RECURSO ESPECIAL Nº 1.821.906 - MG (2019/0179611-5)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. ALIMENTOS. ACORDO. AUDIÊNCIA
DE CONCILIAÇÃO. DÍVIDA. OFERTA. DEVEDOR. VALOR. RECONHECIMENTO
PARCIAL. VINCULAÇÃO. PATAMAR MÍNIMO. NOVA NEGOCIAÇÃO.
POSSIBILIDADE. BENEFICIÁRIO. REPRESENTAÇÃO. CONCORDÂNCIA.
ARREPENDIMENTO POSTERIOR. NULIDADE. FALTA DE PREJUÍZO. SÚMULA Nº
7/STJ.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a verificar se o oferecimento de proposta de acordo
por devedor de alimentos, em audiência de conciliação, sem a presença do
beneficiário, pode importar no reconhecimento parcial da dívida.
3. A proposta de pagamento parcial por devedor de alimentos em audiência de
conciliação já na fase de cumprimento de sentença, perante o patrono da parte
contrária, vincula o devedor no limite da proposta, restando assegurada nova
negociação quanto ao valor remanescente.
4. A decretação de nulidade processual depende da demonstração do efetivo
prejuízo, à luz do princípio pas de nullité sans grief.
5. Recurso especial não provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e
Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 20 de outubro de 2020(Data do Julgamento)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se
de recurso especial interposto por J. G. das S., com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas
"a" e "c", da Constituição Federal, contra o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado
de Minas Gerais assim ementado:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE ALIMENTOS - CITAÇÃO
DESNECESSÁRIA - NULIDADE DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO
INEXISTENTE - LEGALIDADE DO PRAZO PARA PAGAMENTO DA PARCELA
INCONTROVERSA - PROVA DE DIFÍCIL OBTENÇÃO INOCORRENTE - RECURSO DESPROVIDO.
I - A fim de assegurar a pronta efetivação do direito judicialmente reconhecido
numa decisão transitada em julgado de procedência da ação de alimentos, o c.
Tribunal da Cidadania já assentou que, a partir da edição da Lei nº 11.232/05, a
execução dos débitos alimentares vencidos pode e deve ser encetada via
cumprimento de sentença (cf. REsp nº 1.315.476/SP, 3ª T/STJ, rel. Mina. Nancy
Andrighi), o que conduz à inevitável conclusão de que, 'tratando-se de
cumprimento de sentença, fase posterior ao processo de conhecimento,
desnecessária a nova citação do executado, que deverá ser intimado, na pessoa
de seu advogado, mediante publicação na imprensa oficial, para efetuar o
pagamento no prazo de 15 (quinze) dias, a partir de quando, caso não efetue,
passará a incidir a multa de 10% sobre o montante da condenação (art. 475-J do
CPC/73)' (REsp nº 1.634.063/AC, 3ª T/STJ, rel. Min. Moura Ribeiro).
II - O absoluto e eloquente silêncio da parte litigante e, sobretudo, de seus
procuradores na audiência quanto à ausência do 'ex adverso', cujo patrono
presente se fez munido de 'poderes especiais para confessar, desistir,
transigir, firmar compromissos ou acordos, receber e dar quitação', bem
como quanto às ilegalidades e às arbitrariedades que nela teriam sido
cometidas, é motivo suficiente, por si só, para desmerecer ou desacreditar
todo seu blaterar destinado à obtenção 'da anulação da mencionada
audiência e de toda e qualquer determinação ali proferida'.
III - Se em audiência judicial aquele que é tido como devedor propõe a quem
se apresenta como seu credor o pagamento de algumas daquelas parcelas
que lhe estão sendo cobradas sem fazer qualquer ressalva de que nega a
existência da dívida ou, noutros termos, a sua condição de devedor, ele está,
sim, admitindo ou confessando, ainda que implícita ou indiretamente, ser
pelo menos devido o valor proposto. Esta conclusão atende não só aos
princípios da razoabilidade e da efetividade da prestação jurisdicional como,
ainda, àquele que dentre nós veda o empobrecimento ilícito e, em se
tratando de dívida de inequívoca natureza alimentar, àquele que exige respeito à dignidade da pessoa humana.
IV - Por força do art. 523, 'caput', do CPC/15, há, sim, embasamento legal para o
prazo de 20 (vinte) dias concedido judicialmente concedido para o devedor de
alimentos quitar as duas parcelas incontroversas de sua dívida alimentar.
V - Não é difícil e nem muito menos oneroso requerer ao juízo, através de mera
petição, o apensamento aos autos da execução de alimentos do processo
exoneratório ali arquivado ou, ao menos, o traslado para aquele de cópia da
sentença prolatada neste" (e-STJ fl. 596 - grifou-se).
Na origem, a recorrida (M. C. da S.), filha do alimentante, propôs ação de
execução de alimentos contra seu genitor (J. G. da S.), ora recorrente, objetivando receber as
parcelas correspondentes ao período de maio de 2007 a abril de 2009, pedido que foi provido.
A exequente não compareceu à audiência de conciliação na fase de cumprimento
de sentença (nº 005611005198-6), momento no qual o recorrente propôs o pagamento da
dívida relativa aos 2 (dois) últimos meses da pensão alimentícia perante o Juízo e o Ministério
Público estadual, proposta que foi homologada com a concordância do patrono da parte
ex-adversa (e-STJ fl. 45). O juízo de primeira instância já havia expedido o mandado de penhora
(e-STJ fl. 67) de imóvel e a intimação do devedor para oferta de impugnação na execução.
O recorrente interpôs agravo de instrumento em desfavor da decisão de
homologação do acordo, com fulcro no art. 1.015, parágrafo único, do Código de Processo Civil
de 2015, tendo o Tribunal local mantido incólume a conclusão do juízo de primeira instância nos
seguintes termos:
"(...) II - Da nulidade da audiência.
Quanto à alegada nulidade da audiência de conciliação, diz o
agravante 'que, no caso em tela, a presença da agravada era imprescindível para
a composição entre as partes, pela especificidade dos direitos envolvidos, e,
consequentemente, para a realização da audiência que possuía, justamente, o
objetivo de possibilitar essa conciliação', sendo que, 'com o não comparecimento
da agravada, toda a expectativa do agravante em ter a oportunidade de
conciliar-se com a sua filha, ora agravada, dentro dos ditames legais e na
presença de auxiliares da justiça responsáveis por promover a conciliação, foi
bruscamente frustrada, sendo certo que não há o menor sentido em realizar-se
uma audiência de conciliação sem a presença de ambos os interessados,
principalmente quando o patrono da parte ausente aduz, a todo momento, não ter
poderes para composição, como ocorrido'.
Todavia, faz prova o instrumento de procuração aqui reproduzido à
fl. 25-TJ, que o patrono da agravada, ao contrário do que diz o agravante, tinha e
tem, sim, 'poderes especiais para confessar, desistir, transigir, firmar
compromissos ou acordos, receber e dar quitação'.
Não bastasse, impõe-se observar que na ata da dita audiência de
conciliação não há nenhum protesto do agravante e/ou de seus procuradores
acerca da ausência da agravada naquela assentada, do que, frise-se, só agora
se queixam eles através deste agravo de instrumento.
Venhamos e convenhamos, o absoluto e eloquente silêncio do agravante e, sobretudo, de seus procuradores na audiência quanto à ausência
da agravada, bem como quanto às ilegalidades e às arbitrariedades que nela
teriam sido cometidas, é motivo suficiente, por si só, para desmerecer ou
desacreditar todo seu blaterar destinado à obtenção 'da anulação da mencionada
audiência e de toda e qualquer determinação ali proferida'. Aliás, é crucial
observar que o agravante e seus procuradores, a par da ausência da agravada,
das ilegalidades e das arbitrariedades só ventiladas neste recurso, e em atitude
diametralmente oposta ao que nele afirmam e postulam, não tiveram qualquer
acanhamento ou dificuldade para a formulação e apresentação de uma proposta
de acordo exatamente no curso da só agora questionada 'audiência especial'.
Vale lembrar, alegar e não provar é o mesmo que não alegar
(allegatio et non probatio quasi non allegatio) e, na hipótese dos autos, o
agravante não comprovou suas assertivas. Se a parte estava insatisfeita com o
andamento da audiência de conciliação, deveria ter registrado suas irresignações
que justificariam a anulação do ato e de suas deliberações.
Todavia, ao contrário disso, quedou-se inerte.
No arrematar este ponto, consigno que o presente agravo de
instrumento não é meio hábil à verificação da alegação de que 'visível enlace e
intimidade entre o patrono da agravada, conciliadores e o Julgador se fez
presente em todo o curso da audiência', bem como de que 'os presentes sequer
se deram ao trabalho de dissimular, deixando claro, a todo tempo, a proximidade
que, aliás, como por eles proferido, se estende também a família da agravada -
intimidade, harmonia e amistosidade que somente ao agravante e a seus
procuradores faltava'.
Ora, se a parte litigante acredita ter sido de qualquer forma
prejudicada por suposta parcialidade do julgador, deveria se valer de instrumento
próprio (art. 146, CPC/15).
III - Do constrangimento.
O agravante afirma em suas razões recursais ter sido constrangido
a efetuar o pagamento das duas últimas parcelas, valores que apenas
apresentou como proposta para acordo, sustentando que 'a mera oferta e
disposição de pagamento do ofertado (...) sem que a parte adversa manifeste a
sua aceitação, em nada vincula o proponente'.
Neste particular, convém repetir aqui os exatos termos do que
consta da ata da audiência no atinente à referida proposta: 'neste ato o
executado propõe, a título de acordo, o pagamento das duas últimas parcelas
atualizadas e corrigidas, sendo o valor apurado dividido em 20 (vinte) parcelas
iguais e consecutivas' (fl. 198 - grifei).
Venhamos e convenhamos, se em audiência judicial aquele que
é tido como devedor propõe a quem se apresenta como seu credor o
pagamento de algumas daquelas parcelas que lhe estão sendo cobradas sem
fazer qualquer ressalva de que nega a existência da dívida ou, noutros
termos, a sua condição de devedor, ele está, sim, admitindo ou confessando,
ainda que implícita ou indiretamente, ser pelo menos devido o valor
proposto.
Esta conclusão atende não só aos princípios da razoabilidade e da
efetividade da prestação jurisdicional como, ainda, àquele que dentre nós veda o
empobrecimento ilícito e, em se tratando de dívida de inequívoca natureza
alimentar, àquele que exige respeito à dignidade da pessoa humana.
Logo, nas condições e termos em que feita a proposta do
agravante, lícito concluir serem mesmo incontroversas as duas parcelas dos
alimentos que ele se propôs a pagar à filha agravada ''a título de acordo'. IV - Do prazo para pagamento.
Segundo o agravante, 'o prazo de 20 (vinte) dias, estipulado pelo
magistrado de primeiro grau, para o pagamento (...) não está previsto em
qualquer dispositivo legal e, baseado na postura adotada, em audiência, pelo
julgador, tudo leva a crer que foi concedido discricionariamente'.
Entretanto, já demonstrada a natureza incontroversa das parcelas
que se ordenou pagas no prazo de 20 (vinte) dias, impõe-se reconhecer que dito
prazo é até superior àquele definido no art. 523, 'caput', do CPC/15 (...)
V - Da prova de difícil obtenção.
Ao argumento de que lhe seria difícil e oneroso, enquanto
aposentado e domiciliado 'há exatos 274 (duzentos e setenta e quatro)
quilômetros da comarca de Barbacena', obter a cópia da sentença que o teria
exonerado da obrigação alimentar, quer o agravante, 'por temer uma futura
decisão ultra petita', ser dispensado da produção dessa prova, dizendo, ainda,
que 'sua concretização só poderia ser imputada à agravada/exequente'.
Por primeiro, impõe-se observar que, como dito na inicial deste
agravo de instrumento, 'a afirmativa, prevista em ata, dos patronos do réu, ora
agravante, de que a pensão alimentícia da exequente se encontra exonerada, foi
uma simples resposta à pergunta proferida pelos conciliadores e pelo il. Julgador,
não sendo levantada em nenhum momento, pela parte ré' (fls. 10v/11-TJ).
Destarte, por força do art. 373, II, do CPC/15, incumbe ao
executado/agravante o ônus da prova acerca do por ele alegado fato extintivo,
modificativo ou impeditivo do direito da exequente/agravada.
E, num segundo ponto, é de se observar que o próprio
executado/agravante também diz que 'o teor da sentença requerida pelo juízo
encontra-se nos autos do processo de exoneração, há anos arquivado no mesmo
foro de competência da presente, sendo essa a única fonte para obtenção do
documento solicitado' (fl. 10v-TJ).
Ora, se assim o é, para o cumprimento do que lhe foi ordenado, ao
executado/agravante bastaria requerer ao juízo 'a quo', mediante singela petição,
o apensamento aos autos originários daquele 'processo de exoneração, há anos
arquivado no mesmo foro de competência da presente', ou, ao menos, que cópia
de sua sentença fosse trasladada para os autos originários.
Como de fácil constatação, nenhuma dificuldade ou onerosidade
obsta a produção da prova determinada ao agravante.
De qualquer forma, acreditando o executado/agravante na
'irrelevância deste documento para o deslinde da ação' e que seria 'ultra petita' a
decisão que extrapole a 'execução de quantia líquida e certa, apresentada pela
agravada como a compreendida entre o período de 05/2007 e 04/2009, em
momento já fixado na peça inicial' (fl. 10v-TJ), quer me parecer inócua a
discussão que tenta ele estabelecer em torno desse tema, como isso querendo
se ver dispensado da produção de prova que ele mesmo pode deixar de produzir
quer por tê-la como irrelevante ou quer por lhe ser perfeitamente possível corrigir,
pelas regulares vias recursais, eventual julgamento 'ultra petita' realizado pelo
magistrado 'a quo'.
Mediante tais considerações, NEGO PROVIMENTO ao recurso”
(e-STJ fls. 603-607 - grifou-se).
Os embargos de declaração opostos pelo recorrente foram rejeitados (e-STJ fls.
643-651).
Em suas razões, além de divergência jurisprudencial, o recorrente aponta
violação do disposto nos arts. 489, § 1º, IV e V, e 1.022, II, do Código de Processo Civil de 2015
devido à suposta existência de negativa de prestação jurisdicional. No mérito, alega
contrariedade aos arts. 165, 166, 385, 389, 390 e 694 do CPC/2015.
Sustenta que o Tribunal de origem não fundamentou os motivos pelos quais
considerou como confissão de dívida a mera proposta de acordo. Alega que a proposta de
acordo, na audiência especial de conciliação, tem por objetivo exclusivo a autocomposição e,
consequentemente, a resolução da lide.
Afirma, ainda, não ser devedor de nenhum montante pleiteado pela ora recorrida,
tendo apenas ofertado "o que entendia estar dentro das suas possibilidades no momento do
acordo, na esperança de se ver livre da lide" (e-STJ fl. 505).
Assevera que a sua liberdade foi cerceada e que inexistiria dispositivo legal
indicando que a mera proposta de composição, realizada em audiência de conciliação, possa
ensejar confissão de dívida, motivo pelo qual reputa como violados os arts. 385, 389 e 390 do
Código de Processo Civil.
Sustenta que "o estímulo à solução consensual dos conflitos, é papel não só do
Estado, como também dos sujeitos do processo, em que aqui se destaca a figura do Juiz, que
orientado pelos princípios processuais consagrados no art. 3º do CPC/154, pode, sempre que
possível, incentivar a conciliação" (e-STJ fl. 661).
Por fim, defende que a confissão judicial só pode ser obtida por meio de
depoimento pessoal em audiência de instrução e julgamento, além de arguir a nulidade do
acórdão recorrido por carência de fundamentação.
Não foram apresentadas as contrarrazões (e-STJ fl. 695).
O recurso especial foi admitido na origem (e-STJ fls. 697-698) ao fundamento de
que se reveste "de razoabilidade a tese recursal, relativa à alegação de ofensa ao disposto no
art. 166 do CPC, segundo a qual a mera proposta de acordo feita em audiência de conciliação
não importa em confissão de dívida" (e-STJ fl. 698), ascendendo os autos a esta colenda Corte.
O Ministério Público Federal, instado a se manifestar, por meio do seu
representante legal, o Subprocurador-Geral da República Antônio Carlos Alpino Bigonha,
opinou pelo provimento do recurso especial nos termos da seguinte ementa:
"Civil. Contratos. Transação. Proposta rejeitada. Ato que não importa reconhecimento da procedência do pedido, renúncia de direito ou confissão. Parecer pelo
provimento do recurso especial" (e-STJ fl. 707).
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator):
A irresignação não merece prosperar.
O acórdão impugnado pelo recurso especial foi publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
Cinge-se a controvérsia a verificar se o oferecimento de proposta de acordo por
devedor de alimentos em audiência de conciliação já na fase de cumprimento de sentença,
perante o patrono da parte contrária, pode ser interpretado como confissão de dívida.
1. Da violação dos arts. 489, § 1º, IV e V, e 1.022 do CPC/2015
O recorrente alega que o tribunal de origem, ao julgar os embargos de
declaração, teria deixado de sanar as omissões e as contradições apontadas. No entanto, da
simples leitura da fundamentação (e-STJ fls. 643-651), verifica-se que o acórdão recorrido
analisou pontualmente todas as questões suscitadas no recurso.
Assim, no tocante à alegada negativa de prestação jurisdicional (artigo 1.022 do
Código de Processo Civil de 2015), agiu corretamente o Tribunal de origem ao rejeitar os declaratórios por inexistir omissão, contradição ou obscuridade no acórdão embargado, ficando
patente, em verdade, o intuito infringente da irresignação, que objetivava a reforma do julgado
por via inadequada.
Confiram-se:
"AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
RESPONSABILIDADE CIVIL. MATÉRIA JORNALÍSTICA. VIOLAÇÃO DOS ARTS.
489 E 1.022 DO CPC/2015. OMISSÃO NÃO VERIFICADA. CONCLUSÃO DO
ACÓRDÃO PELA NÃO CONFIGURAÇÃO DOS DANOS MORAIS. REVISÃO DO
JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA
7/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.
1. A alegada ofensa aos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015 não ficou configurada,
uma vez que o Tribunal de origem examinou, de forma fundamentada, todas
as questões submetidas à apreciação judicial na medida necessária para o
deslinde da controvérsia, ainda que tenha decidido em sentido contrário à
pretensão do recorrente (...) (AgInt no AREsp 1.439.955/RS, Rel. Ministro
MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/6/2019, DJe
13/6/2019 - grifou-se).
"AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE
SEGURO. OMISSÃO NO ACÓRDÃO DE ORIGEM. ARTIGOS 489 E 1.022 DO
CPC. NÃO OCORRÊNCIA. LIMITES DO RISCO CONTRATADO. REEXAME DE
PROVAS. SÚMULAS 5 E 7/STJ. NÃO PROVIMENTO.
1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas, pelo Tribunal de
origem, de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões,
obscuridades ou contradições, deve ser afastada a alegada ofensa aos arts.
489, § 1º, IV, e 1.022, I e II, do Código de Processo Civil.
2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória e a
interpretação de cláusulas contratuais (Súmulas 5 e 7/STJ).
3. Agravo interno a que se nega provimento" (AgInt no AREsp 1.374.504/SP, Rel.
Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 11/6/2019, DJe
14/6/2019 - grifou-se).
Registre-se que, mesmo à luz do art. 489 do Código de Processo Civil de 2015, o
órgão julgador não está obrigado a se pronunciar acerca de todo e qualquer ponto suscitado
pelas partes, mas apenas sobre aqueles capazes de, em tese, de algum modo, infirmar a
conclusão adotada pelo órgão julgador (inciso IV). A motivação contrária ao interesse da parte
ou mesmo omissa em relação a pontos considerados irrelevantes pelo julgador não autoriza o
acolhimento dos embargos declaratórios.
Como se vê, houve o enfrentamento de toda a questão posta em discussão, que
foi desenvolvida e analisada fundamentadamente, ainda que em sentido contrário à pretensão
do recorrente.
2. Da oferta
Primeiramente, válido esclarecer que desde a edição da Lei nº 11.232/2005,
matéria atualmente regida pelo art. 528, § 8º, do CPC/2015, a execução dos débitos alimentares
pretéritos deve ser feita por meio de cumprimento de sentença.
A propósito:
"DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ALIMENTOS.
EXECUÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ARTIGOS ANALISADOS: 475-J E
732 DO CPC.
(...) 2. Determinar se a sistemática de execução estabelecida a partir da edição
da Lei nº 11.232/05 pode também ser aplicada à execução de alimentos.
3. A Lei 11.232/2005 pretendeu tornar a prestação jurisdicional mais célere e
menos burocrática, antecipando a satisfação do direito reconhecido na
sentença. 4. Tendo em vista a urgência e a importância do crédito alimentar, conclui-se
que a execução dos débitos alimentares pretéritos deve ser feita por meio de
cumprimento de sentença.
5. Recurso especial conhecido e provido" (REsp 1.315.476/SP, Rel. Ministra
NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/10/2013, DJe 25/10/2013 - grifou-se).
A oferta de pagamento espontâneo em audiência de conciliação em execução de
dívida alimentar pelo devedor perante o Judiciário e com a concordância do representante da
parte contrária apto a tanto (e-STJ fl. 603) tem caráter vinculante em relação ao proponente.
Importante consignar que a alimentanda, já maior, busca, desde 2011, quando
ajuizada a ação, receber a pensão alimentícia referente ao período compreendido entre maio
de 2007 a abril de 2009.
Na audiência de conciliação, consumada na fase de cumprimento de sentença, o
devedor reconheceu parcialmente a obrigação alimentar em favor de sua filha maior M. C. da
S., que não compareceu ao ato processual, tendo sido devidamente representada por seu
patrono com poderes específicos. Na ocasião, o executado concordou com o pagamento dos 2
(dois) últimos meses dos alimentos cobrados na inicial, no prazo de 20 (vinte) dias e, sob pena
de multa, comprometeu-se a juntar aos autos, em 30 (trinta) dias, cópia da sentença que o teria
exonerado dos alimentos.
O sistema jurídico pátrio não abarca a pretensão do recorrente porque
incompatível com a dinâmica processual que preza pela duração razoável dos litígios (arts. 5º,
inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988 e 139, inciso II, do CPC/2015), bem como pela
racionalidade do sistema.
Em seu apelo nobre, o devedor visa debater temas alheios à fase executória (art.
525 do CPC/2015), os quais deveriam ter sido objeto da fase cognitiva. O fato de ter sido
exonerado da obrigação alimentar em momento posterior, em ação revisional, não o beneficia
em relação ao débito cobrado e reconhecido, em parte, por ele mesmo, espontaneamente,
perante as autoridades públicas competentes.
Ressalta-se que a conclusão adotada pelo Tribunal local conferiu fiel
cumprimento ao art. 526 do CPC/2015 que enfatiza ser "lícito ao réu, antes de ser intimado
para o cumprimento da sentença, comparecer em juízo e oferecer em pagamento o valor
que entender devido, apresentando memória discriminada do cálculo".
Não se desconhece que o CPC/2015 reiteradamente incentiva a resolução
consensual de conflitos por meio da conciliação ou da mediação, admitindo acordos entre as
partes no lugar de decisões imperativas do Estado-Juiz. Aliás, tal percepção retrata perspectiva
adotada desde a Constituição Brasileira do Império, de 1824, como se afere do seu art. 161: “sem se fazer constar, que se tem intentado o meio da reconciliação, não se começará
Processo algum” (www.planalto.gov.br).
Destaca-se que o CPC/2015 cuidou das "Ações de Família" no Capítulo X, do
Título III, do Livro I da Parte Especial em seus artigos 693 a 699, os quais dispõem acerca dos
procedimentos especiais de jurisdição contenciosa no Direito de Família. À luz do princípio da
autonomia de vontade, o mencionado diploma estimula, como não deveria deixar de ser, a
solução consensual dos conflitos familiares, o que pode ser viabilizado por meio do auxílio
interdisciplinar (arts. 694 do CPC/2015). A opção do devedor, contudo, foi admitir parte da
obrigação já firmada anteriormente ao propor o pagamento das 2 (duas) parcelas devidas, o
que foi homologado em juízo.
Os denominados negócios jurídicos, indispensáveis à resolução de controvérsias,
dependem não apenas da disponibilidade do direito, mas da vontade das partes (arts. 166 e
190/CPC/2015), requisitos inexistentes na hipótese sob análise. Os mecanismos de
autocomposição, contudo, remanescem acessíveis às partes.
Válido mencionar o seguinte exceto do acórdão recorrido:
"(...) Venhamos e convenhamos, se em audiência judicial aquele
que é tido como devedor propõe a quem se apresenta como seu credor o
pagamento de algumas daquelas parcelas que lhe estão sendo cobradas sem
fazer qualquer ressalva de que nega a existência da dívida ou, noutros
termos, a sua condição de devedor, ele está, sim, admitindo ou confessando,
ainda que implícita ou indiretamente, ser pelo menos devido o valor
proposto. Esta conclusão atende não só aos princípios da razoabilidade e
da efetividade da prestação jurisdicional como, ainda, àquele que dentre nós
veda o empobrecimento ilícito e, em se tratando de dívida de inequívoca
natureza alimentar, àquele que exige respeito à dignidade da pessoa
humana. Logo, nas condições e termos em que feita a proposta do
agravante, lícito concluir serem mesmo incontroversas as duas parcelas dos
alimentos que ele se propôs a pagar à filha agravada "a título de acordo (...)".
(e-STJ fl. 605 - grifou-se).
O Tribunal de Justiça ponderou que a oferta equivaleria à confissão plena e total
do débito. De fato, não há falar no instituto da confissão, mas sim em reconhecimento
parcial do débito no limite do valor ofertado, que vincula o proponente. Tal ponderação,
contudo, não altera a conclusão a que chegou a Corte local. A proposta de procedência parcial
do pedido executivo não impede que as partes realizem futura composição quanto ao valor
remanescente, à luz dos princípios da boa-fé objetiva e da vedação de
comportamento contraditório.
3. Da ausência de prejuízo
Extrai-se do acórdão recorrido:
"(...) impõe-se observar que na ata da dita audiência de conciliação
não há nenhum protesto do agravante e/ou de seus procuradores acerca da
ausência da agravada naquela assentada, do que, frise-se, só agora se queixam
eles através deste agravo de instrumento (...) o absoluto e eloquente silêncio
do agravante e, sobretudo, de seus procuradores na audiência quanto à
ausência da agravada, bem como quanto às ilegalidades e às arbitrariedades que
nela teriam sido cometidas, é motivo suficiente, por si só, para desmerecer ou
desacreditar todo seu blaterar destinado à obtenção 'da anulação da mencionada
audiência e de toda e qualquer determinação ali proferida' (...)" (e-STJ fl. 603 - grifou-se).
A orientação desta Corte é a de que a decretação de nulidade processual
depende da demonstração de efetivo prejuízo a quem alega (pas de nullité sans grief),
consectário lógico dos princípios da instrumentalidade de formas e da duração razoável do
processo.
A propósito:
"AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ALIMENTOS.
MAIORIDADE DO ALIMENTANDO. EXONERAÇÃO AUTOMÁTICA DA PENSÃO.
INADMISSIBILIDADE.
1. É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que 'a não observância da
prevenção na distribuição dos autos enseja incompetência relativa do juízo e não
absoluta. Por essa razão, em se tratando de incompetência relativa, deve ser
alegada pela parte interessada em tempo oportuno, quando ainda não tenha sido julgada a ação ou o recurso, sob pena de preclusão' (REsp 1224215/PR, Rel.
Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 01/09/2011, DJe
22/09/2011).
2. Ademais, deve a parte comprovar a existência de prejuízo na não obediência
das regras de prevenção, porquanto deve prevalecer o princípio pas de nullité
sans grief, sendo que, na espécie, não houve demonstração nesse sentido.
3. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento pacífico 'A maioridade civil,
em que pese faça cessar o poder familiar, não extingue, modo automático, o
direito à percepção de alimentos, que subjaz na relação de parentesco e na
necessidade do alimentando, especialmente estando matriculado em curso
superior' (RHC 28566/GO, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO,
TERCEIRA TURMA, julgado em 21/9/2010, DJe 30/9/2010).
4. Na hipótese, o Tribunal de origem entendeu que o alimentando demonstrou
que permanece tendo necessidade de receber os alimentos, cumprindo o seu
ônus, na condição de filho maior. Dessarte, chegar à conclusão diversa do
Tribunal de origem, no sentido de afastar a pretensão de exoneração de
alimentos em razão de estarem preenchidos os requisitos relativos à necessidade
do alimentando e a possibilidade do alimentante, demandaria o necessário
reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula
7/STJ.
5. Agravo interno não provido" (AgInt no AREsp 904.010/SP, Rel. Ministro LUIS
FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/8/2016, DJe 23/8/2016).
"AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. 1. EXECUÇÃO. ACORDO NÃO
HOMOLOGADO JUDICIALMENTE. IMPOSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO COMO
TÍTULO JUDICIAL. 2. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUSTENTAÇÃO ORAL NÃO
PREVISTA. NULIDADE DO JULGAMENTO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO.
PRINCÍPIO PAS DE NULLlTÉ SANS GRIEF. 3. AGRAVO INTERNO
DESPROVIDO.
1. A jurisprudência desta Casa dispõe no sentido de que 'a ausência de
homologação judicial do instrumento de transação, por si só, não retira do
documento o caráter de título executivo, embora lhe subtraia a possibilidade de
execução como título judicial' (REsp n. 1.061.233/SP, Relatora a Ministra Nancy
Andrighi, Terceira Turma, julgado em 1º/9/2011, DJe 14/9/2011).
2. O sistema das nulidades processuais é informado pela máxima pas de
nullité sans grief, segundo a qual não se decreta nulidade sem prejuízo.
3. Agravo interno desprovido" (AgInt nos EDcl no AREsp 1098396/MG, Rel.
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/6/2018,
DJe 29/6/2018 - grifou-se).
Em verdade, o alimentante arrependeu-se de ter anuído com o cumprimento de
parcelas da dívida cobrada na fase executiva, motivo pelo qual aponta genericamente nulidades
processuais que nem sequer foram demonstradas. A sua argumentação, ademais, resta
atingida pela preclusão consumativa, porquanto não apresentada no momento processual
oportuno. Por fim, a alegação de que teria sido surpreendido pela cobrança da dívida alimentar
(art. 10 do CPC/2015) não prospera, haja vista ter participado ativamente tanto da fase
cognitiva, quanto da executória, inclusive da audiência de conciliação ora em exame.
Desse modo, ante o óbice da Súmula nº 7/STJ, as conclusões da origem são
insindicáveis nesta Corte.
Importante registrar que ao litigante remanesce a possibilidade de alegar eventual
suspeição ou impedimento do juízo que de alguma forma o tiver prejudicado por suposta
parcialidade por meio de instrumento próprio (art. 146, CPC/2015).
4. Do dispositivo
Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.
Considerando que o agravo de instrumento interposto na origem visa impugnar
decisão interlocutória na qual não se arbitraram honorários advocatícios (e-STJ fl. 45), não há
fixação de honorários recursais.
É o voto.