Fonte: Dizer o Direito
Referência: https://www.dizerodireito.com.br/2019/12/sumula-638-do-stj-comentada.html
Foi aprovada recentemente a Súmula 638 do STJ, com a seguinte redação:
Súmula 638-STJ: É abusiva a cláusula contratual que restringe a responsabilidade de instituição financeira pelos danos decorrentes de roubo, furto ou extravio de bem entregue em garantia no âmbito de contrato de penhor civil.
CLÁUSULAS ABUSIVAS
É nula a cláusula que limite o valor da indenização na hipótese de eventual furto, roubo ou
extravio do bem empenhado
Súmula 638-STJ: É abusiva a cláusula contratual que restringe a responsabilidade de
instituição financeira pelos danos decorrentes de roubo, furto ou extravio de bem entregue
em garantia no âmbito de contrato de penhor civil.
STJ. 2ª Seção. Aprovada em 27/11/2018, DJe 5/12/2018.
Penhor civil
Penhor é o direito real pelo qual o devedor ou terceiro transfere ao credor, em garantia do débito, a posse
de uma coisa móvel.
A coisa dada em penhor é “empenhada” ou “apenhada”.
Não se pode confundir penhor (garantia real) com penhora (ato do processo de execução).
Penhor de joias
A Caixa Econômica Federal oferece uma forma de conferir empréstimo de modo mais ágil e sem
burocracia. Trata-se do empréstimo com penhor.
A pessoa interessada em obter um empréstimo procura a CEF e obtém o empréstimo, oferecendo, como
garantia, joias, pedras preciosas, canetas, relógios etc.
Quando a pessoa paga o empréstimo, recebe de volta o bem empenhado.
Se o mutuário não quitar o empréstimo, a coisa apenhada é leiloada.
Imagine agora a seguinte situação hipotética:
Pedro, precisando de dinheiro, resolve tomar um empréstimo na CEF e, como garantia, entrega o seu anel
de formatura.
No contrato assinado, havia uma cláusula que dizia que, em caso de roubo, furto ou extravio da joia
empenhada, a CEF deveria pagar ao mutuário, a título de danos materiais e morais, o valor máximo de 1,5
vezes da quantia pela qual foi avaliado o bem. Ex: se o bem tivesse sido avaliado em R$ 10 mil, a CEF
pagaria, no máximo, R$ 15 mil de indenização.
Uma semana após Pedro dar o bem em garantia, houve um furto na agência da CEF e levaram o anel, que
estava guardado em um cofre.
A CEF deverá indenizar Pedro por esse furto?
SIM. O furto ocorrido deve ser entendido como fortuito interno, inerente à atividade explorada pelo
banco. Assim, a instituição financeira é responsável por furtos ou mesmo roubos em seus cofres (STJ. 4ª
Turma. REsp 1.250.997/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 5/2/2013).
Essa cláusula que limita o valor da indenização é válida?
NÃO. O CDC prevê, em seu art. 51, I:
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento
de produtos e serviços que: I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer
natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações
de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada,
em situações justificáveis;
No contrato de penhor celebrado com a Caixa, é notória a hipossuficiência do consumidor, pois este,
necessitando de empréstimo, apenas adere a um contrato cujas cláusulas são inegociáveis, submetendose, inclusive, à avaliação unilateral realizada pela instituição financeira. Vale ressaltar que, comumente, a
avaliação é inferior ao preço cobrado do consumidor no mercado varejista de joias.
Ao aceitar dar em penhor sua joia pessoal, o consumidor demonstra não estar interessado em vender esse
bem empenhado, preferindo transferir apenas a posse temporária dela à instituição financeira, em
garantia de um empréstimo. Pago o empréstimo, ele tem plena expectativa de ter de volta seu bem. Isso
revela que, em regra, o mutuário possui uma relação afetiva com a coisa apenhada.
O que fazer, então, no caso concreto?
O juiz deverá reconhecer que a cláusula é nula de pleno direito, nos termos do art. 51, I, do CDC, devendo
condenar à CEF a pagar um valor justo de indenização, que atenda estritamente aos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade.
Deve-se salientar que, além dos danos materiais, a CEF deverá ser condenada a pagar também danos
morais, uma vez que, conforme já salientado, o consumidor que decide pelo penhor assim o faz
pretendendo receber o bem de volta, e, para tanto, confia que o mutuante o guardará pelo prazo ajustado.
Se a coisa empenhada fosse para o proprietário um bem qualquer, sem nenhum valor sentimental,
provavelmente o consumidor optaria pela venda da joia, e, certamente, obteria um valor maior.
Qual é o prazo prescricional para o ajuizamento dessa ação de indenização?
5 anos, nos termos do art. 27 do CDC:
Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do
produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a
partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
O furto das joias, objeto do penhor, constitui falha do serviço prestado pela instituição financeira, devendo
incidir o prazo prescricional de 5 anos para a ação de indenização, conforme previsto no art. 27 do CDC.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.369.579-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 24/10/2017 (Info 616).