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16 de agosto de 2017

JURISDIÇÃO CIVIL: REFLEXÕES SOBRE NOVOS PARADIGMAS PARA A SUA COMPREENSÃO

JURISDIÇÃO CIVIL: REFLEXÕES SOBRE NOVOS PARADIGMAS PARA A SUA COMPREENSÃO

Jurisdicción civil: reflexiones sobre nuevos paradigmas para su comprensión
Revista de Processo | vol. 269/2017 | p. 19 - 57 | Jun / 2017
DTR\2017\1811
_____________________________________________________________________________________
Antônio Pereira Gaio Júnior
Pós-Doutor em Direito (Universidade de Coimbra/PT). Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos (Ius Gentium Conimbrigae/ Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra-PT). Doutor em Direito (UGF). Mestre em Direito (UGF). Pós-Graduado em Direito Processual (UGF). Professor Adjunto de Processo Civil da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ. Membro do Instituto Ibero-americano de Direito Processual – IIDP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Advogado. jgaio@terra.com.br

Área do Direito: Civil; Processual

Resumo: O presente artigo procura demonstrar os novos paradigmas da Jurisdição Civil, tudo a partir da análise de seus atributos e da possibilidade de alcance dos mesmos por outras vias legítimas de satisfação de direitos.

 Palavras-chave:  Jurisdição - Novos paradigmas - Satisfação de direitos - Arbitragem - Justiça conciliativa

Abstract: El presente artículo se trata de demostrar los nuevos paradigmas de la jurisdicción civil, todo a partir del análisis de sus atributos y la posibilidad de lograr lo mismo para otra forma legítima de satisfacción de los derechos.

 Keywords:  Jurisdicción - Nuevos paradigmas - Satisfacción del derechos - Arbitraje - Justicia conciliativa

Sumário:  
1Introdução - 2Reflexões sobre o conceito de jurisdição - 3Soberania estatal e a flexibilização do “poder” jurisdicional - 4A realização da função jurisdicional: uma busca pela pacificação social - 5Considerações finais - 6Referências bibliográficas


1 Introdução

É fato que o senso comum, invariavelmente, transforma fenômenos históricos em realidades naturais que teriam existido sempre e de maneira uniforme, ou mesmo que, de repente, surgiram já em seu modelo atual.
Verdade é que, ao se utilizar das mesmas palavras para definir fenômenos em constante transformação, gera-se a ilusão de que eles não são históricos.1
Nesta esteira, muito bem esclarece Thomas Kuhn,2 que as revoluções ou quebras de paradigmas são decorrentes de uma série de evoluções3 operacionalizadas sob, ou ao redor, de determinados modelos construídos, ou, aqui, institutos que, como em qualquer ciência social, realizam-se sempre em caráter pendular, ou seja, fatores sociais, econômicos, políticos, e mesmo jurídicos, entrelaçam-se na quebra de paradigmas que, longe da matemática, podem subtrair antes mesmo de somar, ou mesmo subdividir fenômenos antes mesmo de multiplicá-los.4
A jurisdição, como um dos atributos do Estado moderno, não tem paradeiro diferente. Ainda que atingida em suas características e princípios, ou mesmo em alguns deles, vê-se, diante de flexibilização do conceito de soberania, uma guinada em seus aspectos e dogmas, sacramentados e eternizados por uma construção doutrinária que é edificada no plano constitucional5, já nos séculos XVIII e XIX, e, posteriormente, alocada para o plano processual6, no século XX.
Apenas a título introdutório, já que será enfrentado em item próprio, nota-se, sob um olhar amplo – isto é, voltado ao contexto mundial –, que, em meados do aludido século XX, mais precisamente com o advento do Tratado de Paris, de 18.04.1951, operacionalizou-se a instituição da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), levando a Europa Ocidental a conduzir um processo de integração econômica complexo, findando em uma quebra paradigmática na evolução do Direito Internacional com a construção do Direito Comunitário, hoje Direito da União Europeia.
Sob a ótica do instituto da jurisdição é que se deve depreender a guinada conceitual e prática dos atributos inerentes ao Estado, na medida em que o Direito da União Europeia relaciona matérias que, além de serem concernentes aos Direitos Público e Privado, constrói entidades supranacionais (Conselho de Ministros, Comissão Europeia – Órgãos Executivos; Parlamento Europeu; Tribunal de Justiça Europeu), os quais exercem autoridade, eficácia e efetividade sobre os Estados que compõem a denominada, hoje, União Europeia,7 espancando, portanto, princípios clássicos do direito moderno, sobretudo no que se refere ao papel do Estado perante seus poderes intra e extraterritoriais.
Sobre tais questões supracitadas é que desenvolveremos algumas breves reflexões que, no seu decorrer, poderão suscitar outras indagações e possíveis soluções, resultando, quem sabe – e ainda que timidamente –, em futuras evoluções.
Ainda, dentro do contexto ínsito ao campo da funcionalidade jurisdicional, é de se observar atividades voltadas à composição de conflitos, aquelas a que denominamos de “meios propícios à solução de conflitos”, entendendo aí a Conciliação, Mediação e Arbitragem, cuja prática voltada à realização dos direitos se faz, inegavelmente, presente, o que, de certo, enfrentaremos mais adiante.
Fazendo parte do conteúdo a ser aqui assentado, temos ainda o ambiente cartorário como ensejador de uma série de demandas que, tradicionalmente, encontrava lugar tão somente no ambiente forense, mas que, carreada pela Lei 11.441/2007, passou a ter outro locus operandi ou campo de domínio possível para a sua satisfação. Estamos a falar das pretensões em sede de separação, divórcio, inventário e partilha consensuais que, somadas àquela da usucapião (autorizada pela Lei 13.105/2015), poderão ser acertadas em um cartório de notas, logicamente, desde que se perfaça uma série de requisitos que, igualmente, serão motivos de enfrentamento no presente estudo.
De tudo, objetiva-se aqui apresentar reflexões que possam demonstrar que tanto o campo conceitual como o funcional da jurisdição passam por variáveis que possibilitam, de certa forma, um olhar plurívoco de realização em vários ambientes, que não somente aquele do aparato jurisdicional, mas tudo no interesse da necessária satisfação dos direitos.

2 Reflexões sobre o conceito de jurisdição

O Estado moderno, para melhor atingir seu objetivo, que é o bem comum, dividiu seu poder soberano em três outros: Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário, tendo cada um deles uma função estatal.
Assim, ao Legislativo compete a estruturação da ordem jurídica por meio da atitude legislativa; ao Executivo, a administração; e ao Judiciário, de um modo geral, a composição dos litígios nos casos concretos.
À função de compor litígios, de declarar e realizar o Direito dá-se o nome de Jurisdição.
Etimologicamente, a palavra Jurisdição é derivada do latim juris­dictio (ação de administrar a justiça, oriunda das expressões jus dicere, jurisdictio).8
Como já bem expressava Celso Neves,9 o vocábulo “jurisdição” é insuficiente para demonstrar todo o alcance intelectivo e prático que se poderia delinear tal instituto, dificultando, inclusive, a construção uníssona para entendimento acerca deste assunto, tanto em nível pátrio quanto na literatura estrangeira. Couture10 já dizia ser o conceito de Jurisdição uma prova de fogo para os juristas, e mesmo Calamandrei, de maneira vanguardista, quase que como premunição, sustentava não ser possível dar à Jurisdição uma definição para todos os tempos e para todos os povos,11 o que também lhe seguia Alfredo Rocco,12 dizendo tratar-se de um problema conceitual ainda por se decidir a ciência jurídica.
O fato é que, notoriamente, o homem, enquanto animal político, encontra na coletividade organizada formas efetivas para o alcance de pretensões individuais, daí a concepção também de Estado.
Impulsionado pelo alargamento natural do Estado, Montesquieu sistematizou uma forma de separação de poderes que, a despeito das ideias, mesmo que ainda incipientes nos escritos de Aristóteles e de Locke, partia da noção de que o próprio poder controlaria o poder, estabelecendo-se uma compartimentação entre os mesmos, definindo-se, portanto, em um sistema de freios e contrapesos. Daí a concepção de tripartição dos Poderes em Legislativo, Executivo e Judiciário.13
Neste sentido, a cada um dos Poderes supracitados fica reservada a responsabilidade precípua em uma atividade específica.
Assim, ao Legislativo compete à atividade estrutural da ordem jurídica através da atitude legislativa; ao Executivo cabe, enquanto atividade principal, a administração da máquina pública; reservando ao Judiciário, como atividade primordial, aquela de índole jurisdicional, notadamente, a composição de litígios e/ou declaração de direitos diante dos casos concretos.
Convém ressaltar que nenhum dos aludidos Poderes realiza as funções acima referidas com exclusividade. Isto porque, ao Poder Legislativo, cabe, por conseguinte, julgar em determinados casos, como nos crimes de responsabilidade de seus próprios pares, assim, como também, no que concerne ao Presidente da República; em outro passo, ao Poder Executivo poderá normatizar determinadas situações, através, por exemplo, das Medidas Provisórias; diferente também não se faz no âmbito do Poder Judiciário, pelo qual este realizará atividades administrativas, quando da organização e forma de atuação de seus servidores, ou mesmo no que toca aos tribunais, quando de edições de resoluções, objetivando uma melhor otimização nos serviços cartorários.14
Isto posto, partindo da ideia de Jurisdição como atributo conferido ao exercício da atividade jurisdicional por parte de um dos Poderes do Estado, qual seja, o Poder Judiciário, o seu conceito – como já referido por Calamandrei em linhas acima – possui uma diversidade de alcances.
Para Chiovenda, a Jurisdição consiste na atuação da lei mediante a substituição da atividade alheia pela atividade dos órgãos públicos, afirmando, ainda, a existência de uma vontade da lei, e colocando-a posteriormente em prática.15
Já, para Francesco Carnelutti, a Jurisdição é entendida como um meio de que se vale o Estado para a justa composição da lide. Neste sentido, a atividade jurisdicional, exercida pela autoridade estatal por meio do processo, visa à composição de um conflito de interesses, sendo justa, pois, que se refere, estar a solução da demanda de acordo com o Direito vigente, entendendo-se ainda por “lide”, o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida.16
Guasp e Aragones, após subdividirem a concepção de Jurisdição sob três pontos de vista – quais sejam: o objetivo (conjunto de matérias processuais em que intervêm os órgãos do Estado); subjetivo (conjunto de órgãos estatais que intervêm no processo); e atividade (conjunto de atos realizados pelos órgãos estatais, ao intervir no processo)17 –, reduzem a ideia da mesma em uma “función estatal de satisfacción de pretensiones”18.
Para Rosenberg, Schwb e Gottwald a finalidade da atividade jurisdicional civil seria a satisfação dos direitos subjetivos.19
Em critério mais amplo e, por isso, vetorizando, de forma segura, a incidência do instituto com a sua atuação primária nas órbitas dos poderes do Estado, somado ao real e ao efetivo comprometimento lato e stricto sensu com o exercício da atividade jurisdicional, Celso Neves20 considerou a Jurisdição como: poder, relacionando-a ao plano da soberania estatal, justificada pela manifestação do monopólio estatal, em sede de capacidade de decidir e impor, imperativamente, suas decisões; função, justificada pelas atribuições que caracterizam os órgãos estatais, estas diretamente relacionadas à promoção da pacificação social por meio do processo; atividade, já aí relacionada à prática dos atos no âmbito do processo – instrumento pelo qual a jurisdição opera –, exercício este praticado pelo magistrado, oriundo do poder a ele conferido pelo próprio Estado.
Conforme se depreende, para a caracterização da Jurisdição, critérios e conceitos se diversificam na medida das concepções e do foco de observação do instituto enquanto fenômeno jurídico.
Notadamente, convém pontuar aqui que a função de pacificação social não se faz unívoca no tocante ao amplo espectro que campeia a atividade jurisdicional.
De fato, em se tratando de denominada a Jurisdição Voluntária, não obstante sua notável e pontual característica prática, que é representada pela realização de uma intensa função jurisintegrativa,21 no que se refere à sua natureza processual, esta, sem dúvida, é marcada por controvérsias e questionamentos que ora recrudescem, atravessando gerações no âmbito do progresso da ciência processual, mesmo diante da ótica hodierna, encravada sob o manto da instrumentalidade.
Tal natureza jurídica acima referendada, cujo teor investigativo se fundamenta, em um primeiro momento, na noção de Jurisdição como função do Estado de solucionar conflitos a ele submetidos e, neste ínterim, ser a Jurisdição Voluntária uma autêntica Jurisdição; em um segundo momento, sendo considerada efetiva Jurisdição, justificar a existência de similitudes bem como as diferenças que a fragmentam da Jurisdição contenciosa, sob os domínios dos elementos caracterizadores de uma atividade jurisdicional voltada à solução de conflitos.
Com relação à primeira indagação, mesmo que a despeito do que já bem expressa o art. 16 do CPC (LGL\2015\1656), é patente que a atividade jurisdicional não limita supressão de contenciosidade. Não precisaríamos nem mesmo pedir auxílio ao texto legal, v.g., art. 20 do CPC (LGL\2015\1656), bastaria, sim, exercício intelectivo no reconhecimento da existência de situações jurídicas que ainda não se constituíram em relações jurídicas, entretanto, em futuro próximo, podem se converter nestas relações, precisando, por isso, ser acauteladas de quaisquer sofismas, tornando verdadeiramente certo o direito duvidoso, cabendo, aqui, exclamar, nos dizeres de Carnelutti, que a incerteza equivale ao perigo do litígio.22
Assim, poder-se-ia colocar o problema da contenciosidade ou não da Jurisdição Voluntária – para aqueles que entendem estar atrelada à atividade da Jurisdição somente a solução de controvérsias –, na ideia de que, de certo – diferentemente da Jurisdição Contenciosa, onde, nesta se conhece o conflito de interesses atual –, na Jurisdição Voluntária conhecer-se-ia um conflito de interesses potencial,23 ainda que entendido e estendido à forma latente.
Lopes da Costa, ao contextualizar o papel exercido pela Jurisdição voluntária, a despeito do exercício quer de uma função jurisdicional, quer administrativa, coloca no plano do auxílio, ou mesmo da intervenção do Estado na chancela para a validade de negócio jurídico, a intenção prática da identidade voluntária desta Jurisdição. De maneira precisa, antes mesmo de afirmar a denominação dada por Zanobini,24 sustenta haver também, na ordem privada, um mundo jurídico, este formado por pessoas, sob o ponto de vista de sua capacidade jurídica, bem como pelas relações jurídicas que entre elas se estabelecem.
Trata-se de uma ordem eminentemente dinâmica em evolução, onde Direitos se extinguem, se adquirem, ou mesmo se transmitem; nesta citada ordem “o Estado intervém, ou realizando atos que também pelo particular podem ser praticados e a ele, assim, equipara-se (compra, venda, locação, permuta), ou cooperando com o particular para auxiliá-lo na aquisição e na alteração de direitos privados. Cria sujeitos de direito (pessoas jurídicas), supre ou integra a capacidade jurídica dos incapazes (tutela, curatela), providencia sobre documentação e a publicidade de atos jurídicos, regula registros públicos, como forma de aquisição ou conservação de direitos e assim por diante”.25
Observa-se que, se há voluntariedade nesta espécie de Jurisdição, tal voluntariedade partiria mesmo do Estado que, de maneira voluntária – ativa –, exige sua participação, como em um controle jurisdicional indispensável, de maneira voluntária e proposital para o reconhecimento da validade do interesse jurídico ansiado pelo interessado.
Por outro lado, em recente obra, a nossa festejada Ada Pellegrini Grinover assenta, com propriedade, ser que jurisdição na atualidade, não mais poder, mas “função, atividade e garantia. Seu principal indicador é o acesso à Justiça, estatal ou não, e seu objetivo, o de pacificar com justiça.”26 Este conceito, atesta a brilhante professora, abrange a justiça estatal, a justiça arbitral e a justiça conciliativa.
Cediço é que a atividade jurisdicional em seus aspectos finalísticos, qual seja, a composição do litígio e, como consequência, a pacificação social a partir de um processo justo, não se restringe somente à atividade estatal. É fato que a própria arbitragem possui tal virtude, e mesmo a conciliação e mediação, quer extra ou endoprocessual, estão encarnadas na expectativa pela composição de litígios, possuindo aptidão para a pacificação das relações entre os partícipes de tais meios.
Por tudo, entendemos diferentemente da professora supracitada, no que se refere à afirmativa de não ser mais a jurisdição dotada do elemento “poder”, já que para Ada, na justiça conciliativa não haveria exercício do poder.27
De fato, conforme já pontuamos alhures, a noção de “poder” como um dos elementos constituidores do conceito de jurisdição, de muito já vem sendo flexibilizada, não sendo considerado de conteúdo indubitável ou absoluto em suas razões, mesmo porque, conforme já ilustrado em sede europeia, os Estados-membros da União Europeia delegam ao Tribunal Europeu parcela de sua soberania, ao se comprometerem com o respeito para com o controle das decisões de seus Tribunais de Justiça.
Diante disso, mesmo em sede pátria, quando se tem prometido pelo texto constitucional, mais precisamente no art. 5º, § 4ª, que o “Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”, não se tem a descaracterização do elemento “poder”, como integrante do conceito de jurisdição, mas tão somente a perspectiva de sua flexibilização para fins de alcance ao respeito da dinâmica do direito material a ser protegido.
Em verdade, ao observarmos o crescente alargamento dos ambientes propiciadores de uma solução de controvérsias, notamos que o objetivo inegável do legislador fora viabilizar locus diversos daquele estatal, para fins de, igualmente, oportunizar a satisfação dos direitos justificadora do alcance da paz social, algo que, desde sempre, notabiliza como um dos elementos da jurisdição: a sua “função”.
De tudo, seja a justiça arbitral, a justiça conciliativa e mesmo, ainda, os procedimentos pela via cartorária, não correspondem à jurisdição a partir de seu conceito racionalmente construído, mas possuem natureza voltada à função jurisdicional, que é propiciar a paz social com solução da questio colocada pelas partes, ou mesmo apresentada pelos interessados para fins de homologação da vontade, o que, em última análise, apresenta-se em sede de jurisdição voluntária, onde o caráter de administração de interesses privados se faz presente.

3 Soberania estatal e a flexibilização do “poder” jurisdicional

É fato que não podemos figurar na crédula ilusão de que nosso sistema jurídico está fundamentalmente desvinculado, e mesmo descomprometido, com sistemas processuais alienígenas, ou organismos supranacionais com funções jurisdicionais específicas, as quais, estariam nós, brasileiros, submetidos diante de eventuais demandas.
O Brasil, por meio de suas instituições, dando prova de seu interesse nesta matéria, ainda que de forma incipiente – acompanhadas pelas grades curriculares do Ensino Jurídico no país, que, lamentavelmente, ainda não contemplam de maneira satisfatória o estudo dos Direitos Internacional e Comunitário, insistindo assim, em fechar os olhos para uma realidade que já bate à nossa porta –, fez aprovar, conforme já acostado em linhas atrás, a Emenda Constitucional 45, onde, em seu art. 5º, § 4º, expressa: “O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.”
Notadamente, como se observa, decorrente do que já foi avençado na introdução do presente texto, vem a Jurisdição – paradigmaticamente ao modelo clássico, este já é visto e, essencialmente, ligado à noção do também conceito clássico de Soberania –, obtendo contornos evolutivos e complexos, quando as próprias características do que se entende por Soberania saem do contexto jurídico e ingressam, de forma correta, no âmbito político.
Trata-se, na verdade, de questão eminentemente complexa, já que a análise da soberania nacional, na sua percepção atual, envolve uma série de fatores que devem ser levados em consideração.28
Não se pretende, aqui, aprofundar tal questão, entretanto, convém, como já expresso acima, ressaltar a importância do tema diante da relação de interdependência dos Estados partícipes de uma integração, quer regional, comunitária, e mesmo internacional, tanto em modelos de organismos supranacionais quanto intergovernamentais.29
Inicialmente, deve-se sobressair que a noção de soberania é verdadeiramente histórica, variando a sua interpretação no tempo e espaço, onde, simultaneamente, à sua evolução e conceituação, tem-se a evolução do conceito de Estado.30
Neste sentido, justifica-se o que preceitua Paulo Henrique Castex:
“Primeiramente a soberania é um conceito de difícil definição jurídica, pois está intrinsecamente fundamentada em elementos de filosofia política e outros metajurídicos. Em segundo lugar, sua análise, muitas vezes, está permeada de enfoques ideológicos, ligados a sentimentos patrióticos e ideologias nacionalistas, o que dificulta, consideravelmente, uma abordagem científica neutra do tema. Por fim, o debate sobre a transformação do conceito de soberania é recente e não recebeu ainda a atenção necessária da doutrina especializada, porque está diretamente relacionado com a fase de transição pela qual estão passando o mundo e o direito, com os fenômenos da globalização e processos de integração econômica”.31
Não obstante, as dificuldades conceituais atuais da soberania, há de se levar em conta a existência de um determinado consenso quanto às características da mesma.32
Boa parte da doutrina classifica-a como una, indivisível, imprescritível e inalienável.33
Ocorre que, diante dos condicionamentos econômicos ditados pelas grandes mutações em um contexto mundial atual, deve-se observar, com extremo cuidado, a óptica da soberania ilimitada, isto é, sem restrições.
Com o desenvolvimento dos processos de integração, a soberania do Estado passou a ter uma percepção especial, onde, nas palavras de Luís Sá, “a emergência do fenômeno das limitações formais dos poderes soberanos dos Estados na nossa época, sobretudo, em resultado da integração dos Estados, implicou na necessidade de revisão, ou melhor, de adulteração profunda do conceito de soberania, tal como surgiu e foi constituído historicamente.”34
Neste sentido, permeando tanto pelos aspectos substantivos quanto adjetivos da soberania,35 as características da indivisibilidade e inalienabilidade da soberania estatal devem ser relativizadas na medida em que a integração regional, limitando a esfera da jurisdição doméstica dos Estados-Membros, alarga as possibilidades de colaboração intergovernamental, fortificada por um processo decisório coletivo.36
Caminha-se assim, em face da ratione necessitatis econômica, para uma soberania supranacional oriunda de parcerias econômicas e políticas de países, objetivando uma maior projeção dos seus produtos internos e atraindo investimentos, bem como adotando fórmulas protecionistas para a defesa de seus mercados, evitando, assim, certo isolamento diante da concorrência crescente, garantindo, portanto, uma maior participação no sistema mundial atual.
Diante do contexto vigente, temos a limitação ou divisão da soberania, entretanto, não sendo a mesma perdida, conforme observa Celso Mello:
“Tem-se considerado que o estado dotado de soberania continua a existir e o que ele delega aos organismos internacionais são apenas algumas competências. Enfim, a soberania não é mais indivisível.”37
A chamada “limitação da soberania” deve ser interpretada a partir da ideia de que os Estados-Membros partícipes de uma integração, em determinadas áreas específicas, delegam seus direitos soberanos aos órgãos representantes desta integração.38 Desta forma, tal delegação significa uma transferência de poder decisório para instituições comunitárias em determinadas searas.
Por meio das ditas noções, os países da Comunidade Europeia firmaram o que se chamou de soberania compartilhada ou coletiva.
Neste modelo, os Estados-Membros limitaram seus próprios direitos soberanos em certas áreas39 e os transferiram para instituições comunitárias sobre as quais não detêm o controle direto.
Considera-se, assim, que cada Estado-Membro cede parte de sua soberania e liberdade de ação em matérias específicas, sobre as quais não pode dispor individualmente, investindo tais direitos nos órgãos supranacionais, os quais têm competência para legislar ou gerenciar em questões veiculadas aos objetivos da comunidade.40
Importante ressaltar que o que se transfere não é a titularidade irrevogável dos poderes estatais, mas, sim, o exercício de poderes determinados dos Estados-partes para a comunidade.
Com o fenômeno da integração e da emergência de sociedades que se relacionam em instâncias supranacionais, é de afirmar que a noção, tradicionalmente construída, de soberania exclusiva não atende à realidade atual, na medida em que uma nova forma de relação entre os Estados, situada entre o próprio Estado e uma organização internacional, traduz na ideia da soberania dividida ou limitada, não condicionada, entretanto há uma questão eminentemente irrevogável, como adverte João da Mota Campos:
“Aceitar limitações da soberania nacional não significa aceitar a possibilidade de transferências irrevogáveis de competências soberanas (...), a autolimitação da soberania não afeta a independência do Estado, que continua liberta de qualquer ingerência exterior nos seus assuntos internos; diversamente, a transferência de competências soberanas do Estado tem como consequência que a entidade que delas se beneficia adquire o poder de as exercer e de tomar, contra a vontade do Estado, decisões que o vinculam.”41
Depois de toda a contextualização hodierna da Soberania, na entrada de um novo milênio, surgem formas ou endereços jurisdicionais, em escala local, nacional, regional, comunitária e mesmo internacional, abrangendo o chamado contencioso dos Direitos Humanos (Tribunais ou Cortes de Direitos Humanos), órgãos protetores das liberdades públicas ou repressivos de ilícitos praticados face à humanidade (Tribunais Penais Internacionais), de interesses essenciais e comuns, quer a entes públicos, quer a particulares.
Em sede do CPC (LGL\2015\1656) 2015, procurou o legislador avançar bem em relação ao Código Buzaid, ao prever um título relativo aos limites Jurisdição Nacional e atributos para uma Cooperação Internacional (Livro II, Titulo II), demonstrando, nitidamente, a premente necessidade de diálogo jurisdicional com órgãos jurisdicionais alienígenas, de modo a fazer valer as decisões internas e externas, ou seja, o exercício da soberania é também de índole cooperativa.

4 A realização da função jurisdicional: uma busca pela pacificação social

4.1 Breve introdução justificadora

Com a percepção de que a atividade jurisdicional estatal tem sido deveras incipiente, isto em decorrência de uma série de fatores, como os de origens procedimentais, administrativas ou operacionais, e até mesmo de quadros, vem crescendo a consciência de que fundamental é pacificar, mesmo que esta não decorra de obra eminentemente estatal desde que seja por método eficiente e protetor das liberdades fundamentais do cidadão.42
A política do consenso deve ser estimulada como tônica essencial na formação jurídica do operador do direito hodierno, sendo perceptível, sem exigir muitos esforços, o despreparo deste, sobretudo no campo prático, com as mais diversas modalidades instrumentais fora do aparato jurisdicional estatal, v.g., conciliação, mediação e arbitragem.
Em feliz apontamento, estreitando laços com o assunto, assinala Cappelletti:
“Numa época em que se falou demasiadamente e com frequência sobre revoluções culturais, vale a pena sublinhar o caráter genuinamente revolucionário do movimento em prol do acesso à justiça, não somente no âmbito da ação prática, senão também quanto ao método de pensamento e, mais particularmente, do método de análise jurídica.
“Se, na verdade, no terreno da ação, a mudança aportada e projetada foi radical, tendo-se dado um sentido novo e com conteúdo à ideia já por si mesma revolucionária, no plano do pensamento, em troca, foi tal, que se transformaram completamente os temas e modos de análise científica do jurista moderno.”43

4.2 A justiça arbitral

Conforme enfrentado no item anterior acerca do fenômeno da integração e da emergência de sociedades que se relacionam em instâncias supranacionais, é de afirmar que a noção tradicionalmente construída de soberania exclusiva não atende à realidade atual, na medida em que uma nova forma de relação entre os Estados, situada entre o próprio Estado e uma organização internacional, traduz-se na ideia da soberania dividida ou limitada, não condicionada, entretanto há uma questão eminentemente irrevogável, como adverte João da Mota Campos:
“Aceitar limitações da soberania nacional não significa aceitar a possibilidade de transferências irrevogáveis de competências soberanas (...), a autolimitação da soberania não afeta a independência do Estado que continua a liberta de qualquer ingerência exterior nos seus assuntos internos; diversamente, a transferência de competências soberanas do Estado tem como consequência que a entidade que delas se beneficia adquire o poder de exercê-las e de tomar contra a vontade do Estado decisões que o vinculam.”44
Notadamente, vem a Jurisdição – paradigmaticamente ao seu modelo clássico, este essencialmente ligado à noção do também conceito clássico de Soberania –, obtendo contornos evolutivos e complexos quando as próprias características do que se entende por soberania saem do contexto jurídico e ingressam, de forma correta, no âmbito político.
Forçoso se faz, portanto, acostar as ideias supracitadas a toda problemática que envolve a Arbitragem e sua natureza jurídica, justificadora da tipicidade que a mesma adquire quando de sua instituição, indo muito mais além, tocando, certeiramente, na função a que a mesma fora concebida, isto é, como mais uma via propícia à solução de conflitos, contribuindo, substancialmente, com a função pacificadora da sociedade, esta nota característica de uma das relevantes funções do Estado Moderno, sempre sob os auspícios do Poder Judiciário.
Trata a Arbitragem (regulada pela Lei 9.307/1996) de meio propício à solução de conflitos sobre direitos patrimoniais disponíveis ou transacionáveis45, que, por meio de árbitro privado, escolhido pelas partes e destas recebendo poderes, decide a controvérsia, possuindo tal decisão a mesma força e efeitos jurídicos decorrentes daquelas sentenças proferidas pelos órgãos do Poder Judiciário.
Assim, temos que as partes, capazes, envolvidas em um conflito acerca de direitos patrimoniais disponíveis ou transacionáveis possuem a faculdade de escolher uma pessoa, física ou jurídica para solucionar específica lide, deixando de lado a prestação jurisdicional estatal.
Nesta toada, é válido afirmar ser, a arbitragem, efetivamente um foro privilegiado e propício para a concretização do direito agredido, seja por meio de uma composição amigável ou mesmo através da convergência dos esforços dos litigantes, no sentido de lograrem de maneira célere, sem atropelos às garantias essenciais do devido processo legal, da segurança jurídica e da justiça da decisão, a solução da controvérsia.
Por outro lado, dúvidas não restam ter, a arbitragem, no tocante ao seu desenvolvimento como um método propício à solução de litígios, natureza tipicamente processual, configurando-se, verdadeiramente, em instrumento hábil para tal satisfação do direito molestado.
É efetivamente possível a flexibilização da função judicante estatal para outros entes por ele autorizados, sendo despiciendo aludir que até a própria Constituição Federal de 1988 é autorizadora de hipóteses sobre as quais o Estado brasileiro reconhece esta necessidade (ex vi da própria Justiça Desportiva, Arbitragem em Dissídios Coletivos, e mesmo em sede de submissão à jurisdição de Tribunal Penal Internacional).
Nisto, ao se revelar em sede de via arbitral, atividade tipicamente exercida pelo Poder Judiciário através de juízes togados – como o ato de julgar um conflito de interesses, proferindo-se sentença com força de coisa julgada –, nota-se o caráter jurisdicional de tal atividade, inclusive como instrumento de pacificação social, e é, nestes termos, que deve ser entendida sua natureza.
Há, inclusive, quem diga ter o CPC/2015 (LGL\2015\1656) reconhecido a própria existência de outra jurisdição não estatal na medida em que regra o seu art. 337, § 6º, que a “ausência de alegação da existência de convenção de arbitragem, na forma prevista neste Capítulo, implica aceitação da jurisdição estatal e renúncia ao juízo arbitral”, portanto, implicando na expressão “jurisdição estatal”, a possibilidade de outra jurisdição, in casu, a arbitral.46
A ideia esboçada em linhas atrás – esta referente à flexibilização da soberania estatal, entendendo a jurisdição, de certo, como um dos conteúdos alocados na esfera de poderes do Estado – demonstra, certamente, que mirado na concepção conceitual de jurisdição (Poder, Função e Atividade do Estado)47, é plenamente possível o exercício de atributo tipicamente jurisdicional, ainda que, cabe frisar, não se possa generalizar estar presente de forma plena todo o conteúdo representativo da jurisdição estatal, e nem se pretende tal intento.
No âmbito da doutrina pátria, merece, neste sentido, trazer à colação alguns pontos de realce em consonância com aludido entendimento, a despeito de igual sintonia ser encontrada na literatura estrangeira.48
Nestes termos, bem observa Nery Júnior e Andrade Nery:
“A natureza jurídica da arbitragem é de jurisdição. O árbitro exerce jurisdição porque aplica o direito ao caso concreto e coloca fim à lide que existia entre as partes. A arbitragem é instrumento de pacificação social. Sua decisão é exteriorizada por meio de ‘sentença’, que tem qualidade de título executivo judicial (CPC (LGL\2015\1656) 475-N IV), não havendo necessidade de ser homologada pela jurisdição estatal. A execução da sentença arbitral é aparelhada por título judicial, sendo passível de impugnação ao cumprimento de sentença com fundamento no CPC (LGL\2015\1656) 475-L, segundo a LArb 33, § 3º.”49
Para Carlos Alberto Carmona, os árbitros como os juízes togados dizem o direito, concretizando a vontade da lei, exercendo, nestes termos, a função, atividade e poder, características da jurisdição, visto que o árbitro, ao aceitar o encargo, recebe das partes o poder de conhecer as questões de fato e de direito da demanda, valorar as provas produzidas, bem como decidir a controvérsia, substituindo a vontade destas mesmas partes, dado o caráter vinculativo do ato sentencial por ele prolatado.50
Na mesma toada, Joel Dias Figueira Júnior afirma que os termos claros e precisos utilizados pelo legislador pátrio, ao equiparar sentença arbitral à sentença proferida pelo juiz estatal, “colocou uma pá de cal sobre a questão”, dado que a decisão prolatada pelo árbitro corresponde a ato de autoridade que decide o conflito e vincula as partes ao cumprimento da declaração, constituição, condenação, mandamento ou execução, gerando todos os efeitos da coisa julgada. Neste sentido, o juízo arbitral regulado pela Lei 9.307/96 tem natureza jurisdicional, exercendo o árbitro “jurisdição de caráter privado”, de maneira veraz.51
Em verdade, “a decisão do árbitro não ‘equivale’ a uma sentença; ela é uma sentença; a eficácia da sentença arbitral e a autoridade de coisa julgada que resulta dela não têm nenhuma diferença daquela que qualifica a sentença judicial”52 e, ainda que pese ser carecedora, por exemplo, em casos de necessidade de imposição de força executiva sobre os julgados arbitrais, quando do descumprimento pela parte perdedora, tal dado não desqualificaria a natureza, haja vista a ótica dirigida sobre a função restauradora da composição do conflito em sede arbitral, quando do próprio cumprimento da decisão. Teríamos aí, então, que típica função? Outra, notoriamente, não seria senão aquela classicamente desenvolvida pelo Poder Judiciário que é a da pacificação social e que é flexibilizada com autorização legal para o exercício judicante pela via do juízo arbitral.53
Deve-se atentar para o fato de que a adoção de qualquer das teorias que enfrentam a natureza jurídica da arbitragem, certamente, irá depender das premissas tomadas como verdadeiras para o desenvolvimento intelectual reflexivo – e mesmo pragmático – da argumentação objetivada.

4.3 A justiça conciliativa

A Ciência Jurídica, como qualquer ciência social, sob o ponto de vista da historicidade, realiza-se, indubitavelmente, de maneira pendular. Queremos entender, com isso, que os métodos de solução de controvérsias, mesmo após a detenção do monopólio jurisdicional pelo Estado, não alteraram em sentido metodológico as formas que já eram praticadas em nível de resilição de conflitos.
Neste sentido, partindo – e apenas – da ideia de divisão das formas de solução de controvérsias, Niceto Alcalá Zamora y Castillo, na prestigiosa obra Proceso, Autocomposición y Autodefesa,54 bem retratou os aludidos métodos como relativos à autodefesa, autocomposição e heterocomposião.55
Pois bem, é fato que a conciliação e a mediação, tidas como métodos de autocomposição de conflitos, portanto, componentes da denominada Justiça Conciliativa, fazem parte da cultura do consenso, ou cultura de conciliação56, que conheceu impulso crescente na sociedade pós-industrial, mas que tem, nos países em desenvolvimento, significativos desdobramentos, indicando “não apenas a institucionalização de novas formas de participação na administração da justiça e de gestão racional dos interesses públicos e privados, mas assumindo também relevante papel promocional de conscientização política”57.
No Brasil, tem-se a estimulação da conciliação não somente em caráter de plano de trabalho, como o faz para fins de “melhoria” da prestação jurisdicional o Conselho Nacional de Justiça – CNJ –, com o denominado “movimento pela conciliação”, cuja missão é contribuir “para a efetiva pacificação de conflitos, bem como para a modernização, rapidez e eficiência da Justiça Brasileira”58 e, ainda, o novel Código de Processo Civil – Lei 13.105/15 – com estipulações de incentivo à composição consensual dos conflitos endoprocessualmente, ex vi dos arts. 3º, §§ 2ª e 3º, 165, 334, muito antes, legislações já incentivam as conciliações, como, por exemplo, as Leis 9.957 e 9.958 de 12.01.2000, estatuindo as Comissões Paritárias de Conciliação Prévia nas empresas; Conselhos de Conciliação e Arbitramento, coordenados pelos juízes gaúchos; Juizados Informais de Conciliação em São Paulo; Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista Rural em algumas cidades mineiras, como Montes Claros e Patrocínio, e mesmo, no caso da Mediação, a recentíssima Lei. 13.140/15.
O que se quer aqui é apontar que, mesmo fora do ambiente jurisdicional estatal, temos que a prática da Justiça Conciliativa exerce o compromisso com a necessária e imprescindível função da pacificação social, escopo indissociável da jurisdição, elemento de caracterização conceitual em sua compreensão.
Notadamente, não se tem tão somente a jurisdição estatal o compromisso para com aludida perspectiva voltada à natureza teleológica que mira a satisfação dos direitos, mas, e de maneira pontual, tanto a conciliação quanto a mediação são métodos de solução de conflitos que, não obstante em sua prática extraprocessual, não se credenciem como jurisdição em si, assumem um papel exercido pela sociedade civil que assenta e vetoriza uma das peças essenciais na construção conceitual da jurisdição que é, por tudo, a pacificação do conflito, i.e., paz social.
Insta, por fim, atentar, como já fora objeto de linhas atrás, que a jurisdição, ainda que cravada da função pacificadora em sua gênese, não logra invariavelmente em tal êxito, quando, v.g., estar-se diante de decisões descumpridas ou mal cumpridas, como também ocorre com a dita Justiça Conciliativa, quando não se chega ao êxito na aplicação técnica de seu intento. Não obstante isso, ontologicamente, não se quer dizer que se prescinda de tal objetivo como caracterizador de sua índole pacificadora.

4.4 Procedimentos cartorários

Em determinadas matérias, a lei proíbe, de maneira sistemática, a autocomposição, a mediação, o juízo arbitral, ou mesmo a satisfação voluntária de determinada pretensão.
Em tais casos, a sujeição ao exame judicial para a sua procedência é condição essencial.
Neste contexto é que em sede de direito processual civil pátrio encontra-se lugar a denominada “jurisdição voluntária”, ainda que não nominada assim pelo legislador do novel CPC/2015 (LGL\2015\1656), mas que, nem por isso, trasmuda-se em outro “ser”, senão nesta própria jurisdição, não obstante tipificada com tal nome pelos códigos processuais civis brasileiros antecessores e de reconhecimento secular.
Entende-se como jurisdição voluntária aquela em que ocorre a mera participação do Poder Judiciário em negócios jurídicos privados, a fim de conferir-lhe validade, por isso é que se diz ser a jurisdição voluntária aquela que exerce a administração pública dos interesses privados, não havendo, portanto, conflitos a serem dirimidos, sendo formalmente capitulada nos arts. 719 a 770 do CPC (LGL\2015\1656), em matérias como: divórcio e separação judicial consensual, extinção consensual de união estável, abertura de testamento e codicilo, herança jacente, declaração e divisão de bens de ausente, coisas vagas, interdição, de organização e da fiscalização das fundações, dentre outras.
É bem verdade que a Jurisdição Voluntária, como já outrora pontuada, ainda que diante de sua pontual característica prática – esta representada pela realização de uma intensa função jurisintegrativa59, no que se refere à sua natureza processual –, faz-se marcada por controvérsias e questionamentos que ora recrudescem, atravessando gerações.
Usando a Jurisdição Contenciosa como paradigma em visão macroscópica da mesma, a doutrina, com mais ou menos frequência, vem estampando, em produções intelectuais, pontos de convergência e divergência com relação à Jurisdição Voluntária, no intuito, pensamos, de mero exercício didático, o que, de certo, esconderá reflexões críticas necessárias à exata compreensão do papel desempenhado por ambas as Jurisdições no contexto da processualística civil hodierna.
À bem de todo o exposto, é fato que se dará o emprego procedimental da jurisdição voluntária diante de determinadas circunstâncias nos chamados direitos indisponíveis (no âmbito civil, são as questões ligadas ao Estado e à capacidade das pessoas. Ex.: divórcio, anulação de casamento, separação, interdição, investigação de paternidade).
Ocorre que alguns destes procedimentos, quando de índole consensual entre os interessados ou envolvidos no interesse em questão, foram compreendidos como possíveis de ser viabilizados fora da seara jurisdicional do Estado, pois que a própria pretensão ansiada pelos interessados, em tese, não exigiria ou justificaria a presença obrigatória do juiz estatal, contribuindo muitas vezes pela atenção a ser dada em procedimentos não contenciosos em face daqueles que, certamente, exigiriam maior participação da atividade judicial na solução de conflitos, somando ao interesse na diminuição de demanda que solapam as comarcas de todo o país.
Assim, fruto do projeto de Reforma do Poder Judiciário, fora editada a Lei 11.441 de 04.01.2007, alterando dispositivos da Lei 5.869 de 11.01.1973 – Código de Processo Civil –, possibilitando que procedimentos que até então estavam limitados à exigência de seu processamento no âmbito da jurisdição estatal fossem alcançados pela possibilidade de propositura em sede de via administrativa (Cartório de Notas), portanto, nos casos de inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual, e mesmo no CPC/2015 (LGL\2015\1656), com a possibilidade de manejo da usucapião na forma extrajudicial, ex vi do art. 1.071.
Em verdade, a Lei 11.441/2007 busca a desburocratização e efetividade dos atos que, mesmo demonstrando a vontade dos interessados, maiores e capazes, permaneciam submetidos à análise prévia da autoridade judicial, por explícita exigência legal, para produzirem efeitos quando homologados.
Explicitando um pouco sobre o conteúdo da digitada lei, esta autoriza que os inventários em que existam partilhas amigáveis, bem como as separações e os divórcios consensuais, sejam manejados, extrajudicialmente, perante o oficial de registro cartorário.
Importante ressaltar que não poderá haver o interesse de menores, tanto no inventário como nas separações/divórcios, sob pena de tornar vedada a utilização da via extrajudicial.
Resta evidente que a legislação supra, muito embora conceda a opção de realização da separação, do divórcio e do inventário consensual, ou seja, fora das órbitas do Poder Judiciário, permanece reconhecendo como obrigatória a representação dos interessados por meio de advogado.
Observa-se ser essencial tal situação para resguardar que a vontade das partes seja exatamente reproduzida nas disposições levadas ao cartório, sendo necessária a participação de advogado ou defensor público, a fim de evitar abusos e desencontros entre o interesse dos litigantes e a realidade apresentada às autoridades competentes. Aliás, o espírito dos citados §§ 1º e 2º do art. 610 traduzem em requisito de validade tais presenças.
A legislação supracitada, contudo, deve ser entendida, e isto é de bom grado ratificar, como uma prerrogativa concedida às partes – desde que satisfeitos os requisitos legais – em optarem por realizar o inventário de seu parente, ou ainda sua separação ou seu divórcio pela via extrajudicial.
Diante de eventuais divergências interpretativas e de conteúdo decorrentes da própria extensão, e procedimentos prestigiados pela da Lei 11.441/2007, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) teve por bem regulamentar a referida Lei, ouvindo, de antemão, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação dos Notários e Registradores do Brasil.
Nestes termos, editada foi a Resolução 35 do CNJ, devidamente publicada em 24.04.2007, regulamentando a aplicação da Lei 11.441/2007, esta que, como já anteriormente visto, trata da possibilidade de realização dos procedimentos relativos ao inventário, partilha, separação e divórcio consensuais pela via administrativa, qual seja, o Cartório de Notas (Tabelionato).
De início, cabe apontar que a dita Resolução 35 estabeleceu, dentre outras regras, o respectivo critério de cobrança dos emolumentos para a prestação dos referidos serviços a serem cobrados pelos cartórios, pois que, com o advento da Lei 11.441/2007, ao passar a permitir que determinados procedimentos, sem litígio, fossem realizados na esfera administrativa, uma diversidade de Cartórios, diante da omissão da Lei, no que toca ao critério de cobrança, passou a estabelecer taxas muitas vezes excessivas aos interessados na realização dos atos elencados pela própria Lei, sobrecarregando os procedimentos em onerosidade pecuniária, visto que o parâmetro de cobrança praticado estava sendo aquele decorrente da quantidade de bens, ou seja, quanto maior o número de bens envolvidos no procedimento, mais elevado seria o valor a pagar.
Assim, estabelecido foi no art. 4º da Resolução 35, o seguinte:
“Art. 4º. O valor dos emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente remuneração dos serviços prestados, conforme estabelecido no parágrafo único do art. 1º da Lei 10.169/2000, observando-se, quanto a sua fixação, as regras previstas no art. 2º da citada lei.”
Cabe esclarecer que o dispositivo apontado pelo art. 4º supra dita parâmetros mais razoáveis para a cobrança de taxas de emolumentos, fixando, por exemplo, um valor mínimo e máximo para o exercício do ato, e ainda a tão necessária observância das peculiaridades socioeconômicas de cada região, otimizando, positivamente, os procedimentos em questão.
Vale a pena lembrar, por conseguinte e em regra, o evidente apelo social dos institutos referidos, não podendo estes culminar em elevadas despesas para os interessados. Não custa sublinhar que a Lei 11.441/2007, em seu art. 3º, garante aos comprovadamente necessitados a gratuidade dos serviços, abrangendo todos os atos ali previstos, ratificando tal entendimento os arts. 6º e 7º da sempre citada Resolução 35 do CNJ.
Em esclarecimento final à questão retro, importante se faz aqui acostar o art. 2º da Lei 10.169/2000, cuja referência ao mesmo fora cotejada no corpo do art. 4º alhures citado:
“Art. 2º Para a fixação do valor dos emolumentos, a Lei dos Estados e do Distrito Federal levará em conta a natureza pública e o caráter social dos serviços notariais e de registro, atendidas ainda as seguintes regras:
“I – os valores dos emolumentos constarão de tabelas e serão expressos em moeda corrente do País;
“II – os atos comuns aos vários tipos de serviços notariais e de registro serão remunerados por emolumentos específicos, fixados para cada espécie de ato;
“III – os atos específicos de cada serviço serão classificados em:
“a) atos relativos a situações jurídicas, sem conteúdo financeiro, cujos emolumentos atenderão às peculiaridades socioeconômicas de cada região;
“b) atos relativos a situações jurídicas, com conteúdo financeiro, cujos emolumentos serão fixados mediante a observância de faixas que estabeleçam valores mínimos e máximos, nas quais enquadrar-se-á o valor constante do documento apresentado aos serviços notariais e de registro.
“Parágrafo único. Nos casos em que, por força de lei, devam ser utilizados valores decorrentes de avaliação judicial ou fiscal, estes serão os valores considerados para os fins do disposto na alínea b do inciso III deste artigo.”
Outro conteúdo de suma importância e esclarecimento pela Resolução 35 foi aquele relativo à competência e às regras para determinar a escolha do tabelionato de notas apto à prática dos atos procedimentais da matéria a ser manejada, não deixando dúvidas sobre a liberalidade do interessado no tocante a sua escolha.
Nisso, de pronto, já no art. 1º da multicitada Resolução, tem-se estabelecido que:
Art. 1º Para a lavratura dos atos notariais de que trata a Lei 11.441/07, é livre a escolha do tabelião de notas, não se aplicando as regras de competência do Código de Processo Civil.”
Em seguida, igualmente em matéria relevante, assegurada é a escolha facultativa da via administrativa pelos interessados, podendo, inclusive, solicitar ao juízo – em casos de demandas judiciais já em andamento – a suspensão do processo judicial pelo prazo de 30 dias, a fim de que se promova a instauração do procedimento em respectiva instância cartorária. É o que noticia o art. 2º da Resolução 35, in verbis:
“Art. 2º É facultada aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial.”
Mais precisamente, quanto ao inventário e à partilha, a Resolução expressa em seu art. 11 não ser necessária a observância do art. 990 do CPC/1973 (LGL\1973\5) (art. 617 do CPC/2015 (LGL\2015\1656)), no que se refere à ordem para a representação do espólio.
No que toca ao denominado companheiro (a), indicam os arts. 18 e 19 da aludida Resolução 35 o entendimento de que seu direito à meação pode ser reconhecido por escritura pública, desde que consentindo os demais herdeiros e interessados na herança, todos absolutamente capazes, alargando assim o alcance das normas estabelecidas na Lei em questão, propriamente para os que vivem sob o status de união estável.
Por outro lado, ocorrendo controvérsia acerca de tal questão, esta deverá ser devidamente solucionada em Juízo. Nisto, estabelece o conjunto de dispositivos abaixo:
“Art. 18 O (A) companheiro (a) que tenha direito à sucessão é parte, observada a necessidade de ação judicial se o autor da herança não deixar outro sucessor ou não houver consenso de todos os herdeiros, inclusive quanto ao reconhecimento da união estável.
“Art. 19. A meação de companheiro (a) pode ser reconhecida na escritura pública, desde que todos os herdeiros e interessados na herança, absolutamente capazes, estejam de acordo.”
Outra questão importante é aquela acerca da existência de credores do espólio, o que muito bem define a Resolução em seu art. 27, preceituando que tal ocorrência não impede a realização de inventário, partilha ou adjudicação por escritura pública: “Art. 27 A existência de credores do espólio não impedirá a realização do inventário e partilha, ou adjudicação, por escritura pública”.
Assim, uma vez tendo o falecido deixado dívidas, é absolutamente possível que se processe respectivo inventário perante o Cartório, sendo em tal instância analisados os bens, efetivando-se o devido pagamento a eventuais credores para, então, partilhar os demais.
Por fim, no que concerne ao sigilo das escrituras públicas, o CNJ, através da Resolução em tela, indica a negativa de sua ocorrência nos casos de separação e divórcios consensuais. É o que anota o art. 42, na seguinte forma: “Art. 42 Não há sigilo nas escrituras públicas de separação e divórcio consensuais”.
De tudo, resta garantido que, se for de preferência da parte que seu processo seja promovido judicialmente, não poderá ser impedida para tanto, sob pena de inconstitucional afronta ao art. 5º, inciso XXXV, de nossa Constituição Federal, essa que, indubitavelmente, proclama a inafastabilidade da jurisdição, somando-se ainda ao art. 3º, caput, do CPC (LGL\2015\1656).
Com relação à regulação extrajudicial da usucapião, possibilita o CPC/2015 (LGL\2015\1656) o seu reconhecimento em sede cartorária, no entanto, por óbvio, necessita da consensualidade daquele até então titular do direito real e de outros diretos registrados na matrícula do imóvel usucapiendo, bem como na matrícula dos imóveis dos confinantes (inciso II do art. 1.071).
Não havendo dita consensualidade, seja por ausência expressa do consentimento de qualquer um dos titulares de direito reais e de outros direitos registrados, ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo, e na matrícula dos imóveis confinantes, mesmo que notificado pelo registrador competente para se manifestar em 15 dias (art. 1.071, IV, § 2º), ou mesmo por meio de impugnação ao pedido de reconhecimento extrajudicial da usucapião (art. 1.068, IV,§ 10), não impedirá o ajuizamento de eventual ação judicial de usucapião (art. 1071, IV,§ 9º), ratificando, notadamente, o próprio direito constitucional ao acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF/88 (LGL\1988\3), e agora também, art. 3º, caput, do CPC (LGL\2015\1656)).
Como se vê, mesmo que diante de requisitos necessários à correta instauração via Cartório de Notas das pretensões em tela (inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual e a usucapião), inegavelmente nada exclui a ideia de estar-se diante de atividade tipicamente jurisdicional, correspondendo aos próprios ensejos aos quais tem o cidadão quando da procura pela jurisdição estatal, tanto que, conforme frisado repetidamente, nada o impede de provocar o Serviço Público da Justiça quando entender ser a melhor via satisfativa da pretensão escolhida, ainda que não resistida por outrem.
O que se quer com isso é demonstrar que os atributos da jurisdição podem ser parcialmente atribuídos a outros entes, flexibilizados, desde que devidamente reconhecidos e regulados legislativamente, para fins de se obter o interesse almejado.

5 Considerações finais

Procurou-se aqui demonstrar que, não obstante o caráter plurívoco e destoante dos mais variados conceitos de jurisdição, seus conteúdos (in)formadores, tidos por nós como essenciais – Poder, Função e Atividade –, não são exclusivos, indelegáveis ou irrenunciáveis, sendo, de certo, realizados em outros ambientes e, por vezes, em processos e procedimentos fora do domínio do Serviço Público da Justiça (Jurisdição Estatal), de modo a comprovar que a satisfação dos direitos ou alcance das pretensões miradas pode se conquistar em outras órbitas tão legítimas (Justiça Arbitral, Justiça Conciliativa e Cartório de Notas) quando aquela a qual o cidadão fora “programado” a sempre estrabicamente provocar (Jurisdição Estatal).
Afinal, o que vale sempre é tornar as pessoas mais felizes ou menos infelizes.

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1 SORJ. A nova sociedade brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000, p. 44. Na esteira da importância do fundamento histórico para o descortinar de uma realidade, muitas vezes despercebida pela necessidade de se viver intensamente o presente (consequência) sem se comunicar com a origem (causa) do fenômeno em questão, importante aqui trazer à lume a ideia de Kuhn acerca de tal sensação, sustentando o filósofo que: “Se a história fosse vista como repositório para algo mais do que anedotas ou cronologias, poderia produzir uma transformação decisiva na imagem de ciência que atualmente nos domina”. KUHN. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2003, p. 19.


2 KUHN. A Revolução copernicana. Rio de Janeiro: Lisboa, Edições 70, 2002.

3 É de se observar que a ideia de evolução para Thomas Kuhn não significaria exatamente uma noção de progresso, mas, sim, na ideia de que se a ciência é a reunião de fatos, teorias e métodos reunidos nos textos atuais, então os cientistas são homens que, com ou sem sucesso, empenharam-se em contribuir com um ou outro elemento para essa constelação específica. O desenvolvimento torna-se o processo gradativo através do qual esses itens foram adicionados, isoladamente ou em combinação, ao estoque sempre crescente que constitui o conhecimento e a técnica científicos. KUHN. A estrutura das revoluções científicas, cit., p. 20. Importante, então, o entendimento acerca dos paradigmas (não obstante o caráter polissêmico de seus conceitos) como toda concepção científica alicerçada por determinados pressupostos, aceitos pela comunidade científica como verdades indiscutíveis.
Nesta toada, ao se relacionarem o processo evolutivo e progressão da ciência por meio de revoluções e daí a quebra de paradigmas ou “verdades científicas”, temos que, segundo Kuhn, a história das ciências não deve ser estudada, supondo-se, como a historiografia tradicional imagina, que o processo científico se dá através da acumulação contínua de conquistas obtidas pelas gerações precedentes, de modo que se pudesse descrevê-las como um processo evolutivo. As revoluções científicas (ou a quebra de um determinado paradigma e sua substituição por outro) ocorrem, esporadicamente, quando um determinado modelo deixa de ofertar soluções para um numerário considerável de problemas, impulsionados por novas condições históricas, bem como pelo próprio desenvolvimento da ciência.
Veja-se, portanto, que é plenamente adaptável à constatação de que tal fenômeno revolucionário vem atingindo construções conceituais, e por que não práticas, em vários institutos aqui processuais, tais como a jurisdição, ação, processo e mesmo na organização judiciária, onde, construídos sob outras “verdades científicas”, não coadunam, ou ainda, não mais se aderem à dinâmica jurídica e ao tecido social hodierno.


4 BOBBIO. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 67 et seq. A multiplicação e mesmo a mundialização de determinados direitos coloca a ciência jurídica diante de enfrentamentos aos quais o próprio modelo europeu continental – deitado em raízes kelsianas –, onde a verdade jurídica condicionava à sua própria segurança, não previa suportar.
Como adverte Ovídio Batista, ao examinar o caráter materializante da normatividade jurídica diante de tecido social complexo, usando como pano de fundo a autoridade do grande lógico e jurista Leibniz, em seus escritos acerca do método da jurisprudência, dando plena medida do significado e da novidade da concepção matematizante da Ciência do Direito: “‘a teoria do direito inclui-se entre aqueles – escreve ele (Leibniz) – que não dependeu de experimentos, mas de definições e logo após, como confirmação, aduz ser possível compreender que algo é justo, mesmo quando não haja ninguém que possa fazê-lo vigorar, não diversamente do que ocorre em matemática, onde ‘as relações aritméticas são verdadeiras, mesmo que não haja quem as numere nem existam coisas a numerar’”. Democracia moderna e processo civil. In: GRINOVER; DINAMARCO; WATANABE (Coord.). Participação e processo. São Paulo: Ed. RT, 1988, p. 111.


5 ALBERTINI, Pierre et al.La Déclaration des droits de l’homme et du citoyen de 1789. Paris: Economica, 1993, p. 113.

6 CHIOVENDA. Princípios de Derecho Procesal Civil. Traducción do Prof. José Casais Y Santaló. México: Cardenas, 1989. t. I, p. 95-96; CARNELUTTI. Instituciones del Proceso Civil. Traducción de la quinta edición italiana por Santiago Sentis Melendo. Buenos Aires: Ediciones Jurídicas Europa-America, 1956. v. 1, p. 28.

7 Fazem parte hoje da estrutura institucional da União Europeia: a) O Parlamento Europeu.
b) Conselho Europeu.
c) Conselho.
d) Comissão Europeia.
e) Tribunal de Justiça da União Europeia.
f) Tribunal de Contas
O Conselho e a Comissão supracitados são assistidos por dois comitês com funções consultivas: o Comitê Econômico e Social e o Comitê das Regiões.
Complementando a presente estrutura está o Banco Europeu de Investimentos – BEI –, dotado de personalidade jurídica, o Sistema Europeu de Bancos Centrais – SEBC – e o Banco Central Europeu – BCE –, também dotado de personalidade jurídica.
Especificamente sobre a estrutura institucional da UE, ver, dentre outros, GAIO JÚNIOR. O consumidor e sua proteção na União Europeia e Mercosul. Lisboa: Juruá Editorial, 2014, p. 47-92; ARNAUD, Vicente Guillermo. Mercosur – Unión Europea, Nafta y hos Processos de Integración regional. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1996, p. 271; FARIA, Werter R. Quadro Institucional da Comunidade Européia. Revista de informação legislativa. a. 32, n. 28, p. 179.
Para um aprofundamento mais específico em tão formidável e essencial instituição, confira, ainda, dentre outros: CAMPOS, João da Mota. Direito comunitário. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989; CASSELA, Paulo Borba. Comunidade Européia e seu ordenamento jurídico. São Paulo: Ltr., 1994; CARCOMO LOBO, Maria Tereza. Manual de direito comunitário. Curitiba: Juruá, 2001; ALBUQUERQUE MELLO, Celso D. de. Direito internacional da integração. Rio de Janeiro: Renovar, 1996; PORTO, Manuel et al. A União Européia. Coimbra: Centro de Estudos Europeus, 1994; MOURA RAMOS, Rui Manuel. Das comunidades à União Européia. Coimbra: Coimbra Editora, 1994.


8 DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. 23. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 802.

9 NEVES, Celso. Estrutura fundamental do processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 3.

10 No entanto, afirmava ser a função imediata da jurisdição aquela de decidir conflitos e controvérsias de relevância jurídica. (COUTURE, Eduardo J. Fundamentos de Derecho Procesal Civil. 2. ed. Buenos Aires: Depalma, 1958, p. 42).

11 “Del concetto di giurisdizione non si può dare uma definizione assoluta , valevole per tutti i tempi e per tutti i popoli.” (CALAMANDREI, Piero. Opere Giuridiche. Napoli: Morano Editore, 1970. v. IV, p. 34).

12 ROCCO, Alfredo. La Sentenza Civile. Milano: Giuffrè, 1962, p. 10.

13 Cabe notar que Montesquieu, em sua obra Do Espírito das Leis, já abrandava a rigidez da divisão entre os diversos Poderes do Estado. Vale ressaltar ainda que, mais precisamente no Capítulo VI do Livro XI da referida obra, observa-se que, diversamente do que alguns entendem, o aludido autor não sustenta os Poderes como conteúdos estanques. Admitindo ele a unidade do denominado Poder Estatal, exclamava a ingerência de um dos Poderes do Estado em competências aparentemente alheias a sua área de abrangência. É de se frisar, como já afirmava Léon Duguit (Traité de droit constitucionnel: la théorie génerale de i’état. v. II. Paris: DeBoccard, 1928, p. 663), que a confusão entre a separação de funções não provém de Montesquieu, mas de seus intérpretes.


14 Oportuno trazer aqui as ideias de Calamandrei acerca do assunto, em que o mestre italiano sustenta que a distinção entre as funções dos Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, pode-se dar, pelo menos teoricamente, pelo exercício de três critérios, sendo eles o orgânico, o formal e o substancial. O critério orgânico implica na distinção da função a partir do órgão que a exerce. Já, no que se refere ao critério formal, este corresponde a uma distinção realizada mediante a forma de como se revestem os atos praticados pelas três funções estatais. Quanto ao critério substancial, este dita a análise sob a óptica da natureza ou do conteúdo do ato em si, bem como os seus efeitos jurídicos, independente do órgão que o exerce. (CALAMANDREI. Instituciones de derecho procesal civil. v. 1, p. 186).


15 CHIOVENDA. Principii di diritto processuale civile. 4. ed. Napoli: Jovene, 1965, p. 301.

16 CARNELUTTI. Instituciones del proceso civil. v. 1, p. 28.

17 GUASP, Jaime; ARAGONES, Pedro. Derecho procesal civil. 5. ed. Madri: Civitas, 2002. t. I, p. 89.

18 Ibidem, p. 92.

19 ROSEMBERG, Leo; SCHWAB, Karl Heinz; GOTTWALD, Peter. Zivilprozeßcht. Münchhen, 2004, p. 2-3.

20 NEVES, Celso. Op. cit., p. 28; CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 28. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012, p. 125.

21 Sobre a característica prática oriunda de atividade processual jurisintegrativa, esta é desenvolvida pelo exercício da Jurisdição Voluntária, ver por todos, NEVES, Celso. Op. cit., p. 43-51.

22 CARNELUTTI. Instituciones del nuevo proceso civil italiano. Roma: Foro Italiano, 1951, v. I, p. 19.

23 Ibidem, p. 21.

24 “A chamada jurisdição voluntária abrange, pois, os atos de administração de interesses privados, qualquer que seja o órgão que os pratique, autoridade administrativa ou autoridade jurisdicionária. “Sob a mesma denominação, à espera que outra surja, menor (sic) que a de Zanobini, para vencer a lei do menor esforço que vai mantendo a romana através dos séculos.” (LOPES DA COSTA, Alfredo de Araújo. A administração pública e a ordem jurídica privada (jurisdição voluntária). Belo Horizonte: Bernardo Álvares, 1961, p. 65-70).


25 Ibidem, p. 65.

26 GRINOVER, Ada Pellegrini. Ensaio sobre a processualidade. Brasília: Gazeta Jurídica, 2016, p. 30.

27 Ibidem, p. 5.

28 CASTEX, Paulo Henrique. Os blocos econômicos como sociedade transnacional – A questão da Soberania. In: CASELLA, Paulo Borba (Coord.). Mercosul, integração regional e globalização. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 279-280. No mesmo sentido JELLINEK, Georg. Teoria general del estado. Buenos Aires: Editorial Albatroz, 1954, p. 356.

29 Contribui, para a análise da intensidade do grau de interdependência entre os Estados-partes em um determinado modelo integracionista, a observância em torno da estrutura institucional deste próprio modelo, trazendo a lume, assim, a existência de organismos supranacionais e intergovernamentais.A supranacionalidade, cujo conteúdo se encontra presente em uma etapa do processo integracionista denominada “União Econômica”, tendo por modelo atual a União Europeia, é exposta assim por Pierre Pescatore (Lê droit de l’integration emergence d’un phénomène nouveau dans les relations internationales selon l’expérience des Communautés Européennes. Genève: Sijthoff – Leiden/IHUEI, 1972, p. 51): “Voilà donc en résumé ce que je comprends, pour ma part, comme constituant l’essenciel de la supranacionalité: um pouvoir, réel et aoutonome, placé au service d’objectifs communs à pluisiers Etats. Dans cette définition, la notion d’objectif’ doit resumer en um mot l’idée d’ordre determiné par l’existence de valeurs et d’intérêts communs”.
Neste sentido, a supranacionalidade se caracteriza pela reunião de três elementos: o reconhecimento, por um grupo de Estados, de um conjunto de interesses ou valores comuns; a criação de um poder efetivo colocado a serviço desses interesses ou valores; a autonomia desse poder.
Os interesses ou valores comuns motivam certos Estados a se unirem com o intuito de alcançar objetivos comuns. Tais interesses comuns podem ser os mais diversos, como a própria implementação de um mercado comum, por exemplo. Já os valores comuns são os motivadores da união de esforços empreendidos pelo grupo de Estados, que se dispõe, até mesmo, a subordinar os interesses nacionais em prol dos interesses comuns, no intuito de atingirem os objetivos comuns.
Para a realização desses objetivos comuns são criados poderes efetivos. A institucionalização é colocada a serviço desses objetivos comuns, cabendo aos órgãos estruturais criados produzir, interpretar e aplicar normas jurídicas que devem ser respeitadas, bem como tomar decisões que comprometam os Estados.
Ainda é preciso haver autonomia dos citados órgãos estruturais, caracterizando-se por ser um poder distinto dos poderes dos Estados-membros. Deste modo, “(...) os órgãos supranacionais são formados por um quadro próprio de funcionários, desvinculados dos governos dos países-membros, e suas decisões são autônomas em relação a esses governos”. (LIMA FLORENCIO, Sérgio Abreu; FRAGA ARAÚJO, Ernesto Henrique. Mercosul hoje. São Paulo: Alfa Omega, 1996, p. 69.)
A criação de órgãos colocados exclusivamente a serviço dos objetivos comunitários faz com que a continuidade do processo integracionista se encontre resguardada dos ímpetos políticos circunstanciais dos governos.
Sobre tal questão, entende Ricardo Seitenfus (Para uma nova política externa brasileira. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1994, p. 115) que “a instituição comunitária não deve, então ser tão somente o somatório das vontades dos Estados-Membros. Possui dinâmica e latitude de atuação próprias, a permitir da tomada de posições que extrapolem a visão imediatista e os interesses personalistas das administrações dos países que a integram. Certamente, a instituição espelha as vontades dos seus membros, inclusive no que diz respeito a sua incorporação funcional, mas é, a um só tempo, distinta e superior, na medida em que a ordem comunitária deverá sobrepor-se à ordem nacional que persiste naqueles assuntos para os quais foi definida sua competência”.
Deste modo, os órgãos, dotados de poderes autônomos, não representam a vontade individual dos Estados, mas a vontade comunitária. Assim, a supranacionalidade determina o aparecimento de um poder que se coloca acima dos Estados, resultante da transferência de parte das suas funções próprias aos domínios abrangidos pela entidade supranacional, passando esta a exercê-las tendo em vista o interesse comunitário e não o interesse individual dos Estados.
De certo, é, portanto, o órgão supranacional independente, em face dos governos dos Estados-Membros, assinalando neste sentido Gualtiero Martín-Marchesini (La supranacionalidad en la integración latinoamericana. Revista de Direito Público. a. XXI, n. 85. jan.-mar. 1998, p. 148): “La supranacionalidad es el poder que los Estados miembros de una comunidad delegan en organismos independientes de los gobiernos de dichos Estados para que tengan competencia suficiente de normar, ejecutar y dirimir todo lo referente a los objetivos comunes que llevaron a dichos Estados a integrarse en una comunidad organizada”.
Já com relação à intergovernabilidade, desenvolvida no âmbito do modelo mercosulino de integração, ela possui característica que se apresenta no sentido de relacionamento entre governos, disso decorrendo o fato de os Estados Nacionais preservarem suas autonomias plenamente. E, sendo assim, “as disposições que entre eles se celebram não podem jamais impor a qualquer deles a supremacia de outra, ou qualquer forma de submissão a algum organismo posto acima da soberania”, conforme sustenta Adroaldo Furtado Fabrício (A prejudicialidade de Direito Comunitário nos tribunais supranacionais. Revista da AJURIS. a. XXIV, n. 69. mar. 1997, p. 20).
Deste modo, o Estado-Membro detém a mesma liberdade de ação que possuía antes mesmo de pertencer a determinado bloco integracionista, compreendendo aí que as decisões internas poderão ser tomadas ainda que venham a contrariar o intuito integracionista. O Estado-parte não sofre, ademais, qualquer ingerência na sua autonomia individual.
Os interesses discutidos em fóruns de negociação intergovernamental são individuais, ou seja, advêm de cada Estado-Membro em sua particularidade, e as decisões, porventura tomadas, são aplicadas por iniciativa dos Estados mediante formas próprias de internalização.
Os órgãos estruturais, com característica intergovernamental, não são autônomos e independentes em relação aos governos nacionais. Representam, na verdade, a vontade política dos Estados-Membros, cabendo aos funcionários de tais órgãos a representação fiel da vontade dos governos.
Neste entendimento, assentam Sérgio Florêncio e Ernesto Araújo (Op. cit., p. 69): “Órgãos intergovernamentais são aqueles formados por representantes dos governos-funcionários que exercem uma função no quadro administrativo interno de cada país e que são encarregados também de participar das negociações; a decisão de um órgão intergovernamental é simplesmente uma decisão conjunta dos governos nele representados”.
Do exposto, percebe-se a nítida distinção entre as duas características em foco, a saber: a supranacionalidade e a intergovernabilidade, possuindo cada qual peculiaridades, as quais qualificam a estrutura institucional do processo integracionista que as adota, cabendo ainda salientar a diferença apontada por Deisy Ventura (A ordem jurídica do Mercosul. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996, p. 29) entre os organismos dotados de órgãos supranacionais e daqueles detentores de órgãos intergovernamentais: “(...) a diferença básica a ser estabelecida entre organismos intergovernamentais e supranacionais é precisamente a detecção do interesse predominante. Nos primeiros, trata-se de fóruns destinados a cotejar interesses individuais e, se for o caso, harmonizá-los. São marcadamente espaços de negociação, cujas decisões, em existindo, serão aplicadas por iniciativa dos Estados-Membros. Entidades supranacionais pressupõem a negociação em outro nível, para definir o interesse coletivo, através de processo decisório próprio, a serviço do qual elas colocarão em funcionamento uma estrutura independente”.


30 FISCHBACH, Oscar Georg. Teoria general del estado. Barcelona: Editorial Laboral, 1949, p. 135.Raquel Kritsch (Soberania. A construção de um conceito. São Paulo: Humanitas. FFLCH/USP: Imprensa Oficial do Estado, 2002, p. 29-31), com rigor, sob o ponto de vista histórico, delineia o momento no qual a noção de soberania pôde ser diretamente associada ao nascente Estado moderno: “A noção de soberania, (...), aparece como um conceito em transformação desde pelo menos a difusão ideológica e prática do cristianismo na Europa, a partir do século X. Num primeiro momento, esse fenômeno que viria a ser nomeado soberania indicava mais a atribuição da função de ‘comissário de Deus’ a este ou aquele agente. Isto é, a determinação de quem fazia cumprir a lei em nome de Deus nesta ou naquela esfera de governo em circunstâncias determinadas. A Questão das Investiduras, por exemplo, girava em torno do problema de quem teria poder para nomear os bispos e investir no clero. Neste momento, o problema da soberania se colocava não apenas para o imperador ou para o papa, mas para todos os poderes que pretendiam obter a supremacia nas querelas em questão. E, de modo um pouco diferente do que ocorreria com a noção de Estado moderno, soberania, nesse sentido, não era incompatível com a ideia de uma comunidade universal cristã.
“Foi apenas num momento posterior, com os acréscimos políticos e conceituais gerados pela recuperação do direito romano e dos escritos dos antigos – em especial os de Aristóteles –, pela síntese de Tomás de Aquino e pelas transformações em curso no Ocidente latino, sobretudo nos séculos XII e XIII, que se tornou possível pensar a capacidade de criar e impor a lei – fosse em nome de um legislador divino ou humano – como um atributo do conceito que seria sintetizado na ideia de soberania. A decisão de Felipe, o Belo, de taxar o clero francês, independentemente de seus laços com a igreja de Roma, ilustra bem a nova dimensão do problema: tratava-se agora de impor uma lei num determinado território como afirmação de uma vontade humana suprema.
“Somente depois de adquirir esse segundo sentido é que a noção de soberania pôde ser diretamente associada ao nascente Estado moderno: foi a partir daí que o poder de criação e imposição da lei por um legislador passou a transformar-se mais e mais num atributo de uma formação de poder territorial específica, definida em termos cada vez mais leigos e independentes de normas e concepções divinas e universalistas. Quando essa ‘união’ conceitual e prática passa a ter lugar, a história desses dois conceitos se entrelaça de tal modo que como duas entidades teórica e historicamente distintas, como dois movimentos temporais diferenciados que – numa quase fusão –encontram-se por um certo período e em determinado lugar na história.”
Sobre toda a doutrina clássica da soberania, esta, baseada numa visão tradicional desenvolvida por Bodin, Hobbes, Rosseau, Hegel, dentre outros, ver BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 10. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000, p. 123-132; FRIEDE, Reis. Curso da teoria geral do Estado. Teoria constitucional e relações internacionais. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000, p. 32-37; REIS, Márcio Monteiro. Interpretação constitucional do conceito de soberania – As possibilidades do Mercosul. In: CASELLA, Paulo Borba (Coord). Mercosul, integração regional e globalização. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 917-919; PAUPÉRIO, Arthur Machado. O conceito polêmico de soberania. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p. 35-149.


31 CASTEX, Paulo Henrique. Op. cit., p. 280. Vale ressaltar opinião de Celso D. Albuquerque Mello (Op. cit., p. 123) que, entendendo também estarmos em um período de transição, sustenta que a soberania hoje tem um conteúdo meramente formal, “soberania é um feixe de competências que o Estado possui e lhe é dado pela ordem jurídica internacional”.
Sobre a problemática conceitual de Soberania, a que também a denomina de “crise contemporânea desse conceito”. Ver BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 122-123.


32 REIS. Op. cit., p. 922.

33 “Una, por não ser possível a convivência simultânea de dois poderes soberanos. Soberano é aquele poder que se situa acima de todos os demais, não estando submetido a nenhum outro. Não é compatível a convivência de mais de um poder soberano no mesmo âmbito. Indivisível, por conclusão lógica entre a sua unidade; no entanto, a indivisibilidade da soberania não impede a divisão do seu exercício. A teoria da divisão de poderes importa, na verdade, em uma divisão da própria soberania. Imprescritível e inalienável, pois encarna o poder supremo, insuscetível de lesão e indisponível.” Idem. Para Hermann Heller: “La soberanía del Estado significa, pues, la soberania de la organización estatal como poder de ordenación territorial supremo y exclusivo. El Estado, como organización territorial soberana, es creador supremo de las normas y tiene el monopolio del poder de coacción física legítima, la ultima ratio de todo poder”. (HELLER, Hermann. Teoria del estado. Pánuco: Fondo de Cultura Economica, 1963, p. 273). Sobre tais características, sustentando ainda que soberania é o poder originário, incondicionado, exclusivo e coativo, ver dentre outros, DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da teoria geral do Estado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 69; PAUPÉRIO, Arthur Machado. Teoria democrática da soberania. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997, v. 2, p. 15-17.


34 SÁ, Luís. Soberania e Integração na CEE. Lisboa: Editorial Caminho, 1987, p.54.

35 “Soberania, em termos objetivos se traduz através de um conceito extremamente complexo. Trata-se de uma expressão que pode ser traduzida, simultaneamente, por intermédio de duas diferentes classes gramaticais, ou seja, a classe substantiva e a adjetiva. No sentido material (substantivo) é o poder que tem a coletividade humana (povo) de se organizar jurídica e politicamente (forjando, em última análise, o próprio Estado) e de fazer valer, no seu território, a universalidade de suas decisões. No aspecto adjetivo, por sua vez, a soberania se exterioriza conceitualmente como qualidade suprema do poder, inerente ao Estado, como nação política e juridicamente organizada.” (FRIEDE, Reis. Op. cit., p. 31-32. No mesmo sentido, BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 122-123; PAUPÉRIO, Arthur Machado. O conceito polêmico de soberania, p. 27-28. Observando tais aspectos em um sentido externo e interno, R. Carré de Malberg sustenta que: “(...), la soberanía del Estado se presenta habitualmente como doble: se la divide en soberanía externa y soberanía interna. La primera se manifiesta em las relaciones internacionales de los Estados. Implica para el Estado soberano la exclusión de toda subordinación, de toda dependencia respecto de los Estados extranjeros. Gracias a la soberanía externa, el Estado tiene, pues, una potestad suprema, en el sentido de que su potestad se halla libre de toda sujeción o limitación respecto a una potestad exterior. Decir que los Estados son soberanos en sus relaciones recíprocas significa también que son respectivamente iguales los unos a los otros, sin que ninguno de ellos pueda pretender jurídicamente una superioridad o autoridad cualquiera sobre ningún otro Estado. En la expresión ‘soberanía externa’ la palabra soberanía es, pues, en realidad sinónima de independencia: no tiene así sino un alcance completamente negativo. Por el contrario, en la expresión ‘soberanía interna’ parece tomar una significación positiva. La soberanía interna implica en efecto que el Estado posee, bien en las relaciones con aquellos individuos que son miembros suyos o que se hallan dentro de su territorio, o bien en sus relaciones con todas las demás agrupaciones públicas o privadas formadas dentro de él, una autoridad suprema, en el sentido de que su voluntad predomina sobre todas las voluntades de esos individuos o grupos, al no poseer éstas sino una potestad inferior a la suya. La palabra soberanía sirve, pues, aquí para expresar que la potestad estatal es la más alta potestad que existe en el interior del Estado, que es una summa potestas. Por lo tanto la soberanía tiene dos facetas. Y sin embargo no debe verse, en la soberanía interior y exterior, a dos soberanías distintas”. (MALBERG, R. Carré de. Teoria general del estado. México: Fondo de Cultura Económica, 2001, p. 81-82).


36 Aponta no mesmo sentido, Oliveiros Litrento (A soberania em mudança. Revista de Ciência Política. v. 27. maio-ago. 1994), sustentando que a necessidade de cooperação entre Estados – cooperação política, militar e econômica –, que revela no mundo contemporâneo uma verdadeira interdependência entre os mesmos, faz com que haja uma quase integração de suas vidas política, econômica e social. Para tal, há uma limitação prática (necessária) da esfera da jurisdição de cada Estado, com reflexos óbvios na soberania nacional.
De acordo com o autor supracitado, a interdependência econômica e tecnológica é indiscutível e irreversível e mostra a nítida perspectiva de um mundo unificado pela técnica nas próximas décadas.


37 Op. cit., p. 123.

38 OBRADOVIC, Daniela. Community law and doctrine of disible sovereignty. Legal issues of europe Integration. Deventer, The Netherlands: Kluwer Law and Taxation Publishers, 1993/1, p.7.

39 ROCHA, Wagner. Mercosul. Da intergovernabilidade à supranacionalidade? Curitiba: Juruá, 2000, p. 7. O autor supracitado sustenta ainda que, em se tratando de tal limitação da soberania, “não existe, como temem os ‘eurocéticos’, os ‘mercocratas’ e os ‘nacio-autoritários’, uma supressão da soberania do Estado, mas sim uma limitação consentida, posto que disposta através de tratados, permanecendo intocada a subordinação direta de cada país ao Direito Internacional”.


40 Os tratados que estabelecem a Comunidade não cedem jurisdição sobre todos os campos de atividade para as instituições da comunidade. Dito entendimento tem fundamento no chamado princípio da subsidiariedade, objetivado no preâmbulo do Tratado da União Europeia (Acordo de Maastricht) e definido pelo art. 3º, B, do tratado que instituiu a Comunidade Europeia nos seguintes termos:
“A Comunidade Europeia atuará nos limites das atribuições que lhe são conferidas e dos objetivos que lhe são cometidos pelo presente tratado.
“Nos domínios que não sejam das suas atribuições exclusivas, a Comunidade intervém apenas de acordo com o princípio da subsidiariedade, se e na medida em que os objetivos da ação encarada não possam ser suficientemente realizados pelos Estados-Membros e possam, pois, devido à dimensão ou aos efeitos da ação prevista, serem melhores alcançados no nível comunitário.
“A ação da Comunidade não deve exceder o necessário para atingir os objetivos do presente tratado.”
Denota-se que o princípio supracitado tem por finalidade assegurar uma divisão entre poderes atuais da Comunidade Europeia e os poderes residuais dos Estados-Membros.
Sustenta Luizella Giardino B. Branco que: “O princípio da subsidiariedade constitui, para os Estados-Membros, um mecanismo judicial obrigatório de autodefesa contra o que se percebe como um risco do uso excessivo dos poderes comunitários, garantindo o direito dos seus próprios poderes residuais em áreas não cobertas pelas ações comunitárias”. (BRANCO, Luizella Giordano B. Sistema de solução da controvérsia no Mercosul. Perspectivas para a criação de um modelo institucional permanente. São Paulo: LTr, 1997, p. 30).
Sobre o princípio da subsidiariedade no âmbito da União Europeia, ver também LENAERTS, Koen. The principle of subsiadiarity and the environment in the european union: Kee Ping The Balance of Federalism. Fordham International Law Journal. v. 17, n. 4, 1994, p. 846-852; PIRES, Francisco Lucas. Tratados que instituem a comunidade e União Européia. Lisboa: Alquitas Editorial Notícias, 1994, p. 1-2; CARCOMO LOBO, Maria Tereza. Op. cit., p. 131.


41 CAMPOS, João da Mota. Direito comunitário. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. v. 1, p. 537.

42 O próprio Estado Brasileiro, em prática reiterada diante das Cortes Arbitrais Internacionais, reconhece a eficiência da Arbitragem como meio propício à satisfação de contendas em uma diversidade de matérias, o que, certamente, deveria funcionar como política de incentivos à prática de tal via instrumental resolutiva de conflitos em território pátrio.Disso, bem já noticiava Arnold Wald há bons anos, ratificando a aludida ideia incentivadora: “A exemplo dos últimos anos, o de 2007 representou uma fase de consolidação da arbitragem nacional e internacional no Brasil. O instituto tem sido cada vez mais utilizado por empresas brasileiras e recentes dados da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI) mostram que o Brasil se tornou o maior usuário da arbitragem na América Latina e já está em quarto lugar no ranking mundial da CCI, atrás apenas dos Estados Unidos, da França e da Alemanha” (WALD, Arnold. Brasil lidera uso de arbitragem na América Latina. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: [www.consultorjuridico.com.br]. Acesso em: 26.11.2015).
Para conhecimento mais amplo do instituto da Arbitragem como meio propício à solução de conflitos em âmbito internacional, mais precisamente no que se refere a conflitos comerciais e resilição de controvérsias em blocos econômicos tais como Mercosul e União Europeia, ver, por todos, GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira. O consumidor e sua proteção na União Europeia e Mercosul – Pesquisa conjuntural como contribuição à política desenvolvimentista de proteção consumerista nos blocos. Lisboa: Juruá Editorial, 2014; GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira; MACHADO GOMES, J. M.. Compêndio de direito econômico. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2005.


43 CAPPELLETTI, Mauro. Processo, ideologias e sociedade. Trad. e notas de Elicio de Cresci Sobrinho. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 2008. v. I, p. 391.

44 CAMPOS, João da Mota. Direito comunitário. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. v. I, p. 537.

45 Cabe frisar aqui que, no caso, a ressalva feita acerca de direitos “transacionáveis”, a despeito de o próprio texto legal indicar “direitos patrimoniais disponíveis” (art. 1º da Lei 9.307/96), como aqueles passíveis de solução pela arbitragem, possui razão de ser. Ainda que o direito possa ser indisponível, não significa que seja impossível de ser transacionado como v. g., os alimentos. Nisso, o direito de alimentos é, verdadeiramente, indisponível, no entanto, quanto ao quantum referente a ele, para o mesmo não podemos sustentar idêntica indisponibilidade, dada a possibilidade de ser objeto de transação, disponível nestes termos. No mesmo sentido, ver dentre outros, LA CHINA, Sérgio (L’Arbitrato: Il Sistema e l’experienza. Milano: Giuffrè, 1999, p. 27-28), para quem “il necessario rispetto di una certa disciplina non significa che la stessa sai adottada a tutela di diritti assoluti della persona o di status assimilabili a quelli familiari e coniugali (e troppo corrivi si è oggi nel parlare di status e statuti del lavoratore, dell’impeditore,... senza rendersi conto delle pericolose implicazioni di um uso improprio del linguaggio); também CÂMARA, Alexandre Freitas. Arbitragem. Lei 9.307/96. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1997, p. 13.
Nesta seara, merece ainda acostar apontamento de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery (Código de Processo Civil comentado. 10. ed. São Paulo: Ed. RT, 2007, p. 1.393): “É disponível o direito sobre o qual as partes podem dispor, transigir, abrir mão. Em suma, todo direito que puder ser objeto de transação (CC 841; CC/16 (LGL\1916\1) 1035) pode ser examinado e julgado por meio de juízo arbitral”.


46 SOUZA, André Pagani de. et al. Teoria geral do processo contemporâneo. São Paulo: Atlas, 2016, p. 123.

47 Cf. por todos, NEVES, Celso. Estrutura fundamental do processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 28; ARAÚJO CINTRA, Antônio Carlos de; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 28. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012, p. 155.

48 Ver, por todos, NAVARRETE, Antonio María Lorca. Manual de Derecho de Arbitraje: Manual Teórico Práctico de Jurisprudencia Arbitral Española. Madrid: Dykinson, 1997, p. 113-114; POZNANSKI, Bernard G. The Nature and Extent of na Arbitrator’s Powers international Comercial Arbitration. Journal of International Arbitration. 04/71/108, n.03, 1987. Aliás, para este: “An arbitrator’s authotity is actually hybrid innature, consisting of a contractual basis for the creation and restriction of his powers, coupled with a jurisdictional authority as permitted to exist or as assisted by state authority. It has been proposed that the contratual and the jurisdictional nature of arbitration are in the process of assimilating each other. This type of consideration, it is submitted, is unnecessary. As will be seen, the powers of an arbitrator are the result of a combination of both natures which creates a process for dispute settlement with its origin in contract yet reflecting some of the characteristics of the public judicial process”.

49 NERY JÚNIOR, Nelson; ANDRADE NERY, Rosa Maria. Código de Processo Civil comentado. 10. ed. São Paulo: Ed. RT, p.1.398.

50 CARMONA, Carlos Alberto. Árbitros e juízes: guerra ou paz? In: MARTINS, Pedro A. Batista et al. Aspectos fundamentais da lei de arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 425.

51 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Manual da arbitragem. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1997, p. 94-96.

52 ALVIM, J. E. Carreira. Tratado geral da arbitragem interno. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000, p. 89.

53 Cf. o nosso GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira. Teoria geral da arbitragem. Curitiba: Juruá, 2016, p. 73-77.

54 CASTILLO, Niceto Alcalá Zamora y. Proceso, autocomposición y autodefesa. México: UNAM, 1970.

55 Sobre o assunto ver o nosso GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira. Instituições de direito processual civil. 3. ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 66-67.

56 Denti-Vigoriti, “Le rôle de Ia conciliation comme moyen d'éviter le procés”. Relatório geral apresentado ao VII Congresso Intern. Dir. Proc., Würzburg, 1983, in Effektjver Rechtsschutz und Verfassungsmässige Ordnung, Habscheid, Bielfeld, 1983, p. 350 apud GRINOVER, Ada Pellegrini. Os fundamentos da justiça conciliativa. Disponível em: [www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/os-fundamentos-da-justi%C3%A7a-conciliativa]. Acesso em: 03.01.2017.

57 Idem.

58 Movimento pela conciliação. Disponível em: [www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao-portal-da-conciliacao/movimento-conciliacao-mediacao]. Acesso em: 03.01.2017.


59 Sobre a característica prática oriunda de atividade processual jurisintegrativa, esta desenvolvida pelo exercício da Jurisdição Voluntária, ver por todos, NEVES, Celso. Op. cit., p. 43-51.