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8 de junho de 2021

Não é abusiva a cláusula do contrato de cartão de crédito que autoriza a operadora/financeira, em caso de inadimplemento, debitar na conta corrente do titular o pagamento do valor mínimo da fatura, ainda que contestadas as despesas lançadas.

 REsp 1.626.997-RJ, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 01/06/2021.

Cartão de crédito. Inadimplemento. Pagamento do valor mínimo da fatura. Débito direto na conta corrente do titular. Possibilidade.

Não é abusiva a cláusula do contrato de cartão de crédito que autoriza a operadora/financeira, em caso de inadimplemento, debitar na conta corrente do titular o pagamento do valor mínimo da fatura, ainda que contestadas as despesas lançadas.


Inicialmente, a teor do quanto previsto no contrato de emissão e utilização do cartão de crédito, em caso de não pagamento da fatura na data de seu vencimento ou cancelamento do cartão por inadimplemento, o titular autorizaria o emissor a debitar em sua conta corrente o valor mínimo correspondente aos gastos por ele efetuados, caso haja saldo para tanto.

Essa operação de débito direto do valor mínimo da fatura consiste em uma ferramenta apenas utilizada quando o cliente não realiza, esponte própria, o pagamento do montante devido no prazo contratual assinalado, sequer do valor mínimo expressamente acordado para manter o fluxo do contrato de cartão de crédito.

A prática do pagamento mínimo como opção do titular do cartão fora reconhecida como válida pelo Banco Central do Brasil, desde a edição da Resolução n. 3.919/2010.

Hodiernamente, não existe mais o pagamento mínimo obrigatório de determinado percentual do valor da fatura, mas, cada instituição financeira pode estabelecer com os consumidores o montante de adimplemento mínimo mensal, em função do risco da operação, do perfil do cliente ou do tipo de produto.

Certamente, o pagamento mínimo previsto na modalidade contratual de cartão de crédito constitui uma mera liberalidade da operadora, que insere tal condição na contratualidade de maneira a conquistar e fidelizar o usuário, a fim de fortalecer o sistema de crédito na modalidade cartão.

A hipótese de débito do valor mínimo constitui uma das condições para que se conceda crédito aos titulares do cartão, possibilitando a estes últimos, o abatimento parcial do quanto devido e não adimplido. Trata-se, portanto, de uma espécie de garantia à continuidade do ajuste estabelecido entre as partes.

Com a facilidade do débito mínimo, condições vantajosas são experimentadas por ambas as partes da relação jurídica: a financeira mantém a continuidade e o fluxo do sistema e do serviço de cartão de crédito e garante o pagamento de parcela dos valores inadimplidos na data, sem a necessidade da realização de procedimentos executivos forçados; já o titular de cartão de crédito inadimplente mantém o saldo disponível do crédito do cartão para realizar outras despesas e realiza o pagamento parcial do débito com a amortização do quanto devido sem que ocorra o bloqueio da operação, deixando de se submeter às regras e encargos atinentes ao procedimento de execução forçada.

Inegavelmente, não há no ordenamento jurídico obrigação legal para a concessão de crédito sem garantia, nem mesmo vedação a tal prática, motivo esse que impede rotular como abusivo o débito de parcela mínima do total de gastos efetuados pelos titulares dos cartões de crédito.

Portanto, não se reputa abusiva a cláusula inserta em contrato de cartão de crédito que autoriza a operadora/financeira a debitar na conta corrente do respectivo titular o pagamento do valor mínimo da fatura em caso de inadimplemento, porquanto tal ajuste não ofende o princípio da autonomia da vontade, que norteia a liberdade de contratar, tampouco possui o condão de violar o equilíbrio contratual ou a boa-fé, haja vista que tal proceder constitui mero expediente para facilitar a satisfação do crédito com a manutenção da contratualidade havida entre as partes.

Do mesmo modo, em todas as hipóteses nas quais o titular do cartão contestar a fatura, se não realizado o pagamento no prazo, tendo sido expressamente contratado e devidamente informado ao consumidor a ocorrência do débito do valor mínimo diretamente na conta corrente, não há falar em abusividade.

17 de abril de 2021

Súmula 638 do STJ comentada

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://www.dizerodireito.com.br/2019/12/sumula-638-do-stj-comentada.html

Foi aprovada recentemente a Súmula 638 do STJ, com a seguinte redação:

Súmula 638-STJ: É abusiva a cláusula contratual que restringe a responsabilidade de instituição financeira pelos danos decorrentes de roubo, furto ou extravio de bem entregue em garantia no âmbito de contrato de penhor civil.

CLÁUSULAS ABUSIVAS 

É nula a cláusula que limite o valor da indenização na hipótese de eventual furto, roubo ou extravio do bem empenhado 

Súmula 638-STJ: É abusiva a cláusula contratual que restringe a responsabilidade de instituição financeira pelos danos decorrentes de roubo, furto ou extravio de bem entregue em garantia no âmbito de contrato de penhor civil. STJ. 2ª Seção. Aprovada em 27/11/2018, DJe 5/12/2018. 

Penhor civil 

Penhor é o direito real pelo qual o devedor ou terceiro transfere ao credor, em garantia do débito, a posse de uma coisa móvel. A coisa dada em penhor é “empenhada” ou “apenhada”. Não se pode confundir penhor (garantia real) com penhora (ato do processo de execução). 

Penhor de joias 

A Caixa Econômica Federal oferece uma forma de conferir empréstimo de modo mais ágil e sem burocracia. Trata-se do empréstimo com penhor. A pessoa interessada em obter um empréstimo procura a CEF e obtém o empréstimo, oferecendo, como garantia, joias, pedras preciosas, canetas, relógios etc. Quando a pessoa paga o empréstimo, recebe de volta o bem empenhado. Se o mutuário não quitar o empréstimo, a coisa apenhada é leiloada. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: Pedro, precisando de dinheiro, resolve tomar um empréstimo na CEF e, como garantia, entrega o seu anel de formatura. No contrato assinado, havia uma cláusula que dizia que, em caso de roubo, furto ou extravio da joia empenhada, a CEF deveria pagar ao mutuário, a título de danos materiais e morais, o valor máximo de 1,5 vezes da quantia pela qual foi avaliado o bem. Ex: se o bem tivesse sido avaliado em R$ 10 mil, a CEF pagaria, no máximo, R$ 15 mil de indenização. Uma semana após Pedro dar o bem em garantia, houve um furto na agência da CEF e levaram o anel, que estava guardado em um cofre. 

A CEF deverá indenizar Pedro por esse furto? SIM. O furto ocorrido deve ser entendido como fortuito interno, inerente à atividade explorada pelo banco. Assim, a instituição financeira é responsável por furtos ou mesmo roubos em seus cofres (STJ. 4ª Turma. REsp 1.250.997/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 5/2/2013). 

Essa cláusula que limita o valor da indenização é válida? NÃO. O CDC prevê, em seu art. 51, I: 

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; 

No contrato de penhor celebrado com a Caixa, é notória a hipossuficiência do consumidor, pois este, necessitando de empréstimo, apenas adere a um contrato cujas cláusulas são inegociáveis, submetendose, inclusive, à avaliação unilateral realizada pela instituição financeira. Vale ressaltar que, comumente, a avaliação é inferior ao preço cobrado do consumidor no mercado varejista de joias. Ao aceitar dar em penhor sua joia pessoal, o consumidor demonstra não estar interessado em vender esse bem empenhado, preferindo transferir apenas a posse temporária dela à instituição financeira, em garantia de um empréstimo. Pago o empréstimo, ele tem plena expectativa de ter de volta seu bem. Isso revela que, em regra, o mutuário possui uma relação afetiva com a coisa apenhada. 

O que fazer, então, no caso concreto? 

O juiz deverá reconhecer que a cláusula é nula de pleno direito, nos termos do art. 51, I, do CDC, devendo condenar à CEF a pagar um valor justo de indenização, que atenda estritamente aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Deve-se salientar que, além dos danos materiais, a CEF deverá ser condenada a pagar também danos morais, uma vez que, conforme já salientado, o consumidor que decide pelo penhor assim o faz pretendendo receber o bem de volta, e, para tanto, confia que o mutuante o guardará pelo prazo ajustado. Se a coisa empenhada fosse para o proprietário um bem qualquer, sem nenhum valor sentimental, provavelmente o consumidor optaria pela venda da joia, e, certamente, obteria um valor maior. 

Qual é o prazo prescricional para o ajuizamento dessa ação de indenização? 5 anos, nos termos do art. 27 do CDC: 

Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria. 

O furto das joias, objeto do penhor, constitui falha do serviço prestado pela instituição financeira, devendo incidir o prazo prescricional de 5 anos para a ação de indenização, conforme previsto no art. 27 do CDC. STJ. 4ª Turma. REsp 1.369.579-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 24/10/2017 (Info 616). 

11 de abril de 2021

PLANO DE SAÚDE: É abusiva cláusula contratual de plano de saúde que impõe à dependente a obrigação de assumir eventual dívida do falecido titular, sob pena de exclusão do plano

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-689-stj.pdf

Falecendo o titular do plano de saúde coletivo, seja este empresarial ou por adesão, nasce para os dependentes já inscritos o direito de pleitear a sucessão da titularidade, nos termos dos arts. 30 ou 31 da Lei nº 9.656/98, a depender da hipótese, desde que assumam o seu pagamento integral. A conduta da operadora, de impor à dependente a obrigação de assumir eventual dívida do falecido titular, sob pena de ser excluída do plano de saúde, configura, em verdade, o exercício abusivo do direito de exigir o respectivo pagamento, na medida em que, valendo-se da situação de fragilidade da beneficiária e sob a ameaça de causar-lhe um prejuízo, constrange quem não tem o dever de pagar a fazê-lo, evitando, com isso, todos os trâmites de uma futura cobrança dirigida ao legítimo responsável (espólio). STJ. 3ª Turma. REsp 1.899.674/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/03/2021 (Info 689). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João era cliente de um plano de saúde coletivo. Ele era titular e sua esposa Regina, sua dependente no plano. O plano previa a coparticipação. Assim, 10% das despesas com internação hospitalar deveriam ser custeadas pelo usuário o plano.

Essa previsão é abusiva? Em princípio, a cláusula que preveja a coparticipação do usuário nas despesas médico-hospitalares afronta direitos do consumidor e a legislação dos planos de saúde? 

NÃO. 

• Regra: não é abusiva cláusula contratual de plano privado de assistência à saúde que estabeleça a coparticipação do usuário nas despesas médico-hospitalares em percentual sobre o custo de tratamento médico realizado sem internação. 

• Exceção: esta cláusula será abusiva em dois casos: 

1) Se a coparticipação do usuário financiar integralmente o procedimento médico-hospitalar; 

2) Se o percentual exigido do usuário representar, no caso concreto, uma restrição severa aos serviços médico-hospitalares. 

Não é abusiva cláusula contratual de plano privado de assistência à saúde que estabeleça a coparticipação do usuário nas despesas médico-hospitalares em percentual sobre o custo de tratamento médico realizado sem internação, desde que a coparticipação não caracterize financiamento integral do procedimento por parte do usuário, ou fator restritor severo ao acesso aos serviços. STJ. 3ª Turma. REsp 1.566.062-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 21/6/2016 (Info 586). 

Voltando ao caso concreto 

João passou meses internado no hospital tratando de uma grave doença. Ao final, ele acabou falecendo. Regina foi chamada até o escritório do plano de saúde e lhe explicaram o seguinte: As despesas da internação de João totalizaram R$ 300 mil. Pelo sistema de coparticipação, João teria que pagar R$ 30 mil ao plano (10% do total). Ocorre que João faleceu. Diante disso, a operadora propôs a Regina que ela continuasse no plano, agora como titular, sem nova carência, no entanto, para que fosse aceita, ela deveria assumir a dívida do seu falecido marido. Caso não aceitasse, seria excluída do plano. Regina aceitou e assinou o contrato com o plano, constando essa cláusula de assunção da dívida. 

Indaga-se: essa cláusula é válida? 

NÃO. É abusiva cláusula contratual de plano de saúde que impõe à dependente a obrigação de assumir eventual dívida do falecido titular, sob pena de exclusão do plano. STJ. 3ª Turma. REsp 1.899.674/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/03/2021 (Info 689). 

O art. 30 da Lei nº 9.656/98 versa sobre a hipótese de perda do vínculo empregatício por rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, e prevê, expressamente, que, em caso de morte do titular, o direito de permanência é assegurado aos dependentes cobertos pelo plano ou seguro privado coletivo de assistência à saúde: 

Art. 30. Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral. 

(...) § 3º Em caso de morte do titular, o direito de permanência é assegurado aos dependentes cobertos pelo plano ou seguro privado coletivo de assistência à saúde, nos termos do disposto neste artigo. 

Já o art. 31 da referida lei trata da hipótese de aposentadoria do titular e estabelece o direito de manutenção do contrato, inclusive na hipótese de morte do titular: 

Art. 31. Ao aposentado que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, pelo prazo mínimo de dez anos, é assegurado o direito de manutenção como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral. 

Na mesma toada, o art. 8º da Resolução ANS nº 279/2011 prevê que, “em caso de morte do titular é assegurado o direito de manutenção aos seus dependentes cobertos pelo plano privado de assistência à saúde, nos termos do disposto nos artigos 30 e 31 da Lei n. 9.656/1998”. 

A conduta de impor à dependente a obrigação de assumir eventual dívida do falecido titular, sob pena de ser excluída do plano de saúde, configura, em verdade, o exercício abusivo do direito de exigir o respectivo pagamento, na medida em que, valendo-se da situação de fragilidade da beneficiária e sob a ameaça de causar-lhe um prejuízo, constrange quem não tem o dever de pagar a fazê-lo, evitando, com isso, todos os trâmites de uma futura cobrança dirigida ao legítimo responsável (espólio). 

Aliás, a pretexto de exercer regularmente um direito amparado no contrato, o plano de saúde também desvirtua o fim econômico e social dos arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/98, pois se vale da garantia neles assegurada como moeda de troca para coagir a dependente à quitação da dívida deixada pelo titular que morreu.