RECURSO ESPECIAL Nº 1.630.199 - RS (2012/0223295-1)
RELATOR : MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA
EMENTA
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONDOMÍNIO. AÇÃO
DE PROCEDIMENTO COMUM AJUIZADA POR LOCATÁRIO. PRETENSÃO
VINCULADA À RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE O PROPRIETÁRIO LOCADOR E
O ESTABELECIMENTO COMERCIAL. ILEGITIMIDADE ATIVA
RECONHECIDA NA ORIGEM. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE
SUCUMBÊNCIA. RAZOABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
1. Nos termos do art. 18 do CPC/2015, correspondente ao art. 6º do
CPC/1973, "ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo
quando autorizado pelo ordenamento jurídico". Não existe norma que
confira ao locatário legitimidade para atuar em Juízo na defesa dos
interesses do condômino locador.
2. O vínculo obrigacional estabelecido no contrato de locação dá-se entre o
inquilino e o locador.
3. A convenção realizada entre os particulares transfere a posse direta do
imóvel e, eventualmente, o dever de arcar com obrigações propter rem, de
titularidade do proprietário, mas não sub-roga o inquilino em todos os
direitos do condômino perante o condomínio.
4. No caso específico dos autos, a pretensão autoral está embasada em
ocorrências inerentes à relação jurídica estabelecida entre o proprietário e
o condomínio.
5. O locatário não possui legitimidade para ajuizar ação contra o
condomínio, no intuito de questionar o descumprimento de regra estatutária,
a ausência de prestação de contas e a administração de estabelecimento
comercial, cujo reconhecimento resultaria na necessidade de adequações
de cota condominial e recomposição de prejuízos financeiros.
6. Não havendo condenação, o valor dos honorários advocatícios deve ser
arbitrado consoante apreciação equitativa do juiz, na forma prevista pelo
art. 20, § 4º, e observados os critérios das alíneas "a", "b" e "c" de seu § 3º,
todos do CPC/1973, dispositivos aplicáveis ao caso.
7. No presente feito, o valor da verba honorária observou os parâmetros
legais e os critérios de proporcionalidade e razoabilidade.
8. Recurso especial a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial,
nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Buzzi (Presidente),
Luis Felipe Salomão, Raul Araújo e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília-DF, 05 de agosto de 2021 (Data do Julgamento)
Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA
Relator
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA (Relator): Na
origem, NOEMIA ANA GASPERIN ME e LOURDES N. F. FARINA ajuizaram ação de
reparação de danos contra SHOPPING CENTER BENTO GONÇALVES.
As autoras se qualificaram, na petição inicial, como locatárias de loja
pertencente a terceira pessoa, situada no estabelecimento comercial requerido. Afirmaram
que o réu, desde a inauguração do empreendimento, teria praticado irregularidades e
ilegalidades na administração, consistentes na adoção de critérios equivocados de
despesas condominiais, falta de regular prestação de contas e locação indevida de
espaço de uso comum, sem contabilização na receita condominial. Alegaram haver
indevida exoneração de multas e encargos de condôminos inadimplentes, além de
equívoco no rateio das despesas, considerando a área das unidades e a área total do
shopping. O demandado tampouco estaria cumprindo cláusula estatutária prevendo
variedade de lojas no local, reduzindo a visitação de clientes e causando prejuízo às
requerentes.
Argumentaram que a responsabilidade pelo pagamento do condomínio e de
seus encargos é do proprietário da unidade, mas, no caso de locação, "essa obrigação
pode ser transferida ao locatário, permanecendo com o proprietário a obrigação solidária
de adimplir tais despesas" (e-STJ fl. 4).
Pediram a correção da cota condominial em proporção à área da loja
locada, abatimento e restituição de valores, além da reparação de danos materiais e
morais.
O Magistrado de primeira instância julgou extinto o feito, sem resolução do
mérito, por ilegitimidade ativa, na forma do artigo 267, inciso VI, do CPC/1973, sobrevindo
apelação, à qual se negou provimento, por acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do
Rio Grande do Sul assim ementado (e-STJ fl. 1.082):
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. CONDOMÍNIO.
LOCATÁRIO. ILEGITIMIDADE ATIVA. EXTINÇÃO DO FEITO COM FUNDAMENTO
NO ARTIGO 267, INCISO VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
Pretendendo as autoras, locatárias de loja no Shopping Center demandado, com a
presente ação, na verdade, inserir-se no âmbito das decisões do condomínio,
adotadas tanto pelo demandado na condição de administrador, quanto pela
assembleia de condôminos, afirmando-as irregulares, não possuem legitimidade para o feito, pois buscam questionar a forma pela qual a coisa comum é gerida,
cabendo ao condômino-locador toda e qualquer irresignação.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Redução do valor estabelecido para os honorários
advocatícios.
DERAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME.
Os embargos de declaração opostos pelas recorrentes foram rejeitados
(e-STJ fls. 1.101/1.105).
Nas razões do especial (e-STJ, fls. 1.109/1.114), fundamentadas no art.
105, III, "a", da CF, apontam violação dos seguintes dispositivos legais, vinculados aos
respectivos argumentos:
(i) arts. 1.315 e 1.319 do CC/2002 e 3º e 267 do CPC/1973 – legitimidade
ativa:
Ao contrário do entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul, as Autoras são partes legítimas para figurar no pólo ativo da
demanda que visa a reparação pelos danos advindos das irregularidade praticadas
pelo Recorrido.
Na qualidade de locatárias, as Autoras arcaram com as despesas condominiais e
suportaram as abusividades praticadas pelo Demandado, de modo que assumiram
todas as obrigações do proprietário do imóvel com relação ao condomínio, como
demonstrou a prova oral e pericial produzida, sendo legítimas interessadas a
pleitear a condenação do Réu.
As ilegalidades praticadas pelo Condomínio são sentidas diretamente pelo
locatário, possuidor direto da unidade condominial, por isso, consectária sua
legitimidade ativa.
A jurisprudência tem se manifestado no sentido de que locatário, quando se
responsabiliza por todas as despesas do condomínio, é parte legítima para propor
ações envolvendo a cobrança ou a discussão de valores relativos ao condomínio,
(e-STJ fl. 1.111)
(ii) art. 20 do CPC/1973 – honorários:
A decisão vergastada também viola ao artigo 20, do CPC já que, embora tenha
reduzido a verba honorária para R$5.000,00, tal montante revela-se exagerado, em
face do valor atribuído à causa. A manutenção da decisão afronta, por via direta, ao
disposto no artigo 20, § 3°, do Código de Processo Civil.
Ora, aplica-se à hipótese o estatuído no parágrafo 4°, do artigo 20, do CPC e,
assim, faz-se necessário redimensionar a verba honorária, fixando-se em valor
condizente com o zelo profissional e com a importância da causa.
Observado o que dispõe o artigo 20, § 4° do CPC, tendo em vista os honorários
advocatícios fixados em desacordo com o grau de zelo profissional despendido, a
natureza e importância da causa, o trabalho realizado e o tempo exigido para o
serviço, de fato, o valor dos honorários fixados extrapola os aspectos
mencionados.
Nessas circunstâncias, justifica-se plenamente a substituição da decisão,
reconhecendo-se a violação denunciada e reduzindo- se a verba honorária fixada.
(e-STJ fl. 1.113)
O recorrido apresentou contrarrazões (e-STJ fls. 1.121/1.129).
Indeferido o processamento do recurso especial (e-STJ fls. 1.133/1.137), foi
interposto o agravo (e-STJ fls. 1.141/1.154).
Contraminuta apresentada (e-STJ fls. 1.161/1.166).
Agravo convertido em recurso especial (e-STJ fl. 1.178).
É o relatório.
Decido.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA (Relator):
A
questão jurídica submetida a exame no presente recurso especial, em essência, diz
respeito à legitimidade ativa de locatário para ajuizar ação contra o condomínio, no intuito
de questionar o descumprimento de regra estatutária, a ausência de prestação de contas
e a administração de estabelecimento comercial, cujo reconhecimento resultaria na
necessidade de adequações de cota condominial e recomposição de prejuízos
financeiros.
Como visto, o Tribunal de Justiça manteve a sentença que havia declarado
a ilegitimidade ativa das autoras para julgar extinto o processo, consignando que estas,
"na condição de locatárias, não podem ser consideradas como condôminas para efeito de
legitimidade perante o demandado na condição de administrador, ou a assembléia de
condôminos, a fim de questionar em juízo a forma pela qual a coisa comum é gerida e a
natureza dos encargos cobrados com a intenção de nova fixação do valor do condomínio
em proporção à sua área locada, pois nenhum liame existe entre o condomínio e o
locatário" (e-STJ fl. 1.085).
Segundo o acórdão impugnado, as locatárias não mantêm relação
contratual com o shopping, mas com o locador da sala comercial. As reclamações do
inquilino a respeito de eventuais irregularidades na administração do condomínio
deveriam ser dirigidas ao proprietário da unidade locada para que este, na condição de
condômino, adotasse as providências necessárias.
As recorrentes sustentam que esse entendimento viola os arts. 1.315 e
1.319 do CC/2002 e 3º e 267 do CPC/1973, destacando que "arcaram com as despesas
condominiais e suportaram as abusividades praticadas pelo Demandado, de modo que
assumiram todas as obrigações do proprietário do imóvel com relação ao condomínio,
como demonstrou a prova oral e pericial produzida, sendo legítimas interessadas a
pleitear a condenação do Réu" (e-STJ fl. 1.111). Concluem que "as ilegalidades
praticadas pelo Condomínio são sentidas diretamente pelo locatário, possuidor direto da
unidade condominial, por isso, consectária sua legitimidade ativa" (e-STJ fl. 1.111).
Não há controvérsia quanto ao fato alegado no recurso, atinente à responsabilidade contratual das locatárias para responder pelos encargos do imóvel.
Incontroversa, de igual modo, a circunstância fixada no acórdão, de que as demandantes
buscam "cobrar do réu reparação por danos alegadamente sofridos em razão de
irregularidades e ações em desacordo com a legislação, praticadas pela Administração do
Shopping Center Bento Gonçalves, com a argumentação, em suma, de irregularidades no
rateio de despesas, dispensa de juros e encargos moratórios e falta de regular prestação
de contas" (e-STJ fl. 1.085).
Definidas essas premissas, cabe analisar se as autoras, ora recorrentes,
são dotadas de legitimidade para demandar contra o condomínio, em virtude dos fatos
narrados na petição inicial.
Entendo que o desfecho conferido ao caso deve ser mantido.
Nos termos do art. 18 do CPC/2015, correspondente ao art. 6º do
CPC/1973, "ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando
autorizado pelo ordenamento jurídico". Não existe norma que confira ao locatário
legitimidade para atuar em Juízo na defesa dos interesses do condômino locador.
A leitura dos autos evidencia que a pretensão autoral está embasada em
ocorrências inerentes à relação jurídica estabelecida entre o proprietário e o condomínio.
Com efeito, muito embora tenha se atribuído à ação o título de reparação
de danos, cuida-se, em verdade, de nítida pretensão dirigida ao ajuste de contas fundado
na má administração do estabelecimento comercial e na inobservância de obrigação
estabelecida na convenção do condomínio, resultando daí a pretensão reparatória.
Nessas condições, não aproveitam às autoras insurgentes os dispositivos
do Código Civil invocados no recurso especial (arts.1.315 e 1.319), que tratam de direitos
e deveres do condômino. Confiram-se:
Art. 1.315. O condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer para
as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que
estiver sujeita.
Parágrafo único. Presumem-se iguais as partes ideais dos condôminos.
(...)
Art. 1.319. Cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da
coisa e pelo dano que lhe causou.
O vínculo obrigacional estabelecido no contrato de locação se dá entre o
inquilino e o locador.
A convenção realizada entre os particulares transfere a posse direta do
imóvel e, eventualmente, o dever de arcar com obrigações propter rem, de titularidade do
proprietário, mas não sub-roga o inquilino em todos os direitos do condômino perante o
condomínio.
Cabe anotar, ainda nesse propósito, que a Terceira Turma desta Corte, ao analisar recurso semelhante ao presente, concluiu que o condômino, isoladamente, não
possui legitimidade para propor ação de prestação de contas contra o condomínio. Eis a
ementa do julgado:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. CONDOMÍNIO. PRESTAÇÃO DE
CONTAS. CARÊNCIA DA AÇÃO. CONDÔMINO. ILEGITIMIDADE ATIVA. ART. 22,
§ 1º, "f", DA LEI nº 4.591/1964. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. DOCUMENTOS
APRESENTADOS EXTRAJUDICIALMENTE.
1. O condômino, isoladamente, não possui legitimidade para propor ação de
prestação de contas, pois a obrigação do síndico é de prestar contas à
assembleia, nos termos do art. 22, § 1º, "f", da Lei nº 4.591/1964.
2. Faltará interesse de agir ao condômino quando as contas já tiverem sido
prestadas extrajudicialmente, porque, em tal hipótese, a ação judicial não terá
utilidade.
3. Recurso especial provido.
(REsp n. 1.046.652/RJ, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA,
TERCEIRA TURMA, julgado em 16/9/2014, DJe 30/9/2014)
Tomando por referência o citado precedente, admitindo-se, pois, que nem
mesmo o condômino proprietário pode exigir contas isoladamente do condomínio, por
maior razão não poderia o inquilino formular pedido dessa natureza, tal qual no caso
presente, conforme se colhe da petição inicial:
(i) Tais irregularidades representam-se pela adoção de critério equivocados no
rateio das despesas condominiais, indevida dispensa de juros e encargos
moratórios, falta de regular prestação de contas, além da locação de espaço
de uso comum, sendo que os valores auferidos não são contabilizados como
receita condominial, (e-STJ fl. 2 – grifei).
(ii) A cobrança desse valor foi justificada sob o argumento de que a festa serviria
para incrementar as vendas e locações das lojas, divulgando o empreendimento. O
Condomínio, todavia, a par de cobrar o valor dos codôminos, entre eles as autoras,
jamais prestou contas do evento, (e-STJ fl. 2 – grifei).
(iii) Diante da ausência de prestação de contas até esta data, as Autoras
postularam administrativamente junto ao Demandado. No entanto, não lograram
êxito, o que justifica a propositura da presente, (e-STJ fl. 2 – grifei).
(iv) Considerando que não houve prestação de contas até esta data, o
Demandado obriga-se a restituir os valores cobrados, razão pela qual postula a
devolução do valor de R$1.200,00, corrigido pelo IGP-M e juros de 12% ao ano,
desde maio/2001, (e-STJ fl. 3 – grifei).
(v) Nesse ponto requer, desde já, seja a demandada intimada a exibir todas as
contas de energia elétrica e o sistema de rate á das mesmas, sob as penas do
artigo 359, do Código de Processo Civil (e-STJ fl. 4 – grifei),
(vi) Apesar de já instado por diversas vezes, o Condomínio recusa-se a prestar as
contas mensalmente limitando-se apenas à exibição do mensal, sem exibir
os comprovantes das efetivas despesas e, também sem exibir os comprovantes
das receitas auferidas, (e-STJ fl. 7 – grifei).
(vii) A esquiva do Demandado, na regular e sistemática prestação de contas, poderá servir para encobrir eventuais benefícios que se deram ou que ainda se
apresentem em relação a alguns dos condôminos, (e-STJ fl. 7 – grifei),
(viii) O Demandado limita se a apresentar balancete de despesas, sem jamais ter
apresentado ou prestado contas das receitas auferida, o que impede a conferência dos valores apropriados no Fundo de Promoção, (e-STJ fl. 7 – grifei),
As autoras, como locatárias, poderiam pedir contas ao locador, não
diretamente ao condomínio, conforme previsto no art. 23, § 2º, da Lei n. 8.245/1991:
Art. 23. O locatário é obrigado a:
(...)
XII - pagar as despesas ordinárias de condomínio.
§ 1º Por despesas ordinárias de condomínio se entendem as necessárias à
administração respectiva, especialmente:
a) salários, encargos trabalhistas, contribuições previdenciárias e sociais dos
empregados do condomínio;
b) consumo de água e esgoto, gás, luz e força das áreas de uso comum;
c) limpeza, conservação e pintura das instalações e dependências de uso comum;
d) manutenção e conservação das instalações e equipamentos hidráulicos,
elétricos, mecânicos e de segurança, de uso comum;
e) manutenção e conservação das instalações e equipamentos de uso comum
destinados à prática de esportes e lazer;
f) manutenção e conservação de elevadores, porteiro eletrônico e antenas
coletivas;
g) pequenos reparos nas dependências e instalações elétricas e hidráulicas de uso
comum;
h) rateios de saldo devedor, salvo se referentes a período anterior ao início da
locação;
i) reposição do fundo de reserva, total ou parcialmente utilizado no custeio ou
complementação das despesas referidas nas alíneas anteriores, salvo se
referentes a período anterior ao início da locação.
§ 2º O locatário fica obrigado ao pagamento das despesas referidas no
parágrafo anterior, desde que comprovadas a previsão orçamentária e o
rateio mensal, podendo exigir a qualquer tempo a comprovação das
mesmas (grifei).
Confiram-se, a propósito, as anotações de Sylvio Capanema de Souza ao
referido dispositivo legal (in "A Lei do Inquilinato Comentada". 8ª ed., Rio de Janeiro:
Forense, 2012, p. 135/136):
A cobrança das despesas ordinárias de condomínio, elencadas no § 1 º, depende
da comprovação, a ser feita pelo locador ou sublocador, da previsão orçamentária
do condomínio e do rateio.
Não bastam a previsão e o rateio. É preciso, ainda, que o locador comprove o
pagamento, exibindo, quando solicitado pelo locatário, os respectivos recibos. Tais
documentos deverão ser solicitados pelo locador ao síndico ou à administradora do
edifício, que ficam também obrigados a fornecê-los.
Diante da recusa do locador em exibir os documentos comprobatórios das
despesas ordinárias, poderá o locatário valer-se da medida cautelar de exibição de
documentos, sem prejuízo da consignação judicial do aluguel e dos encargos.
Os síndicos e administradores de condomínio passam a ter maior responsabilidade
perante os condôminos que são locadores, estando sempre prontos para lhes
fornecer cópias das previsões orçamentárias, das atas das assembleias, dos
rateias, da utilização do fundo de reserva, para que sejam exibidas aos locatários,
viabilizando sua cobrança.
A disposição é excelente e oportuna, já que muitos locadores cobram tais despesas aleatoriamente, sem qualquer comprovação, usando-as como uma forma
oblíqua para aumentar os aluguéis, que consideram defasados.
Têm, agora, os locatários um poderoso e eficiente instrumento para se defender de
tão censurável comportamento, condicionando o pagamento destas verbas à
exibição dos comprovantes.
Diz a lei que a exibição pode ser exigida a qualquer tempo, ou seja, mesmo depois
do pagamento. Nesta hipótese, verificando-se que houve cobrança excessiva ou
indevida, poderá o locatário recuperar o que pagou, pela via da ação de repetição
de indébito.
Por isso, é recomendável que os locadores conservem tais documentos, pelo
menos pelo prazo de cinco anos, quando se opera, então, a prescrição.
Desse modo, se a má administração do condomínio tornou onerosa a
relação contratual locatícia, cabe ao inquilino buscar providência frente ao proprietário do
imóvel, tal como anotado no acórdão recorrido.
Não se quer dizer com isso, evidentemente, que o inquilino não possa se
voltar contra o condomínio em Juízo, desde que, para tanto, fique caracterizado o liame
subjetivo para figurar no feito. As próprias recorrentes trazem precedente que exemplifica
essa hipótese, em caso absolutamente distinto do que ora se analisa, no qual se
reconheceu a legitimidade do locatário para demandar o condomínio por suposta
divulgação de comunicado ofensivo à sua honra.
Conclui-se, em suma, que o locatário não possui legitimidade para ajuizar
ação contra o condomínio, no intuito de questionar o descumprimento de regra
estatutária, a ausência de prestação de contas e a administração de estabelecimento
comercial, cujo reconhecimento resultaria na necessidade de adequações de cota
condominial e recomposição de prejuízos financeiros.
As recorrentes também se insurgem contra o valor dos honorários de
sucumbência, arbitrado pelo Tribunal de Justiça com base no art. 20, § 4º, do CPC/1973,
norma aplicável à época do julgamento da apelação.
Com efeito, à míngua de provimento de conteúdo condenatório, o valor dos
honorários devia mesmo ser fixado segundo apreciação equitativa do juiz, com
observância dos critérios indicados nas alíneas "a", "b" e "c" do art. 20, § 3º, da lei
processual.
No caso, a Corte estadual sopesou "o trabalho desenvolvido pelos
procuradores, a realização de perícia, com várias complementações e solicitação de
documentos" (e-STJ fl. 1.087), para fixar a remuneração dos advogados em R$ 5.000,00
(cinco mil reais), quantia que não se mostra excessiva.
Assim, não prosperam as alegações recursais, mantendo-se o acórdão
impugnado.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do
voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Marco Buzzi (Presidente), Luis Felipe Salomão, Raul Araújo e Maria
Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.