Fonte: Dizer o Direito
Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/12/info-1038-stf.pdf
PROCESSO LEGISLATIVO
O Poder Legislativo pode emendar projeto de lei de conversão de medida provisória quando a
emenda estiver associada ao tema e à finalidade original da medida provisória
O Poder Legislativo pode emendar projeto de lei de conversão de medida provisória quando
a emenda estiver associada ao tema e à finalidade original da medida provisória.
É constitucional o art. 6º da Lei 14.131/2021, que simplificou o processo de concessão de
benefício de auxílio por incapacidade temporária.
STF. Plenário. ADI 6928/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 22/11/2021 (Info 1038).
O caso concreto foi o seguinte:
O Congresso Nacional editou a Lei federal nº 14.131/2021, que previu, em seu art. 6º, a possibilidade de
concessão do auxílio por incapacidade temporária (“auxílio-doença”) sem necessidade de perícia médica
presencial. Confira:
Art. 6º Fica o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) autorizado, até 31 de dezembro de 2021,
a conceder o benefício de auxílio por incapacidade temporária de que trata o art. 59 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, mediante apresentação pelo requerente de atestado médico e de
documentos complementares que comprovem a doença informada no atestado como causa da
incapacidade.
§ 1º Os requisitos para a apresentação e a forma de análise do atestado médico e dos documentos
complementares referidos no caput deste artigo serão estabelecidos em ato conjunto da
Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS.
§ 2º O procedimento estabelecido no caput deste artigo será adotado em caráter excepcional e a
duração do benefício por incapacidade temporária dele resultante não terá duração superior a 90
(noventa) dias.
§ 3º O INSS cientificará o requerente, no momento do requerimento, de que o benefício concedido
com base neste artigo não está sujeito a pedido de prorrogação e de que eventual necessidade de
acréscimo ao período inicialmente concedido, ainda que inferior a 90 (noventa) dias, estará sujeita
a novo requerimento.
Vale ressaltar que a Lei nº 14.131/2021 é fruto da conversão da Medida Provisória nº 1.006/2020.
ADI
A Associação Nacional dos Peritos Médicos Federais – ANMP propôs ADI contra esse art. 6º da Lei nº
14.131/2021, argumentando que:
- a MP nº 1.006/2020, em seu texto original, não previa essa regra do art. 6º;
- a MP tratava originalmente apenas sobre aumento da margem de crédito consignado dos titulares de
benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social durante o período da
pandemia de covid-19;
- essa regra do art. 6º foi inserida mediante emenda parlamentar que não tinha relação com o tema
original da MP;
- logo, haveria inconstitucionalidade formal.
Além disso, haveria também inconstitucionalidade material. Isso porque o dispositivo impugnado
substituiu indevidamente a perícia técnica por atestados médicos e outros documentos complementares.
Asseverou, ainda, ter havido inconstitucional aumento de despesa gerado pela norma impugnada.
O STF concordou com o pedido formulado na ADI? Esse art. 6º da Lei nº 14.131/2021 é inconstitucional?
NÃO.
Possibilidade de emenda
O Poder Legislativo pode emendar projeto de lei de conversão de medida provisória quando a emenda
estiver associada ao tema e à finalidade original da medida provisória (pertinência temática).
O poder de emenda é prerrogativa institucional inerente ao exercício do Poder Legislativo e importante
atividade de controle democrático dos atos do Poder Executivo. Além disso, no caso das medidas
provisórias, há previsão expressa no § 12 do art. 62 da CF/88, que admite a possibilidade de alteração do
texto original:
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas
provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
(...)
§ 12. Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta
manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 32/2001)
Vale ressaltar, no entanto, que as emendas parlamentares apresentadas durante a análise de medidas
provisórias devem guardar pertinência temática com a matéria originalmente versada. O objetivo da
análise da pertinência temática é evitar que matérias dissociadas do tema tratado na medida provisória,
com tramitação diferenciada, sejam aprovadas sem o debate democrático pertinente.
O Poder Legislativo pode emendar projeto de lei de conversão de medida provisória quando a emenda
estiver associada ao tema e à finalidade original da medida provisória.
STF. Plenário. ADI 6928/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 22/11/2021 (Info 1038).
Dispositivo não trata sobre matérias de iniciativa reservada do chefe do Executivo
Quanto à alegada inconstitucionalidade formal decorrente do aumento de despesas gerado pela norma
impugnada, no art. 63 da Constituição Federal se proíbe que emenda parlamentar aumente despesa
prevista apenas nos projetos de iniciativa privativa do Presidente da República e sobre organização dos
serviços administrativos da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, dos Tribunais Federais e do
Ministério Público:
Art. 63. Não será admitido aumento da despesa prevista:
I - nos projetos de iniciativa exclusiva do Presidente da República, ressalvado o disposto no art.
166, § 3º e § 4º;
II - nos projetos sobre organização dos serviços administrativos da Câmara dos Deputados, do
Senado Federal, dos Tribunais Federais e do Ministério Público.
No caso analisado, não se trata de tema incluído entre os de iniciativa privativa do Presidente da República,
nos termos do § 1º do art. 61 da CF/88, tampouco de organização administrativa da Câmara dos
Deputados, do Senado Federal, dos Tribunais Federais e do Ministério Público.
É de se anotar que, observados os limites do art. 63 da CF/88 e atendido o disposto no art. 113 do ADCT,
é possível que emenda parlamentar acarrete aumento de despesa pública em projeto de lei.
Ademais, a norma questionada não gerou aumento de despesa pública, por não estender as hipóteses de
auxílio-doença. O que foi alterado, em caráter excepcional e temporário a vigorar até 31/12/2021, foi a
forma de comprovação da incapacidade laboral do segurado do RGPS para a obtenção do auxílio-doença.
Portanto, a norma impugnada não aumentou despesa pública e não colocou em risco o equilíbrio
financeiro e atuarial do sistema previdenciário.
O segurado, temporariamente incapacitado para o trabalho, terá direito ao auxílio-doença independente
de a incapacidade ter sido aferida pela perícia médica presencial ou por atestado médico e documentos
comprobatórios.
Ausência de inconstitucionalidade material
O dispositivo não contraria qualquer das normas constitucionais.
O complexo normativo pelo qual se dispõe sobre a obrigatoriedade de realização de perícias como
instrumento para evitar fraudes ao sistema de seguridade social está previsto em leis e atos normativos
infraconstitucionais.
Eventuais fraudes ocorridas em razão da nova sistemática estabelecida devem ser resolvidas pelos
instrumentos de investigação e jurisdição ordinária.
Além disso, a nova previsão preserva a competência e a autonomia do perito médico federal, que pode
concluir, após análise dos documentos, pelo atendimento dos pressupostos ou não para a concessão do
auxílio por incapacidade temporária.
Portanto, a norma impugnada, excepcional e transitória, concretiza o direito fundamental à previdência
social do segurado incapaz para o trabalho ou para a atividade habitual, contribui para a eficiência na
prestação do serviço público e reduz o impacto da pandemia decorrente da Covid-19 sobre a renda dos
beneficiários do Regime Geral de Previdência Social.
É constitucional o art. 6º da Lei 14.131/2021, que simplificou o processo de concessão de benefício de
auxílio por incapacidade temporária.
STF. Plenário. ADI 6928/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 22/11/2021 (Info 1038).
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente o pedido formulado e,
com isso, reconheceu a constitucionalidade do art. 6º da Lei nº 14.131/2021.