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19 de novembro de 2021

Em regra, a contagem do prazo bienal da ação rescisória somente se inicia com o trânsito em julgado da última decisão proferida no processo, ainda que só se esteja discutindo a inadmissibilidade de um recurso

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-711-stj-2.pdf


AÇÃO RESCISÓRIA Em regra, a contagem do prazo bienal da ação rescisória somente se inicia com o trânsito em julgado da última decisão proferida no processo, ainda que só se esteja discutindo a inadmissibilidade de um recurso 

O termo inicial do prazo para ajuizamento da ação rescisória, quando há insurgência recursal da parte contra a inadmissão de seu recurso, dá-se da última decisão a respeito da controvérsia, salvo comprovada má-fé. STJ. 3ª Turma. REsp 1.887.912-GO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 21/09/2021 (Info 711). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João ajuizou ação de usucapião contra Pedro. O juiz julgou o pedido procedente. O réu interpôs apelação, mas o Tribunal de Justiça manteve a sentença. Ainda inconformado, Pedro interpôs recurso especial contra o acórdão. O Presidente do TJ, contudo, inadmitiu o recurso especial. Essa decisão foi publicada em abril/2017. Pedro não desistiu e interpôs o agravo em recurso especial previsto no art. 1.042 do CPC: 

Art. 1.042. Cabe agravo contra decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal recorrido que inadmitir recurso extraordinário ou recurso especial, salvo quando fundada na aplicação de entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em julgamento de recursos repetitivos. 

No STJ, o Ministro Relator decidiu que o Presidente do TJ agiu corretamente e que o recurso especial, de fato, não deveria ser admitido. Essa decisão foi publicada em maio/2020. Pedro não recorreu contra essa decisão, tendo havido o trânsito em julgado em maio/2020. 

Ação rescisória 

Em junho/2020, Pedro ajuizou, no Tribunal de Justiça, ação rescisória afirmando que a concessão da usucapião, neste caso, violou determinados dispositivos do Código Civil. O Tribunal de Justiça não conheceu da ação afirmando que: 

- o prazo da rescisória é de 2 anos, nos termos do art. 975 do CPC: 

Art. 975. O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo. 

- no caso concreto, deve-se considerar que o trânsito em julgado ocorreu em abril/2017. Isso porque as decisões posteriores não examinaram o mérito e ficaram apenas discutindo a admissibilidade do recurso. 

- logo, entre abril/2017 a junho/2020 já se passaram mais de 2 anos. 

O STJ concorda com essa linha de argumentação desenvolvida pelo TJ? 

NÃO. Enquanto não estiver definitivamente decidida a questão acerca da ocorrência ou não do trânsito em julgado, o prazo decadencial da ação rescisória não se inicia, sob pena de se causar grave insegurança jurídica. Caso contrário, o recorrente deveria ter ajuizado uma ação rescisória “condicional”, juntamente com a interposição do agravo. Assim, caso o Poder Judiciário levasse mais de dois anos para decidir se o recurso especial deveria, ou não, ser admitido, não haveria decadência para o ajuizamento da ação rescisória, pois ela já estaria em tramitação. Esse procedimento, contudo, além de atentar contra a economia processual, não se mostra razoável, causando insegurança jurídica e desnecessária sobrecarga ao Poder Judiciário. Nesse sentido: 

(...) 1. O processo é instrumento de solução de litígios, que deve garantir às partes um desenrolar tranquilo de sua cadeia de atos. A surpresa e a instabilidade não agregam à pacificação social. 2. Estabelecer que o prazo para a ação rescisória teria início antes do último pronunciamento judicial sobre a admissibilidade do recurso interposto geraria situação de inegável instabilidade no desenrolar processual, exigindo da parte o ajuizamento de ação rescisória “condicional”, fundada na eventualidade de uma coisa julgada cuja efetiva ocorrência ainda não estaria definida. 3. O ajuizamento de ação rescisória antes mesmo de finda a discussão sobre a tempestividade de recurso interposto atenta contra a economia processual. 4. A extemporaneidade do recurso não obsta a aplicação da Súmula 401 do STJ (O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial.), salvo na hipótese de má-fé do recorrente. (...) STJ. Corte Especial. EREsp 1352730/AM, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 05/08/2015. 

No julgamento do citado EREsp 1.352.730/AM, estabeleceu-se uma exceção, qual seja, a existência de máfé da parte recorrente, hipótese em que a data do trânsito em julgado não se postergaria. Em outras palavras, caso fique demonstrado que a parte se insurgiu contra a inadmissibilidade de seu recurso sem qualquer fundamento, apenas para postergar o encerramento do feito, em nítida má-fé processual, o entendimento aqui proposto não prevaleceria. 

Em suma: O termo inicial do prazo para ajuizamento da ação rescisória, quando há insurgência recursal da parte contra a inadmissão de seu recurso, dá-se da última decisão a respeito da controvérsia, salvo comprovada má-fé. STJ. 3ª Turma. REsp 1.887.912-GO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 21/09/2021 (Info 711).

18 de outubro de 2021

Em relação a ações rescisórias ajuizadas com base no art. 485, V, do CPC/1973 (art. 966, V, do CPC/2015), o recurso especial poderá ultrapassar os pressupostos da ação e chegar ao exame do seu mérito

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-705-stj.pdf


AÇÃO RESCISÓRIA - Em relação a ações rescisórias ajuizadas com base no art. 485, V, do CPC/1973 (art. 966, V, do CPC/2015), o recurso especial poderá ultrapassar os pressupostos da ação e chegar ao exame do seu mérito 

O recurso especial interposto contra acórdão em ação rescisória pode atacar diretamente os fundamentos do acórdão rescindendo, não precisando limitar-se aos pressupostos de admissibilidade da rescisória. Se o recorrente está alegando que houve violação à literal disposição de lei (violação à norma jurídica), com base no art. 485, V, do CPC/1973 (art. 966, V, do CPC/2015), o mérito do recurso especial se confunde com os próprios fundamentos para a propositura da ação rescisória, autorizando o STJ a examinar também o acórdão rescindendo. Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: V - violar literal disposição de lei; Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: V - violar manifestamente norma jurídica; STJ. Corte Especial. EREsp 1.434.604-PR, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 18/08/2021 (Info 705). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João constava no registro de imóveis como sendo o proprietário da “Fazenda Bom Pasto”. Ocorre que a União e a Funai alegam que essa fazenda está localizada em terras tradicionalmente ocupadas por índios. 

A quem pertencem as terras tradicionalmente ocupadas por índios? 

Pertencem à União (art. 20, XI, da CF/88). No entanto, essas terras destinam-se à posse permanente dos índios, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. Em suma, são bens da União, mas para serem usadas pelos índios. Por isso, alguns autores classificam essas terras como sendo bens públicos de uso especial. 

Ação reivindicatória 

Com base na argumentação acima exposta, a União e a Funai ajuizaram ação reivindicatória contra João. O juiz federal julgou o pedido procedente, reconhecendo que o imóvel integra terras tradicionalmente ocupadas por índios e determinando, por consequência, o seu retorno ao domínio da União. Essa sentença transitou em julgado. 

Ação rescisória 

Algum tempo depois, João ajuizou ação rescisória, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (art. 108, I, “b”, da CF/88), pedindo a rescisão da sentença. O autor alegou que a sentença deveria ser rescindida porque teria violado literal disposição de lei (violado manifestamente norma jurídica): 

CPC/1973 

Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: (...) V - violar literal disposição de lei;

CPC/2015  

Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: (...) V - violar manifestamente norma jurídica; 

O TRF julgou o pedido improcedente, sob o argumento de que não estavam preenchidos os pressupostos de admissibilidade da ação rescisória. Para o TRF, não estavam presentes quaisquer das hipóteses que autorizam a ação rescisória, hipóteses essas previstas nos incisos do art. 485 do CPC/1973 (art. 966 do CPC/2015). 

Recurso especial 

João interpôs recurso especial contra o acórdão do TRF. Ocorre que, no recurso especial, João alegou que a área de seu imóvel nunca foi terra indígena e, por essa razão, não era bem da União e não poderia ser objeto de ação reivindicatória. Desse modo, o recorrente não se limitou aos seus pressupostos de admissibilidade, impugnando, assim, diretamente o mérito do acórdão rescindendo. 

Decisão da 1ª Turma do STJ 

A 1ª Turma do STJ não conheceu do recurso especial interposto por João. Afirmou-se que o recurso especial em sede de ação rescisória deve limitar-se aos pressupostos dessa ação e não atacar o próprio mérito. Em outras palavras, o que a 1ª Turma do STJ disse foi o seguinte: - no recurso especial interposto, João deveria ter discutido apenas os pressupostos do art. 485 do CPC/1973 (art. 966 do CPC/2015); - o recurso especial manejado em sede de ação rescisória deve se limitar aos pressupostos de cabimento da ação, sem adentrar nos fundamentos adotados no acórdão rescindendo; - como João ficou apenas insistindo na tese de mérito, mostra-se incabível o recurso especial. 

Embargos de divergência 

Ainda inconformado, João opôs embargos de divergência alegando que esse entendimento da 1ª Turma está em sentido contrário a precedentes da Corte Especial do STJ. 

A Corte Especial do STJ deu provimento aos embargos de divergência? A 1ª Turma do STJ deve conhecer do recurso especial interposto por João mesmo ele tendo atacado os fundamentos do acórdão rescindendo? SIM. 

Se o recorrente está alegando que houve violação à literal disposição de lei (violação à norma jurídica), com base no art. 485, V, do CPC/1973 (art. 966, V, do CPC/2015), o mérito do recurso especial se confunde com os próprios fundamentos para a propositura da ação rescisória, autorizando o STJ a examinar também o acórdão rescindendo. É de se concluir, portanto, que, em relação a ações rescisórias ajuizadas com base no art. 485, V, do CPC/1973 (art. 966, V, do CPC/2015), o recurso especial poderá ultrapassar os pressupostos da ação e chegar ao exame do seu mérito. 

O recurso especial interposto contra acórdão em ação rescisória pode atacar diretamente os fundamentos do acórdão rescindendo, não precisando limitar-se aos pressupostos de admissibilidade da rescisória. STJ. Corte Especial. EREsp 1.434.604-PR, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 18/08/2021 (Info 705).

9 de outubro de 2021

O termo inicial do prazo para ajuizamento da ação rescisória, quando há insurgência recursal da parte contra a inadmissão de seu recurso, dá-se da última decisão a respeito da controvérsia, salvo comprovada má-fé

Processo

REsp 1.887.912-GO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 21/09/2021, DJe 24/09/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Ação rescisória. Prazo decadencial. Termo inicial. Inadmissão de recurso. Ausência de má-fé processual. Trânsito em julgado inicialmente reconhecido ou última decisão sobre a controvérsia.

 

DESTAQUE

O termo inicial do prazo para ajuizamento da ação rescisória, quando há insurgência recursal da parte contra a inadmissão de seu recurso, dá-se da última decisão a respeito da controvérsia, salvo comprovada má-fé.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Registra-se que enquanto não estiver definitivamente decidida a questão acerca da ocorrência ou não do trânsito em julgado, o prazo decadencial da ação rescisória não se inicia, sob pena de se causar grave insegurança jurídica.

Nessa mesma linha de entendimento, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do EREsp 1.352.730/AM, de relatoria do Ministro Raul Araújo, entendeu que não se pode admitir o início do prazo para a ação rescisória antes do último pronunciamento judicial sobre a admissibilidade do recurso interposto, sob pena de se gerar "situação de inegável instabilidade no desenrolar processual".

Caso contrário, o recorrente deveria ter ajuizado uma ação rescisória "condicional", juntamente com a interposição de agravo de instrumento impugnando a decisão que tornou sem efeito a apelação e reconheceu o trânsito em julgado.

Assim, caso o Poder Judiciário levasse mais de dois anos para decidir se a sua apelação fora ou não anulada pelo acolhimento dos embargos de declaração da parte interessada, como, de fato, ocorreu, não haveria decadência para o ajuizamento da ação rescisória, pois ela já estaria em tramitação.

Esse procedimento, contudo, além de atentar contra a economia processual, não se mostra razoável, causando insegurança jurídica e desnecessária sobrecarga ao Poder Judiciário.

No julgamento do citado EREsp 1.352.730/AM, estabeleceu-se uma exceção, qual seja, a existência de má-fé da parte recorrente, hipótese em que a data do trânsito em julgado não se postergaria.

Em outras palavras, caso fique demonstrado que a parte se insurgiu contra a inadmissibilidade de seu recurso sem qualquer fundamento, apenas para postergar o encerramento do feito, em nítida má-fé processual, o entendimento aqui proposto não prevaleceria.


24 de agosto de 2021

O recurso especial interposto contra acórdão em ação rescisória pode atacar diretamente os fundamentos do acórdão rescindendo, não precisando limitar-se aos pressupostos de admissibilidade da rescisória

Processo

EREsp 1.434.604-PR, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 18/08/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Recurso especial em sede de ação rescisória. Art. 485, V, do CPC/1973. Impugnação dos fundamentos do acórdão rescindendo. Possibilidade.

DESTAQUE

O recurso especial interposto contra acórdão em ação rescisória pode atacar diretamente os fundamentos do acórdão rescindendo, não precisando limitar-se aos pressupostos de admissibilidade da rescisória.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Inicialmente, anota-se que no acórdão embargado concluiu-se pelo não cabimento do recurso especial interposto em sede de ação rescisória, com base no art. 485, V, do Código de Processo Civil de 1973, porque não se limitara aos seus pressupostos de admissibilidade, impugnando, assim, diretamente o mérito do acórdão rescindendo.

O aresto paradigma da Corte Especial, diversamente do aresto embargado, considerou que é viável recurso especial interposto contra acórdão proferido em ação rescisória, baseada no art. 485, V, do CPC/1973, que se insurge contra os fundamentos do acórdão rescindendo.

O entendimento do acórdão paradigma mostra-se correto, especialmente quando relacionado ao disposto no art. 485, V, do Código de Processo Civil de 1973 (atualmente art. 966, V, do CPC de 2015), pois se há alegação de violação a literal disposição de lei no acórdão recorrido, o mérito do recurso especial se confunde com os próprios fundamentos para a propositura da ação rescisória, autorizando o STJ a examinar também o acórdão rescindendo.

É de se concluir, portanto, que, em relação a ações rescisórias ajuizadas com base no art. 485, V, do CPC de 1973, o recurso especial poderá ultrapassar os pressupostos da ação e chegar ao exame do seu mérito.


14 de agosto de 2021

Ação rescisória. Pacificação da jurisprudência em sentido contrário e posterior. Súmula 343/STF: Aplicabilidade?

 

Direito processual civil – Ação rescisória

Ação rescisória. Pacificação da jurisprudência em sentido contrário e posterior. Súmula 343/STF: Aplicabilidade?

A ministra Isabel Gallotti lembrou que "'a pacificação da jurisprudência desta corte em sentido contrário e posteriormente ao acórdão rescindendo não afasta a aplicação do enunciado 343 da Súmula do STF'. A data relevante para se aferir se o acórdão rescindendo é passível de rescisão, em face do óbice da Súmula 343/STF, é a data em que foi ele prolatado e não a do respectivo trânsito em julgado, que pode ter sido bastante posterior, em função de recurso julgado insusceptível de conhecimento". O raciocínio é da Quarta Turma, no julgamento do AgInt no AREsp 1.699.338.

Terceira Turma rescinde acórdão que trocou correção de danos materiais pelo IGP-M por taxa de juros do cheque especial

 

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu recurso especial de um banco e rescindiu acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que, ao apontar que uma condenação por danos materiais deveria ser calculada como determinado na sentença, estabeleceu que a correção dos valores deveria ocorrer com base na taxa de juros do cheque especial.

Entretanto, a sentença havia fixado que essa correção deveria ser realizada com base no Índice Geral de Preços Mercado (IGP-M), e não conforme a taxa de juros do cheque especial.

Na fase de execução de sentença – decorrente de condenação por danos morais e materiais –, o credor informou que o banco lhe devia mais de R$ 1,9 milhão, mas a instituição financeira sinalizou excesso de execução e alegou que o valor real seria de aproximadamente R$ 60 mil.

O juízo de primeiro grau julgou procedente a impugnação e determinou que os danos materiais fossem corrigidos de acordo com o IGP-M, mas o TJRS, apesar de determinar o cálculo conforme a sentença, acabou concluindo que a correção dos valores deveria ser realizada com base na taxa de juros do cheque especial. Posteriormente, por fundamentos semelhantes, o tribunal negou a ação rescisória do banco.

Relator e revisor

O ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do recurso especial, destacou que, no julgamento da apelação, o desembargador revisor divergiu do relator apenas em relação ao dano moral – não havendo, em sua manifestação, qualquer menção aos danos materiais.

Assim, em relação aos danos materiais, o ministro afirmou que prevaleceu o voto do desembargador relator – que, nos termos da sentença, fixou a correção monetária pelo IGP-M – e, no tocante aos danos morais, o voto divergente do revisor (que apenas reduziu o valor da condenação por danos morais).

"Dessa forma, sendo nítida a violação ao artigo 485, inciso IV, do CPC/1973 (artigo 966, inciso IV, do CPC/2015), considerando a ofensa à coisa julgada, impõe-se o provimento do recurso especial para reformar o acórdão recorrido", concluiu o magistrado ao rescindir o acórdão do TJRS e restabelecer a decisão de primeiro grau que fixou a correção dos danos materiais com base no IGP-M. 

Leia o acórdão no REsp 1.655.856.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1655856

8 de maio de 2021

RECURSO ESPECIAL Nº 1.663.326 - RN: DA AÇÃO RESCISÓRIA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.663.326 - RN (2017/0067009-6) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 


DA AÇÃO RESCISÓRIA 

O principal efeito do trânsito em julgado material das decisões judiciais de mérito é imutabilidade da relação jurídica por ela decidida, servindo, pois, ao propósito de evitar a perpetuidade dos litígios, pacificando as pretensões resistidas, e de impedir a manutenção da insegurança jurídica acerca de matéria submetida ao crivo jurisdicional. No entanto, diante da possibilidade de que decisões judiciais de mérito que contenham vícios graves sejam revestidas pela autoridade da coisa julgada, o sistema processual previu o remédio da ação rescisória, que visa reparar essas sérias imperfeições, superando a imutabilidade de uma determinada decisão judicial de mérito. Contudo, tendo em vista a prevalência do princípio segurança jurídica, a ação rescisória somente é cabível nas hipóteses taxativamente previstas em lei e de acordo com a expressa manifestação da parte prejudicada. Realmente, conforme o sólido entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, a correção de vícios por meio da ação rescisória é medida excepcional, “cabível nos limites das hipóteses taxativas de rescindibilidade previstas no art. 485 do CPC/73 [...], em razão da proteção constitucional à coisa julgada e do princípio da segurança jurídica” (AgInt na AR 4.821/RN, Segunda Seção, DJe 18/03/2019, sem destaque no original). 

1.1. DO EXAURIMENTO DE INSTÂNCIA, DA PRECLUSÃO E A AÇÃO RESCISÓRIA (ART. 245 DO CPC/73; 278 DO CPC/15) 

Como se trata de via processual própria para a desconstituição da coisa julgada, que corresponde à preclusão máxima do sistema processual, o exaurimento de instância no processo rescindendo não é um dos pressupostos para a ação rescisória. Assim, o fato de, no processo rescindendo, não ter sido interposto algum recurso eventualmente cabível, ou de o ter sido sem a invocação de determinada tese de defesa, não impede o exame de mérito da rescisória, pois o essencial para tanto é que a decisão rescindenda tenha incidido em alguma das hipóteses de rescindibilidade previstas no art. 485 do CPC/73 – vigente à época do trânsito em julgado. Realmente, o entendimento da e. Segunda Seção é de que “a preclusão não é obstáculo ao cabimento da ação rescisória”, de modo que “o fato de não ter sido interposto algum recurso eventualmente cabível, ou tê-lo sido sem a invocação de determinado dispositivo legal, não impede o ajuizamento de ação rescisória”; portanto, “não se exige exaurimento de instância como pressuposto para a ação rescisória” (AgRg na AR 4.459/DF, Segunda Seção, DJe 01/02/2016, sem destaque no original). 

Dessa forma, ainda que, na hipótese concreta, a requerente não tenha interposto apelação da sentença rescindenda – que, julgou antecipadamente a lide e indeferiu a produção de prova por ela requerida –, essa circunstância, por si mesma, não representa óbice ao cabimento da ação rescisória. Assim, o recurso especial não comporta provimento no ponto, devendo ser examinado, na sequência, a fim de se apurar a alegada violação ao art. 485, V, do CPC/73, se houve a efetiva demonstração de violação literal a dispositivo legal, exigida pelo referido dispositivo. 

1.2. CABIMENTO DA RESCISÓRIA POR VIOLAÇÃO LITERAL DA LEI 

Apesar de o exaurimento de instância não ser pressuposto do ajuizamento da ação rescisória, o respeito à coisa julgada e à segurança jurídica demanda que, na ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC/73 (hoje, art. 966, V, do CPC/15), se demonstre a violação frontal, manifesta e literal à lei, a qual deve ser flagrante, a ponto de poder ser considerada teratológica. A ação rescisória não é, de fato, admitida como sucedâneo recursal, não sendo permitido o ajuizamento da ação rescisória com a simples intenção de rediscutir o acerto ou a correção do julgamento. 

Com efeito, a jurisprudência desta e. Terceira Turma pontua que “o cabimento da ação rescisória com suporte no art. 485, V, do CPC/73, pressupõe a demonstração clara e inequívoca de que a decisão de mérito impugnada tivesse contrariado a literalidade do dispositivo legal suscitado, atribuindo-lhe interpretação jurídica absurda, teratológica ou insustentável, sob pena de se perpetuar a discussão sobre matéria decidida e desrespeitar a segurança jurídica” (REsp 1750556/GO, Terceira Turma, DJe 11/10/2019). 

1.3. VINCULAÇÃO AOS PEDIDOS E AOS DISPOSITIVOS TIDOS POR LITERALMENTE VIOLADOS 

Segundo a doutrina, a indicação de violação literal de disposição de lei é ônus do requerente, haja vista constituir a causa de pedir da ação rescisória, vinculando, assim, o exercício da jurisdição pelo órgão competente para sua apreciação. 

De fato, conforme leciona BARBOSA MOREIRA, “cada suposta violação constitui uma causa petendi”, razão pela qual “o autor precisa indicar, na inicial, a norma a seu ver infringida”, logo, “ao órgão julgador não é lícito acolher o pedido senão com base em alguma(s) das alegadas” violações, pois, “se nenhuma delas ocorreu, terá de julgar o pedido improcedente, ainda que verifique a transgressão de norma não indicada pelo autor” (Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. V, 15ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2009, pp. 132-133, sem destaque no original). 

Na mesma linha, FLAVIO YARSHELL pontua que “não compete ao tribunal, a pretexto da iniciativa do autor, reexaminar toda a decisão rescindenda, para verificar se nela haveria outras violações a literal disposição de lei não alegadas pelo demandante, nem mesmo ao argumento de se tratar de matéria da ordem pública” (Ação rescisória: juízos rescindente e rescisório, São Paulo: Malheiros, 2005, p. 151, sem destaque no original). 

Dessa forma, na ação rescisória do art. 485, V, do CPC/73, o juízo rescisdente do Tribunal se encontra vinculado aos dispositivos de lei apontados pelo autor como literalmente violados, não podendo haver exame de matéria estranha à apontada na inicial, mesmo que o tema possua a natureza de questão de ordem pública, sob pena de transformar a ação rescisória em mero sucedâneo recursal. 

1.4. DA VIOLAÇÃO LITERAL À LEI E A DECISÃO SOBRE A PRODUÇÃO DE PROVAS 

Como visto, para que a via processual da ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC/73 não se transforme em espécie de sucedâneo recursal, a rediscussão da justiça da decisão fustigada deve se ater aos limites do absurdo e da teratologia na interpretação do texto legal, o que, em regra, também não ocorre quando for necessário reexaminar os critérios fáticos envolvidos na aplicação da norma jurídica. 

Em relação aos limites da rescindibilidade da rescisória pautada na literal violação de disposição de lei, a doutrina pontua que, 

“se se tratar de ofensa à lei [...], trata-se de demonstrar a adoção de solução normativa em si mesma equivocada, ou demonstrar que a solução normativa pela qual se optou é inadequada ao quadro fático constante dos autos”, porquanto “a ação rescisória, medida excepcional que é, não se pode transformar numa ação de revisão, pura e simplesmente, do que tenha sido decidido no processo de onde emanou a decisão rescindenda, como se de uma apelação se tratasse” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recurso Especial, Recurso extraordinário e ação rescisória. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, pp. 513-514, sem destaque no original). 

Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência desta Terceira Turma, que afirma que “a viabilidade da ação rescisória por ofensa de literal disposição de lei pressupõe violação frontal e direta da literalidade da norma jurídica, sendo inviável, nesta seara, a reapreciação das provas produzidas o u a análise acerca da correção da interpretação dessas provas pelo acórdão rescindendo” (AgInt no AREsp 569.690/SP, Terceira Turma, DJe 25/11/2016). 

A e. Primeira Seção, examinando hipótese de indeferimento do pedido de produção de provas, adota posicionamento equivalente, ao asseverar que “as afirmações de que a prova pericial requerida pelo autor deveria obrigatoriamente ser produzida [...] não se relaciona[...] a uma suposta transgressão ao Direito em tese, mas sim diz[...] respeito ao inconformismo do autor com o juízo concreto de adequação dos fatos às normas, circunstância essa que confere à pretensão deduzida caráter de indevido sucedâneo recursal” (AR 5.015/SP, Primeira Seção, DJe 10/11/2017, sem destaque no original). 

Assim, em conclusão, não há violação literal de disposição legal quando o exame da tese da rescisória demandar a reanálise do contexto fático envolvido na interpretação do texto da lei, sendo esta a hipótese da apreciação da adequação da dispensa fundamentada da produção de prova requerida pela parte com consequente julgamento antecipado da lide. 

1.5. DO CERCEAMENTO DE DEFESA PELO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE 

À luz dos princípios da livre apreciação da prova e do livre convencimento motivado, o Juiz é o destinatário final das provas, a quem cabe avaliar sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em consonância com o disposto na parte final do art. 130 do CPC/73 (atual art. 370, caput e parágrafo único, do CPC/15). Por essa razão, se, a despeito de um anterior deferimento do pedido de produção de provas, houver o julgamento antecipado da lide, em virtude de motivada declaração de inutilidade da produção probatória requerida, não se configurará cerceamento de defesa. Essa é a orientação prevalente nas Turmas de Direito Privado desta Corte, que consignam que “não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide, devidamente fundamentado, sem a produção das provas pretendidas pela parte, uma vez que cabe ao magistrado dirigir a instrução e deferir a produção probatória que considerar necessária à formação do seu convencimento” (REsp 1810435/SP, Terceira Turma, DJe 28/11/2019, sem destaque no original). 

No mesmo sentido: AgInt no AREsp 1051746/SP, Quarta Turma, DJe 15/03/2018.

AÇÃO RESCISÓRIA. EXCEPCIONALIDADE. HIPÓTESES. TAXATIVIDADE. EXAURIMENTO DE INSTÂNCIA. PRESCINDIBILIDADE. ART. 485, V, DO CPC/73. LITERAL VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO LEGAL. INDICAÇÃO DA NORMA VIOLADA. ÔNUS DO AUTOR. CAUSA DE PEDIR. TRIBUNAL. VINCULAÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.663.326 - RN (2017/0067009-6) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. EXCEPCIONALIDADE. HIPÓTESES. TAXATIVIDADE. EXAURIMENTO DE INSTÂNCIA. PRESCINDIBILIDADE. ART. 485, V, DO CPC/73. LITERAL VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO LEGAL. INDICAÇÃO DA NORMA VIOLADA. ÔNUS DO AUTOR. CAUSA DE PEDIR. TRIBUNAL. VINCULAÇÃO. JULGAMENTO ANTECIPADO. PRODUÇÃO DE PROVA. INDEFERIMENTO MOTIVADO. REAPRECIAÇÃO. INVIABILIDADE. JUÍZO RESCINDENTE. LIMITES. EXTRAPOLAÇÃO. SUCEDÂNEO RECURSAL. CARACTERIZAÇÃO. 

1. Ação rescisória, pautada no art. 485, V, do CPC/ 73, por meio da qual, por alegada violação literal dos arts. 332, 382 e 397 do CPC/73, se pretende desconstituir sentença que julgou parcialmente procedente ação adjudicatória de imóvel, objeto de contrato de compra e venda. 

2. Recurso especial interposto em: 10/11/2016; conclusos ao gabinete em: 20/12/2017; aplicação do CPC/15. 

3. A correção de vícios por meio da ação rescisória é medida excepcional, cabível nos limites das hipóteses taxativas de rescindibilidade previstas no art. 485 do CPC/73, em homenagem à proteção constitucional à coisa julgada e ao princípio da segurança jurídica. Precedente. 

4. Como se trata de via processual própria para a desconstituição da coisa julgada, que corresponde à preclusão máxima do sistema processual, o exaurimento de instância no processo rescindendo não é um dos pressupostos para a ação rescisória, tampouco a preclusão consumativa é obstáculo ao seu processamento. Precedente. 

5. Ainda que, na hipótese concreta, a requerente não tenha interposto apelação da sentença rescindenda – que, julgou antecipadamente a lide e indeferiu a produção de prova por ela requerida –, essa circunstância, por si mesma, não representa óbice ao cabimento da ação rescisória. 

6. A rescisória fundada no art. 485, V, do CPC/73, pressupõe a demonstração clara e inequívoca de que a decisão de mérito impugnada contrariou a literalidade do dispositivo legal suscitado, atribuindo-lhe interpretação jurídica absurda, teratológica ou insustentável, não alcançando a reapreciação de provas ou a análise da correção da interpretação de matéria probatória. 

7. A indicação do dispositivo de lei violado é ônus do requerente, haja vista constituir a causa de pedir da ação rescisória, vinculando, assim, o exercício da jurisdição pelo órgão competente para sua apreciação. 

8. Não é possível ao Tribunal, a pretexto da iniciativa do autor, reexaminar toda a decisão rescindenda, para verificar se nela haveria outras violações à lei não alegadas pelo demandante, mesmo que se trate de questão de ordem pública. 

9. O juiz é o destinatário final das provas, a quem cabe avaliar sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento fundamentado das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em juízo cuja revisão demanda a reapreciação do conjunto fático dos autos. Precedentes. 

10. Na hipótese dos autos, o juízo rescindente promovido pelo Tribunal de origem ultrapassou os limites das causas de pedir deduzidas pelo autor na presente ação rescisória, além de não ter observado que o indeferimento da produção probatória e o julgamento antecipado da lide foi devidamente fundamentado. 

11. O acolhimento da pretensão de desconstituição da sentença transitada em julgado acarretou, portanto, a utilização da ação rescisória como sucedâneo recursal. 

12. Recurso especial provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 11 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento)

AÇÃO RESCISÓRIA. ACÓRDÃO IMPUGNADO. RENÚNCIA AO PRAZO RECURSAL. EFEITOS IMEDIATOS. TRÂNSITO EM JULGADO. CÔMPUTO. CIÊNCIA DA PARTE EX ADVERSA.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.344.716 - RS (2012/0196144-8) 

RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA 

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. ACÓRDÃO IMPUGNADO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. RENÚNCIA AO PRAZO RECURSAL. EFEITOS IMEDIATOS. TRÂNSITO EM JULGADO. CÔMPUTO. CIÊNCIA DA PARTE EX ADVERSA. DECADÊNCIA. OCORRÊNCIA. 

1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2). 

2. O Tribunal de origem, em autos de ação rescisória proposta pela Fazenda Nacional, rejeitou prejudicial de decadência e, quanto ao mérito, julgou parcialmente procedente o pedido, a fim de desconstituir em parte o acórdão rescindendo, proferido em embargos à execução, para "excluir a correção pelo IGP-M nos meses de julho e agosto de 1994, por ofensa à coisa julgada", reconhecendo, outrossim, a inexistência de ofensa à coisa julgada pela inclusão da Taxa Selic nos cálculos, não obstante o título judicial tenha expressamente condenado à restituição de valores pagos indevidamente a título de Finsocial, mediante incidência de correção monetária, a partir do recolhimento indevido, e juros de mora de 1% (um por cento), a contar do trânsito em julgado. 

3. Inexiste violação dos arts. 165, 458 e 535 do CPC/1973 quando o Tribunal de origem aprecia fundamentadamente a controvérsia, apontando as razões de seu convencimento, ainda que de forma contrária aos interesses da parte, como constatado na hipótese. 

4. Dispõe a Súmula 401 do STJ: “O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial”. 

5. "É firme o entendimento no âmbito do STJ no sentido de que a decadência do direito de propor a ação rescisória se comprova pelo trânsito em julgado da última decisão proferida no processo, aferido pelo transcurso do prazo recursal e não unicamente pela certidão de trânsito em julgado, a qual apenas certifica que a decisão transitou em julgado" (AR 4.665/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/04/2016, DJe 19/05/2016) 

6. A desistência do recurso ou a renúncia ao prazo recursal constitui ato unilateral de vontade do recorrente que independe da aquiescência da parte contrária e produz efeitos imediatos, ensejando o trânsito em julgado, se for o caso, à luz dos arts. 158, caput, 501 e 502 do CPC/1973. 

7. Não obstante os efeitos imediatos preconizados na lei processual civil ao pedido de renúncia, não havendo homologação judicial, o princípio do contraditório impede que o trânsito em julgado seja reconhecido antes da ciência da parte ex adversa, pois não se pode permitir a abertura de um prazo, no caso, decadencial de 2 (dois) anos, de que cuida o art. 495 do CPC/1973, antes que ocorra a indispensável intimação da parte interessada do fato processual que lhe dá origem. 

8. Hipótese em que deve ser contado o prazo decadencial da data da primeira intimação da Fazenda Nacional, após o pedido de renúncia ao prazo recursal e ao direito de recorrer, ocorrida em 07/03/2006. 

9. Considerando que foi proposta a ação rescisória em 18/03/2008, a parte autora decaiu do direito, porquanto inobservado o prazo bienal previsto no art. 495 do CPC/1973. 

10. Recurso especial do Banco Santander Brasil S/A e Outros conhecido e provido. Recurso especial da Fazenda Nacional prejudicado. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo o julgamento, por unanimidade, conhecer do recurso especial do Banco Santander Brasil S/A e outros e dar-lhe provimento, julgando prejudicado o da Fazenda Nacional, nos termos do voto-vista do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Regina Helena Costa votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 05 de maio de 2020 (Data do julgamento). 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO GURGEL DE FARIA (Relator): Trata-se de recursos especiais interpostos pelo BANCO SANTANDER BRASIL S.A. e OUTROS e pela FAZENDA NACIONAL, ambos com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região assim ementado (e-STJ fls. 1.038/1.039): 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL DO PRAZO. ÚLTIMA DECISÃO PROFERIDA NA CAUSA. OFENSA À COISA JULGADA. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. LEI NOVA. TAXA SELIC. JUROS DE MORA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. MATÉRIA NÃO DECIDIDA NO PROCESSO DE CONHECIMENTO. 1. A contagem do prazo para a propositura da ação rescisória começa a partir do momento em que não couber qualquer recurso contra a decisão rescindenda, de acordo com a interpretação conjunta dos arts. 467 e 495 do CPC. A data em que transitou em julgado a última decisão proferida na causa demarca o início do prazo decadencial de dois anos. Entendimento apoiado na Súmula n° 401 do STJ. 2. Não há razoabilidade na interpretação do art 495 do CPC que preconiza o cômputo em separado dos prazos, nas situações em que há recurso parcial ou recurso de ambas as partes, para aferir o trânsito em julgado. O prazo para a propositura da ação rescisória é uno, valendo para ambas as partes. 3. O nosso ordenamento jurídico admite, excepcionalmente, a desconstituição da coisa julgada, quando houver coisa julgada material em processo com as mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido, relativamente ao dispositivo da decisão de mérito. Proíbe-se novo julgamento em razão do efeito negativo da coisa julgada material, que impede que a questão principal já definitivamente decidida seja novamente julgada como questão principal em outro processo. 4. A controvérsia envolve o conteúdo e os limites objetivos da coisa julgada, que tornam obrigatória a observância do que foi decidido no processo de conhecimento, quando for liquidado e executado o título judicial. Os cálculos de liquidação apresentados pela parte credora não podem extrapolar os estritos termos e o correto alcance da sentença exequenda. 5. A Lei n° 9.250/1995, que determina a aplicação de juros equivalentes à taxa SELIC na restituição e na compensação de tributos pagos indevidamente, é superveniente à sentença. Por essa razão, não poderia o provimento judicial determinar a incidência da taxa SELIC. Mesmo que os recursos interpostos pelas partes sejam posteriores à Lei n° 9.250/1995, não há falar em ofensa à coisa julgada, uma vez que a questão não foi enfrentada no acórdão. Somente haveria ofensa se a taxa SELIC tivesse sido expressamente excluída e a parte interessada não houvesse se insurgido oportunamente. 6. A controvérsia a respeito da taxa SELIC surgiu quando as autoras postularam a execução provisória da sentença, momento em que sequer a decisão havia transitado em julgado. Por conseguinte, não se verifica a preclusão a impedir o cômputo desse índice. 7. É descabido pretender limitar o cômputo da taxa SELIC a partir do trânsito em julgado da sentença. A legislação posterior introduziu novo regramento sobre os juros devidos na restituição de tributos pagos indevidamente, derrogando tacitamente a regra que previa juros a partir do trânsito em julgado (art. 167, § único, do CTN), norma materialmente ordinária. 8. A solução da controvérsia é semelhante, no tocante aos expurgos inflacionários ocorridos nos meses de julho e agosto de 1994. Evidentemente que, inexistindo debate sobre a matéria e, portanto, decisão a respeito, o conteúdo e os limites da coisa julgada não a abrangem. 9. Quanto o autor apresentar a conta de liquidação de sentença, deve considerar todos os índices de correção monetária que entender corretos, sob pena de preclusão. Sobrevindo decisão sobre os cálculos, advém a qualidade de coisa julgada da sentença, abrangendo o que for decidido sobre os expurgos inflacionários. 

Os embargos de declaração opostos pelo Banco Santander Brasil S.A., pela Fazenda Nacional e pelo Ministério Público Federal foram acolhidos para modificar o acórdão embargado "quanto à distribuição dos honorários advocatícios, que devem ser divididos em partes iguais, permitindo-se a mútua compensação" (e-STJ fl. 1.100). 

Os segundos aclaratórios do Banco Santander Brasil S.A. foram acolhidos, sem atribuição de efeitos infringentes (e-STJ fls. 1.128/1.135). 

Em relação à parte não unânime do acórdão que julgou parcialmente procedente a ação rescisória foram opostos embargos infringentes, os quais foram rejeitados nos termos da seguinte ementa (e-STJ fl. 1.214): 

EMBARGOS INFRINGENTES. EM AÇÃO RESCISÓRIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. COISA JULGADA. VIOLAÇÃO. CRITÉRIO. PREVISÃO OU NÃO NA SENTENÇA. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça quanto à aplicação da correção monetária na fase de execução de sentença, distingue as hipóteses em que a sentença do processo de conhecimento, transitada em julgado, indicou o critério de correção monetária a ser utilizado, daqueles casos em que não houve tal previsão. 2. É firme o entendimento do STJ no sentido da possibilidade de inclusão dos expurgos, na fase de execução, quando na sentença não foram estabelecidos os índices de correção monetária a serem utilizados, mesmo que não discutidos no processo de conhecimento. 3. Na hipótese, a sentença exequenda adotou expressamente os índices de correção monetária a serem aplicados para calcular o valor da execução, descabendo a incidência, na fase de execução, de índice diverso daqueles, sob pena de violação da coisa julgada. 

O Banco Santander Brasil S.A. opôs embargos de declaração, os quais foram acolhidos em parte "apenas para fins de prequestionamento" (e-STJ fl. 1.310). 

Em suas razões de recurso especial, o Banco Santander Brasil S.A. e Outros alegam, de início, que houve ofensa ao arts. 165, 458 e 535 do CPC/1973 pelo acórdão recorrido, por entender que não houve enfrentamento explícito dos argumentos deduzidos, em especial ao disposto nos arts. 186, 499, 501, 502 e 503 do CPC/1973, assim como ao contido no art. 5º, caput e incisos XXII, XXXVI e LIV. 

Sustentam que, ao não reconhecer a decadência do direito de propor a presente ação rescisória, o acórdão recorrido contrariou o disposto nos arts. 2º, 128, 158, 186, 460, 467 a 474, 485, 495, 499, 501, 502 e 503 do CPC/1973. 

Seguem afirmando que, ao julgar parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na ação rescisória, para afastar a observância do IGP-M nos meses de julho e agosto de 1994 nos cálculos apresentados para fins de cumprimento da sentença, incorreu em ofensa à coisa julgada, tendo o acórdão recorrido violado o disposto nos arts. 467, 468, 471, 472 e 474 do CPC/1973 (e-STJ fls. 1.313/1.355). 

A FAZENDA NACIONAL, em suas razões de recurso especial, aduz contrariedade ao art. 535, II, do CPC/1973, ao argumento de que o acórdão recorrido "omitiu-se em relação ao disposto nos artigos 467, 473, 474, do Código de Processo Civil, mesmo instado a tanto pelos embargos de declaração (fls. 919/923), eis que a análise dos pontos suscitados é fundamental ao deslinde da controvérsia" (e-STJ fl. 1.286). 

Assevera que houve violação do art. 485, IV, do CPC/1973, por entender que houve ofensa à coisa julgada pelo acórdão rescindendo, proferido em sede de embargos à execução, pois o título judicial exequendo estabelecera correção monetária sem IGPM e incidência de juros de mora "apenas após o trânsito em julgado, não prevendo a aplicação da SELIC, ao contrário, embora proferida após a entrada em vigor de tal taxa de juros e correção monetária" (e-STJ fl. 1.288). 

Segue afirmando (e-STJ fls. 1.288/1.289): 

Assim, ao contrário do que depois se veio a decidir na r. sentença que rejeitou os embargos à execução (DOC n° 06), bem como na que decidiu os embargos de declaração em seguida opostos (DOC n° 08), não cabia a aplicação, ao caso, quer do IGPM, quer de juros pela taxa SELIC, porque a determinação que havia e que acabou transitando em julgado era em sentido diverso - isto é, pela aplicação de correção monetária com índices expressamente previstos para todo o período (e sem referência ao IGPM) e de juros pela taxa de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado da demanda. 

Em suas contrarrazões, a Fazenda Nacional aduz, de início, que a "diferença entre o cálculo apresentado pelos autores e o cálculo da União importou em R$ 39.951.053,91, em valores atualizados até junho de 1999" (e-STJ fl. 1.409). Assevera que o recurso especial encontra óbice nas Súmulas 7 e 83 do STJ. Acrescenta que a ação rescisória foi proposta no prazo decadencial e que não cabe a inclusão de IGP-M nos cálculos apresentados, por ofensa à coisa julgada (e-STJ fls. 1.406/1.419). 

O Banco Santander Brasil S.A. e Outros alegam ser inadmissível o recurso especial quanto à suposta violação do art. 535 do CPC/1973, por ser deficiente de fundamentação. Defendem a inexistência de ofensa à coisa julgada pelo acórdão recorrido, ao reconhecer a incidência da taxa Selic em sede execução, de modo que não haveria contrariedade aos dispositivos apontados pela Fazenda Nacional (e-STJ fls. 1.421/1.450). 

Os recursos especiais foram admitidos (e-STJ fl. 1.453/1.456). 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO GURGEL DE FARIA (Relator): Nos termos do que decidido pelo Plenário do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Enunciado Administrativo 2). 

Feita essa anotação, o Tribunal de origem, em autos de ação rescisória proposta pela Fazenda Nacional, rejeitou prejudicial de decadência e, quanto ao mérito, julgou parcialmente procedente o pedido, a fim de desconstituir em parte o acórdão rescindendo, proferido em embargos à execução, para "excluir a correção pelo IGPM nos meses de julho e agosto de 1994, por ofensa à coisa julgada" (e-STJ fl. 1.035). Outrossim, reconheceu a inexistência de ofensa à coisa julgada pela inclusão da Taxa Selic nos cálculos, não obstante o título judicial tenha expressamente condenado à restituição de valores pagos indevidamente a título de Finsocial, mediante incidência de correção monetária, a partir do recolhimento indevido, e juros de mora de 1% (um por cento), a contar do trânsito em julgado. 

Cabe registrar que os autos informam que, no curso do processo de conhecimento, os contribuintes recorrentes propuseram execução provisória da sentença, incluindo IGP-M e taxa Selic. 

Do recurso especial do Banco Santander Brasil S.A. e Outros 

Inicialmente, quanto à apontada ofensa aos arts. 165, 458 e 535 do CPC/1973, não se vislumbra nenhum equívoco ou deficiência na fundamentação contida no acórdão recorrido, sendo possível observar que o Tribunal de origem apreciou integralmente a controvérsia, apontando as razões de seu convencimento, não se podendo confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. 

Em seguida, sustenta a parte recorrente que a ação rescisória foi proposta quando já superado o prazo de 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão, de acordo com o art. 495 do CPC/1973, vigente à época. Argumenta que deve ser considerada não a data da certificação do trânsito em julgado, mas a sua efetiva ocorrência, que, no caso, em última análise, corresponderia à data em que formulara desistência do último recurso interposto nos autos, em 15/12/2005, "antes mesmo da publicação do v. acórdão que solveu o Agravo Regimental por si interposto no âmbito do STJ, dando-se por cientes do resultado do respectivo julgamento e dizendo-se com ele de acordo (CPC, art. 503)" (e-STJ fl. 1.336). 

No caso, sobre o tema, assim decidiu o Tribunal de origem, conforme atesta o seguinte excerto do voto condutor do julgado (e-STJ fls. 1.097/1.099): 

O STJ, em 17/10/2005, negou seguimento aos recursos especiais opostos por ambas as partes (fls. 752/754). Somente os embargantes interpuseram agravo regimental. A 1a Turma do STJ negou provimento ao recurso, em 06/12/2005 (fl. 769). Os embargantes, em 15/12/2005, renunciaram ao prazo recursal e ao direito de recorrer do acórdão (fl. 770). Em 06/02/2006, o relator proferiu despacho determinando a certificação do trânsito em julgado e a remessa dos autos ao tribunal de origem (fl. 772). Embora manifestada a renúncia, o acórdão foi publicado no Diário da Justiça da União em 06/03/2006 (fl. 778). Em 07/03/2006, os embargantes ratificaram a renúncia (fl. 779). Os autos foram conclusos ao relator, que os devolveu sem despacho. A Coordenadoria da 1ª Turma procedeu à intimação da Fazenda Nacional por mandado, cujo arquivamento ocorreu em 07/03/2006. A certidão do trânsito em julgado do acórdão foi exarada em 23/03/2006 (fl. 781). Esta ação rescisória foi ajuizada em 18/03/2008. O art. 158 do CPC determina que os atos das partes, consistentes em declarações unilaterais ou bilaterais de vontade, produzem imediatamente a constituição, a modificação ou a extinção de direitos processuais. É certo que a renúncia ao prazo recursal e ao direito de recorrer faz cessar os efeitos da interposição do recurso, ou seja, acarreta o imediato trânsito em julgado da sentença em relação ao renunciante. Conquanto o CPC não exija a homologação judicial, cabe ao juiz ou ao tribunal examinar a regularidade do ato processual de renúncia, declarando os efeitos já operados. O reconhecimento da regularidade do ato de renúncia pelo relator do recurso especial tornou desnecessária a realização de qualquer ato processual, salvo a certificação do trânsito em julgado, uma vez que não havia mais possibilidade de interpor qualquer recurso contra o acórdão. No entanto, após os embargantes renunciarem, a Coordenadoria da 1ª Turma publicou o acórdão. Não obstante a renúncia já tivesse sido apreciada, remeteu os autos ao relator para novo exame. Restituídos os autos sem despacho, desta feita intimou a União do acórdão. E, finalmente, certificou o trânsito em julgado. O equívoco no processamento dos autos, após o despacho que examinou a renúncia, levou a União a concluir que o prazo recursal ainda estava em curso. Do contrário, qual a utilidade de intimar as partes de decisão já transitada em julgado? Por essa razão, considerou a data em que foi certificado o trânsito em julgado do acórdão como o prazo inicial para a propositura da ação rescisória, mormente porque a certidão apenas dá conta do fato, sem referir a data em que ocorreu. Parece-me claro que a União foi induzida em erro quanto ao decurso do prazo recursal e à data em que efetivamente o acórdão transitou em julgado. Isso acarretou-lhe evidente prejuízo, já que o marco temporal para o ajuizamento da rescisória deslocou-se para momento muito anterior à certidão do trânsito em julgado. Assegurar a garantia do devido processo legal não é somente observar e respeitar as normas do processo judicial previamente estabelecidas; envolve avaliar e ponderar as conseqüências da observância ou inobservância dessas normas. Considerar que houve o trânsito em julgado no momento em que os embargantes manifestaram a renúncia, ignorando que os atos processuais posteriores, em vez de cumprir a sua finalidade, alteraram o correto processamento do feito e originaram falta de clareza quanto ao real estado do processo, implica negar o direito da União a uma decisão razoável. Nesse caso, a solução a ser dada é a que causa a menor restrição possível. Assim, em que pese a data do trânsito em julgado, decorrente da renúncia ao prazo recursal e ao direito de recorrer, não se confunda com a data da certificação nos autos, no caso presente configura-se circunstância excepcional que justifica a consideração dessa última, para fins de contagem do prazo decadencial para o ajuizamento da ação rescisória (grifos acrescidos). Todavia, entendo que não deve prevalecer esse entendimento. 

A propósito do tema, dispõe a Súmula 401 do STJ: “O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial”. 

Verifica-se no excerto transcrito, nos autos da ação principal (REsp 784.297/RS), que houve o julgamento do agravo regimental, último recurso interposto pelos contribuintes, ora recorrentes, em 06/12/2005. Posteriormente, em 15/12/2005, foi protocolada petição requerendo a renúncia ao prazo recursal e ao direito de recorrer do acórdão, tendo o eminente Ministro relator, em 06/02/2006, determinado a certificação do trânsito em julgado, sem homologar tal pedido. 

Em outras palavras, em 06/02/2006, o Ministro relator determinou a certificação do trânsito em julgado, em virtude do pedido de renúncia ao prazo recursal e ao direito de recorrer do acórdão, que negara provimento ao seu agravo regimental, pleito este formulado em 15/12/2005. 

Contudo, sobreveio a publicação do acórdão que julgou o agravo regimental em 06/03/2006, tendo sido a Fazenda Nacional intimada pessoalmente em 07/03/2006. A certidão de trânsito em julgado foi lavrada em 23/03/2006. 

Cabe ressaltar que não é a data da lavratura da certidão que estabelece o trânsito em julgado, mas a de sua efetiva ocorrência, que se verifica, em regra, pelo transcurso do prazo para interpor recurso contra a última decisão proferida no processo. 

Nesse sentido, refiro-me aos seguintes julgados: 

PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/1973 NÃO CONFIGURADA. RECURSO ESPECIAL EM AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO DECADENCIAL. DATA DO EFETIVO TRÂNSITO EM JULGADO EM DETRIMENTO DA CERTIDÃO. PRECEDENTES DO STJ. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 343/STF. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. ALÍNEA "C". NÃO DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. [...] 3. "A decadência da ação rescisória se comprova pelo trânsito em julgado da última decisão proferida no processo de conhecimento, aferido pelo transcurso do prazo recursal e não pela certidão de trânsito em julgado que, ademais, não aponta o trânsito naquela data, mas apenas certifica que a decisão transitou em julgado" (AgRg na AR 2.946/RJ, Terceira Seção, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 19/3/2010; e AgRg na AR 4.666/CE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 23/2/2012). [...] 7. Agravo conhecido se para conhecer parcialmente do Recurso Especial e, nessa extensão, negar-lhe provimento. (AREsp 724.470/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/11/2019, DJe 18/11/2019) (grifos acrescidos). 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. MILITAR DO EXÉRCITO. ART. 485, V, DO CPC. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. PRESCRIÇÃO. PRAZO DECADENCIAL. ART. 495 DO CPC. TERMO INICIAL. DATA DO EFETIVO TRÂNSITO EM JULGADO. IMPRESTABILIDADE DA CERTIDÃO DE TRÂNSITO EM JULGADO. PRECEDENTES DESTA CORTE. AÇÃO RESCISÓRIA EXTINTA COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. 1. Consoante dispõe o art. 495 do CPC e a Súmula 401/STJ, o direito de propor ação rescisória extingue-se em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado do último pronunciamento judicial. 2. É firme o entendimento no âmbito do STJ no sentido de que a decadência do direito de propor a ação rescisória se comprova pelo trânsito em julgado da última decisão proferida no processo, aferido pelo transcurso do prazo recursal e não unicamente pela certidão de trânsito em julgado, a qual apenas certifica que a decisão transitou em julgado. Precedentes. 3. Sendo as partes intimadas da última decisão proferida no processo em 29/05/2008, iniciou-se o prazo quinquenal recursal cabível (art. 258 do RISTJ e arts. 188, 536 e 557, § 1°, do CPC) em 30/05/2008, findando-se em 09/06/2008. Não tendo qualquer das partes insurgido-se contra a referida decisão, operou-se o trânsito em julgado do decisum em 10/06/2008, o qual coincide com o dies a quo do prazo decadencial previsto no art. 495 do CPC. 4. Assim, o termo final do prazo decadencial para o ajuizamento da ação rescisória era 10/06/2010. Contudo a inicial da presente ação rescisória só foi protocolada em 14/06/2010, ou seja, após o decurso do prazo de dois anos, operando-se, portanto, a decadência. 5. Ação rescisória extinta, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC. (AR 4.665/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/04/2016, DJe 19/05/2016) (grifos acrescidos). 

No caso, a certidão, lavrada em 23/03/2006, não indicou a data em que teria ocorrido o trânsito em julgado. Tão somente o certificou, de modo que se impõe perquirir o exato momento desse relevante fato processual, para fins de exame da decadência. 

Em regra, a desistência do recurso ou a renúncia ao prazo recursal constitui ato unilateral de vontade do recorrente que independe da aquiescência da parte contrária e produz efeitos imediatos, ensejando o trânsito em julgado, se for o caso, à luz dos arts. 158, caput, 501 e 502 do CPC/1973. 

Essa compreensão pode ser extraída dos seguintes julgados: 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. DESISTÊNCIA DO RECURSO ESPECIAL, SEM RESSALVAS. HOMOLOGAÇÃO EFETUADA. PEDIDO DE RETRATAÇÃO, EM RELAÇÃO A PARTE DO RECURSO, EM SEDE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência é pacífica no sentido de que a desistência do recurso produz efeitos imediatos, tendo em vista que, nos termos do art. 501 do CPC, "o recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso". A produção dos efeitos prescinde, inclusive, de homologação judicial, pois o atual Código de Processo Civil não exige essa providência (STF-RE 65.538/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Antônio Neder, DJ de 18.4.1975; REsp 246.062/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 20.5.2004). 2. Assim, formulado de modo regular o pedido de desistência do recurso, e havendo a respectiva homologação, opera-se a preclusão, cujo principal efeito é o de ensejar o trânsito em julgado em relação à decisão recorrida, caso não haja outro recurso pendente de exame. No mesmo sentido: REsp 7.243/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 2.8.1993; AgRg no RCDESP no Ag 494.724/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 10.11.2003. Na doutrina, o entendimento de José Carlos Barbosa Moreira. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg nos EDcl no REsp 1.014.200/SP, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 7/10/2008, DJe 29/10/2008) (grifos acrescidos). 

AGRAVO REGIMENTAL EM DESISTÊNCIA EM AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE DESISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL PENDENTE DE JULGAMENTO. DESISTÊNCIA PROTOCOLADA OPORTUNAMENTE. HOMOLOGAÇÃO. 1. O pedido de desistência dos recursos cabíveis, cumulado com o pleito de renúncia ao direito em que se funda a ação, desde que formulados antes do transcurso do prazo recursal, importa no trânsito em julgado da ação, nos lindes da motivação ventilada no petitório. 2. In casu, revela-se viável o pedido de desistência, uma vez que protocolado anteriormente à decisão do agravo regimental no recurso especial. 3. Restando inquestionável o equívoco cometido pela Secretaria do Tribunal (juntada tardia de petição), atestado, inclusive, por certidão por ela mesma expedida, não podem ser prejudicadas as partes do processo, impondo-se seja considerada oportunamente interposta a Desistência, que se pretende seja homologada. 4. Agravo regimental provido, para declarar nulo o julgamento realizado em 04/02/2010, noticiado por certidão juntada à fl. 794 e homologar a desistência pleiteada às fls. 796/801, restando incólume a decisão de não conhecimento do recurso especial de fls. 777/781. (AgRg na Desis no AgRg no REsp 902.711/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/10/2010, DJe 18/11/2010) (grifos acrescidos). 

Desse modo, a desistência do recurso ou a renúncia ao prazo recursal determina, em regra, o trânsito em julgado da decisão impugnada, se não houver, vale registrar, recurso pendente de julgamento da outra parte. 

Contudo, a hipótese revela uma peculiaridade que impede o reconhecimento do trânsito em julgado em 15/12/2005, data do protocolo da renúncia. Como não há notícia de que houve homologação pelo eminente relator, a Fazenda Nacional teve ciência do pedido de renúncia ao prazo recursal e ao direito de recorrer quando foi intimada pessoalmente, em 07/03/2006, do acórdão proferido nos autos do agravo regimental. 

Não obstante os efeitos imediatos preconizados na lei processual civil ao pedido de renúncia, não havendo homologação judicial, o princípio do contraditório impede que o trânsito em julgado seja reconhecido antes da ciência da parte ex adversa. Não se pode permitir a abertura de um prazo, no caso, decadencial de 2 (dois) anos, de que cuida o art. 495 do CPC/1973, antes que ocorra a indispensável intimação da parte interessada do fato processual que lhe dá origem. 

Nesse contexto, no caso, deve ser contado o prazo decadencial da data da primeira intimação da Fazenda Nacional, após o pedido de renúncia, ocorrida em 07/03/2006. Desse modo, considerando que foi proposta a ação rescisória em 18/03/2008, a parte autora decaiu do direito de propor a ação rescisória, porquanto inobservado o prazo de 2 (dois) anos do art. 495 do CPC/1973. 

Por fim, em face do reconhecimento da decadência, remanescem prejudicadas as demais alegações apresentadas em ambos os recursos especiais. 

Ante o exposto, CONHEÇO do recurso especial do Banco Santander Brasil S.A. e OUTROS e DOU-LHE PROVIMENTO, a fim de pronunciar a decadência do direito de propor a ação rescisória e, assim, julgar extinto o processo, com resolução de mérito, nos termos do arts. 269, IV, do CPC/1973 (art. 487, II, do CPC/2015). Outrossim, JULGO PREJUDICADO o recurso especial da Fazenda Nacional. 

Acresço, em favor do Banco Santander Brasil S.A. e OUTROS, à condenação em honorários advocatícios já arbitrada na instância ordinária, a quantia de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), restando fixados em R$ 100.000,00 (cem mil reais), com fundamento no art. 20, §§ 3 e 4º, do CPC/1973 (requisitos que devem ser observados em face da época da prolação da decisão impugnada), determinando, ainda, o reembolso das custas e despesas processuais eventualmente antecipadas pela parte recorrente. 

É como voto. 

7 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Reclamação e Ação Rescisória - Jaldemiro Rodrigues de Ataíde Jr.

O enunciado do § 5º do art. 966 do CPC/2015 diz menos do que deveria, pois apresenta como nova hipótese de cabimento da ação rescisória apenas a aplicação de precedente sem a realização do devido distinguishing - ou melhor, a aplicação do precedente a caso que versa sobre fatos materiais distintos daqueles constantes no caso que gerou o precedente - , olvidando que também se viola a ratio decidendi do precedente quando não se a considera em caso que versa sobre fatos materiais semelhantes. É óbvio que o intérprete pode (e deve), a partir do § 5º do art. 966 do CPC/2015, construir norma jurídica cuja hipótese de incidência contenha também a não aplicação do precedente a caso que verse sobre fatos materiais semelhantes ao do caso que gerou o precedente; mas, e se tal disposição legal for interpretada restritivamente? O legislador pátrio não contou com esse risco. 


ATAÍDE Jr, Jaldemiro Rodrigues de. Comentários ao Código de Processo Civil, Coord. Angélica Arruda Alvim, Araken de Assis, Eduardo Arruda Alvim e George Salomão Leite. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 1.131.

6 de maio de 2021

AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA MANTIDA EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. PEDIDO RESCISÓRIO DIRIGIDO CONTRA A SENTENÇA EM VEZ DO ACÓRDÃO. MERA IRREGULARIDADE FORMAL. EXTINÇÃO DA RESCISÓRIA. DESCABIMENTO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.569.948 - AM (2015/0272209-6) 

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CPC/1973. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA MANTIDA EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. PEDIDO RESCISÓRIO DIRIGIDO CONTRA A SENTENÇA EM VEZ DO ACÓRDÃO. MERA IRREGULARIDADE FORMAL. EXTINÇÃO DA RESCISÓRIA. DESCABIMENTO. DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA SOBRE O TEMA. 

1. Controvérsia acerca das consequências do vício formal da inicial da rescisória consistente em pedir a rescisão da sentença em vez do acórdão que a substituiu, na vigência do CPC/1973. 

2. Existência de julgados desta Corte Superior no sentido de que esse vício conduziria à impossibilidade jurídica do pedido rescindente, pois não seria possível a rescisão de sentença que já fora substituída pelo acórdão que a manteve. 

3. Julgados específicos, porém, tanto do STF, como desta Turma, além de entendimento doutrinário, no sentido de que a extinção da rescisória com base nesse vício seria excesso de formalismo. 

4. Possibilidade de se compreender na palavra "sentença" a referência também ao acórdão que a substituiu. 

5. Reforma do acórdão recorrido no caso concreto para afastar a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido rescindente. 

6. Entendimento em consonância com a nova disciplina dada à matéria pelo CPC/2015. 

7. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente) e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. Dr(a). VERA CARLA NELSON CRUZ SILVEIRA, pela parte RECORRIDA: COENCIL COMERCIO IMPORTACAO E EXPORTACAO LTDA 

Brasília, 11 de dezembro de 2018(data do julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por CONDOMINIO RESIDENCIAL JARDIM ITAPOA e OUTRO em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, assim ementado: 

EMBARGOS INFRINGENTES EM AÇÃO RESCISÓRIA - CABIMENTO - EXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIOS PASSIVOS UNITÁRIOS - CONFIGURAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO QUE SE IMPÕE. I - Cabem embargos infringentes contra acórdão que julgar embargos dedeclaração, desde que: a) os embargos declaratórios tenham sido interpostoscontra acórdão proferido em apelação ou ação rescisória; b) os demais pressupostos de cabimento, previstos no art. 530 do Código de Processo Civil, sejam preenchidos. II - Há litisconsórcio passivo unitário quando o provimento jurisdicional deverá ser igual para todos. III - Quando o recurso não é conhecido não há o efeito substitutivo, permanecendo íntegra a decisão recorrida, que pode ser objeto de ação rescisória, desde que preenchidos os requisitos do Código de Processo Civil 485. Quando o recurso foi conhecido, haverá o efeito substitutivo e o acórdão que substituiu a decisão recorrida é que poderá ser impugnado pela ação rescisória (...) (in: Código de Processo Civil e Legislação Extravagante, 1 I a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 886). IV - Recurso conhecido e provido" (fls. 963) 

Opostos embargos de declaração, foram acolhidos, sem agregação de efeitos infringentes (fls. 1348/1354). 

Em suas razões, alega a parte recorrente, em síntese, violação ao art. 512 do Código de Processo Civil de 1973, sob o argumento de que o efeito substitutivo dos recursos não operaria no caso em que a apelação esteja fundada em error in procedendo. Aduz, também, que o mero erro de direcionamento da rescisória contra a sentença, em vez do acórdão, não seria suficiente para obstar o conhecimento da rescisória. 

Contrarrazões ao recurso especial às fls. 1718/1756. 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, na qualidade de custo iuris, manifestou-se pelo conhecimento parcial e desprovimento do recurso, nos termos da seguinte ementa: 

AÇÃO DECLARATÓRIA NEGATIVA. PROCEDÊNCIA.APELAÇÃO. PROVIMENTO, POR MAIORIA.EMBARGOS INFRINGENTES. PROVIMENTO.TRÂNSITO EM JULGADO. AÇÃO RESCISÓRIA ALEGANDO ILEGITIMIDADE DE PARTE NA AÇÃO ORIGINÁRIA. PROCEDÊNCIA, POR MAIORIA.EMBARGOS INFRINGENTES ALEGANDO A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO (RESCISÓRIA ATACA A SENTENÇA). RECURSO ESPECIAL (CF, 105, III, "A" E "C"). ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 535, DO CPC/73. INEXISTÊNCIA.ALEGAÇÃO DE AFRONTA AOS ARTIGOS 3o E 6o, 22,125, INCISO I, 267, INCISO VI E § 3°, 460 E 530, TODOS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/73. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 512 E 267, INCISO VI, DA LEI PROCESSUAL CIVIL/73. NÃO CONFIGURAÇÃO.PARECER PELO CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO E, NA PARTE CONHECIDA, PELO SEU DESPROVIMENTO. (fl. 1777) Juízo de admissibilidade do presente recurso realizado com base nas normas do CPC/1973, por ser a lei processual vigente na data de publicação do decisum ora impugnado (cf. Enunciado Administrativo n. 2/STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator): Eminentes colegas, o recurso especial merece ser provido. 

A controvérsia diz respeito ao efeito substitutivo dos recursos, e suas consequências no que tange à admissibilidade da ação rescisória. 

No caso dos autos, o Tribunal de origem não conheceu da rescisória por entender juridicamente impossível o pedido de rescisão de sentença que fora mantida em segundo grau de jurisdição, pois, por força do efeito substitutivo, a ação rescisória deveria ter sido dirigida contra o acórdão que a manteve. 

Confira-se, a propósito, o seguinte trecho do acórdão recorrido: 

02.17. Verifica-se, diante deste breve histórico narrado que a decisão a ser rescindida deveria ser o acórdão que julgou os Embargos Infringentes , fls. 81/90. Isto porque neste a Corte de Justiça conheceu e deu provimento, mantendo-se a sentença apelada. Quando os autos subiram ao Superior Tribunal de Justiça em razão da interposição de Recurso Especial, este não foi conhecido. 02.18. Com o conhecimento e provimento dos Embargos Infringentes houve a substituição de uma decisão pela outra, ou seja, a substituição da sentença pelo acórdão, nos termos do que dispõe o artigo 512 do Código de Processo Civil, segundo o qual dispõe que o julgamento proferido pelo tribunal substituirá a sentença ou decisão recorrida no que tiver sido objeto do recurso. ..................................... 02.21. Nesse sentido, não há como ser rescindida a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito do Primeiro Grau. 02.22. Ante o exposto, conheço o presente recurso de embargos infringentes e dou-lhe provimento a fim de decretar a extinção do processo, sem a resolução do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido, nos termos dos artigos 267, VI, do Código de Processo Civil. 02.23. É como voto. (fls. 981 s.) 

Esse entendimento do Tribunal de origem está em sintonia com julgados desta Corte Superior proferidos na vigência do CPC/1973, salientando-se que a rescisória foi ajuizada em 2007. Ilutrativamente, confira-se: 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. PEDIDO. DIREÇÃO CONTRA SENTENÇA. EXISTÊNCIA DE ACÓRDÃO POSTERIOR QUE A SUBSTITUIU. PEDIDO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÃO GENÉRICA. ARTS. 485, V, E 512 DO CPC. SÚMULA 284/STF. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. Alegações genéricas quanto às prefaciais de afronta ao art. 535 do Código de Processo Civil não bastam à abertura da via especial pela alínea "a" do permissivo constitucional, a teor da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal. 2. Há deficiência argumentativa quando o preceito legal apontado como violado (arts. 485, V, e 512 do CPC) não é suficiente para amparar a tese defendida no recurso especial. Precedentes. 3. O fundamento utilizado no acórdão paradigma a título subsidiário (obiter dictum) não serve de parâmetro de controle da divergência jurisprudencial. Precedentes. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1369630/BA, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/10/2013, DJe 20/11/2013) 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AJUIZAMENTO CONTRA SENTENÇA. EXISTÊNCIA DE ACÓRDÃO. IRREGULARIDADE. 1. A ação rescisória ajuizada contra a sentença proferida no processo de conhecimento, quando há acórdão proferido pelo Tribunal de origem substituindo tal sentença, é inviável de ser analisada. 2.Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 337.443/PE, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 10/06/2008, DJe 23/06/2008) 

Esse entendimento, contudo, dificilmente se sustentaria na vigência do CPC/2015, tendo em vista o princípio da primazia da resolução do mérito, bem como a norma do art. 968, §§ 5º e 6º, que estatui uma hipótese específica de emenda à petição inicial da ação rescisória, destinada justamente ao saneamento do vício relacionado à inobservância do efeito substitutivo dos recursos. 

Confira-se: 

Art. 968. A petição inicial será elaborada com observância dos requisitos essenciais do art. 319, devendo o autor: .......................................... § 5º. Reconhecida a incompetência do tribunal para julgar a ação rescisória, o autor será intimado para emendar a petição inicial, a fim de adequar o objeto da ação rescisória, quando a decisão apontada como rescindenda: I - não tiver apreciado o mérito e não se enquadrar na situação prevista no § 2º do art. 966; II - tiver sido substituída por decisão posterior. § 6º. Na hipótese do § 5º, após a emenda da petição inicial, será permitido ao réu complementar os fundamentos de defesa, e, em seguida, os autos serão remetidos ao tribunal competente.

 Na verdade, até mesmo na vigência do CPC/1973, encontravam posicionamentos no sentido de que considerara excesso de formalismo o erro de direcionamento da pretensão rescindente conta a sentença em vez do acórdão que a substituiu. 

No âmbito doutrinário, confira-se o entendimento de MARCELO NEGRI SOARES, Doutor em Direito Processual Civil pela PUC-SP: 

A ação rescisória mal proposta deve ser sempre aproveitada se puder atingir o fim desejado, seja mesmo sem emenda da inicial, seja após deteminada a emenda, quando for o caso. Aliás, determinar a emenda da inicial se torna obrigatória quando não preenchidos os requisitos genéricos da redação e documentação inicial. Não poderá o juiz, antes de determinar tal emenda, quando presente o fato ensejador, extinguir de pronto o feito. Quando o pedido se dirigir contra a sentença de primeiro grau, equivocadamente, em sendo o caso de pedido de desconstituição de acórdão substitutivo, o tribunal poderá conhecer o pedido diretamente, sem mesmo solicitar a emenda da inicial - art. 267 c/c art. 284, ambos do CPC - haja vista o flagrante erro material do pedido. (Ação rescisória. São Paulo: ed. Art mutatis mutandis, 2015, p. 131 s.). 

No mesmo sentido o entendimento de MARIA LÚCIA LINS CONCEIÇÃO DE MEDEIROS, manifestado em tese de doutorado defendida também na PUC-SP: 

Não é incomum que nas iniciais de ação rescisória, o autor, de forma equivocada peça a rescisão da sentença, quando tal pronunciamento já foi substituído pelo acórdão. Este vício, porém, é sanável [...]. (http://www.dominiopublico.gov.br/download/teste/arqs/cp063484.pdf, acesso em 22/11/2018) 

No âmbito jurisprudencial, ambos os autores acima referidos mencionam seguinte julgado do STF: 

Recurso extraordinário. Agravo regimental. 2. Ação rescisória. Extinção do feito, sem julgamento do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido. 3. Entendimento no sentido de que o autor pretendia rescindir a sentença, em vez de buscar a desconstituição do acórdão que a substituiu. 3. Formalismo excessivo que afeta a prestação jurisdicional efetiva. Erro no pedido que não gera nulidade, nem causa para o não-provimento. 4. Força normativa da Constituição. Jurisprudência do STF quanto à matéria que constitui objeto da ação rescisória. 5. Recurso extraordinário provido. Remessa ao TRT da 4ª Região, a fim de que aprecie a ação rescisória, como entender de direito (RE 395.662 AgR/RS, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 16/03/2004, DJ 23-04-2004) 

No âmbito desta Corte Superior, merece referência fundamento declinado no julgamento do REsp 744.271/DF, DJ 19/06/2006, perante esta Turma, em que a relatora, Min.ª NANCY ANDRIGHI, com percuciência, lembrou que até mesmo no CPC/1973 encontra-se o uso da palavra "sentença" em lugar de "acórdão", de modo esse equívoco não seria suficiente para impedir o conhecimento do mérito da ação rescisória. 

Nas palavras da relatora, verbis: 

Ainda, como fundamento subsidiário, é preciso considerar que, mesmo entendendo que o objeto da rescisória deveria ter sido o acórdão prolatado no julgamento da apelação, não se mostra razoável deixar de admitir a demanda, notadamente quando - ressalte-se - todos os outros requisitos formais foram devidamente preenchidos. O equívoco em utilizar a expressão "sentença" ao invés de acórdão, na hipótese, não se mostra suficiente para impedir a análise do mérito da ação rescisória proposta pelo recorrente. Neste sentido, relevante chamar atenção para o fato de que, na redação de determinados dispositivos legais, o próprio legislador utilizou a expressão "sentença", quando sua intenção era se referir a "acórdão", podendo ser apontado como exemplo o art. 467 do CPC, que dispõe sobre a "sentença não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário". Ora, como é sabido, apenas o acórdão pode ser impugnado por meio de recurso extraordinário, no entanto, o dispositivo legal fez menção à sentença. Com estes fundamentos, deve ser acolhida a pretensão do recorrente apresentada neste recurso especial, seja porque o objeto da ação rescisória, na hipótese, deveria ser, efetivamente, a sentença, considerando que esta não foi substituída pelo posterior acórdão; seja porque, em razão do princípio da efetividade da jurisdição, deve ser considerada mera irregularidade a referência à sentença ao invés da menção ao acórdão. 

Na esteira desse entendimento já manifestado por esta Turma, entendo que, no caso dos autos, o recurso especial merece ser provido para que, superada a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, prossiga o julgamento dos embargos infringentes no Tribunal de origem. 

Observe-se que o próprio Tribunal de origem admitiu que as demais questões suscitadas deixaram de ser apreciadas, em virtude do acolhimento da impossibilidade jurídica do pedido. Confira-se: 

02.04. Quanto as demais alegações não há como prosperar, isto porque consoante se extrai do acórdão ora atacado houve o reconhecimento da impossibilidade jurídica do pedido que, como é de sabença geral trata-se de uma das condições da ação, portanto, seu acolhimento inviabiliza a análise das demais argumentações. (fl. 1353) 

Nesse contexto, eventual pronunciamento desta Corte Superior sobre outras questões suscitadas perante o Tribunal de origem, e repisadas no apelo nobre, configuraria indevida supressão de instância. 

Destarte, o recuso especial merece ser provido. 

Ante o exposto, voto no sentido de DAR PROVIMENTO ao recurso especial para rejeitar a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, determinando o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que prossiga o julgamento das demais questões suscitadas nos embargos infringentes, como se entender de direito. 

É o voto. 

4 de maio de 2021

AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA PROFERIDA EM AÇÃO INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE. FALECIMENTO DO PRETENSO GENITOR BIOLÓGICO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. LEGITIMIDADE PASSIVA NA AÇÃO RESCISÓRIA DOS HERDEIROS DO FALECIDO E NÃO DO ESPÓLIO

RECURSO ESPECIAL Nº 1.667.576 - PR (2017/0077797-4) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA PROFERIDA EM AÇÃO INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE. FALECIMENTO DO PRETENSO GENITOR BIOLÓGICO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. LEGITIMIDADE PASSIVA NA AÇÃO RESCISÓRIA DOS HERDEIROS DO FALECIDO E NÃO DO ESPÓLIO. AÇÃO DE ESTADO E DE NATUREZA PESSOAL. EMENDA À PETIÇÃO INICIAL PARA MODIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO, SEM ALTERAÇÃO DO PEDIDO OU DA CAUSA DE PEDIR, APÓS A CONTESTAÇÃO DO RÉU. ADMISSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA EFETIVIDADE DO PROCESSO, ECONOMIA PROCESSUAL E INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. OBRIGATORIEDADE DE A ALTERAÇÃO SE REALIZAR ANTES DO ESCOAMENTO DO BIÊNIO DA AÇÃO RESCISÓRIA, SOB PENA DE DECADÊNCIA. 

1- Ação proposta em 07/02/2014. Recursos especiais interpostos em 01/10/2015 e atribuídos à Relatora em 18/07/2017. 

2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deve ser ajuizada em face do espólio ou em face dos herdeiros; (ii) se é admissível a determinação judicial de emenda à petição inicial para correção do polo passivo após a contestação do réu na ação rescisória e após o escoamento do biênio para ajuizamento da ação rescisória. 

3- Por se tratar de ação de estado e de natureza pessoal, a ação de investigação de paternidade em que o pretenso genitor biológico é pré-morto deve ser ajuizada somente em face dos herdeiros do falecido e não de seu espólio, sendo irrelevante o fato de se tratar de rediscussão da matéria no âmbito de ação rescisória, para a qual igualmente são legitimados passivos os sucessores do pretenso genitor biológico, na medida em que são eles as pessoas aptas a suportar as pretensões rescindente e rescisória deduzidas pelos supostos filhos. 

4- Em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, é admissível a emenda à petição inicial para modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação do réu. Precedentes. 

5- No âmbito da ação rescisória, a admissibilidade de modificações no polo passivo, seja para inclusão de litisconsortes passivos necessários, seja para a substituição de parte ilegítima, deve ser realizada, obrigatoriamente, até o escoamento do prazo bienal para o ajuizamento da ação rescisória, sob pena de se operar a decadência. 

6- Recurso especial de GILMAR M conhecido e desprovido; recurso especial do espólio de JOÃO G conhecido e provido, para reconhecer a decadência do direito de rescindir a coisa julgada e julgar improcedente a ação rescisória. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial de GILMAR M e dar provimento ao recurso especial de JOÃO G, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Dr(a). TIAGO BECKERT ISFER, pela parte RECORRIDA: G M. 

Brasília (DF), 10 de setembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recursos especiais interpostos por GILMAR M, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, e por espólio de JOÃO G, também com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, ambos em face de acórdãos do TJ/PR que, por unanimidade, negaram provimento aos agravos internos por eles interpostos. 

Recursos especiais interpostos e m: 01/10/2015. Atribuídos ao gabinete e m: 26/03/2018. 

Ação: rescisória ajuizada por GILMAR M em face de espólio de JOÃO G, visando rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade por elas ajuizada, que julgou improcedente o pedido e que transitou em julgado em 08/02/2012. 

Decisão unipessoal: determinou a emenda da petição inicial da ação rescisória, a fim de que o espólio fosse substituído pelos herdeiros de JOÃO G. 

Acórdão: por unanimidade, negou-se provimento aos agravos internos interpostos pelos recorrentes, nos termos das seguintes ementas: 

AGRAVOS REGIMENTAIS. EMENDA À INICIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. INVESTIGADO FALECIDO. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS HERDEIROS. A ação rescisória que visa desconstituir sentença proferida em ação de investigação de paternidade, cujo réu é falecido, recai sobre os herdeiros, posto que a providência pretendida nesses autos tem o poder de implicar em alterações na esfera jurídica daqueles. (...) AGRAVOS REGIMENTAIS. EMENDA À INICIAL. POSSIBILIDADE. ECONOMIA PROCESSUAL E INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. ART. 284 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Embora a regra não seja a da emenda à petição inicial após a citação, a regularização processual pode ocorrer em casos específicos, em homenagem aos princípios da economia processual e da instrumentalidade, combinados com o art. 284 do Código de Processo Civil. 

Recurso especial de GILMAR M: alega-se violação aos arts. 12, V, e 472, ambos do CPC/73, ao fundamento de que a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deveria ser ajuizada em face do espólio ou, quando muito, em litisconsórcio passivo necessário entre espólio e herdeiros, razão pela qual deve ser reformada a decisão judicial que determinou fosse emendada a petição inicial (fls. 1.509/1.525, e-STJ). 

Recurso especial do espólio de JOÃO G: alega-se violação aos arts. 264, 267, VI, e 495, todos do CPC/73, ao fundamento de que seria inadmissível a ordem judicial de emenda à inicial, quer seja porque já teria havido contestação do réu e, consequentemente, estabilização subjetiva da lide, quer seja porque a emenda somente ocorreu após o escoamento do biênio da ação rescisória, tendo se operado a decadência (fls. 1.306/1.324, e-STJ). 

Ministério Público Federal: opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso especial de GILMAR M; e pelo conhecimento e provimento do recurso especial do espólio de JOÃO G (fls. 1.723/1.730, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deve ser ajuizada em face do espólio ou em face dos herdeiros; (ii) se é admissível a determinação judicial de emenda à petição inicial para correção do polo passivo após a contestação do réu na ação rescisória e após o escoamento do biênio para ajuizamento da ação rescisória. 

1. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO POR GILMAR M. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 12, V, E 472, AMBOS DO CPC/73. 

O recorrente GILMAR M sustenta inicialmente que seria correto o ajuizamento da ação rescisória em face do espólio de JOÃO G, na medida em que a ação investigatória de paternidade cuja sentença se pretende rescindir teria sido ajuizada exclusivamente em face dele enquanto vivo, de modo que não poderia haver a posterior substituição processual pelos herdeiros. 

Sustenta o recorrente ainda, em caráter subsidiário, que, se se entender pela legitimação passiva dos herdeiros, a hipótese seria de litisconsórcio passivo necessário desses com o espólio. 

Em se tratando especificamente de ação investigatória de paternidade, leciona Flávio Tartuce: 

Em regra, a ação será proposta contra o suposto pai ou suposta mãe, diante do seu caráter pessoal. Falecido este ou esta, a ação será proposta contra os herdeiros da pessoa investigada, não contra o espólio, justamente diante deste caráter pessoal. Lembre-se de que o espólio não tem personalidade jurídica, o que afasta a possibilidade de propositura da demanda contra este. (TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol. 5: direito de família. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 501). 

A questão é explorada mais profundamente por Rolf Madaleno: 

A legitimação passiva na ação de filiação é do ascendente investigado, no caso a suposta mãe, em sendo investigada a maternidade, ou o pai, no caminho oposto. Se o investigado já é falecido, serão réus os respectivos herdeiros, a serem individual e pessoalmente citados, tendo em vista ser uma ação de estado, não podendo ser representados pelo inventariante, acaso ainda tramitando o processo de inventário do investigado sucedido, mesmo se a pretensão judicial inserir pedido cumulativo e relativo ao quinhão hereditário do investigante. Isso porque a ação é de investigação de filiação, e visa ao reconhecimento da perfilhação. É uma ação declaratória de estado da pessoa e não guardar qualquer correlação com o resultado econômico oriundo da procedência da investigatória, e também implicará um resultado econômico se o extinto declarado genitor tiver deixado bens para inventariar e não estiver prescrita a ação de petição de herança. (MADALENO, Rolf. Direito de família. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 624/625). 

A jurisprudência desta Corte, de igual modo, fixou-se no sentido de que a ação de investigação de paternidade deve ser ajuizada em face dos herdeiros e não do espólio do falecido. 

Nesse sentido, confiram-se: REsp 5.280/RJ, 3ª Turma, DJ 11/11/1991; REsp 120.622/RS, 3ª Turma, DJ 25/02/1998; REsp 331.842/AL, 3ª Turma, DJ 10/06/2002. Nesse contexto, o fato de a sentença que se pretende rescindir ter sido proferida em ação investigatória de paternidade em que somente JOÃO G figurou como parte, o que sustentaria a tese recursal de que, após o seu falecimento, a ação rescisória deveria ser ajuizada em face do espólio, e não dos seus herdeiros, não modifica em absolutamente nada o entendimento acima mencionado. 

Com efeito, embora o CPC/73 não trate da legitimidade passiva para a ação rescisória (e, anote-se, que o CPC/15 também não examine esse tema), é correto afirmar que a regra do art. 487, I, do CPC revogado (idêntico ao art. 967, I, do novo CPC), que disciplina a legitimidade ativa e que informe que poderá propor a referida ação “quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular” deve se aplicar, por lógica, coerência e simetria, também à adequada configuração da legitimação passiva da ação rescisória. 

Por essa razão, o falecimento da parte após o trânsito em julgado da sentença a ser rescindida implica em sucessão processual não apenas no polo ativo, mas também no polo passivo. 

Tratando especificamente dessa matéria, leciona José Carlos Barbosa Moreira: 

Merece consideração especial a hipótese de sucessão intercorrente, quanto a alguma pessoa que, por haver sido parte no outro feito, devesse ser citada para a rescisória. Na sucessão causa mortis e na sucessão a título universal entre pessoas jurídicas (por exemplo: fusão ou incorporação de sociedades), não há dúvida de que a legitimação passiva se transfere aos sucessores. (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil – Vol. 5 – Arts. 476 a 565. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 174/175).

Como se sabe, a legitimidade passiva decorre de uma relação lógica e abstrata entre quem pede, o que se pede e contra quem se pede, devendo figurar no polo passivo a pessoa indicada pelo autor que possa ser compelida e reúna condições de satisfazer o pedido inicial. 

Tendo em mira essa premissa, conclui-se que, evidentemente, o espólio não é parte legítima para responder à ação rescisória em que se pleiteie a rescisão de sentença e o rejulgamento de ação investigatória de paternidade post mortem, seja como legitimado exclusivo, seja como litisconsorte passivo necessário, na medida em que, nessa ação, nada será pedido contra o espólio, que tão somente é um ente despersonalizado apto a titularizar a universalidade jurídica denominada herança até que se efetive a partilha dos bens. 

Sublinhe-se que as eventuais repercussões econômicas ou patrimoniais derivadas do reconhecimento, ou não, da filiação que se pretende alcançar por intermédio da ação investigatória de paternidade é que poderão, hipoteticamente, ser objeto de pretensões autônomas que serão deduzidas contra o espólio, como já se consignou em precedentes desta Corte em relação à petição de herança (AgRg no Ag 580.197/SP, 4ª Turma, DJe 04/05/2009) e à execução de dívidas do de cujus (REsp 1.559.791/PB, 3ª Turma, DJe 31/08/2018). 

Por tais razões, não há que se falar em violação aos arts. 12, V, e 472, ambos do CPC/73, motivo pelo qual o recurso especial interposto por GILMAR M deve ser desprovido. 

2. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELO ESPÓLIO DE JOÃO G. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 264, 267, VI, E 495, TODOS DO CPC/73. 

A primeira tese apresentada no recurso especial do espólio de JOÃO G é de que a consequência jurídica do reconhecimento de sua ilegitimidade passiva para responder a ação rescisória seria o indeferimento da petição inicial e, consequentemente, a extinção do processo sem resolução de mérito (art. 267, VI, combinado com art. 295, II, ambos do CPC/73), não havendo que se cogitar a possibilidade de emenda à petição inicial após a citação do recorrente (violação ao art. 264 do CPC/73). 

Não se pode olvidar, evidentemente, que há antigo precedente desta Corte que consignou que a ilegitimidade não pode ser concebida “como simples erro na petição inicial, passível de correção”, motivo pelo qual “iniciado o processo sob uma titularidade, a alteração no polo ativo, por meio de emenda, corresponderia a uma substituição processual, mormente quando é determinada após a citação, hipótese expressamente vedada, salvo exceções não presentes no caso, a teor do artigo 264 do Código de Processo Civil”. (REsp 758.622/RJ, 3ª Turma, DJ 10/10/2005). 

Ocorre que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, evoluiu no sentido de que é admissível a emenda à petição inicial para modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação. Nesse sentido: AgRg no REsp 1.362.921/MG, 2ª Turma, DJe 01/07/2013; AgInt no AREsp 921.282/PR, 4ª Turma, DJe 27/02/2018. 

Existe, inclusive, precedente específico da 3ª Turma desta Corte: 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU INCLUSÃO DE PARTE NO POLO PASSIVO DA AÇÃO APÓS A CITAÇÃO DO RÉU. INTERDITO PROIBITÓRIO. AUSÊNCIA DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 535 DO CPC. EMENDA DA INICIAL APÓS CITAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS E DA ECONOMIA PROCESSUAL. PECULIARIDADES DO CASO QUE JUSTIFICAM A RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO. INEXISTÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR OU PEDIDO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Não há violação do disposto no art 535 do CPC quando o aresto recorrido adota fundamentação suficiente para dirimir a controvérsia, sendo desnecessária a manifestação expressa sobre todos os argumentos apresentados. 2. Observados os princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, é possível a relativização das regras previstas no art. 264 do CPC para se admitir a emenda da inicial após a citação do réu desde que isso não acarrete alteração da causa de pedir ou do pedido. Precedentes. 3. Recurso especial não provido. (REsp 1.473.280/ES, 3ª Turma, DJe 14/12/2015. 

Por tais motivos, conclui-se que o acórdão recorrido não violou os arts. 264 e 267, VI, ambos do CPC/73, razão pela qual o recurso especial do espólio de JOÃO G não merece ser provido sob esse fundamento. 

É preciso examinar, contudo, a segunda tese deduzida no recurso especial do espólio de JOÃO G, segundo a qual teria havido violação ao art. 495 do CPC/73, na medida em que o recorrido GILMAR M teria decaído do direito de rescindir a sentença proferida na ação investigatória de paternidade em virtude de não ter havido a substituição do polo passivo antes do término do prazo bienal. 

A esse respeito, destaque-se desde logo precedente da Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça: 

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO RESCISÓRIA. PROPOSITURA APENAS EM FACE DE PARTE DOS INTEGRANTES DA RELAÇÃO ORIGINÁRIA. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. CORREÇÃO. DECADÊNCIA. 1. Nas ações rescisórias integrais devem participar, em litisconsórcio unitário, todos os que foram partes no processo cuja sentença é objeto de rescisão. 2. A propositura de ação rescisória sem a presença, no polo passivo, de litisconsorte necessário somente comporta correção até o prazo de dois anos disciplinado pelo art. 495 do CPC. Após essa data, a falta de citação do litisconsorte implica a decadência do direito de pleitear a rescisão, conduzindo à extinção do processo sem resolução do mérito. 3. Embargos de divergência conhecidos e providos. (EREsp 676.159/MT, Corte Especial, DJe 30/03/2011). 

Conquanto o precedente acima mencionado verse sobre complementação de polo passivo e a hipótese examinada neste recurso especial envolva substituição do polo passivo, colhe-se da ratio decidendi os fundamentos determinantes que justificam a aplicação da mesma solução jurídica já consolidada nesta Corte. 

Com efeito, o precedente se funda na existência de “falha do próprio autor da ação rescisória”, que “gerou graves inconvenientes”, como a surpresa causada a quem havia sido beneficiado pela coisa julgada e que repentinamente se encontra, muitos anos após, sob ameaça de rescisão e de ruptura da estabilidade e da segurança dela originada, motivo pelo qual a formação da relação jurídico-processual deve sempre observar o prazo decadencial bienal do art. 495 do CPC/73. 

Essas mesmas circunstâncias fáticas também se encontram, concreta ou potencialmente, presentes na hipótese em exame, na medida em que os herdeiros, somente agora, seriam surpreendidos e teriam ciência de nova ação ajuizada pelos pretensos filhos do de cujus, em que se visa rescindir coisa julgada formada em Fevereiro de 2012. 

Anote-se, ademais, que embora a inventariante do espólio de JOÃO G igualmente seja herdeira, há mais quatro herdeiros que eventualmente podem não ter ciência da presente ação rescisória, de modo que o elemento surpresa acima mencionado se fará presente em relação a eles. 

Além disso, registre-se que, ao tempo da propositura da ação rescisória, não existia sequer dúvida objetiva ou razoável acerca da legitimação do polo passivo na ação investigatória de paternidade, pois o primeiro julgado desta Corte que apontou a legitimação dos herdeiros, e não do espólio, está datado de 1991. 

Assim, a despeito de ser possível a modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação, com a substituição do réu pelo correto legitimado, essa alteração deverá ser realizada, obrigatoriamente, até o escoamento do prazo bienal decadencial da ação rescisória. 

Na hipótese, a sentença proferida na ação ajuizada pelo recorrente GILMAR M em face de JOÃO G e que julgou improcedente o pedido de reconhecimento da paternidade transitou em julgado em 08/02/2012 e a ação rescisória contra o espólio de JOÃO G foi ajuizada em 23/01/2014. 

Contudo, somente em 21/11/2014 houve a modificação do polo passivo para a substituição do espólio pelos herdeiros de JOÃO G, conforme se depreende da petição de fls. 1.301/1.303 (e-STJ), razão pela qual se operou a decadência na forma do art. 495 do CPC/73 que, pela fundamentação acima expendida, foi violado pelo acórdão recorrido. 

3. CONCLUSÃO. 

Forte nessas razões, CONHEÇO e NEGO PROVIMENTO ao recurso especial de GILMAR M; e CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso especial do espólio de JOÃO G, a fim de reconhecer a decadência do direito de rescindir a coisa julgada que se formou na ação investigatória de paternidade com base no art. 495 do CPC/73 e, consequentemente, julgar improcedente a ação rescisória com base no art. 269, IV, do CPC/73.