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24 de março de 2022

O art. 241-E do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao explicitar o sentido da expressão "cena de sexo explícito ou pornográfica" não restringe tal conceito apenas às imagens em que a genitália de crianças e adolescentes esteja desnuda.

Processo

Processo sob segredo judicial, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 15/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Estatuto da Criança e do Adolescente. Arts. 6º, 240, 241-B e 241-E da Lei n. 8.069/1990. Expressão "cena de sexo explícito ou pornográfica". Exposição de órgãos genitais das vítimas. Prescindibilidade. Contexto obsceno, poses sensuais, e a finalidade sexual das imagens. Suficiência.

 

DESTAQUE

O art. 241-E do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao explicitar o sentido da expressão "cena de sexo explícito ou pornográfica" não restringe tal conceito apenas às imagens em que a genitália de crianças e adolescentes esteja desnuda.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

No caso, o Tribunal a quo adotou entendimento segundo o qual, para a configuração das condutas típicas preconizadas nos arts. 240 e 241-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, seria necessário que as fotografias das vítimas contivessem a exibição de órgãos genitais, cena de sexo explícito ou pornográfica, o que não ocorre na hipótese em análise, tendo em vista que as adolescentes usavam lingerie ou biquíni nas fotografias juntadas pela acusação.

Todavia, à luz da correta exegese aplicável à legislação de regência, o exame da controvérsia tem como premissa básica e inafastável o escopo (mens legis) que perpassa todo o Estatuto da Criança e do Adolescente, especialmente o comando normativo insculpido no art. 6º do referido Diploma Legal, conforme as seguintes balizas, in verbis: "Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento."

Ao amparo desse firme alicerce exegético, inarredável a conclusão de que o art. 241-E da Lei n. 8.069/1990, ao explicitar o sentido da expressão "cena de sexo explícito ou pornográfica" não o faz de forma integral e, por conseguinte, não restringe tal conceito apenas àquelas imagens em que a genitália de crianças e adolescentes esteja desnuda.

Isso porque, tendo como diapasão a proteção absoluta que a lei oferece à criança e ao adolescente, a tipificação dos delitos nela preconizados, para os quais é necessário lançar mão da definição de "cena de sexo explícito ou pornográfica", deve sopesar todo o contexto fático que circunda a conduta praticada.

Portanto, para esse desiderato, é imprescindível verificar se, a despeito de as partes íntimas das vítimas não serem visíveis nas cenas que compõem o acervo probante (por exemplo, pelo uso de algum tipo de vestimenta), estão presentes o fim sexual das imagens, poses sensuais, bem como evidência de exploração sexual, obscenidade ou pornografia.

9 de fevereiro de 2022

Responde civilmente por danos morais o provedor de aplicação de internet que, após formalmente comunicado de publicação ofensiva a imagem de menor, se omite na sua exclusão, independentemente de ordem judicial

Processo

REsp 1.783.269-MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por maioria, julgado em 14/12/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, DIREITO DIGITAL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Rede social. Provedor de aplicação. Menor. Proteção integral. Dever de toda a sociedade. Publicação ofensiva. Retirada. Ordem judicial. Desnecessidade. Danos morais e à imagem. Omissão relevante. Responsabilidade civil configurada.

DESTAQUE

Responde civilmente por danos morais o provedor de aplicação de internet que, após formalmente comunicado de publicação ofensiva a imagem de menor, se omite na sua exclusão, independentemente de ordem judicial.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 18) e a Constituição Federal (art. 227) impõem, como dever de toda a sociedade, zelar pela dignidade da criança e do adolescente, colocando-os a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, com a finalidade, inclusive, de evitar qualquer tipo de tratamento vexatório ou constrangedor.

As leis protetivas do direito da infância e da adolescência possuem natureza especialíssima, pertencendo à categoria de diploma legal que se propaga por todas as demais normas, com a função de proteger sujeitos específicos, ainda que também estejam sob a tutela de outras leis especiais.

Para atender ao princípio da proteção integral consagrado no direito infantojuvenil, é dever do provedor de aplicação na rede mundial de computadores (Internet) proceder à retirada de conteúdo envolvendo menor de idade - relacionado à acusação de que seu genitor havia praticado crimes de natureza sexual - logo após ser formalmente comunicado da publicação ofensiva, independentemente de ordem judicial.

O provedor de aplicação que, após notificado, nega-se a excluir publicação ofensiva envolvendo menor de idade, deve ser responsabilizado civilmente, cabendo impor-lhe o pagamento de indenização pelos danos morais causados à vítima da ofensa.

A responsabilidade civil, em tal circunstância, deve ser analisada sob o enfoque da relevante omissão de sua conduta, pois deixou de adotar providências que, indubitavelmente sob seu alcance, minimizariam os efeitos do ato danoso praticado por terceiro, o que era seu dever.

Assim, apesar do art. 19 da Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) dispor que o provedor somente será responsável civilmente, em razão de publicação gerada por terceiro, se descumprir ordem judicial determinando as providências necessárias para cessar a exibição do conteúdo ofensivo, afigura-se insuficiente a sua aplicação isolada.

Referida norma, interpretada à luz do art. 5º, X, da Constituição Federal, não impede a responsabilização do provedor de serviços por outras formas de atos ilícitos, que não se limitam ao descumprimento da ordem judicial a que se refere o dispositivo da lei especial.

Registra-se, por fim, que a constitucionalidade do art. 19 da Lei n. 12.965/2014 será ainda decidida pelo Supremo Tribunal Federal (Tema n. 987/STF), que reconheceu repercussão geral da questão constitucional suscitada, sem determinar a suspensão dos processos em curso.



Não é cabível, sem motivação idônea, a alteração do nome de menor para exclusão do agnome "filho" e inclusão do sobrenome materno

Processo

REsp 1.731.091-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/12/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Registro Civil. Poder familiar. Nome de família. Alteração. Hipóteses excepcionais. Motivação. Imprescindibilidade. Titularidade da autoridade parental. Ambos genitores. Separação ou divórcio. Mitigação. Inviabilidade.

 

DESTAQUE

Não é cabível, sem motivação idônea, a alteração do nome de menor para exclusão do agnome "filho" e inclusão do sobrenome materno.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A questão controvertida consiste em saber se é possível, em exercício do poder familiar exclusivamente pelo genitor que detém a guarda do menor, ser estabelecida a alteração de nome para exclusão de agnome "filho" e inclusão de sobrenome da mãe-guardiã, ao fundamento de atender ao melhor interesse da criança, por propiciar sua melhor identificação e "estreitamento de laços para com a família materna".

O sobrenome tem a função de revelar a estirpe familiar no meio social, como também de reduzir riscos de homonímia. Com efeito, aquele que recebe o nome de seu genitor acrescido do agnome "filho" ou "filha" não tem nenhuma mitigação do vínculo com as famílias de seus genitores, tampouco sofre constrangimento por não ter os mesmos sobrenomes de eventual irmão, pois não é função do nome de família estreitar ligação afetiva.

Ademais, o registro de nascimento já contém os nomes dos pais e dos avós paternos e maternos, conforme disposto no art. 54 da Lei dos Registros Públicos. A inclusão do sobrenome materno em quem detém o agnome "filho" não é adequada, sendo certo que o nome dos pais, com seus respectivos sobrenomes, está necessariamente gravado em todas certidões e documentos civis, eleitorais e trabalhistas e que a ausência do apelido de família materno no nome do infante não impede que o autor da ação, no futuro, venha a fazer constar sobrenome de ascendentes, inclusive de avós, no nome de eventual prole.

O art. 57 da Lei dos Registros Públicos elucida que alteração posterior de nome somente é possível por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei, qual seja: I - erros que não exijam qualquer indagação para a constatação imediata de necessidade de sua correção; II - erro na transposição dos elementos constantes em ordens e mandados judiciais, termos ou requerimentos, bem como outros títulos a serem registrados, averbados ou anotados, e o documento utilizado para a referida averbação e/ou retificação ficará arquivado no registro no cartório; III - inexatidão da ordem cronológica e sucessiva referente à numeração do livro, da folha, da página, do termo, bem como da data do registro; IV - ausência de indicação do Município relativo ao nascimento ou naturalidade do registrado, nas hipóteses em que existir descrição precisa do endereço do local do nascimento; V - elevação de Distrito a Município ou alteração de suas nomenclaturas por força de lei.

Por um lado, muito embora o princípio da imutabilidade do nome seja adstrito apenas ao sobrenome (art. 56 da Lei dos Registros Públicos), e não ao prenome ou agnome, ainda assim a exceção que enseja a mudança, em regra, são as hipóteses de inadequação social, sexo psicológico, ridicularia - o que, no caso, não se constata nem é alegado.

Além disso, o art. 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que o poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil; e o art. 1.632 do Código Civil dispõe que a separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos, senão quanto ao direito que aos primeiros cabe de terem em sua companhia os segundos.

Assim, eventual alteração do nome só seria possível cogitar à luz do art. 56 da Lei dos Registros Públicos, isto é, no primeiro ano após o atingimento da maioridade civil do autor, pois não se pode, sem motivação idônea, simplesmente esvaziar o poder familiar do genitor, em questão a envolver o próprio direito da personalidade do menor.



15 de janeiro de 2022

O juízo da comarca de domicílio do adolescente pode conferir autorização para que ele participe de apresentações artísticas inclusive em outras comarcas

 CRIANÇA E ADOLESCENTE

STJ. 3ª Turma. REsp 1.947.740-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 05/10/2021 (Info 714)

O juízo da comarca de domicílio do adolescente pode conferir autorização para que ele participe de apresentações artísticas inclusive em outras comarcas

O art. 7º, XXXIIII, da CF/88 prevê que

criança não pode trabalhar;

adolescente pode trabalhar a partir de 14 anos, na condição de aprendiz;

a partir de 16 anos, o adolescente pode trabalhar normalmente (mesmo sem ser aprendiz), salvo se for um trabalho noturno, perigoso ou insalubre;

trabalho noturno, perigoso ou insalubre só pode ser realizado por maiores de 18 anos.

doutrina e a jurisprudência entendem que é possível o trabalho de crianças e adolescentes em espetáculos artísticos, mesmo antes da idade mínima prevista no art. 7º, XXXIII, da CF/88

artigo 8º, 1, da Convenção 138 da OIT, autoriza a participação de crianças e adolescentes em “representações artísticas”

Art. 149 do ECA (Lei nº 8.069/90) exige uma autorização mediante pronunciamento judicial (“Alvará”) para esses casos

Art. 149. Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará (...)

II - a participação de criança e adolescente em:  a) espetáculos públicos e seus ensaios; (...)

Juízo competente: Vara da Infância e Juventude do domicílio do adolescente

Art. 146, ECA: A autoridade a que se refere esta Lei é o Juiz da Infância e da Juventude, ou o juiz que exerce essa função, na forma da lei de organização judiciária local.

ADI 5326/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 27/9/2018 (Info 917): “Compete à Justiça Comum Estadual (juízo da infância e juventude) apreciar os pedidos de alvará visando a participação de crianças e adolescentes em representações artísticas”

Art. 147. A competência será determinada:

I - pelo domicílio dos pais ou responsável;

II - pelo lugar onde se encontre a criança ou adolescente, à falta dos pais ou responsável.

Essa autorização não pode ser ampla a, geral e irrestrita, para que o adolescente participe de espetáculos públicos até que atinja a sua maioridade civil

Art. 149, § 2º, ECA: As medidas adotadas na conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as determinações de caráter geral.

REsp 1947740/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 05/10/2021: A partir da interpretação do art. 149, §2º, do ECA, conclui-se ser expressamente vedada a concessão de autorização judicial ampla, geral e irrestrita, para que o adolescente participe de espetáculos públicos até que atinja a sua maioridade civil, ainda que se faça acompanhar por seus pais ou responsáveis.

essa espécie de autorização ampla significaria transferir os poderes de decisão totalmente aos pais, sem nenhuma espécie de controle externo, o que comprometeria o adequado desenvolvimento da criança e do adolescente, transformando algo que deveria ser uma atividade complementar, lúdica e de desenvolvimento de habilidades inatas, em uma verdadeira atividade laboral ou profissional prematura e exploratória,

Mas não é necessário solicitar autorização em todas apresentações

STJ adotou um meio-termo

embora a regra do art. 149, §2º, do ECA, impeça a concessão de uma autorização judicial ampla, geral e irrestrita até a maioridade civil, não há óbice para que se acolha o pedido de autorização em menor extensão, estabelecendo-se previamente os critérios básicos para o desenvolvimento da atividade pelo adolescente

especialmente na hipótese em que a atividade se desenvolve de maneira contínua (repetitividade), mas diversa (múltiplas possibilidades de públicos, eventos, horários, localizações etc)

É possível, portanto, que o juízo do domicílio da residência do adolescente, ouvidos o Ministério Público, os pais e até equipe multidisciplinar, autorize as apresentações artísticas e estabeleça:

a) a periodicidade dos eventos em que o adolescente estará autorizado a participar

b) eventuais vedações a eventos em determinados dias ou horários

c) eventuais restrições de público, espaço, infraestrutura etc

Essa autorização deve ser estabelecida por determinado lapso temporal, sem prejuízo do reexame e aprimoramento dessas condicionantes ou diretrizes a qualquer tempo, inclusive com a possibilidade de revogação da autorização na hipótese de descumprimento dos parâmetros fixados.

A autorização judicial para participação de adolescente em espetáculo público em diversas comarcas deve ser concentrada na competência do juízo do seu domicílio, que solicitará providências e informações aos demais juízos, onde ocorra apresentação, quanto ao cumprimento das diretrizes previamente fixadas.

O hipotético prejuízo decorrente da concentração da competência do juízo da comarca do domicílio do adolescente para autorizar a participação em espetáculos públicos, em especial em comarcas distintas, pode ser drasticamente reduzido, até mesmo eliminado, mediante o uso adequado do instituto da cooperação judiciária nacional (arts. 67 a 69, do CPC/2015), que permite, de maneira simplificada e pela via do auxílio direto, o cumprimento de providências e o atendimento de solicitações entre juízos distintos; pode solicitar providências ou obter informações a quaisquer outros juízos de comarcas em que a parte se apresentar

13 de novembro de 2021

A autorização judicial para participação de adolescente em espetáculo público em diversas comarcas deve ser concentrada na competência do juízo do seu domicílio, que solicitará providências e informações aos demais juízos, onde ocorra apresentação, quanto ao cumprimento das diretrizes previamente fixadas.

Processo

REsp 1.947.740-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/10/2021, DJe 08/10/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Apresentação em espetáculo público. Adolescente. Autorização judicial para participação ampla, geral e irrestrita. Impossibilidade. Pedidos em cada comarca de apresentação. Desnecessidade. Competência do local do domicílio do adolescente. Concentração. Art. 147 do ECA. Cooperação judiciária nacional.

 

DESTAQUE

A autorização judicial para participação de adolescente em espetáculo público em diversas comarcas deve ser concentrada na competência do juízo do seu domicílio, que solicitará providências e informações aos demais juízos, onde ocorra apresentação, quanto ao cumprimento das diretrizes previamente fixadas.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A partir da interpretação do art. 149, §2º, do ECA, conclui-se ser expressamente vedada a concessão de autorização judicial ampla, geral e irrestrita, para que o adolescente participe de espetáculos públicos até que atinja a sua maioridade civil, ainda que se faça acompanhar por seus pais ou responsáveis.

Da regra do referido artigo, todavia, não se extrai conclusão jurídica no sentido de que seria necessário ao adolescente que pretenda participar de espetáculos públicos formular pedidos individuais, a serem examinados e decididos em cada comarca em que ocorrerá a respectiva apresentação.

É admissível que o juízo da comarca do domicílio do adolescente, competente em virtude da regra do art. 147 do ECA, ao julgar o pedido de autorização judicial de participação em espetáculo público, que estabeleça previamente diretrizes mínimas para a participação do adolescente em atividade que se desenvolve de maneira contínua, fixando, após a oitiva dos pais e do Ministério Público, os parâmetros adequados para a realização da atividade profissional pela pessoa em formação.

Além da regra impositiva do art. 147 do ECA, a fixação da competência do juízo da comarca do domicílio do adolescente para a concessão de autorização judicial que permita a apresentação em espetáculos públicos decorre da proximidade e do conhecimento existente entre o juízo e a entidade familiar e da necessidade de fixação de critérios uniformes para a concessão da autorização.

O hipotético prejuízo decorrente da concentração da competência do juízo da comarca do domicílio do adolescente para autorizar a participação em espetáculos públicos, em especial em comarcas distintas, pode ser drasticamente reduzido, até mesmo eliminado, mediante o uso adequado do instituto da cooperação judiciária nacional (arts. 67 a 69, do CPC/2015), que permite, de maneira simplificada e pela via do auxílio direto, o cumprimento de providências e o atendimento de solicitações entre juízos distintos.

Dessa forma, o juízo da comarca do domicílio do adolescente poderá, de maneira muito mais simples e objetiva, solicitar providências ou obter informações a quaisquer outros juízos de comarcas em que a parte se apresentar, seja antes ou após o evento, a fim de verificar se as diretrizes estabelecidas estão sendo fielmente cumpridas, se há necessidade de ajustes ou aprimoramentos e, enfim, se está sendo concretizado o princípio do melhor interesse.

10 de agosto de 2021

A Justiça da Infância e da Juventude tem competência absoluta para processar e julgar causas envolvendo matrícula de menores em creches ou escolas, nos termos dos arts. 148, IV, e 209 da Lei n. 8.069/1990

PROCESSO REsp 1.846.781-M,S Rel. Min. Assusete Magalhães, Primeira Seção, julgado em 10/02/2021, DJe 29/03/2021.

DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE


A Justiça da Infância e da Juventude tem competência absoluta para processar e julgar causas envolvendo matrícula de menores em creches ou escolas, nos termos dos arts. 148, IV, e 209 da Lei n. 8.069/1990

8 de agosto de 2021

Demonstrado interesse jurídico e justificada a finalidade, é cabível a extração de cópias dos autos da apuração de ato infracional, não se podendo utilizar os documentos obtidos para fins diversos do que motivou o deferimento de acesso

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/07/info-699-stj.pdf


PROTEÇÃO CÍVEL - Demonstrado interesse jurídico e justificada a finalidade, é cabível a extração de cópias dos autos da apuração de ato infracional, não se podendo utilizar os documentos obtidos para fins diversos do que motivou o deferimento de acesso 

O art. 143 do ECA estabelece, como regra geral, a vedação à divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito à apuração de atos infracionais. Esta disposição, em primeiro juízo, obsta o acesso de terceiros aos referidos autos. Todavia, a vedação contida no art. 143 não é absoluta, sendo mitigada, conforme se extrai do art. 144 do ECA. Assim, presentes interesse e finalidade justificadas, deverá a autoridade judiciária deferir a extração de cópias ou certidões dos atos do processo infracional. No caso, a requerente comprovou seu interesse jurídico, pois é mãe da adolescente apontada como infratora e foi vítima do ato infracional imputado à filha. Ademais, a requerente apresentou finalidade justificada ao pleitear o seu acesso aos autos do processo de apuração do ato infracional, consignando a utilidade dos documentos nele produzidos para servirem como provas em ação de deserdação. STJ. 6ª Turma. RMS 65.046-MS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 01/06/2021 (Info 699). 

Imagine a seguinte situação hipotética:

 Regina foi vítima de ato infracional praticado por Beatriz (adolescente de 17 anos), que é sua filha. O Ministério Público ajuizou ação socioeducativa (apuração de ato infracional) em face de Beatriz no Juízo da Infância e Juventude. Regina, assistida por advogado, pediu para extrair cópia integral dos autos do processo de apuração de ato infracional. A requerente justificou seu pedido afirmando que irá ajuizar ação cível de deserdação contra Beatriz e, para tanto, necessita dos documentos do processo para embasar o seu pedido. O Juízo da Infância e Juventude negou o pedido afirmando que o art. 143 do ECA proíbe a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional. 

Agiu corretamente o magistrado? NÃO. Vamos entender com calma. 

Inicialmente, é importante ressaltar que, de fato, é vedada a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a quem se atribui autoria de ato infracional. É o que prevê o art. 143 do ECA: 

Art. 143. É vedada a divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional. Parágrafo único. Qualquer notícia a respeito do fato não poderá identificar a criança ou adolescente, vedando-se fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco, residência e, inclusive, iniciais do nome e sobrenome. 

Essa vedação se encerra se o adolescente atingir a maioridade permanecendo em cumprimento de medida socioeducativa? 

NÃO. A vedação continua com seus efeitos em face do adolescente que atinge a maioridade e permanece cumprindo medida socioeducativa, pois lhe é estendido o princípio da proteção integral. Nesse sentido: 

“Essa vedação não se encerra se o adolescente atingir a maioridade e permanecer em cumprimento de medida socioeducativa, pois lhe é estendida a prescrição legal em virtude do Metaprincípio da Proteção Integral, mantendo-se, assim, hígida a tutela estatutária dos seus direitos fundamentais, tal como o direito ao respeito” (SEABRA, Gustavo Cives. Manual de Direito da Criança e do Adolescente. Belo Horizonte: CEI, 2021, p. 344). 

A violação do art. 143 do ECA caracteriza dano moral? SIM. Confira os seguintes julgados do STJ: 

Tratando-se de matéria veiculada pela imprensa, a responsabilidade civil por danos morais exsurge quando o texto publicado extrapola os limites da informação, evidenciando a intenção de injuriar, difamar e caluniar terceiro (REsp 1390560/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/10/2013, DJe 14/10/2013). 

Caracterização automática do abuso do direito de informar na hipótese de publicação do nome e da imagem de menor morto, atribuindo-lhe autoria de ato infracional, violando o princípio da proteção integral da criança e adolescente, positivado nos artigos 143 e 247 do ECA. STJ. 3ª Turma. AgRg no REsp 1354696/PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 23/10/2014. 

A preservação da imagem e da intimidade dos menores, em tenra idade ou prestes a alcançar a maturidade, é reflexo do comando constitucional da sua proteção integral, com absoluta prioridade em assegurar seus direitos fundamentais (arts. 227, da CF/88, 4º do ECA). Independente do grau da reprovabilidade da conduta do menor, o Ordenamento Jurídico veda a divulgação de imagem de adolescentes a quem se atribua a autoria de ato infracional, de modo a preservar a sensível e peculiar condição de pessoa em desenvolvimento. STJ. 3ª Turma. REsp 1442083/ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 21/09/2017. 

Existe alguma infração administrativa, caso não seja observado o art. 143 do ECA? 

SIM. É a infração administrativa tipificada no art. 247 do ECA: 

Art. 247. Divulgar, total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo ou judicial relativo a criança ou adolescente a que se atribua ato infracional: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. § 1º Incorre na mesma pena quem exibe, total ou parcialmente, fotografia de criança ou adolescente envolvido em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga respeito ou se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de forma a permitir sua identificação, direta ou indiretamente. § 2º Se o fato for praticado por órgão de imprensa ou emissora de rádio ou televisão, além da pena prevista neste artigo, a autoridade judiciária poderá determinar a apreensão da publicação ou a suspensão da programação da emissora até por dois dias, bem como da publicação do periódico até por dois números. (Expressão declarada inconstitucional pela ADIN 869). 

A vedação contida no art. 143 do ECA é relativa ou absoluta? 

É relativa. O art. 144 do ECA mitiga a vedação contida no art. 143: 

Art. 144. A expedição de cópia ou certidão de atos a que se refere o artigo anterior somente será deferida pela autoridade judiciária competente, se demonstrado o interesse e justificada a finalidade. 

Assim, demonstrado interesse jurídico e justificada a finalidade, é cabível a extração de cópias dos autos de apuração de ato infracional. No caso, a vítima do ato infracional comprovou seu interesse jurídico e apresentou finalidade justificada ao pleitear o seu acesso aos autos do processo de apuração do ato infracional, consignando a utilidade dos documentos nele produzidos para servirem como provas em ação de deserdação. 

Em suma: Demonstrado interesse jurídico e justificada a finalidade, é cabível a extração de cópias dos autos da apuração de ato infracional, não se podendo, no entanto, utilizar os documentos obtidos para fins diversos do que motivou o deferimento de acesso aos autos. STJ. 6ª Turma. RMS 65.046-MS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 01/06/2021 (Info 699). 

 

24 de junho de 2021

A regra que estabelece a diferença mínima de 16 (dezesseis) anos de idade entre adotante e adotando (art. 42, § 3º do ECA) pode, dada as peculiaridades do caso concreto, ser relativizada no interesse do adotando.

Processo

REsp 1.338.616-DF, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 15/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Adoção unilateral socioafetiva. Diferença mínima de 16 anos de idade entre adotante e adotando. Peculiaridades do caso concreto. Art. 42, § 3º, do ECA. Relativização. Possibilidade.

 

Destaque

A regra que estabelece a diferença mínima de 16 (dezesseis) anos de idade entre adotante e adotando (art. 42, § 3º do ECA) pode, dada as peculiaridades do caso concreto, ser relativizada no interesse do adotando.

Informações do Inteiro Teor

Inicialmente, não se pode olvidar que a intenção do legislador, ao fixar uma diferença mínima de 16 (dezesseis) anos de idade entre o adotando e o adotante, foi, além de tentar reproduzir - tanto quanto possível - os contornos da família biológica padrão, evitar que a adoção camuflasse motivos escusos, onde a demonstração de amor paternal para com o adotando mascarasse/escondesse interesse impróprio.

Entretanto a referida limitação etária, em situações excepcionais e específicas, não tem o condão de se sobrepor a uma realidade fática - há muito já consolidada - que se mostrar plenamente favorável, senão ao deferimento da adoção, pelo menos ao regular processamento do pedido, pelo que o regramento pode ser mitigado, notadamente quando, após a oitiva das partes interessadas, sejam apuradas as reais vantagens ao adotando e os motivos legítimos do ato.

Assim, o dispositivo legal atinente à diferença mínima etária estabelecida no art. 42, § 3º do ECA, embora exigível e de interesse público, não ostenta natureza absoluta a inviabilizar sua flexibilização de acordo com as peculiaridades do caso concreto, pois consoante disposto no artigo 6º do ECA, na interpretação da lei deve-se levar em conta os fins sociais a que se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

O aplicador do Direito deve adotar o postulado do melhor interesse da criança e do adolescente como critério primordial para a interpretação das leis e para a solução dos conflitos. Ademais, não se pode olvidar que o direito à filiação é personalíssimo e fundamental, relacionado, pois, ao princípio da dignidade da pessoa humana.

No caso, o adotante é casado, por vários anos, com a mãe do adotando, razão por que esse se encontra na convivência com aquele desde tenra idade; o adotando possui dois irmãos que são filhos de sua genitora com o adotante, motivo pelo qual pode a realidade dos fatos revelar efetiva relação de guarda e afeto já consolidada no tempo, merecendo destaque a peculiaridade de tratar-se, na hipótese, de adoção unilateral, circunstância que certamente deve importar para a análise de uma possível relativização da referência de diferença etária.

A justa pretensão de fazer constar nos assentos civis do adotando, como pai, aquele que efetivamente o cria e educa juntamente com sua mãe, não pode ser frustrada por apego ao método de interpretação literal, em detrimento dos princípios em que se funda a regra em questão ou dos propósitos do sistema do qual faz parte.

Ademais, frise-que a presente deliberação não está sacramentando a adoção em foco, uma vez que, na instância de origem, o processo se submeterá a toda instrução e coleta de provas, cabendo, então, ao juiz instrutor da causa averiguar se são satisfatórias todas as demais circunstâncias inerentes ao caso.

Diante do norte hermenêutico estabelecido por doutrina abalizada e da jurisprudência que se formou acerca da mitigação de regras constantes do ECA quando em ponderação com os interesses envolvidos, a regra prevista no art. 42, § 3º do ECA, no caso concreto, pode ser interpretada com menos rigidez, sobretudo quando se constata que a adoção visa apenas formalizar situação fática estabelecida de forma pública, contínua, estável, concreta e duradoura.


https://youtu.be/jzWeh0mog18?t=18020



8 de junho de 2021

Demonstrado interesse jurídico e justificada a finalidade, é cabível a extração de cópias dos autos da apuração de ato infracional, não se podendo, no entanto, utilizar os documentos obtidos para fins diversos do que motivou o deferimento de acesso aos autos.

 RMS 65.046-MS, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 01/06/2021.

Apuração de ato infracional. Segredo de justiça. Pleito de acesso aos autos pela vítima. Instrução de ação de deserdação. Interesse jurídico. Finalidade justificada. Extração de cópias. Possibilidade.

Demonstrado interesse jurídico e justificada a finalidade, é cabível a extração de cópias dos autos da apuração de ato infracional, não se podendo, no entanto, utilizar os documentos obtidos para fins diversos do que motivou o deferimento de acesso aos autos.


O art. 143 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, como regra geral, a vedação à divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito à apuração de atos infracionais. Esta disposição, em primeiro juízo, obsta o acesso de terceiros aos referidos autos.

Todavia, a vedação contida no art. 143 do Estatuto da Criança e do Adolescente não é absoluta, sendo mitigada, conforme se extrai do art. 144 deste mesmo diploma normativo, nas hipóteses em que há interesse jurídico e justificada finalidade no pleito de acesso aos autos. Nesse caso, presentes interesse e finalidade justificados, deverá a autoridade judiciária deferir a extração de cópias ou certidões dos atos do processo infracional.

No caso, a vítima do ato infracional comprovou seu interesse jurídico e apresentou finalidade justificada ao pleitear o seu acesso aos autos do processo de apuração do ato infracional, consignando a utilidade dos documentos nele produzidos para servirem como provas em ação de deserdação.

Uma vez que o Estatuto da Criança e do Adolescente exige a justificação da finalidade para a qual se defere o pleito de acesso aos autos e de extração de cópias do processo de apuração de ato infracional, é certo que a concessão do pedido está vinculada a esta finalidade (no caso, instrução de ação de deserdação), não se podendo utilizar os documentos obtidos para finalidade diversa, sob pena de responsabilização cível e penal.

17 de abril de 2021

AÇÃO CIVIL PÚBLICA; DIREITOS INFANTO-JUVENIS; REMOÇÃO DA INTERNET DE CONTEÚDOS VIOLADORES; LIBERDADE DE EXPRESSÃO E LIBERDADE RELIGIOSA; LIMITES CONSTITUCIONAIS; RESPEITO AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES; MEDIDA LIMINAR MANTIDA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. "DISCIPLINA COM VARA". IMPOSSIBILIDADE. DESCONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E O ECA. MANUTENÇÃO DA LIMINAR DEFERIDA. 1- Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público em face da agravante e outros, com pedido liminar, visando à remoção de conteúdos violadores de direitos infanto-juvenis. Livro e conteúdos na internet que estimulam a promoção de castigos físicos pelos pais como método de educação de crianças e adolescentes, com justificativa religiosa. 2. A liberdade de expressão e a liberdade religiosa, asseguradas constitucionalmente, não são valores absolutos, encontram limites estabelecidos na própria Constituição e em outros valores constitucionalmente protegidos, como o respeito aos direitos fundamentais das crianças e adolescentes. 3. Nos termos do art. 227 da Constituição Federal, é dever, não apenas da família, mas também da sociedade e do Estado, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à dignidade e ao respeito, além de colocá-los a salvo de toda forma de violência, crueldade e opressão. 4. É possível extrair, de alguns capítulos do livro "O Que Toda Mãe Gostaria de Saber Sobre Disciplina Bíblica", incentivo ao castigo físico sob o pretexto de disciplinar os filhos, como, por exemplo, o trecho do Capítulo 11 "Como usar a vara - a correção física propriamente dita" e demais conteúdos disponibilizados na internet com o mesmo teor. 5. Havendo abuso no exercício da liberdade de expressão em detrimento ao respeito, dignidade e condição peculiar da criança e do adolescente, como pessoas em desenvolvimento, o Estado deve se valer de todos os meios lícitos para garanti-los, afigurando-se correta a decisão recorrida quanto à necessidade de exclusão dos conteúdos inapropriados, bem como no sentido de que a comercialização do livro só será legítima se os trechos abusivos forem retirados. 6. Ante a presença dos requisitos autorizadores da liminar pleiteada, impõe-se a manutenção da decisão agravada, nos termos do verbete sumular nº 58 da jurisprudência desta Corte: "Somente se reforma a concessão ou indeferimento de liminar, se teratológica, contrária à Lei ou à evidente prova dos autos". NEGATIVA DE PROVIMENTO AO RECURSO.



0051737-42.2020.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO

VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL

Des(a). MÔNICA DE FARIA SARDAS - Julg: 10/12/2020 - Data de Publicação: 14/12/2020

AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE; FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA; SOBREPOSIÇÃO AO VÍNCULO BIOLÓGICO; PROTEÇÃO AO INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA

APELAÇÃO. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADO. ROL DE TESTEMUNHAS NÃO APRESENTADO. PRECLUSÃO. ASSENTAMENTO REALIZADO VOLUNTARIAMENTE PELO AUTOR. IRRETRATABILIDADE DO ATO JURÍDICO. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.604 DO CÓDIGO CIVIL. FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA QUE SE SOBREPÕE AO VÍNCULO BIOLÓGICO. PROTEÇÃO AO INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 1. Trata-se de ação negatória de paternidade em que postula o autor a exclusão de seu nome do registro civil de nascimento do réu, por não ser o pai biológico do menor. 2. Cerceamento de defesa afastado, eis que o autor postulou especialmente a prova pericial referente ao exame de DNA e deixou de apresentar rol de testemunhas, conforme informado na petição inicial, manifestando a necessidade da prova testemunhal, somente após a sentença de improcedência, em sede de apelação. 3. Os assentamentos no Registro Civil são atos jurídicos cuja reversibilidade somente se afigura possível diante da comprovação da existência de vício de consentimento (erro, dolo, coação). 4. Autor que livre, consciente e voluntariamente manifestou a vontade de ser pai, declarando-se como tal ao registrar o menor, vindo a alegar ter sido induzido a erro pela mãe da criança. 5. O reconhecimento dos filhos havidos na constância de relacionamento é irrevogável, sendo aqui o registro civil fruto genuíno de manifestação de vontade livre de vícios de qualquer natureza, ficando afastada a possibilidade de invalidação do ato jurídico por mera conveniência, uma vez que o autor veio a contestar a paternidade apenas após o fim do relacionamento com a genitora do menor. 6. Conjunto probatório que demonstra a existência de relação socioafetiva ao longo dos anos de convivência do autor com o filho. 7. Posse do estado de filho pelo menor por mais de sete anos, por força do ato de registro do pai que assim se declarou, sendo que o vínculo afetivo entre os mesmos não se desfaz em função do resultado de exame DNA negativo, atraindo a tutela do direito fundamental à dignidade humana. 8. Vínculo socioafetivo publicamente consentido que se sobrepõe ao vínculo biológico clandestino, impondo a prevalência do interesse superior do menor e a proteção a seus direitos da personalidade, especialmente a manutenção do vínculo de filiação, o direito ao nome de família e o status familiar, que não podem sucumbir aos conflitos de ordem interfamiliar e suas intermitentes conveniências. 9. Desprovimento do recurso.



0061222-25.2015.8.19.0038 - APELAÇÃO

DÉCIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL

Des(a). ELTON MARTINEZ CARVALHO LEME - Julg: 01/12/2020 - Data de Publicação: 03/12/2020

11 de abril de 2021

DIREITO CONSTITUCIONAL – COMUNICAÇÃO SOCIAL: É constitucional legislação estadual que proíbe toda e qualquer atividade de comunicação comercial dirigida às crianças nos estabelecimentos de educação básica

 DIREITO CONSTITUCIONAL – COMUNICAÇÃO SOCIAL

 

Regulamentação de publicidade dirigida às crianças em estabelecimentos de educação básica - ADI 5631/BA 

 

Resumo:

 

É constitucional legislação estadual que proíbe toda e qualquer atividade de comunicação comercial dirigida às crianças nos estabelecimentos de educação básica.

Os estados federados têm competência legislativa para restringir o alcance da publicidade dirigida à criança enquanto estiverem nos estabelecimentos de educação básica. Essa restrição promove a proteção da saúde de crianças e adolescentes, dever que a própria Constituição Federal (CF) define como sendo de absoluta prioridade. A limitação, tal como disposta na legislação estadual impugnada [Lei 13.582/2016 do estado da Bahia (1), alterada pela Lei 14.045/2018 (2)], implica restrição muito leve à veiculação de propaganda, porquanto circunscrita ao local para o qual é destinada, delimitada apenas a alguns produtos e a um público ainda mais reduzido.

   As restrições à liberdade de expressão comercial podem ser aplicadas especialmente no ambiente escolar. Ademais, a Organização Mundial da Saúde (OMS), por meio da Resolução 63.14/2010, adotou uma série de recomendações dirigidas aos Estados, a fim de que regulem a publicidade de bebidas não-alcoólicas e de alimentos ricos em gorduras e açúcares. As recomendações, baseadas em evidências científicas, foram acompanhadas de um relatório técnico para auxiliar os Estados. Nele, a OMS recomenda, por exemplo, que os locais onde as crianças se reúnem devem ser livres de todas as formas de publicidade de alimentos ricos em gorduras saturadas, gorduras trans, açúcares ou sódio. Esses locais incluem, mas não se limitam a eles, escolas e suas mediações, clínicas e serviços pediátricos, eventos esportivos e atividades culturais.

A racionalidade trazida pela recomendação é evidente: essas instituições agem como in loco parentis, ou seja, no lugar dos pais. Não existe nesses locais a possibilidade de os pais ou os responsáveis pelas crianças desligarem a televisão ou o rádio. Os pais não estão presentes fisicamente. Por isso, como afirma a recomendação, “dentro da escola, o bem-estar nutricional das crianças deve ser a pedra angular”.

Com base nesse entendimento, o Plenário julgou improcedente o pedido de declaração de inconstitucionalidade da Lei 13.582/2016 do estado da Bahia, com as alterações implementadas pela Lei 14.045/2018.

(1) Lei 13.582/2016 do estado da Bahia: “Art. 1º - Fica proibida no Estado da Bahia a publicidade, dirigida a crianças, de alimentos e bebidas pobres em nutrientes e com alto teor de açúcar, gorduras saturadas ou sódio. § 1º - A vedação se estenderá no período compreendido entre 06 (seis) e 21 (vinte e uma) horas, no rádio e televisão, e em qualquer horário nas escolas públicas e privadas. § 2º - Fica impedida a utilização de celebridades ou personagens infantis na comercialização, bem como a inclusão de brindes promocionais, brinquedos ou itens colecionáveis associados à compra do produto. Art. 2º - A publicidade durante o horário permitido deverá vir seguida de advertência pública sobre os males causados pela obesidade. Art. 3º - Em caso de descumprimento das restrições apresentadas nos artigos antecedentes, o infrator estará sujeito às penas de: I – multa; II - suspensão da veiculação da publicidade; III - imposição de contrapropaganda. § 1º - O Estado providenciará, na forma do regulamento, a graduação da pena de multa de acordo com a gravidade. § 2º - A contrapropaganda será divulgada pelo responsável da mesma forma, frequência e dimensão e, preferencialmente, no mesmo veículo, local, espaço e horário, de forma capaz de desfazer o malefício e informar as crianças sobre o mal ocasionado pelo consumo dos alimentos indicados no artigo 1º. § 3º - A pena de multa, suspensão da veiculação da publicidade e imposição de contrapropaganda será aplicada pela administração, mediante procedimento administrativo, assegurados o contraditório e ampla defesa. § 4º - As sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar antecedente ou incidente de procedimento administrativo. Art. 4º - Entende-se por publicidade qualquer forma de veiculação do produto ou marca, seja de forma ostensiva ou implícita em programas dirigidos ao público infantil. Art. 5º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

(2) Lei 14.045/2018 do estado da Bahia: “Art. 1º   - Esta Lei altera a Lei nº 13.582, de 14 de setembro de 2016, para dispor sobre a publicidade infantil nos estabelecimentos de ensino de educação básica no Estado da Bahia. Art. 2º   - A Lei nº 13.582, de 14 de setembro de 2016, passa a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art. 1º - Fica proibida, no Estado da Bahia, a comunicação mercadológica dirigida às crianças nos estabelecimentos de educação básica. Art. 3º - ... § 3º - A pena de multa e a suspensão da veiculação da publicidade serão aplicadas pela administração, mediante procedimento administrativo, assegurada ampla defesa e contraditório; Art. 4º - Por comunicação mercadológica entende-se toda e qualquer atividade de comunicação comercial, inclusive publicidade, para a divulgação de produtos, serviços, marcas e empresas independentemente do suporte, da mídia ou do meio utilizado.’Art. 3º   - Ficam revogados o § 1º do artigo 1º; o artigo 2º; o inciso III do artigo 3º e os §§ 2º do artigo 3º; da Lei nº 13.582, de 14 de setembro de 2016. Art. 4º   - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. ”

ADI 5631/BA, relator Min. Edson Fachin, julgamento em 25.3.2021