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15 de novembro de 2021

É formal e materialmente constitucional a LC 144/2014 (de iniciativa parlamentar), que modificou a LC 51/85, tratando sobre a aposentadoria dos policiais, com critérios mais favoráveis

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-1027-stf.pdf 


PROCESSO LEGISLATIVO É formal e materialmente constitucional a LC 144/2014 (de iniciativa parlamentar), que modificou a LC 51/85, tratando sobre a aposentadoria dos policiais, com critérios mais favoráveis

É formalmente constitucional lei complementar — cujo processo legislativo teve origem parlamentar — que contenha regras de caráter nacional sobre a aposentadoria de policiais. É constitucional a adoção — mediante lei complementar — de requisitos e critérios diferenciados em favor dos policiais para a concessão de aposentadoria voluntária. 

STF. Plenário. ADI 5241/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/8/2021 (Info 1027).

LC 144/2014 

A Lei Complementar nº 144/2014 tratou sobre a aposentadoria do servidor público policial, nos termos do § 4º do art. 40 da Constituição Federal. Vale ressaltar que a LC 144/2014 foi fruto de um projeto de lei de iniciativa parlamentar. Antes de verificar o que decidiu o STF, cumpre fazer algumas perguntas relacionadas com o tema. 

Os policiais têm direito à aposentadoria especial? 

SIM. Os policiais são servidores que exercem atividades de risco. Logo, possuem direito à aposentadoria especial. A previsão constitucional para isso estava no art. 40, § 4º, II, da CF/88 e, depois da EC 103/2019, encontrase no art. 40, § 4º-B: 

Art. 40 (...) 

§ 4º É vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios em regime próprio de previdência social, ressalvado o disposto nos §§ 4º-A, 4º-B, 4º-C e 5º. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019) (...) 

§ 4º-B. Poderão ser estabelecidos por lei complementar do respectivo ente federativo idade e tempo de contribuição diferenciados para aposentadoria de ocupantes do cargo de agente penitenciário, de agente socioeducativo ou de policial dos órgãos de que tratam o inciso IV do caput do art. 51, o inciso XIII do caput do art. 52 e os incisos I a IV do caput do art. 144. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103/2019) 

Existe Lei Complementar regulando essa aposentadoria especial dos policiais? 

SIM. Trata-se da Lei Complementar nº 51/85. Segundo o STF, a LC 51/85 foi recepcionada pela CF/88, considerando que os policiais exercem atividade que se enquadra no critério de perigo ou risco, estando, portanto, em harmonia com o inciso II do § 4º do art. 40 da CF/88 (na época ainda em vigor). Nesse sentido: ADI 3817, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 13/11/2008. 

O que a LC 144/2014 modificou? 

A LC 144/2014 alterou dois pontos da LC nº 51/85: I – a ementa; II – o art. 1º. 

Vejamos:  

Antes 

Dispõe sobre a aposentadoria do funcionário policial, nos termos do art. 103, da Constituição Federal.


Depois da LC 144/14

Dispõe sobre a aposentadoria do servidor público policial, nos termos do § 4º do art. 40 da Constituição Federal. 

Desse modo, a LC 144/2014 impôs expressamente duas conclusões: 

• Os servidores policiais têm direito à aposentadoria especial prevista no art. 40, § 4º da CF; 

• A aposentadoria especial dos servidores policiais é regulada pela LC 51/85. 


Antes 

Art. 1º O funcionário policial será aposentado: 

II - compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, aos 65 anos (sessenta e cinco) anos de idade, qualquer que seja a natureza dos serviços prestados. 


ATUALMENTE (com a LC 144/14) 

Art. 1º O servidor público policial será aposentado: 

II - voluntariamente, com proventos integrais, independentemente da idade: 

a) após 30 (trinta) anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, 20 (vinte) anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se homem; 

b) após 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, 15 (quinze) anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se mulher. 


Quanto aos requisitos da aposentadoria especial dos policiais, houve uma única alteração: 

A policial do sexo feminino passou a se aposentar voluntariamente com 5 anos a menos que os policiais do sexo masculino. 

Essa previsão de tratamento diferenciado é constitucional? 

SIM. A mulher apresenta diferenças biológicas em relação ao homem, razão pela qual são admitidas diferenciações em prol do sexo feminino, desde que proporcionais. Isso não ofende o art. 5º, I, da CF/88, que consagra uma igualdade material (e não meramente formal). Além disso, essa diferenciação dos critérios de aposentadoria entre homens e mulheres não é nova, estando prevista em alguns dispositivos da CF/88, como o art. 40, § 1º, III. 

ADI 

A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil – ADEPOL ajuizou ADI contra a LC 144/2014. A ADEPOL alegou que o dispositivo impugnado violou os arts. 1º, III; 2º; 3º, IV; 5º, I e LIV; 40, § 1º, II; 61, § 1º, c; 84, IV, da CF/88, incorrendo em inconstitucionalidade formal por usurpação de competência privativa do Presidente da República para propor lei de natureza complementar que disponha sobre o regime jurídico e a aposentadoria dos servidores públicos. Além disso, afirmou que a norma violaria a isonomia. 

Esses argumentos foram acolhidos pelo STF? 

NÃO. Vamos analisar com calma o que foi decidido. 

Iniciativa comum x iniciativa reservada 

A regra geral, no direito brasileiro, é que os projetos de lei podem ser apresentados por qualquer membro do Congresso Nacional ou por comissão de qualquer de suas Casas, bem como pelo Presidente da República, e, ainda, pelos cidadãos, no caso de iniciativa popular (art. 61, §2º, da CF/88). Trata-se daquilo que a doutrina especializada convencionou chamar de iniciativa comum, que, por estabelecer a mais ampla participação dos agentes estatais e da sociedade civil no processo legislativo, bem retrata o compromisso democrático e o caráter liberal do regime engendrado pela Assembleia Nacional Constituinte. Em relação a algumas matérias, contudo, a Constituição confia a determinados agentes políticos a prerrogativa de iniciar o processo legislativo. Fala-se, então, em iniciativa legislativa reservada ou privativa, estabelecida, sempre em caráter excepcional, com o propósito de garantir a separação de poderes ou a autonomia de determinadas entidades. Além disso, a reserva de iniciativa serve como mecanismo de aproveitamento da expertise que o gestor público acumula em seu campo de atuação, confiando-lhe a oportunidade de elaborar proposição legislativa a ser submetida ao Congresso Nacional. Vale ressaltar, contudo, que “a iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que, por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo, deve necessariamente derivar de norma constitucional expressa e inequívoca” (ADI-MC 724/RS, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 27/4/2001). Em outras palavras, os dispositivos constitucionais que tratam sobre a iniciativa reservada devem ser interpretados restritivamente porque eles excepcionam a regra geral. Tendo isso em mente, no caso concreto, o STF entendeu que a LC 144/2014 não violou a alínea “c” do art. 61, § 1º, II, da Constituição Federal: 

Art. 61. (...) 

§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: (...) II - disponham sobre: (...) c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; 

Isso porque a referida lei não teve por objetivo dispor sobre o regime jurídico dos servidores públicos da União. A LC 144/2014 teve o propósito de disciplinar assunto relacionado com a categoria de servidores policiais de todos os entes federativos. Logo, não se invadiu campo reservado à iniciativa privativa do Presidente da República, já que não se amolda ao art. 61, § 1º, II, “c”, da Constituição Federal. 

É formalmente constitucional lei complementar — cujo processo legislativo teve origem parlamentar — que contenha regras de caráter nacional sobre a aposentadoria de policiais. STF. Plenário. ADI 5241/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/8/2021 (Info 1027). 

Ausência de inconstitucionalidade material 

O STF entendeu que também não há inconstitucionalidade material da norma por suposta violação à isonomia, à dignidade humana e à igualdade ao diferenciar a idade dos servidores policiais para fins de aposentadoria. O próprio texto constitucional reconhece a situação particular dos agentes de segurança, permitindo que lei complementar atribua regras especiais de aposentadoria, conforme a atual redação do art. 40 da CF/88: 

Art. 40. O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial. (...) 

§ 4º É vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios em regime próprio de previdência social, ressalvado o disposto nos §§ 4º-A, 4º-B, 4º-C e 5º. (...) 

§ 4º-B. Poderão ser estabelecidos por lei complementar do respectivo ente federativo idade e tempo de contribuição diferenciados para aposentadoria de ocupantes do cargo de agente penitenciário, de agente socioeducativo ou de policial dos órgãos de que tratam o inciso IV do caput do art. 51, o inciso XIII do caput do art. 52 e os incisos I a IV do caput do art. 144. 

A respeito da diferenciação prevista no referido dispositivo constitucional, há de se ressaltar que são justificadas diferenciações entre indivíduos que se encontram em situações distintas. A LC 144/2014 respeita o princípio da proporcionalidade e garante o devido tratamento aos agentes de segurança pública envolvidos nas atividades de risco. Impende ressaltar que a constitucionalidade da Lei Complementar 51/1985, em sua redação anterior, foi reconhecida pelo STF (ADI 3.817, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 2.4.2009) e esse posicionamento foi posteriormente reforçado em sede de repercussão geral (RE 567.110, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 16.8.2010, Tema 26). 

É constitucional a adoção — mediante lei complementar — de requisitos e critérios diferenciados em favor dos policiais para a concessão de aposentadoria voluntária. STF. Plenário. ADI 5241/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/8/2021 (Info 1027). 

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente o pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada em face do art. 1º, II, da LC 51/85, na redação dada pela LC 144/2014.