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19 de junho de 2021

Se houve determinação judicial para que o Município fizesse contratação temporária em razão da Covid-19, não se pode dizer que isso configure preterição ilegal de pessoa aprovada no concurso para o mesmo cargo, sendo que o certame era para cadastro de reserva

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/06/info-695-stj.pdf

CONCURSO PÚBLICO - Se houve determinação judicial para que o Município fizesse contratação temporária em razão da Covid-19, não se pode dizer que isso configure preterição ilegal de pessoa aprovada no concurso para o mesmo cargo, sendo que o certame era para cadastro de reserva 

A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva. STJ. 2ª Turma. RMS 65.757-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 04/05/2021 (Info 695). 

Imagine a seguinte situação adaptada: 

O Município de Petrópolis (RJ) realizou concurso para o cargo de enfermeiro. Não havia vagas disponíveis para provimento imediato, de forma que o certame tinha por objetivo a formação de cadastro de reserva. Paula prestou o concurso e foi aprovada em 2019. No início de 2020, como é do conhecimento geral, iniciou-se no Brasil e no mundo a pandemia decorrente do novo coronavírus. O Ministério Público ajuizou ação civil pública contra o Município pedindo a ampliação da rede pública de saúde, inclusive com a contratação de mais profissionais para atendimento da população. Em razão dessa demanda, o Município fez a contratação temporária de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem para auxiliar no atendimento das pessoas acometidas da Covid-19. Ao tomar conhecimento dessas contratações temporárias, Paula impetrou mandado de segurança afirmando que estava sendo preterida e pedindo a nomeação imediata no cargo de enfermeira. 

A questão chegou até o STJ. O pedido de Paula deverá ser acolhido? NÃO. Vamos entender com calma. 

O candidato aprovado em cadastro reserva possui direito subjetivo à nomeação em cargo público? 

Em regra, não. 

REGRA: O certame para formação de cadastro reserva pressupõe a inexistência de cargos vagos ou a ausência de necessidade de provimento imediato, ou de dotação orçamentária. Portanto, a aprovação em cadastro reserva não gera, por si só, o direito subjetivo à nomeação do candidato. 

EXCEÇÃO: A aprovação em cadastro reserva ou fora do número de vagas do edital gera direito subjetivo à nomeação quando demonstrado: • O surgimento superveniente de vaga ou a abertura de novo certame, e • A preterição arbitrária do candidato. 

Hipóteses nas quais existirá direito subjetivo à nomeação 

O STF listou as três hipóteses nas quais existe direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em concurso público: 1) Quando a aprovação do candidato ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital; 2) Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação; 3) Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos de forma arbitrária e imotivada por parte da administração. STF. Plenário. RE 837311/PI, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 09/12/2015 (repercussão geral) (Info 811). 

Voltando à situação hipotética apresentada: No mandado de segurança impetrado, Paula, aprovada no cadastro reserva, buscava o enquadramento na terceira hipótese acima elencada pelo STF, qual seja, o surgimento de novas vagas e a preterição arbitrária e imotivada, para ter reconhecido seu direito à nomeação. Alegou que a contratação temporária seria apta a demonstrar tanto a existência de novas vagas, a necessidade do serviço e a disponibilidade orçamentária, quanto a preterição arbitrária da candidata aprovada. 

A contratação temporária configura, por si só, preterição arbitrária de candidato aprovado em concurso público? A contratação temporária, por si só, não configura preterição arbitrária ou ilegal de candidato aprovado em concurso público. A contratação temporária possui previsão na própria Constituição Federal (art. 37, IX), o que demonstra a sua regularidade intrínseca. Assim, só se pode dizer que a contratação é ilegal se ela não cumpriu os requisitos da lei de regência (no caso, a lei do Município que regulamente as contratações temporárias). Nesse sentido: 

A teor do RE 837.311/PI, julgado sob o regime da repercussão geral, como regra o candidato aprovado em cadastro de reserva não é titular de direito público subjetivo à nomeação, não bastando para a convolação da sua expectativa o simples surgimento de vagas ou a abertura de novo concurso, antes exigindo-se ato imotivado e arbitrário da Administração Pública. Para que a contratação temporária se configure como ato imotivado e arbitrário, a sua celebração deve deixar de observar os parâmetros estabelecidos no RE 658.026/MG, também julgado sob a sistemática da repercussão geral, bem como há de haver a demonstração de que a contratação temporária não se destina ao suprimento de vacância existente em razão do afastamento temporário do titular do cargo efetivo e de que existem cargos vagos em número que alcance a classificação do candidato interessado. STJ. 2ª Turma. RMS 60.682/MT, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 15/08/2019. 

Requisitos estabelecidos pelo STF para a validade da contratação temporária 

O STF, em sede de repercussão geral, enumerou os requisitos para a verificação da regularidade da contratação temporária do art. 37, IX, da CF: 

O conteúdo jurídico do art. 37, inciso IX, da Constituição Federal pode ser resumido, ratificando-se, dessa forma, o entendimento da Corte Suprema de que, para que se considere válida a contratação temporária, é preciso que: a) os casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a necessidade de contratação seja indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração. STF. Plenário. RE 658026/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 9/4/2014 (Info 742). 

Contratação temporária baseada em decisão judicial 

Ressalta-se que a contratação temporária no Município teve origem em demanda judicial, ajuizada em razão da necessidade temporária gerada pelo advento da pandemia. Nessas situações em que a contratação temporária é baseada em decisão judicial, é ainda mais patente a inexistência de preterição arbitrária da administração pública. Existindo determinação judicial, não há margem para a atuação discricionária da administração pública, não havendo hipótese de ilegalidade: 

Não há configuração de preterição de candidato aprovado em concurso público na hipótese em que a administração pública procede à nomeação de outros candidatos em classificação inferior por força de decisão judicial, uma vez que, nessa hipótese, não há margem de discricionariedade à administração, não havendo falar em ilegalidade do ato a ensejar a concessão da ordem. STJ. 2ª Turma. AgInt no RMS 55.701/GO, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 25/08/2020. 

Excepcionalidade da situação: Pandemia de Covid-19 

No caso apresentado, o STJ entendeu que houve regularidade na contratação, pelo Município, de servidores temporários para ocupação da vaga de enfermeiro. A necessidade temporária e o excepcional interesse público estariam baseados na situação de pandemia decorrente da pandemia de Covid-19. É notória a situação de colapso no sistema de saúde decorrente dos altos índices de contaminação pela Covid-19. Portanto, a contratação de profissionais de saúde se mostra como uma necessidade dos entes públicos para o tratamento dos pacientes. Apesar de se tratar do desempenho de funções regulares, como no caso do profissional de enfermagem, a excepcionalidade da situação se evidencia com o aumento de ocupação dos leitos hospitalares e de pessoas que necessitam de assistência da saúde pública. Os números de infectados e pessoas internadas não são estáveis, de modo que esse interesse público na contratação de profissionais de saúde pode aumentar ou diminuir a depender do avanço da pandemia. As chamadas “ondas de contaminação” fazem com que o cenário de necessidade se altere periodicamente. Assim, a contratação temporária se apresenta como instrumento necessário e eficaz para atender aos interesses temporários e excepcionais do cenário atual. 

EC 106/2020 

A título de informação, observa-se que a Emenda Constitucional 106/2020 previu hipótese de contratação temporária específica, no âmbito do Poder Executivo Federal, para o cenário excepcional da pandemia de Covid-19: 

Art. 2º Com o propósito exclusivo de enfrentamento do contexto da calamidade e de seus efeitos sociais e econômicos, no seu período de duração, o Poder Executivo federal, no âmbito de suas competências, poderá adotar processos simplificados de contratação de pessoal, em caráter temporário e emergencial, e de obras, serviços e compras que assegurem, quando possível, competição e igualdade de condições a todos os concorrentes, dispensada a observância do § 1º do art. 169 da Constituição Federal na contratação de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, limitada a dispensa às situações de que trata o referido inciso, sem prejuízo da tutela dos órgãos de controle. Parágrafo único. Nas hipóteses de distribuição de equipamentos e insumos de saúde imprescindíveis ao enfrentamento da calamidade, a União adotará critérios objetivos, devidamente publicados, para a respectiva destinação a Estados e a Municípios. 

Em suma: A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva. STJ. 2ª Turma. RMS 65.757-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 04/05/2021 (Info 695)

11 de maio de 2021

A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva.

RMS 65.757-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 04/05/2021. 

Concurso público. Enfermeiro. Cadastro de reserva. Direito à nomeação. Contratação temporária. Descaracterização. Contratação decorrente da pandemia causada pelo vírus SARS-COV-2. Determinação judicial para contratação temporária.


A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva.


A orientação da jurisprudência do STJ é no sentido de que a simples existência de contratação temporária não significa, por si só, a preterição a direito do aprovado em concurso público, e isso porque além de ter assento constitucional, ou seja, ser uma situação permitida pela lei maior do país, o que denota a sua regularidade intrínseca, a ilegalidade da contratação somente ocorrerá quando não observados os requisitos da lei de regência da respectiva unidade federativa.

No caso analisado, o contexto da demanda revela, de uma lado, que a Administração Pública local agiu com bastante clareza ao arregimentar candidatos para um certame no qual não havia vagas disponíveis, fato que não é debelado, por outro lado, com a contratação temporária de terceiros decorrente da excepcionalidade da situação, ainda atual, da pandemia decorrente do vírus Sars-CoV-2, causador da covid-19.

Pesa considerar ainda que a contratação temporária questionada teve origem em demanda judicial ajuizada justamente com o escopo da necessidade temporária gerada pelo advento da pandemia.

Isso corrobora ainda a inexistência de preterição ilegal, forte na jurisprudência desta Corte que assim compreende quando a nomeação decorre de determinação judicial.

Normalmente os casos concretos avaliados referem-se à inobservância da ordem classificatória, mas como isso advém de decisão judicial então não haveria ilegalidade na prática administrativa, como no caso do AgInt no RMS 55.701/GO (Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 25/08/2020, DJe 01/09/2020).

No presente caso, embora a situação fática seja distinta, a razão é a mesma, porque a Administração Pública local somente procedeu à contratação em virtude de ordem judicial, o que igualmente retira do fato a pecha da preterição ilegal.