que porta um diploma de nível superior na mesma área profissional do título de Ensino Médio profissionalizante ou completo com curso técnico indicado como requisito no certame.

Sob um prisma da análise econômica do Direito, e considerando as consequências práticas da decisão - nos termos do art. 20 do Decreto-Lei n. 4.657/1942 (acrescentado pela Lei n. 13.655/2018, que deu nova configuração à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB) -, não se pode deixar de registrar que a aceitação de titulação superior à exigida traz efeitos benéficos para o serviço público e, consequentemente, para a sociedade brasileira.

Destaca-se os seguintes benefícios: 1) o leque de candidatos postulantes ao cargo é ampliado, permitindo uma seleção mais abrangente e mais competitiva no certame; 2) a própria prestação do serviço público é aperfeiçoada com a investidura de servidores mais qualificados e aptos para o exercício da função pública.

Registre-se que tal postura se coaduna com a previsão do art. 37 da Constituição Federal, que erige o princípio da eficiência dentre os vetores da administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.




8 de agosto de 2021

Impedir que candidato prossiga no concurso público para ingresso porque foi usuário de drogas há sete anos acaba por aplicá-lo uma sanção de caráter perpétuo

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/07/info-699-stj.pdf


CONCURSOS PÚBLICOS - Impedir que candidato prossiga no concurso público para ingresso porque foi usuário de drogas há sete anos acaba por aplicá-lo uma sanção de caráter perpétuo 

Impedir que candidato em concurso público que já é integrante dos quadros da Administração prossiga no certame para ingresso nas fileiras da Política Militar na fase de sindicância de vida pregressa, fundada em relato do próprio candidato no formulário de ingresso na corporação de que foi usuário de drogas há sete anos, acaba por aplicá-lo uma sanção de caráter perpétuo, dado o grande lastro temporal entre o fato tido como desabonador e o momento da investigação social. STJ. 2ª Turma. AREsp 1.806.617-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 01/06/2021 (Info 699). 

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: Em 2019, João foi aprovado nas provas do concurso de soldado da Polícia Militar do Distrito Federal. Chegou, então, a fase de investigação social. João relatou que fez uso de drogas no ano de 2011 (quando tinha 19 anos de idade), tendo figurado em processo criminal arquivado no ano de 2012, em razão da extinção da punibilidade. Com base nessa informação, ele foi excluído do certame, sob o fundamento de que teria assumido a prática de conduta desabonadora. Diante disso, o candidato impetrou mandado de segurança. O juízo de primeiro grau concedeu a segurança, contudo, o TJDFT reformou a sentença para manter a eliminação do candidato no certame, afirmando que a eliminação com base nessa “conduta desabonadora” teria natureza de ato adminsitrativo de caráter discricionário. O candidato interpôs, então, recurso especial dirigido ao STJ sustentando, dentre outros argumentos, que esse fato ocorreu há 7 anos e que, atualmente, goza de boa conduta social, sendo, inclusive servidor público do Distrito Federal (professor da rede pública de ensino). Alegou, ainda, que foi aprovado na fase de investigação social no concurso para Soldado da Polícia Militar do Estado do Maranhão. 

O STJ deu provimento ao recurso do autor? João tem direito de ser considerado aprovado na fase de investigação social? SIM. Vamos entender com calma. 

Sindicância da vida pregressa e investigação social 

Em alguns concursos públicos, o edital prevê que os candidatos serão submetidos a uma fase do certame denominada de “sindicância da vida pregressa e investigação social”. Nesta etapa, o órgão ou entidade que está realizando o concurso coleta informações sobre a vida pregressa, bem como a conduta social e profissional do candidato a fim de avaliar se ele possui idoneidade moral para exercer o cargo pleiteado. Em regra, a investigação social é feita mediante a análise das certidões de antecedentes criminais do candidato. Alguns concursos preveem também que se forneça o nome de autoridades que serão consultadas sobre a índole do candidato. Existem, por fim, editais que exigem a apresentação de um “atestado de boa conduta social e moral” subscrito por uma autoridade declarando que desconhece qualquer fato desabonador na vida do postulante ao cargo. 

A investigação social limita-se ao exame da existência de antecedentes criminais ou poderão ser analisados outros aspectos da vida do candidato? 

Entende a jurisprudência do STJ que a investigação social não se resume a analisar a vida pregressa do candidato quanto às infrações penais que eventualmente tenha praticado. Deve ser analisada a conduta moral e social no decorrer de sua vida, visando aferir o padrão de comportamento diante das normas exigidas ao candidato da carreira policial, em razão das peculiaridades do cargo que exigem a retidão, lisura e probidade do agente público (STJ. 6ª Turma. RMS 24.287/RO, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora Convocada do TJ/PE), julgado em 04/12/2012). Nesse mesmo sentido: 

Jurisprudência em Teses do STJ (Ed. 115): Tese 10: A investigação social em concursos públicos, além de servir à apuração de infrações criminais, presta-se a avaliar idoneidade moral e lisura daqueles que desejam ingressar nos quadros da administração pública. 

Assim, a fase de investigação social engloba não só a constatação de condenações penais transitadas em julgado, como também o exame de outros aspectos relacionados à conduta moral e social do candidato. Esse entendimento foi reafirmado nesse julgado: 

Tratando-se da fase de investigação social para cargos sensíveis, como são os da área policial, a análise realizada pela autoridade administrativa não deve se restringir à constatação de condenações penais transitadas em julgado, englobando o exame de outros aspectos relacionados à conduta moral e social do candidato, a fim de verificar sua adequação ao cargo pretendido. STJ. 2ª Turma. AREsp 1.806.617-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 01/06/2021 (Info 699). 

A investigação social poderá ter caráter eliminatório? 

SIM. A maioria das leis que rege as carreiras prevê que um dos requisitos para que qualquer pessoa tome posse no cargo público é a idoneidade moral. Sendo provada a falta dessa condição, é juridicamente possível a eliminação do candidato. Outro fundamento que pode ser invocado para justificar essa medida é o princípio constitucional da moralidade (art. 37 da CF/88).  Vale ressaltar que a investigação social não pode ter caráter classificatório, ou seja, não interfere na pontuação dos candidatos. Se o eliminado discordar dos critérios utilizados pela banca, poderá buscar auxílio do Poder Judiciário, que tem competência para analisar o ato de exclusão do candidato, quando houver flagrante ilegalidade ou descuprimento do edital (STJ. 1 a Turma. RMS 44.360/MS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 05/12/2013). Isso porque “não viola o princípio da separação dos poderes o controle de legalidade exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos administrativos, incluídos aqueles praticados durante a realização de concurso público.” (STF. 1 a Turma. ARE 753331 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 17/09/2013). 

Caso seja constatado, na investigação social, que o candidato responde a um inquérito policial, ação penal ou tem contra si uma condenação ainda não transitada em julgado, tal circunstância, obrigatoriamente, implicará a sua eliminação do certame? 

NÃO. A jurisprudência entende que o fato de haver instauração de inquérito policial ou propositura de ação penal contra candidato, por si só, não pode implicar a sua eliminação. A eliminação nessas circunstâncias, sem o necessário trânsito em julgado da condenação, violaria o princípio constitucional da presunção de inocência. O STF reafirmou esse entendimento e fixou a seguinte tese em repercussão geral: 

Sem previsão constitucionalmente adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou a ação penal. STF. Plenário. RE 560900/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 5 e 6/2/2020 (repercussão geral – Tema 22) (Info 965). 

Voltando ao caso concreto: 

A discricionariedade administrativa não se encontra imune ao controle judicial, especialmente diante da prática de atos que impliquem restrições de direitos dos administrados, como se afigura a eliminação de um candidato a concurso público. Assim, deve o Poder Judiciário reapreciar os aspectos vinculados do ato administrativo, a exemplo da competência, forma, finalidade, bem como a observância dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. O STJ, ao examinar casos envolvendo a eliminação de candidatos na fase de investigação social de certame público para as carreiras policiais, entende que a sindicância de vida pregressa dos candidatos a concursos públicos deve estar “jungida pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade” (ou seja, ligada à análise desses princípios), nos termos do art. 2º da Lei 9.784/99: 

Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. 

Nesse sentido: Não se afigura razoável a eliminação do Recorrente na fase de investigação social do concurso público, tão somente em razão do indiciamento por crime de menor potencial ofensivo, sobre o qual foi realizada transação penal. STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 1453461/GO, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 09/10/2018. 

Afigura-se desarrazoada e desproporcional a eliminação de um candidato na fase de investigação social de concurso para perito da polícia federal, em razão de fato ocorrido 10 anos antes do certame. Perpetuação de fato que não se amolda ao balizamento constitucional que veda a existência de penas perpétuas. STJ. 6ª Turma. REsp 817.540-RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 1º/10/2009. 

Não se admite pena de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, b, da CF/88) 

Há relato espontâneo de um fato pelo próprio candidato, no respectivo formulário de ingresso na incorporação, de que foi usuário de drogas quando tinha 19 anos de idade e que não mais possui essa adição há sete anos (adição = consumo frequente de drogas). Impedir que o candidato prossiga no certame público por conta desse fato acaba por aplicá-lo uma sanção de caráter permanente, dado o grande lastro temporal entre o fato tido como desabonador e o momento da investigação social. Há, portanto, violação ao art. 5º, XLVII, da CF/88: 

Art. 5º (...) XLVII - não haverá penas: b) de caráter perpétuo; 

Destaca-se, ainda, que o candidato eliminado é servidor público do Distrito Federal, não havendo qualquer registro sobre qualquer ato desabonador de sua reputação moral. Logo, o Poder Público adota uma postura contraditória ao considerar inidôneo para o cargo público um indivíduo que já é servidor público do mesmo ente federativo. 

Em suma 

Impedir que candidato em concurso público que já é integrante dos quadros da Administração prossiga no certame público para ingresso nas fileiras da Política Militar na fase de sindicância de vida pregressa, fundada em relato do próprio candidato no formulário de ingresso na corporação de que foi usuário de drogas há sete anos, acaba por aplicá-lo uma sanção de caráter perpétuo, dado o grande lastro temporal entre o fato tido como desabonador e o momento da investigação social. STJ. 2ª Turma. AREsp 1.806.617-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 01/06/2021 (Info 699). 

DOD PLUS (INFORMAÇÕES EXTRAS) 

Jurisprudência em Teses do STJ (Ed. 9) 

Tese 13: O candidato não pode ser eliminado de concurso público, na fase de investigação social, em virtude da existência de termo circunstanciado, inquérito policial ou ação penal sem trânsito em julgado ou extinta pela prescrição da pretensão punitiva. 

Tese 14: O entendimento de que o candidato não pode ser eliminado de concurso público, na fase de investigação social, em virtude da existência de termo circunstanciado, inquérito policial ou ação penal sem trânsito em julgado ou extinta pela prescrição da pretensão punitiva não se aplica aos cargos cujos ocupantes agem stricto sensu em nome do Estado, como o de delegado de polícia. 

Obs: essas teses terão que ser lidas, agora, em harmonia com o entendimento do STF manifestado no RE 560900/DF (Tema 22), acima mencionado. Em provas de concurso, fique com a redação da tese firmada pelo STF. 

É possível a eliminação de candidato que tenha celebrado transação penal anteriormente? 

NÃO. O STJ recentemente decidiu que um candidato aprovado para agente penitenciário federal não poderia ser eliminado do concurso pelo simples fato de ter celebrado transação penal. Conforme afirmou, corretamente, o Min. Relator, a transação penal não pode servir de fundamento para a não recomendação de candidato em concurso público na fase de investigação social, uma vez que não importa em condenação do autor do fato (art. 76 da Lei n.° 9.099/95). STJ. 2ª Turma. REsp 1302206/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17/09/2013. STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 1453461/GO, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 09/10/2018. No mesmo sentido: STF. 1ª Turma. ARE 713138 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 20/08/2013.  

É possível a eliminação de candidato que tenha, quando adolescente, recebido medida socioeducativa? 

NÃO. A utilização de medida socioeducativa para excluir candidato ressocializado é excessiva, afrontando a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90). A exclusão do candidato nesses casos desvirtua os objetivos conceituais das medidas socioeducativas, tais como estão descritos no § 2º do art. 1º da Lei 12.594/2012 (SINASE). STJ. 2ª Turma. RMS 48.568/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 17/11/2015. 

Se a banca examinadora, na fase de investigação social, determina que o candidato responda a um formulário sobre sua vida pregressa e este, propositalmente, omite informações, poderá ser eliminado do concurso por conta dessa conduta? 

SIM. A omissão do candidato em prestar informações, conforme determinado pelo edital, na fase de investigação social ou de sindicância da vida pregressa, enseja a sua eliminação do concurso público. STJ. 2ª Turma. AgRg no RMS 39.108/PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 23/04/2013. 

Jurisprudência em Teses do STJ (Ed. 9): Tese 16: O candidato pode ser eliminado de concurso público quando omitir informações relevantes na fase de investigação social. 

É possível eliminar o candidato pelo simples fato de ele possuir seu nome negativado nos serviços de proteção de crédito (exs: SPC, SERASA)? 

NÃO. É desprovido de razoabilidade e proporcionalidade o ato que, na etapa de investigação social, exclui candidato de concurso público baseado no registro deste em cadastro de serviço de proteção ao crédito STJ. 5ª Turma. RMS 30.734/DF, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 20/09/2011. 

Jurisprudência em Teses do STJ (Ed. 9): Tese 15: O candidato não pode ser eliminado de concurso público, na fase de investigação social, em virtude da existência de registro em órgãos de proteção ao crédito


19 de junho de 2021

Se houve determinação judicial para que o Município fizesse contratação temporária em razão da Covid-19, não se pode dizer que isso configure preterição ilegal de pessoa aprovada no concurso para o mesmo cargo, sendo que o certame era para cadastro de reserva

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/06/info-695-stj.pdf

CONCURSO PÚBLICO - Se houve determinação judicial para que o Município fizesse contratação temporária em razão da Covid-19, não se pode dizer que isso configure preterição ilegal de pessoa aprovada no concurso para o mesmo cargo, sendo que o certame era para cadastro de reserva 

A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva. STJ. 2ª Turma. RMS 65.757-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 04/05/2021 (Info 695). 

Imagine a seguinte situação adaptada: 

O Município de Petrópolis (RJ) realizou concurso para o cargo de enfermeiro. Não havia vagas disponíveis para provimento imediato, de forma que o certame tinha por objetivo a formação de cadastro de reserva. Paula prestou o concurso e foi aprovada em 2019. No início de 2020, como é do conhecimento geral, iniciou-se no Brasil e no mundo a pandemia decorrente do novo coronavírus. O Ministério Público ajuizou ação civil pública contra o Município pedindo a ampliação da rede pública de saúde, inclusive com a contratação de mais profissionais para atendimento da população. Em razão dessa demanda, o Município fez a contratação temporária de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem para auxiliar no atendimento das pessoas acometidas da Covid-19. Ao tomar conhecimento dessas contratações temporárias, Paula impetrou mandado de segurança afirmando que estava sendo preterida e pedindo a nomeação imediata no cargo de enfermeira. 

A questão chegou até o STJ. O pedido de Paula deverá ser acolhido? NÃO. Vamos entender com calma. 

O candidato aprovado em cadastro reserva possui direito subjetivo à nomeação em cargo público? 

Em regra, não. 

REGRA: O certame para formação de cadastro reserva pressupõe a inexistência de cargos vagos ou a ausência de necessidade de provimento imediato, ou de dotação orçamentária. Portanto, a aprovação em cadastro reserva não gera, por si só, o direito subjetivo à nomeação do candidato. 

EXCEÇÃO: A aprovação em cadastro reserva ou fora do número de vagas do edital gera direito subjetivo à nomeação quando demonstrado: • O surgimento superveniente de vaga ou a abertura de novo certame, e • A preterição arbitrária do candidato. 

Hipóteses nas quais existirá direito subjetivo à nomeação 

O STF listou as três hipóteses nas quais existe direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em concurso público: 1) Quando a aprovação do candidato ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital; 2) Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação; 3) Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos de forma arbitrária e imotivada por parte da administração. STF. Plenário. RE 837311/PI, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 09/12/2015 (repercussão geral) (Info 811). 

Voltando à situação hipotética apresentada: No mandado de segurança impetrado, Paula, aprovada no cadastro reserva, buscava o enquadramento na terceira hipótese acima elencada pelo STF, qual seja, o surgimento de novas vagas e a preterição arbitrária e imotivada, para ter reconhecido seu direito à nomeação. Alegou que a contratação temporária seria apta a demonstrar tanto a existência de novas vagas, a necessidade do serviço e a disponibilidade orçamentária, quanto a preterição arbitrária da candidata aprovada. 

A contratação temporária configura, por si só, preterição arbitrária de candidato aprovado em concurso público? A contratação temporária, por si só, não configura preterição arbitrária ou ilegal de candidato aprovado em concurso público. A contratação temporária possui previsão na própria Constituição Federal (art. 37, IX), o que demonstra a sua regularidade intrínseca. Assim, só se pode dizer que a contratação é ilegal se ela não cumpriu os requisitos da lei de regência (no caso, a lei do Município que regulamente as contratações temporárias). Nesse sentido: 

A teor do RE 837.311/PI, julgado sob o regime da repercussão geral, como regra o candidato aprovado em cadastro de reserva não é titular de direito público subjetivo à nomeação, não bastando para a convolação da sua expectativa o simples surgimento de vagas ou a abertura de novo concurso, antes exigindo-se ato imotivado e arbitrário da Administração Pública. Para que a contratação temporária se configure como ato imotivado e arbitrário, a sua celebração deve deixar de observar os parâmetros estabelecidos no RE 658.026/MG, também julgado sob a sistemática da repercussão geral, bem como há de haver a demonstração de que a contratação temporária não se destina ao suprimento de vacância existente em razão do afastamento temporário do titular do cargo efetivo e de que existem cargos vagos em número que alcance a classificação do candidato interessado. STJ. 2ª Turma. RMS 60.682/MT, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 15/08/2019. 

Requisitos estabelecidos pelo STF para a validade da contratação temporária 

O STF, em sede de repercussão geral, enumerou os requisitos para a verificação da regularidade da contratação temporária do art. 37, IX, da CF: 

O conteúdo jurídico do art. 37, inciso IX, da Constituição Federal pode ser resumido, ratificando-se, dessa forma, o entendimento da Corte Suprema de que, para que se considere válida a contratação temporária, é preciso que: a) os casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a necessidade de contratação seja indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração. STF. Plenário. RE 658026/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 9/4/2014 (Info 742). 

Contratação temporária baseada em decisão judicial 

Ressalta-se que a contratação temporária no Município teve origem em demanda judicial, ajuizada em razão da necessidade temporária gerada pelo advento da pandemia. Nessas situações em que a contratação temporária é baseada em decisão judicial, é ainda mais patente a inexistência de preterição arbitrária da administração pública. Existindo determinação judicial, não há margem para a atuação discricionária da administração pública, não havendo hipótese de ilegalidade: 

Não há configuração de preterição de candidato aprovado em concurso público na hipótese em que a administração pública procede à nomeação de outros candidatos em classificação inferior por força de decisão judicial, uma vez que, nessa hipótese, não há margem de discricionariedade à administração, não havendo falar em ilegalidade do ato a ensejar a concessão da ordem. STJ. 2ª Turma. AgInt no RMS 55.701/GO, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 25/08/2020. 

Excepcionalidade da situação: Pandemia de Covid-19 

No caso apresentado, o STJ entendeu que houve regularidade na contratação, pelo Município, de servidores temporários para ocupação da vaga de enfermeiro. A necessidade temporária e o excepcional interesse público estariam baseados na situação de pandemia decorrente da pandemia de Covid-19. É notória a situação de colapso no sistema de saúde decorrente dos altos índices de contaminação pela Covid-19. Portanto, a contratação de profissionais de saúde se mostra como uma necessidade dos entes públicos para o tratamento dos pacientes. Apesar de se tratar do desempenho de funções regulares, como no caso do profissional de enfermagem, a excepcionalidade da situação se evidencia com o aumento de ocupação dos leitos hospitalares e de pessoas que necessitam de assistência da saúde pública. Os números de infectados e pessoas internadas não são estáveis, de modo que esse interesse público na contratação de profissionais de saúde pode aumentar ou diminuir a depender do avanço da pandemia. As chamadas “ondas de contaminação” fazem com que o cenário de necessidade se altere periodicamente. Assim, a contratação temporária se apresenta como instrumento necessário e eficaz para atender aos interesses temporários e excepcionais do cenário atual. 

EC 106/2020 

A título de informação, observa-se que a Emenda Constitucional 106/2020 previu hipótese de contratação temporária específica, no âmbito do Poder Executivo Federal, para o cenário excepcional da pandemia de Covid-19: 

Art. 2º Com o propósito exclusivo de enfrentamento do contexto da calamidade e de seus efeitos sociais e econômicos, no seu período de duração, o Poder Executivo federal, no âmbito de suas competências, poderá adotar processos simplificados de contratação de pessoal, em caráter temporário e emergencial, e de obras, serviços e compras que assegurem, quando possível, competição e igualdade de condições a todos os concorrentes, dispensada a observância do § 1º do art. 169 da Constituição Federal na contratação de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, limitada a dispensa às situações de que trata o referido inciso, sem prejuízo da tutela dos órgãos de controle. Parágrafo único. Nas hipóteses de distribuição de equipamentos e insumos de saúde imprescindíveis ao enfrentamento da calamidade, a União adotará critérios objetivos, devidamente publicados, para a respectiva destinação a Estados e a Municípios. 

Em suma: A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva. STJ. 2ª Turma. RMS 65.757-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 04/05/2021 (Info 695)

8 de junho de 2021

Impedir que candidato em concurso público que já é integrantes dos quadros da Administração prossiga no certame público para ingresso nas fileiras da Política Militar na fase de sindicância de vida pregressa, fundada em relato do próprio candidato no formulário de ingresso na corporação de que foi usuário de drogas há sete anos, acaba por aplicá-lo uma sanção de caráter perpétuo, dado o grande lastro temporal entre o fato tido como desabonador e o momento da investigação social

 AREsp 1.806.617-DF, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 01/06/2021.

Concurso Público. Polícia militar. Sindicância de vida pregressa. Controle judicial do ato administrativo. Possibilidade. Declaração realizada pelo próprio candidato. Uso de drogas na juventude. Fato ocorrido há vários anos. Posterior ingresso no serviço público. Cargo de professor. Razoabilidade e proporcionalidade do ato restritivo. Reexame. Cabimento.

Impedir que candidato em concurso público que já é integrantes dos quadros da Administração prossiga no certame público para ingresso nas fileiras da Política Militar na fase de sindicância de vida pregressa, fundada em relato do próprio candidato no formulário de ingresso na corporação de que foi usuário de drogas há sete anos, acaba por aplicá-lo uma sanção de caráter perpétuo, dado o grande lastro temporal entre o fato tido como desabonador e o momento da investigação social


Inicialmente, salienta-se que a jurisprudência do STJ já sedimentou o entendimento de que, tratando-se da fase de investigação social para cargos sensíveis, como são os da área policial, a análise realizada pela autoridade administrativa não deve se restringir à constatação de condenações penais transitadas em julgado, englobando o exame de outros aspectos relacionados à conduta moral e social do candidato, a fim de verificar sua adequação ao cargo pretendido.

Por seu turno, destaca-se que a discricionariedade administrativa não se encontra imune ao controle judicial, mormente diante da prática de atos que impliquem restrições de direitos dos administrados, como se afigura a eliminação de um candidato a concurso público, cumprindo ao órgão julgador reapreciar os aspectos vinculados do ato administrativo, a exemplo da competência, forma, finalidade, bem como a observância dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça, ao examinar casos envolvendo a eliminação de candidatos na fase de investigação social de certame público para as carreiras policiais, já teve a oportunidade de consignar que a sindicância de vida pregressa dos candidatos a concursos públicos deve estar jungida pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Na situação em apreço, tem-se o relato de um fato pelo próprio candidato, no respectivo formulário de ingresso na incorporação, de que foi usuário de drogas quando tinha 19 (dezenove) anos de idade e que não mais possui essa adição há sete anos.

Destaca-se, ainda, a informação de que o referido candidato, atualmente, é servidor público, exercendo o cargo de professor, não havendo qualquer registro sobre o envolvimento em qualquer ato desabonador de sua reputação moral.

E mais, há o registro de que esse mesmo candidato foi aprovado na fase de investigação social no concurso para Soldado da Polícia Militar em outro Estado.

Nesse contexto, impedir que o candidato prossiga no certame público para ingresso nas fileiras da Política Militar, além de revelar uma postura contraditória da própria Administração Pública, que reputa como inidôneo um candidato que já é integrante dos quadros do serviço público, acaba por aplicá-lo uma sanção de caráter permanente, dado o grande lastro temporal entre o fato tido como desabonador e o momento da investigação social.


5 de junho de 2021

É inconstitucional a interpretação de disposições legais que viabilizem a promoção a cargo de nível superior a servidores que ingressaram por concurso público para cargo de nível médio

 DIREITO ADMINISTRATIVO – SERVIDORES PÚBLICOS

 

Inconstitucionalidade da ascensão funcional e possibilidade de promoção por conclusão de curso de nível superior - ADI 6355/PE 

Resumo:

É inconstitucional a interpretação de disposições legais que viabilizem a promoção a cargo de nível superior a servidores que ingressaram por concurso público para cargo de nível médio.

A equiparação de carreira de nível médio a outra de nível superior constitui ascensão funcional, vedada pelo art. 37, II, da Constituição Federal (CF) (1).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou procedente em parte o pedido para conferir interpretação conforme à Constituição ao caput e ao § 2º do art. 27, ao art. 30, ao inc. I do art. 32 e ao § 1º do art. 61, todos da Lei Complementar 107/2008 do estado de Pernambuco, para reconhecer a inconstitucionalidade de interpretação desses dispositivos legais que vise possibilitar a promoção, para o cargo de auditor fiscal do tesouro estadual, classe II, aos servidores públicos que ingressaram por concurso nos cargos de nível médio existentes antes da vigência da Lei 11.562/1998, modulando os efeitos dessa decisão para preservar as promoções concedidas e os atos administrativos praticados até a publicação do presente acórdão. Vencido parcialmente o ministro Marco Aurélio apenas no tocante à projeção dos efeitos da decisão.

(1) CF: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;”

ADI 6355/PE, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 28.5.2021 (sexta-feira), às 23:59

11 de maio de 2021

A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva.

RMS 65.757-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 04/05/2021. 

Concurso público. Enfermeiro. Cadastro de reserva. Direito à nomeação. Contratação temporária. Descaracterização. Contratação decorrente da pandemia causada pelo vírus SARS-COV-2. Determinação judicial para contratação temporária.


A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva.


A orientação da jurisprudência do STJ é no sentido de que a simples existência de contratação temporária não significa, por si só, a preterição a direito do aprovado em concurso público, e isso porque além de ter assento constitucional, ou seja, ser uma situação permitida pela lei maior do país, o que denota a sua regularidade intrínseca, a ilegalidade da contratação somente ocorrerá quando não observados os requisitos da lei de regência da respectiva unidade federativa.

No caso analisado, o contexto da demanda revela, de uma lado, que a Administração Pública local agiu com bastante clareza ao arregimentar candidatos para um certame no qual não havia vagas disponíveis, fato que não é debelado, por outro lado, com a contratação temporária de terceiros decorrente da excepcionalidade da situação, ainda atual, da pandemia decorrente do vírus Sars-CoV-2, causador da covid-19.

Pesa considerar ainda que a contratação temporária questionada teve origem em demanda judicial ajuizada justamente com o escopo da necessidade temporária gerada pelo advento da pandemia.

Isso corrobora ainda a inexistência de preterição ilegal, forte na jurisprudência desta Corte que assim compreende quando a nomeação decorre de determinação judicial.

Normalmente os casos concretos avaliados referem-se à inobservância da ordem classificatória, mas como isso advém de decisão judicial então não haveria ilegalidade na prática administrativa, como no caso do AgInt no RMS 55.701/GO (Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 25/08/2020, DJe 01/09/2020).

No presente caso, embora a situação fática seja distinta, a razão é a mesma, porque a Administração Pública local somente procedeu à contratação em virtude de ordem judicial, o que igualmente retira do fato a pecha da preterição ilegal.

20 de abril de 2021

TJDFT reconhece arredondamento para baixo de nota de corte em concurso público

 O Conselho Especial do TJDFT negou pedido de candidata do concurso para Carreira Pública de Assistência Social do Distrito Federal contra ato da Secretária de Estado e Desenvolvimento Social do DF e do Presidente do Tribunal de Contas do DF – TCDF, que autorizou a banca examinadora a realizar o arredondamento para baixo do número de questões necessárias para aprovação na prova objetiva do concurso público.

A candidata argumenta que, com a determinação do TCDF, teve sua classificação alterada e, assim, foi prejudicada no certame. Sustenta a ilegalidade da decisão, por violar o artigo 59 da Lei Distrital 4.949/2012 e o item 11.3 do edital do concurso. Por fim, alega que o TCDF adentrou indevidamente no mérito administrativo.

Ao analisar o pedido, o colegiado reconheceu a razoabilidade da decisão do TCDF e não vislumbrou qualquer irregularidade, uma vez que o arredondamento para cima do número de acertos provocaria a eliminação de diversos candidatos. “Com a aproximação para baixo dos pontos necessários para aprovação, chegou-se a número mais próximo àquele previsto no edital e possibilitou a permanência no certame do maior número de candidatos. A solução observou a proporcionalidade exigida no artigo 59 da Lei Distrital 4.949/2012 e atendeu ao interesse público”, ressaltou a relatora designada.

A relatora designada explicou, ainda, que o edital do concurso não havia adotado os critérios estabelecidos no artigo 59 da mencionada lei e foi retificado, antes do início das inscrições, para adequação à legislação, de forma a determinar, nos casos de anulação de questões, “o ajuste proporcional ao sistema de pontuação previsto no edital”. Acrescentou que, “Após a aplicação da prova objetiva e a distribuição proporcional dos pontos das questões anuladas para as questões válidas, o número mínimo de acertos necessários para aprovação no certame passou a ser superior ao percentual de 60% exigido no edital”.

Diante do exposto e segundo a magistrada, o TCDF, ao analisar diversos pedidos de reexame da contagem dos pontos, no exercício da função fiscalizatória, considerou regular o arredondamento para baixo do número de acertos, conforme entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça. “A decisão do TCDF referiu-se à irregularidade no critério adotado pela banca examinadora na distribuição de pontos de questões anuladas, pela inobservância da Lei Distrital 4.949/2012. Inegável que o concurso público, meio de acesso a provimento de cargo público, constitui ato passível de controle pelo Tribunal de Constas”, finalizou.

Assim, o pedido da candidata foi negado pelo Conselho Especial do TJDFT, em decisão por maioria.

PJe2: 0714290-12.2020.8.07.0000

TJDFT

18 de abril de 2021

Condenação de 10 anos atrás não pode impedir posse de servidor, diz TJ-SP

 A discricionariedade da administração deve ser exercida dentro das balizas legais, não se podendo burlar vedação expressamente prevista na norma para considerar um fato extinto em todos os seus efeitos sob a óptica legal, sob fundamento diverso, como “boa conduta”.

O entendimento é do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao anular ato da presidência da Corte que havia negado a posse de um candidato aprovado em concurso público para o cargo de assistente social judiciário por não possuir "boa conduta".

Isso porque o servidor foi demitido do cargo de assistente social pelo município de Guarda-Mor, em Minas Gerais, por conduta desidiosa apurada em processo administrativo disciplinar. Um inquérito policial contra o trabalhador também embasou a decisão de negar sua posse no TJ-SP. Ele impetrou mandado de segurança, que foi concedido pelo Órgão Especial, por maioria de votos. 

Para o relator do acórdão, desembargador Márcio Bartoli, há ilegalidade no ato de recusar a posse do servidor diante do princípio constitucional da presunção da inocência e da regra do artigo 307, parágrafo único, da Lei Estadual 10.261/68, "preceitos de obrigatória observância pela administração em seus atos, inafastáveis sob o aduzido argumento da discricionariedade do administrador".

Bartoli destacou que os fatos apurados em Guarda-Mor ocorreram há mais de dez anos e superaram o prazo para desconsideração previsto na Lei Estadual 10.261/68, cujo objetivo é evitar a perpetuação de punições, "criando-se lapsos depuradores após os quais nem a prévia infração disciplinar, nem a demissão possam interferir na vida funcional do servidor, ou gerar ao candidato a cargo público incompatibilidade com o exercício da função".

Ainda conforme o magistrado, a perpetuação de sanções fere a dignidade da pessoa humana, assegurada pela Constituição Federal e, por isso, o legislador previu prazos para os efeitos sancionatórios, seja na seara penal, seja na esfera administrativa. Assim, Bartoli concluiu pelo direito líquido e certo do autor à desconsideração de seu histórico funcional pretérito.

Ele concedeu a segurança para anular o ato impugnado e determinar a posse do servidor no cargo para o qual foi aprovado. Houve divergência no julgamento. A relatora sorteada, desembargadora Cristina Zucchi, ficou vencida. Para ela, tratando-se de poder discricionário, é inadmissível a interferência do Judiciário no ato decisório da administração pública, salvo se caracterizada ilegalidade ou teratologia.

"A análise do requisito da 'boa conduta' é parte obrigatória da investigação social no concurso público, momento em que a administração reúne informações sobre o candidato, a fim de atestar a sua idoneidade moral para o exercício de cargo público e a compatibilidade do seu perfil com o exercício do cargo pretendido", afirmou a magistrada.

Processo 2213702-97.2020.8.26.0000

17 de abril de 2021

Não é ilegal a terceirização de serviços jurídicos pela Caixa Econômica Federal

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://www.dizerodireito.com.br/2019/12/nao-e-ilegal-terceirizacao-de-servicos.html


A situação concreta foi a seguinte:
O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública contra a Caixa Econômica Federal (empresa pública federal) pedindo que ela seja proibida de terceirizar a sua atividade jurídica, isto é, que seja proibida de contratar escritórios de advocacia para fazer a sua defesa jurídica.
Para o MPF, a defesa jurídica da Caixa Econômica deve ser feita exclusivamente por seu quadro próprio de advogados, admitidos mediante concurso público.

A tese do MPF foi acolhida pelo STJ?
NÃO.

Terceirização
Terceirização é um processo de gestão empresarial, na qual um “terceiro” assume algumas atividades de uma empresa, sem a necessidade de constituição de vínculo trabalhista entre a empresa que terceiriza e
os empregados da empresa que oferece mão-de-obra, como terceirizada. Em outras palavras, transferem-se para terceiros certos serviços, que, originalmente, seriam executados dentro da própria empresa contratante.
“Ocorre a terceirização quando uma empresa, em vez de executar serviços diretamente com seus empregados, contrata outra empresa para que esta os realize, com o seu pessoal sob a sua responsabilidade. O empregado é contratado pela empresa intermediadora (empregadora), mas presta serviços em outro local (empresa tomadora).” (CORREIA, Henrique. Direito do Trabalho para concursos de analista do TRT, TST e MPU. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 360).
Desse modo, terceirizar significa transferir uma ou mais atividades da empresa para que sejam realizados por outra empresa.

Em regra, a CEF é obrigada a fazer concurso público para a contratação de seus empregados?
SIM. Existe uma súmula do TCU sobre o tema:
Súmula 231-TCU: A exigência de concurso público para admissão de pessoal se estende a toda a Administração Indireta, nela compreendidas as Autarquias, as Fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, as Sociedades de Economia Mista, as Empresas Públicas e, ainda, as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, mesmo que visem a objetivos estritamente econômicos, em regime de competitividade com a iniciativa privada.

Vale ressaltar, contudo, que o fato de a admissão de empregado, em seu quadro de pessoal, dever ser feita mediante concurso público, não inviabiliza a contratação, pela CEF, de terceirizados.

Finalidade da CEF
A CEF é uma empresa pública criada para funcionar como instituição financeira. Sua atividade principal, portanto, não é de natureza jurídica.
As atividades jurídicas envolvendo a CEF, embora importantes para a consecução dos seus objetivos, não são consideradas como sua atividade-fim. A atividade-fim da referida empresa é a prestação de serviços bancários.
A CEF é uma instituição financeira que visa o lucro. Assim, ainda que a contratação de seus empregados deva ser feita mediante aprovação em concurso público, por força de norma constitucional, não há como proibir a terceirização, especialmente em épocas nas quais a CEF possui uma demanda bastante elevada, e comumente sazonal, de serviços jurídicos.

Terceirização é necessária para que a CEF possa manter sua competitividade em relação aos demais bancos
A CEF, como empresa pública inserida no cenário econômico, sujeito à concorrência com outros bancos, não pode ser impedida, mesmo observada a necessidade de admitir empregados de seu quadro de pessoal mediante concurso público, de lançar mão, em determinadas situações, dessa ferramenta gerencial, mesmo porque o art. 173, § 1º, II, da CF/88 afirma que a empresa pública que explore atividade econômica sujeita-se ao regime próprio das empresas privadas:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
(...)
II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;

Dentro dos serviços jurídicos que a CEF necessita, certamente haverá aqueles de alta complexidade e que se vinculam a questões estratégicas da instituição, mas também haverá os padronizados e de simples execução, segundo normas e orientações previamente estabelecidas.
Assim, tanto a realização de concurso público para provimento de emprego de advogado, quanto a terceirização, mediante contratação de escritórios de advocacia, são alternativas legais à CEF, e em conformidade com a moralidade administrativa. O que se exige é que essa decisão seja tomada levando-se em consideração o princípio da economicidade, especialmente considerando-se ser a CEF uma empresa pública, que, por definição, visa o lucro e à qual devem ser garantidas condições de manter-se no mercado
concorrencial em que se insere.
Limitar a atividade da advocacia, dentro da Caixa Econômica Federal, somente permitindo que ela atue com profissionais concursados é retirar a capacidade concorrencial da Caixa. 

Recentes novidades legislativas
As conclusões acima foram reforçadas por recentes novidades legislativas que permitiram a terceirização inclusive de atividades-fim das empresas.

Lei nº 13.429/2017
Em março de 2017, foi editada a Lei nº 13.429/2017, com o objetivo de regulamentar o trabalho temporário e a terceirização.
“A Lei nº 13.429/2017 não restringiu os serviços passíveis de terceirização apenas à atividade-meio da empresa, o que levou à interpretação de que havia sido autorizada a terceirização nas atividades-fim das empresas, inclusive pelos debates dos parlamentares que antecederam a votação do projeto. Apesar da ampla possibilidade de terceirização, a legislação era omissa quanto à possibilidade de terceirização da atividade-fim e gerava insegurança jurídica, pois a imprecisão da norma em admitir (ou não) a terceirização em atividade-fim levava à discussão sobre sua permissão ou não no ordenamento jurídico.” (CORREIA, Henrique. Direito do Trabalho para concursos de analista do TRT, TST e MPU. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 360).

Lei nº 13.467/2017
Em julho de 2017, foi editada a Lei nº 13.467/2017, a chamada Reforma Trabalhista, que também tratou sobre alguns pontos da terceirização que ainda precisavam ser esclarecidos.
A Lei nº 13.467/2017 foi expressa ao dizer que a terceirização abrange quaisquer atividades da empresa contratante, inclusive sua atividade principal (atividade-fim).
Desse modo, não há mais qualquer dúvida de que com essa Lei passou a ser permitida a terceirização de atividades-fim da empresa, de forma que a Lei teve como objetivo superar o entendimento jurisprudencial da Súmula 331 do TST.

Em suma:
A Caixa Econômica Federal, embora vinculada como empresa pública ao Estado, executa uma atividade econômica em ambiente de concorrência.
A terceirização pela Caixa Econômica Federal dos serviços jurídicos não se revela ilegal, considerando que esses serviços não estão relacionados com a atividade-fim da empresa.
STJ. 2ª Turma. REsp 1.318.740-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Rel. Acd. Min. Og Fernandes, julgado em 16/10/2018 (Info 659).