LITIGIOSIDADE REPETITIVA E A
PADRONIZAÇÃO DECISÓRIA: ENTRE O ACESSO À JUSTIÇA E A EFICIÊNCIA DO JUDICIÁRIO
Repeated litigation and standardized rulings: between access to
justice and efficiency of the courts
Revista de Processo | vol. 263/2017 | p. 233 - 255 | Jan / 2017
DTR\2016\24933
_____________________________________________________________________________________
Maria
Cecília de Araujo Asperti
Doutoranda e
Mestre em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo. Visiting Scholar na Universidade de Yale pelo Programa Fox
International Fellowships (2011-2012). Professora da Escola de Direito da
FGV/SP. Advogada. maria.asperti@fgv.br
Área
do Direito: Processual
Resumo:
Se as reformas judiciárias e
processuais realizadas nos anos 70 e 80 no Brasil visaram facilitar o acesso à
justiça, as mudanças mais recentes, em especial do Código de Processo Civil de
2015, buscam a eficiência do Judiciário, privilegiando-se mecanismos de
padronização decisória e julgamento por amostragem, com o intuito de
racionalizar e acelerar o julgamento de casos considerados repetitivos.
Questiona-se se esses mecanismos coadunam-se com o acesso à justiça e o devido
processo legal das partes envolvidas, em especial aqueles que recorrem ao
sistema de justiça de forma pontual e para quem a demanda individual possui
significativa importância. Trata-se de discussão fundamental ante as sensíveis
mudanças na configuração do processo, do Poder Judiciário e da atuação e papel
dos atores envolvidos.
Palavras-chave:
Demandas repetitivas - Acesso à justiça - Eficiência - Precedentes -
Litigiosidade.
Abstract:
If the judicial and procedural
reforms in the 70s and 80s in Brazil aimed at facilitating access to justice,
the most recent changes, in particular the Code of Civil Procedure of 2015,
seek mainly the efficiency of the courts, putting forth practices of
standardized rulings and sample trialing, in order to streamline and speed up
the trial of repeated cases. The question set forth herein is if such mechanisms
are coherent with the right of access to justice and of the due process of the
parties involved, especially those who resort to courts only occasionally and
for whom individual claim has a significant importance. It is a fundamental
discussion in view of the significant changes in the structure of procedural
law, courts and the role of the players involved.
Keywords:
Repeated litigation - Access to justice - Efficiency - Case law -
Litigation.
Sumário:
1Introdução -
2Reformas judiciárias e processuais no Brasil: entre o acesso e a eficiência -
3Litigiosidade repetitiva no Judiciário e no processo - 4Padronização decisória
e os princípios processuais: acesso à justiça e devido processo legal -
5Conclusão - 6Referências
1
Introdução
Se as reformas
judiciárias e processuais realizadas nos anos 70 e 80 no Brasil visaram
facilitar o acesso à justiça e a reinvindicação de direitos individuais e
coletivos em juízo, parece cada vez mais proeminente a tendência das mudanças
mais recentes, em especial do Novo Código de Processo Civil, de buscar a
eficiência do Judiciário e a efetividade do processo, privilegiando-se
mecanismos de padronização decisória e julgamento por amostragem, com o intuito
de racionalizar e acelerar o julgamento de casos considerados repetitivos.
Tendo em vista
uma realidade prática em que técnicas gerenciais de padronização decisória já
vêm sendo amplamente utilizadas, cabe perquirir se a aplicação de dispositivos
processuais que legitimem essas práticas coaduna-se com o acesso à justiça e o
devido processo legal das partes envolvidas em demandas ou recursos
considerados repetitivos, em especial aqueles que recorrem ao sistema de
justiça de forma pontual e para quem a demanda individual possui significativa
importância. Trata-se de discussão fundamental ante as sensíveis mudanças na
configuração do processo, do Poder Judiciário e da atuação e papel dos atores
envolvidos.
Assim, o
presente artigo se propõe a uma análise ainda exploratória sobre o tema, traçando
um panorama das recentes reformas realizadas no Brasil e questionando a
configuração que vem sendo proposta ao direito processual, em que se privilegia
a eficiência em detrimento do acesso à justiça, ressignificando-se as noções
essenciais compreendidas pelo devido processo legal. Como essas respostas se
conformam (ou não) com as garantias de acesso à justiça e do devido processo
legal, tão caras ao processo?
2
Reformas judiciárias e processuais no Brasil: entre o acesso e a eficiência
Diversos são os
diagnósticos de insuficiência das estruturas do Poder Judiciário diante da
crescente demanda pela tutela jurisdicional, levando a uma série de reformas
judiciárias e processuais que partem de premissas e vieses também diversos.
Para compreendê-los, é necessário analisar o cenário de litigiosidade e de
responsividade do Judiciário e as alterações institucionais e legislativas
promovidas para lidar com esse quadro. É nesse contexto que entram em jogo o
uso de técnicas de padronização decisória e mecanismos processuais e gerenciais
de julgamento de demandas e recursos repetitivos, que visam, de modo geral,
uniformizar e dinamizar o processamento de matérias consideradas semelhantes.
Ao se situar a
litigiosidade repetitiva na agenda de reformas processuais e institucionais no
Brasil, é necessário analisar as significativas mudanças verificadas nos
últimos anos, desde a promulgação da Constituição de 1988 até a publicação do
Código de Processo Civil de 2015.
Os anos que
precederam a Constituinte foram marcados pela pauta de facilitação do acesso à
justiça e de abertura das instituições judiciárias para a “litigiosidade
latente”,1 assim entendida como a gama de conflitos sociais que, em
razão dos obstáculos de acesso ao sistema oficial, acabam sujeitos à autotutela,
ocasionando o aumento da violência nas comunidades marginalizadas. É também
nesse período de ambiente de abertura política e de emergência de movimentos
sociais que a reivindicação de direitos sociais, questionando a intensa
desigualdade social e a exclusão da grande maioria da população quanto a
direitos básicos como saúde e educação.2 A pauta, naquele momento,
era a ampliação desses direitos e o estabelecimento de instrumentos que
viabilizassem sua efetivação, de modo a superar a incapacidade do Judiciário de
responder adequadamente à complexidade dos conflitos sociais então
identificados.
Também nessa
época foram promulgadas a Lei dos Juizados de Pequenas Causas, de 1984, que
abriu novas portas para a entrada no sistema oficial de justiça, e a Lei da
Ação Civil Pública, de 1985, que estabeleceu algumas das principais bases para
a tutela coletiva de direitos. O Código de Defesa do Consumidor compõe esse
quadro de medidas, regulamentando os direitos dos consumidores, sua defesa em
juízo e a tutela transindividual desses direitos. São criados os Juizados de
Pequenas Causas, posteriormente conformados como Juizados Especiais Cíveis e
Juizados Especiais Federais, voltados especialmente para a absorção da já
mencionada litigiosidade latente e para uma maior aproximação do cidadão do
sistema de justiça.
Ao mesmo tempo
que há significativa ampliação da arena de atuação do Judiciário com a
constitucionalização de direitos sociais e coletivos, o texto constitucional
também confere guarida a garantias constitucionais processuais, em especial de
acesso à justiça, devido processo legal, ampla defesa, contraditório, motivação
das decisões judiciais, publicidade do processo, dentre outros. São positivados
remédios constitucionais que visam conferir uma tutela mais adequada aos
direitos sociais arrolados, ampliados os poderes do Ministério Público e criada
a Defensoria Pública, principal responsável pela concretização do direito à
assistência jurídica gratuita e integral, também assegurada pela Constituição
Federal.
Essa mudança
paulatina na concepção do papel a ser exercido pelo Judiciário impacta,
notadamente, o estudo do direito processual, sedimentando-se a noção de
garantias e princípios processuais cuja observância consiste em fundamento
basilar do chamado Estado Democrático de Direito. No âmbito do direito
processual civil, é profunda a influência da noção de instrumentalidade do
processo, mediante a qual o processo deve ser entendido sob uma perspectiva
teleológica que transcende a mera técnica, perseguindo-se escopos não somente
jurídicos (de realização do direito material), mas também sociais e políticos,
reconhecendo-se a permeabilidade desse instrumento aos valores tutelados na
ordem político-constitucional e jurídico-material e a seu papel na efetivação
destes.3
Tal concepção
de processo alinha-se com a defesa da facilitação do acesso à justiça e
eliminação dos obstáculos para o exercício efetivo tanto do direito de ação
quanto do de ampla defesa, fortalecendo-se os princípios do devido processo
legal e da inafastabilidade do controle jurisdicional, entendendo-se que esse
acesso deve compreender não somente o ingresso às instituições judiciárias, mas
também o acesso à ordem jurídica justa.4
Como se vê, a
preocupação com o efetivo acesso à justiça permeou algumas das mais importantes
reformas processuais dos últimos anos. Ainda que diferentes diagnósticos e
agendas de pesquisa tenham embasado essas reformas,5 esteve presente
a noção de que o efetivo acesso depende da remoção dos diferenciados óbices que
se colocam entre o indivíduo e o acesso à justiça (ordem jurídica justa), o que
significa dizer que cada pessoa deve conseguir acessar um sistema que lhe
proporcione iguais condições para dele obter uma efetiva tutela de direitos.6
No entanto, se
a agenda de pesquisas que informara as mudanças legislativas até então
enfatizava a necessidade de aproximação entre as instâncias judiciárias e a
população, os estudos divulgados a partir dos anos 1990 são informados por
novas diretivas do Consenso de Washington, do Fundo Monetário Internacional e
do Banco Mundial e que enfatizavam a importância da eficiência do Judiciário
para o desenvolvimento econômico.7 Aos países em desenvolvimento são
outorgadas diversas recomendações para promoção de reformas judiciárias capazes
de assegurar a credibilidade, eficiência, transparência, independência,
previsibilidade e proteção à propriedade privada e aos contratos nas decisões
judiciais.8
É construído a
partir daí um discurso político que acusa a insegurança jurídica e a morosidade
do Judiciário de obstaculizar os investimentos necessários ao crescimento
econômico do país.9 Essa é a mensagem, por exemplo, do relatório da
Secretária de Política Econômica do Ministério da Fazenda denominado “Reformas
Microeconômicas e crescimento a longo prazo”, que enfatiza a importância de uma
reforma do Judiciário que prime pela celeridade, redução de custos e segurança
jurídica no processo de indução do crescimento econômico.10
Essas foram as
principais inspirações para as reformas judiciárias consubstanciadas na EC
45/2004 e no I Pacto Republicano (“Pacto de Estado em favor de um judiciário
mais rápido e republicano”).11 Seguindo-se os valores então
perseguidos, tais reformas privilegiaram medidas de fortalecimento de
precedentes como forma de evitar a interposição ou a tramitação de processos e
recursos semelhantes ou repetitivos, como então começaram a ser
denominados. Nesse sentido, merece destaque a Súmula Vinculante, que atribui
efeito vinculativo a entendimentos do Supremo Tribunal sobre matéria constitucional
em relação ao Judiciário e à administração pública.
As alterações
processuais subsequentes consolidam essa tendência e instituem sistemáticas de
filtros processuais, como no indeferimento liminar de “casos idênticos” com
base em sentença anteriormente prolatada pelo juízo (CPC (LGL\2015\1656), art.
285-A), na súmula impeditiva de recursos (CPC (LGL\2015\1656), art. 518, §
1.º), no estabelecimento do requisito da repercussão geral para processamento
de Recurso Extraordinário (CPC (LGL\2015\1656), art. 543-A) e também no
julgamento por amostragem, com o consequente sobrestamento de recursos
similares como instituído nos arts. 543-B e 543-C do CPC (LGL\2015\1656). Tais
dispositivos conformam um sistema de processamento de demandas e recursos repetitivos
fundado na abordagem maciça de processos e na escolha de casos paradigmáticos,
com o consequente sobrestamento ou indeferimento de demandas e recursos
similares.
O Código de
Processo Civil de 2015 (CPC/2015 (LGL\2015\1656)) corrobora essa lógica e a
intensifica, permitindo o represamento de demandas em primeiro grau e, a pedido
da parte, o sobrestamento de ações ou recursos em qualquer estado ou região.
Adota-se como ponto de partida um diagnóstico de excesso de ações e recursos12
e de que o processo é excessivamente formalista,13 o que
justificaria a implementação de mudanças para torná-lo menos formalista e,
principalmente, mais eficiente.14 Há diversos dispositivos que
permitem a sumarização da cognição em casos que possam ser considerados repetitivos,
criando-se uma lógica processual que legitima, incentiva e, em certos casos,
vincula a utilização de técnicas de padronização decisória.
3
Litigiosidade repetitiva no Judiciário e no processo
3.1
Padronização decisória e gerenciamento de processos pelo Judiciário
O discurso que
prioriza a eficiência do Judiciário e a efetividade das decisões judiciais tem
como claro pano de fundo uma concepção de Judiciário enquanto prestador de um
serviço que, como tal, deve se submeter a parâmetros não só de qualidade, mas
também de produtividade perante seus usuários. Juízes e tribunais são
pressionados para adotar medidas para atendimento de metas quantitativas e para
propiciar maior transparência de suas atividades e gastos, de modo a
possibilitar a aferição do atendimento ou não da eficiência buscada.
Magistrados deixam de ser apenas julgadores para se tornar administradores e
gerenciadores de processos, além de mediadores de conflitos, na medida em que o
acordo também é reverenciado como um produto do sistema de justiça, ao lado da
sentença judicial.
O
funcionamento desse Judiciário também é profundamente impactado (e vice-versa)
pela própria configuração da advocacia, em que estruturas fordistas de
advocacia de massa ganham cada vez maior espaço no mercado jurídico. As
consequências são mais processos e menores custos de contingenciamento com
demandas judiciais para as grandes empresas e para o Estado, considerados os
maiores litigantes do Judiciário.15 Outras causas internas e
externas ao Judiciário poderiam ser mencionadas, como a proliferação de
direitos e a facilitação do acesso, aqui já mencionados, a ampliação da
sociedade de consumo e crescimento da classe média e da população bancarizada,
a ineficiência das instâncias administrativas e de atendimento de consumidores,
dentre outros.16
Fato é que o
fenômeno foi percebido pelo Judiciário e por seus usuários diretos (advogados),
culminando no desenvolvimento de práticas gerenciais e na propositura de
mecanismos processuais que visam responder a essa realidade, a partir dos
valores consagrados pela agenda de pesquisa pós-Constituição de 1988 e pelos
valores ora preponderantes de eficiência do sistema de justiça, efetividade e
previsibilidade das decisões judiciais.
Em termos de
técnicas gerenciais, merece destaque a catalogação de sentenças-tipo (a partir
de casos frequentes), o julgamento em bloco de processos e os mutirões de
conciliação voltados para promoção de acordo em casos repetitivos.
Mesmo antes de
o art. 285-A prever a hipótese específica de reprodução de sentença
anteriormente prolatada em “caso idêntico”, juízes e desembargadores já se
utilizavam de modelos de sentença e de votos com argumentos reproduzidos sobre
casos frequentes. A aplicação dessas decisões-modelo precede, em alguns casos,
a formação de lotes de processos considerados similares, nos quais a mesma
decisão, com pequenas inserções de informações sobre o processo individual, é
aposta automaticamente a diversos processos. É essa a realidade, por exemplo,
dos Juizados Especiais Federais, nos quais o processo é cadastrado a partir de
categorias predefinidas e que determinam a remessa ou não de um processo a um
lote de julgamento.
Ainda em termos
de práticas gerenciais voltadas para o tratamento de demandas repetitivas estão
os mutirões de conciliação organizados a partir de determinado litigante
repetitivo (por exemplo: um banco, uma concessionária de serviços, um grande
varejista) ou certos assuntos relacionados com esses litigantes (por exemplo:
ações de DPVAT, Sistema Financeiro de Habitação, renegociação de dívidas
bancárias). Apesar de não serem práticas decisórias propriamente ditas, estudos
empíricos demonstram que muitas vezes nesses mutirões as condições de acordo
são previamente definidas entre o Judiciário e os grandes litigantes,
amoldando-se em minutas-padrão com margens de negociação predefinidas. Os
mutirões também podem ser considerados como práticas de gerenciamento que visam
lidar com demandas repetitivas cuja repercussão é a outorga de desfechos
padronizados para casos considerados similares.
3.2
Mecanismos de julgamento de “casos repetitivos” no processo civil
A lógica da
reprodução decisória permeia o texto do CPC/2015 (LGL\2015\1656), que conforma
o conceito de “casos repetitivos” como aqueles cujo julgamento se dará em
incidente de resolução de demandas repetitivas e em recursos especial e
extraordinário repetitivos, cuja matéria envolvida poderá ser de direito
material ou processual (art. 928).
O Incidente de
Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), especificamente, tem por critérios de
aplicação (a) a efetiva repetição de processos que contenham sobre uma
mesma controvérsia; (b) que a similitude entre os processos resida na
existência de uma mesma questão de direito; e (c) risco de ofensa à
isonomia e à segurança jurídica17 (arts. 976 ao 987).
O CPC/2015
(LGL\2015\1656) também trata do julgamento de recursos extraordinário e
especial repetitivos, cujos requisitos de aplicabilidade são: (a)
multiplicidade de recursos; e (b) fundamento em idêntica questão de direito18
(arts. 1.036 ao 1.041).
Nesses dois
mecanismos, verifica-se serem critérios de aplicabilidade o volume de
demandas ou recursos e a identidade de questões que versem sobre teses
jurídicas, sendo que o IRDR também estabelece como princípios de aplicação
a isonomia e a segurança jurídica, inibindo-se que decisões diversas acerca de
questões análogas sejam prolatadas. Sem embargo das diferenças procedimentais
entre o IRDR e o julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos,
pode-se afirmar que consistem em técnicas de julgamento por amostragem em que
um caso ou recurso paradigma é escolhido e julgado, aplicando-se o entendimento
esposado no julgamento às demais demandas e recursos considerados análogos. O
CPC/2015 (LGL\2015\1656) prevê, especificamente no caso dos recursos
extraordinário e especial, a possibilidade de a parte alegar a existência de
peculiaridades no seu caso que impeçam a aplicação do julgamento prolatado no
caso paradigma (distinguishing). Se essa distinção não for alegada ou se
a instância julgadora não a reconhecer, a solução conferida ao caso paradigma
será reproduzida aos demais casos afetados, cuja tramitação fica suspensa até o
desfecho do julgamento do caso paradigma.
Embora estes
sejam os principais mecanismos processuais previstos no CPC/2015
(LGL\2015\1656) para julgamento de casos repetitivos, lógicas específicas
destinadas ao tratamento desses processos e recursos permeiam o texto legal,
estabelecendo-se uma configuração sistêmica para que a repetição seja
identificada, agregando-se os processos/recursos e conferindo-se a estes uma
resposta legal idêntica, ao menos no que diz respeito à tese jurídica
repetitiva. A identificação de casos idênticos é fundamento para a
improcedência liminar do pedido (art. 332, II e III) e para a antecipação dos
efeitos da tutela pretendida sem o requisito de urgência (art. 311, II). Ao se
firmar um entendimento em sede de IRDR ou de julgamento de recursos
extraordinário ou especial repetitivos, este tem de necessariamente ser
observado por juízes e tribunais (arts. 927, 962, IV e V).
Como se vê,
esses mecanismos de padronização decisória têm como requisitos de aplicação a
multiplicidade de demandas/recursos fundadas em idêntica questão de direito.
Essa questão (ou questões) integra a causa de pedir da demanda, na qual se
apresenta um fato e se demonstra o seu nexo com o efeito jurídico pretendido. É
da causa de pedir que se extrai o ratio decidendi, ou motivos
determinantes da decisão judicial, que consiste no núcleo do precedente a ser
formado ou aplicado. Luiz Guilherme Marinoni assevera que a despeito de o
precedente possuir no sistema brasileiro caráter eminentemente interpretativo
(e não construtivo), há crescente importância na análise dos fatos deduzidos
quando da formação desses precedentes, reconhecendo-se a importância da
identificação das particularidades fáticas do caso concreto para a adequada
interpretação das regras e princípios extraídos da lei e da Constituição
Federal.19 Para o autor, os fatos não chegam a assumir a importância
que possuem na common law, pois a interpretação e aplicação das regras
jurídica se dá em casos nos quais as questões factuais já foram selecionadas e
determinadas. Contudo, a ideia de um papel mais ativo do juiz na interpretação
do direito conduziria a maior relevância dos fatos para adequada identificação
da norma que deverá ser aplicada.
Se, de um
lado, há crescente importância na identificação dos fatos para construção do
precedente jurisprudencial, os mecanismos de padronização decisória criam
sistemáticas para que a decisão proferida no caso paradigmático seja
reproduzida nos casos considerados repetitivos a este. Não há critérios para
escolha desse caso paradigma, tampouco uma preocupação com a interpretação dos
fatos dos casos repetitivos antes da aplicação do entendimento consolidado no
julgamento do caso paradigma.20
É nesse ponto
que se constata que a sistemática de padronização decisória e de julgamento por
amostragem pode conduzir a uma ressignificação restritiva da noção de acesso à
justiça, à medida que legitima práticas gerenciais de reprodução de julgados e
de aplicação de entendimentos consolidados em um caso paradigma sem que os
argumentos fáticos do caso afetado sejam analisados e que a estes seja dada uma
resposta individualizada. Contrariamente, na solução conferida ao caso concreto
sequer se exige a apreciação do arcabouço fático para posterior aplicação da
decisão proferida no caso paradigma. O que o texto legal indica é a
possibilidade de mera reprodução decisória, conduzindo à interpretação de que o
acesso à justiça poderá significar algo menos do que hoje se entende por acesso
à ordem jurídica justa, porquanto não implicaria necessariamente na apreciação
e pacificação do caso concreto.
4
Padronização decisória e os princípios processuais: acesso à justiça e devido
processo legal
4.1
Acesso à justiça para os litigantes ocasionais e para os litigantes repetitivos
Como visto, as
recentes reformas processuais que culminaram na promulgação do CPC/2015
(LGL\2015\1656) centraram-se na busca pela maior eficiência do Judiciário e
pela efetividade do processo, promovendo-se o uso de mecanismos que legitimem
práticas já há muito adotadas de reprodução de decisões em casos considerados
análogos, os quais têm a sua tramitação suspensa até o julgamento do caso
paradigma.
Essa lógica
processual acarreta a necessidade de se repensar o significado do direito de
acesso à justiça individual, na medida em que o litigante do caso repetitivo
afetado não terá seus argumentos apreciados, a menos que consiga demonstrar uma
peculiaridade que convença o julgador da necessidade de processar
individualmente o seu caso. Caso contrário, terá uma resposta jurisdicional
proveniente de outro caso, a qual poderá, ao menos em tese, ser simplesmente
reproduzida no seu processo. Isso ocorre, especialmente, quando não são levadas
em consideração as peculiaridades do caso concreto ou demais questões jurídicas
suscitadas e que não estão sendo ou não foram debatidas no caso eleito como
paradigmático. Sob outro viés, também afronta o acesso à justiça a eleição de
um caso que não possa ser considerado representativo da controvérsia, levando a
reprodução de um entendimento inadequadamente construído.
Ainda no que
diz respeito à relação entre padronização decisória e acesso à justiça, é
importante ter em vista que uma característica marcante dos casos repetitivos é
o envolvimento de certos entes públicos ou privados, que, com frequência, são
acionados ou litigam diante de indivíduos que com estes se relacionam. São, na
prática, disputas decorrentes da relação estabelecida entre um ator
institucional (poder público, instituições financeiras, concessionárias,
grandes empresas) cuja atuação repercute sob a esfera de direitos de múltiplos
atores individuais (o cidadão, o consumidor, o segurado) em grande escala, seja
de forma continuada, seja circunstancialmente.21
Esses
litigantes que atuam repetidamente em processos similares possuem vantagens
estratégicas diante dos litigantes individuais, sendo capaz de antever os
resultados da litigância, além de conseguir acompanhar e influenciar a formação
de precedentes judiciais junto às cortes superiores. Essa análise foi propagada
no final dos anos 70 pelo autor norte-americano Marc Galanter em seu famoso
texto “Why the Haves Come Out Ahead?: Speculations on the Limits of Legal
Change”,22 em que argumenta que os repeat players, ou
litigantes repetitivos, por recorrerem com mais frequência às cortes judiciais,
possuem vantagens estratégicas com relação a outras, que recorrem ao sistema de
justiça apenas ocasionalmente (one-shotters, os litigantes ocasionais).
Galanter
assevera que os litigantes repetitivos tendem a ser entes artificiais (ou
pessoas jurídicas) que possuem mais recursos para a contratação de advogados,
que focam a sua atuação nos casos similares, dedicando-se à construção de teses
e à defesa da formação de precedentes favoráveis. Justamente em razão de seu
porte e da escala de sua atuação, os litigantes repetitivos têm menos a perder
no caso individual, podendo agir estrategicamente nesse processo de formação de
precedentes e transigir nos casos em que um entendimento desfavorável seja mais
provável, focando energias em casos nos quais as situações fáticas podem
contribuir para um precedente mais benéfico.23
A análise
proposta por Galanter parece ser especialmente pertinente no momento em que o
direito processual brasileiro vive, no qual, como já visto, a litigiosidade
repetitiva ocupa espaço central nas reformas judiciais e processuais. Os
discursos centrados na eficiência do Judiciário e na efetividade do processo,
além de deixar de lado a perspectiva do acesso à justiça enquanto direito a uma
resposta efetiva ao caso concreto, ignoram essa dinâmica que tipicamente
caracteriza as partes nas demandas repetitivas.
Ao pensarmos
se os mecanismos de padronização decisória se coadunam com os princípios de
acesso à justiça e o devido processo legal, é necessário refletir sobre o
impacto dessa disparidade de recursos e de capacidade estratégica entre os
litigantes repetitivos e ocasionais e como essa configuração poderá afetar a
formação de precedentes e o julgamento por amostragem de casos repetitivos.
Ainda que não
seja objeto do presente estudo investigar se de fato os litigantes repetitivos
aferem vantagens nos mecanismos de julgamento por amostragem já existentes, uma
análise meramente exploratória dos temas afetados e já julgados em sede de
Recursos Repetitivos até o momento permite verificar o levantamento de questões
relevantes sobre os mecanismos de padronização decisória.
Percebe-se,
por exemplo, que uma parcela extremamente significativa dos temas refere a
questões de direito processual civil e processual trabalhista (35%),
seguindo-se por temas de direito tributário (20%) e direito administrativo
(17%), conforme abaixo:24
Fonte: Site do
Superior Tribunal de Justiça (elaboração própria).
Essa
prevalência da matéria processual civil e do trabalho parece sinalizar que a
técnica processual ainda se coloca, em muitas situações, como um óbice ao
acesso à justiça, à medida que montantes representativos de recursos foram
identificados e tiveram sua tramitação suspensa para que tais questões fossem
apreciadas antes do prosseguimento do feito. Navegar o processo ainda é um
desafio a ser vencido por aqueles que litigam no Judiciário, em especial pelos
litigantes para quem a demanda jurídica é única e a experiência na litigância é
singular. Caberia investigar em estudo mais aprofundado qual o desempenho dos
litigantes ocasionais no julgamento dessas questões processuais, a fim de
verificar se a disparidade estratégica entre estes e os litigantes repetitivos
repercute na formação de precedentes em matéria processual civil.
De outra
parte, a fração significativa de questões tributárias e administrativas
demonstra o impacto dos recursos envolvendo entes da administração pública, que
estão dentre os maiores litigantes do Judiciário brasileiro. Os mecanismos de
padronização decisória visam responder à morosidade decorrente do excesso de
processos e recursos considerados repetitivos, sem que haja uma reflexão mais
aprofundada sobre as causas da litigiosidade repetitiva e sobre o papel
exercido pelo Estado na conformação desse quadro.
4.2
Padronização decisória e o devido processo legal
Ao lado das
questões atinentes ao acesso à justiça individual dos litigantes envolvidos em
casos repetitivos, é igualmente relevante a interpretação dos mecanismos
processuais que legitimam a padronização decisória e o devido processo legal.25
Com relação,
primeiramente, ao direito à ampla defesa e ao contraditório, é intuitivo que a
lógica de julgamento por amostragem relativize a participação do litigante
individual no processo e suas oportunidades de exercício do direito de defesa.
Muito embora o CPC/2015 (LGL\2015\1656) busque assegurar a representatividade e
o exercício do pleno contraditório quando do julgamento dos casos paradigma,
provendo, inclusive, pela realização de audiências públicas e pela intervenção
de amicus curiae26 (art. 983), fato é que nas ações
individuais o exercício do contraditório e da ampla defesa limita-se apenas à
possibilidade de comprovação da distinção entre a questão a ser decidida no
processo e aquela a ser julgada no Recurso Especial ou Extraordinário afetado
(art. 1.037, § 9.º).
A padronização
decisória coloca em xeque, ainda, o dever de motivação das decisões judiciais,
consagrado pelo art. 93, IX, da Constituição e pelo próprio Novo CPC, em seu
art. 489, § 1.º,27 que, inclusive, amplia substancialmente os
requisitos necessários para que uma sentença judicial seja considerada
adequadamente fundamentada.
Ainda que
referido dispositivo contemple critérios detalhados para o cumprimento do dever
de motivação das decisões judiciais, inclusive a necessidade de se identificar
os fundamentos determinantes de um precedente e sua aplicabilidade ao caso sub
judice (art. 489, V), não há clareza no texto do novo código sobre a
necessidade de a decisão determinar a suspensão de processos considerados
análogos ao caso paradigma.
Ao revés, o
art. 979, § 2.º,28 que trata da suspensão de processos ou recursos
quando da instauração de um IRDR, apenas determina que as teses jurídicas
firmadas em casos repetitivos estejam adequadamente fundamentadas de modo a
viabilizar “a identificação dos processos abrangidos pela decisão do
incidente”. Semelhantemente, o art. 1.037, II, não impõe que a decisão do
relator de recursos especial ou extraordinário repetitivo motive a decisão de
suspensão dos recursos pendentes em território nacional, tampouco especifica se
os tribunais de justiça deverão motivar a decisão que considera determinado
caso análogo àquele afetado em sede de recurso repetitivo. Da mesma forma, os
dispositivos que tratam dos mecanismos de padronização decisória não determinam
que a aplicação da tese firmada pelo tribunal superior seja adequadamente motivada
(arts. 985 e 1.040).
5
Conclusão
A preocupação
com o efetivo acesso à justiça permeou algumas das mais importantes reformas
processuais dos últimos anos. Ainda que diferentes diagnósticos e agendas de pesquisa
tenham embasado essas reformas, esteve presente a noção de que o efetivo acesso
depende da remoção dos diferenciados óbices que se colocam entre o indivíduo e
o acesso à justiça (ordem jurídica justa), o que significa dizer que cada
pessoa deve conseguir acessar um sistema que lhe proporcione iguais condições
para dele obter uma efetiva tutela de direitos. Igualmente importante nessas
reformas e na construção recente do direito processual foi a tutela
constitucional de direitos e o devido processo legal, condizentes com uma
perspectiva teleológica do processo pelo qual este tem de ser entendido como um
instrumento de garantia de direitos individuais e coletivos e de efetivação dos
amplos escopos da jurisdição.
Contudo, as
alterações mais recentes parecem privilegiar a busca pela eficiência do
Judiciário e a efetividade do processo, consagrando mecanismos de padronização
decisória que relativizam as noções de acesso à justiça da perspectiva
individual, restringindo as garantias inerentes ao devido processo legal.
Muito embora
estes também sejam valores necessários a um acesso justo e efetivo ao sistema
de justiça, que deve ser capaz de oferecer uma resposta adequada e tempestiva,
é importante refletir sobre a relativização restritiva das garantias de acesso
à justiça e do devido processo legal que essas lógicas de julgamento por
amostragem parecem impor. Essa análise torna-se ainda mais pungente se
ponderado que a litigiosidade repetitiva tipicamente envolve um litigante
repetitivo, com vantagens estratégicas decorrentes da recorrência com que se
envolve em casos similares, e um litigante ocasional, para quem a demanda é
única. Este litigante ocasional tem mais dificuldades de atuar
estrategicamente, desvantagem esta que pode ser potencializada em um sistema no
qual a atuação em escala e focada na formação de precedentes (e não no caso
individual) é privilegiada.
O presente
estudo não pretende exaurir essas questões, mas, sim, levantar hipóteses para
pesquisas futuras que se proponham não somente a aferir a efetividade e redução
no volume de processos e do congestionamento dos cartórios e tribunais em
decorrência do uso de mecanismos de padronização decisória, como também
investigar o uso dessas técnicas sob a perspectiva do litigante individual, a
fim de apurar se o julgamento conferido sob essa lógica confere à parte a
percepção de acesso e de justiça do resultado e do processo.
6
Referências
ASPERTI, Maria
Cecília de Araujo. Mecanismos consensuais de resolução de disputas
repetitivas: a mediação, a conciliação e os grandes litigantes do
Judiciário. Dissertação de Mestrado defendida perante o Departamento de Direito
Processual da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, USP: 2014.
ASPERTI, Maria
Cecília de Araujo; COSTA, Susana Henriques da; GABBAY, Daniela Monteiro; SILVA,
Paulo Eduardo Alves da. Why the “haves” come out ahead in Brazil? Revisiting
speculations concerning repeat players and one-shooters in the Brazilian
litigation setting. Artigo debatido na conferência Law & Society. maio 2015.
BADARÓ,
Gustavo Henrique Righi Ivany. Correlação entre acusação em sentença. 3. ed. São
Paulo: Ed. RT, 2013.
BASTOS,
Antonio Adonias Aguiar. O devido processo legal nas causas repetitivas. Anais
do Conpedi. Manaus. p. 4950, 2015. Disponível em: [www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/salvador/antonio_adonias_aguiar_bastos.pdf].
Acesso em: 30 jun. 2015
BUENO, Cassio
Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil,
comentários sistemáticos às Leis n. 11.276, de 7-2-2006, 11.277, de 7-2-2006, e
11.280, de 16-6-2006. v. 2. São Paulo: Saraiva, 2006.
CABRAL,
Antonio do Passo. O novo procedimento-modelo (Musterverfahren) alemão: uma
alternativa às ações coletivas. Revista de processo. São Paulo. v. 147.
p. 123-146, 2007.
CAPPELLETTI,
Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988.
CINTRA,
Antonio Carlos de Araújo. GRINOVER, Ada Pellegrini. DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria
geral do processo. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2014
CONSELHO
NACIONAL DE JUSTIÇA. Relatório Justiça em Números 2014. Disponível em:
[www.cnj.jus.br].
CUNHA,
Leonardo José Carneiro da. Anotações sobre o incidente de resolução de demandas
repetitivas previsto no projeto do novo código de processo civil. Revista de
Processo. São Paulo. v. 193. p. 255. mar. 2011.
CUNHA, Luciana
Gross; ALMEIDA, Frederico de. Justiça e desenvolvimento econômico na reforma do
judiciário. Trabalho apresentado no evento sobre Direito e Desenvolvimento: um
diálogo entre os BRICs, promovido pela DIREITO FGV, Universidade de Winsconsin
e ABDI. São Paulo, nov. 2010.
CUNHA, Luciana
Gross; GABBAY, Daniela Monteiro (coords.). Litigiosidade, morosidade e
litigância repetitiva: uma análise empírica. São Paulo: Saraiva, 2013.
(Série Direito e Desenvolvimento).
DAKOLIAS,
María. El sector judicial en America Latina y el Caribe: Elementos de
Reforma. Documento Técnico para o Banco Mundial. n. 319S. Washington D.C: World
Bank, 1997.
DIDIER Jr.,
Fredie. Apontamentos para a concretização do princípio da eficiência do
processo. Novas Tendências do Processo Civil – Estudos sobre o Projeto do
Novo CPC. FREIRE, Alexandre; NUNES, Dierle; DIDIER Jr., Fredie; MEDINA, José
Miguel Garcia; FUX, Luiz; CAMARGO, Luiz Henrique Volpe; OLIVEIRA, Pedro Miranda
de. Salvador: Ed. Juspodium, 2015.
DINAMARCO,
Cândido Rangel. Instrumentalidade do processo. 8. ed. São Paulo:
Malheiros, 2000.
FARIA, José
Eduardo Santos. O Estado e o direito depois da crise. São Paulo:
Saraiva, 2011. (Série Direito em Debate: Direito, Desenvolvimento, Justiça).
FERRAZ, Leslie
Shérida. Acesso à justiça qualificado e processamento de disputas repetitivas
nos juizados especiais cíveis. Revista da AJURIS. Porto Alegre. n. 115.
ano 36. p. 159-171. set. 2009.
FREITAS, Graça
Maria Borges. Reforma do Judiciário, o discurso econômico e os desafios da
formação do magistrado hoje. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg. v. 42. n. 72.
Belo Horizonte. p. 31-44, jul.-dez. 2005.
GALANTER,
Marc. Why the haves come out ahead? Speculations on the limits of legal change.
Law and Society Review. v. 9. n. 1. p. 95-160, 1974.
GALANTER,
Marc. Access to justice in a world of expanding social capability. 37
Fordham Urban Law Journal. p. 115-128, 2010.
GRINOVER, Ada
Pellegrini. Fundamentos da justiça conciliativa. In: GRINOVER, Ada Pellegrini;
WATANABE, Kazuo; LAGASTRA NETO, Caetano. Mediação e gerenciamento do
processo: revolução na prestação jurisdicional – guia prático para a
instalação do setor de conciliação e mediação. São Paulo: Atlas, 2007. p. 1-5.
JUNQUEIRA,
Eliane. Acesso à justiça: um olhar retrospectivo. Revista Estudos Históricos.
n. 18. Rio de Janeiro. p. 389-401, 1996.
MARINONI, Luiz
Guilherme. Precedentes obrigatórios. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2011.
MARINONI, Luiz
Guilherme, Elaboração dos conceitos de ratio decidendi (fundamentos
determinantes da decisão) e obiter dictum no direito brasileiro. Instituto de
Processo Comparado – Núcleo de Direito Processual Comparado. set. 2012.
Disponível em: [http://institutodeprocesso.com.br/marinoni-elaboracao-dos-conceitos-de-ratio-decidendi-fundamentos-determinantes-da-decisao-e-obiter-dictum-no-direito-brasileiro/].
Acesso em: 28 mar. 2015.
MENDES,
Aluisio Gonçalves de Castro. Reflexões sobre o incidente de resolução de
demandas repetitivas previsto no projeto de Novo Código de Processo Civil. Revista
de Processo. v. 211. p. 191, set. 2011.
MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA. Judiciário e Economia. Secretaria da Reforma do Judiciário, 2005.
MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA. Análise da gestão e funcionamento dos cartórios judiciais. Secretaria
da Reforma do Judiciário. Paulo Eduardo Alves da Silva (coord.). Brasília,
2007. Disponível em: [http://portal.mj.gov.br/].
MINISTÉRIO DA
FAZENDA. Secretaria de Política Econômica. Reformas microeconômicas e
crescimento de longo prazo. Brasília, 2004. Disponível em:
[www.fazenda.gov.br/spe/publicacoes/reformasinstitucionais/estudos/Texto_VersaoFinal5.pdf].
Acesso em: 10 maio 2015.
SADEK, Maria
Tereza. Judiciário: mudanças e reformas. Estudos Avançados. v. 18. n.
51. São Paulo. p. 79-101, 2004.
SICA, Heitor
Vitor Mendonça. Velhos e novos institutos fundamentais do direito processual
civil. 40 Anos da Teoria Geral do Processo no Brasil: passado, presente e
futuro. ZUFELATO, Camilo; YARSHELL, Flávio Luiz (orgs.). p. 430-466. São Paulo:
Malheiros, 2013.
SILVA, Paulo
Eduardo Alves da. Gerenciamento de processos judiciais. São Paulo:
Saraiva, 2010.
SOARES DO BEM,
Arim. Centralidade dos Movimentos Sociais na Articulação entre o Estado e a
Sociedade Brasileira nos Séculos XIX e XX. Educ. Soc. Campinas. v. 27.
n. 97. p. 1137-1157set.-dez. 2006.
WATANABE,
Kazuo. Acesso à justiça e sociedade moderna. In: GRINOVER, Ada Pellegrini;
DINAMARCO, Cândido Rangel. Participação e processo. São Paulo: Ed. RT,
1988.
ZUFELATO,
Camilo; YARSHELL, Flávio Luiz (orgs.). 40 Anos da Teoria Geral do Processo
no Brasil: passado, presente e futuro. São Paulo: Malheiros, 2013.
1 Sobre o
conceito de litigiosidade latente, Ada Pellegrini Grinover comenta: “A
morosidade dos processos, seu custo, a burocratização na gestão dos processos,
certa complicação procedimental; a mentalidade do juiz, que nem sempre lança
mão dos poderes que os códigos lhe atribuem; a falta de informação e de
orientação para os detentores dos interesses em conflito; as deficiências do
patrocínio gratuito, tudo leva à obstrução das vias de acesso à justiça e ao
distanciamento entre o Judiciário e seus usuários. O que não acarreta apenas o
descrédito da magistratura e nos demais operadores do direito, mas tem como
preocupante consequência a de incentivar a litigiosidade latente, que
frequentemente explode em conflitos sociais, ou de buscar vias alternativas
violentas ou de qualquer modo inadequadas (desde a justiça de mão própria,
passando por intermediações arbitrárias e de prepotência, para chegar até os
‘justiceiros’)” (Fundamentos da Justiça conciliativa. In: GRINOVER, Ada
Pellegrini. WATANABE, Kazuo e LAGASTRA NETO, Caetano. Mediação e
gerenciamento do processo: revolução na prestação jurisdicional – guia
prático para a instalação do setor de conciliação e mediação. São Paulo: Atlas,
2007, p. 2).
2 “Os
acontecimentos iniciados em meados da década de 1970 marcaram o ressurgimento,
ainda que de maneira fragmentária, dos movimentos sociais na cena política
brasileira e são eles que, formando uma grande rede de articulação a partir da
base social, levaram ao final da ditadura. Não é por outra razão que esse
período ficou conhecido como ‘a era da participação’. A crise que se instalou
no país após 1973, seguida da recessão que aumentou consideravelmente o índice
de desemprego nas grandes metrópoles, a retomada da inflação, o desapontamento
das camadas médias com o desmantelamento do ‘milagre econômico’ e o fim da
ilusão de acesso a um consumo cada vez mais ampliado, todos esses fatores
levaram a uma perda de legitimidade do regime entre amplos setores sociais”
(SOARES DO BEM, Arim. Centralidade dos Movimentos Sociais na Articulação entre
o Estado e a Sociedade Brasileira nos Séculos XIX e XX. Educ. Soc.. Campinas.
v. 27. n. 97. set.-dez. 2006. p. 1150-1151).
3 “A negação
da natureza e objetivo puramente técnicos do sistema processual é ao mesmo
tempo afirmação de sua permeabilidade aos valores tutelados na ordem
político-constitucional e jurídico-material (os quais buscam efetividade
através dele) e reconhecimento de sua inserção no universo axiológico da
sociedade a que se destina” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instrumentalidade do
processo. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 22).
4 “A
problemática do acesso à justiça não pode ser estudada nos acanhados limites do
acesso aos órgãos judiciais já existentes. Não se trata apenas de possibilitar
o acesso à Justiça, enquanto instituição estatal, e sim de viabilizar o acesso
à ordem jurídica justa” (WATANABE, Kazuo. Acesso à justiça e sociedade moderna.
In: GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Participação e
processo. São Paulo: Ed. RT, 1988. p. 128).
5 “Invertendo
o caminho clássico de conquista de direitos descrito por Marshall, o caso
brasileiro não acompanha o processo analisado por Cappelletti e Garth a partir
da metáfora das três ‘ondas’ do ‘access-to-justice-movement’. Ainda que durante
os anos 80 o Brasil, tanto em termos da produção acadêmica como em termos das
mudanças jurídicas, também participe da discussão sobre direitos coletivos e
sobre a informalização das agências de resolução de conflitos, aqui estas
discussões são provocadas não pela crise do Estado de bem-estar social, como
acontecia então nos países centrais, mas sim pela exclusão da grande maioria da
população de direitos sociais básicos, entre os quais o direito à moradia e à
saúde” (JUNQUEIRA, Eliane. Acesso à justiça: um olhar retrospectivo. Revista
Estudos Históricos. n. 18. Rio de Janeiro, 1996. p. 390).
6 Segundo
Kazuo Watanabe, o acesso à ordem jurídica justa compreende não somente o
ingresso com a demanda judicial, mas também “(1) o direito à informação e
perfeito conhecimento do direito substancial e à organização de pesquisa
permanente a cargo de especialistas e ostentadas à aferição constante da adequação
entre a ordem jurídica e a realidade sócio-econômica do país; (2) direito de
acesso à justiça adequadamente organizada e formada por juízes inseridos na
realidade social e comprometidos com o objetivo de realização da ordem jurídica
justa; (3) direito à pré-ordenação dos instrumentos processuais capazes de
promover a efetiva tutela de direitos; (4) direito à remoção de todos os
obstáculos que se anteponham ao acesso efetivo à Justiça com tais
características” (WATANABE, Kazuo. Acesso à justiça e sociedade moderna. In:
GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Participação e processo.
São Paulo: Ed. RT, 1988. p. 135).
7 “A medida
que continúa el proceso de desarrollo económico en América Latina y el Caribe,
aumenta la importancia de la reforma judicial. El buen funcionamiento del poder
judicial es importante para el desarrollo económico. El propósito de todo poder
judicial es ordenar las relaciones sociales y resolver conflictos entre los
diversos actores sociales. En la actualidad el poder judicial es incapaz de
asegurar una resolución predecible y eficiente de los conflictos que respete
los derechos individuales y de propiedad. No puede satisfacer las demandas del
sector privado ni las del público en general, especialmente las de los pobres.
Dado el actual estado de crisis de los sistemas judiciales de Latinoamérica y
el Caribe, el objetivo de los esfuerzos de reforma es la promoción del
desarrollo económico. La reforma judicial es parte del proceso de redefinición
del estado y su relación con la sociedad; el desarrollo económico no puede
continuar sin la efectiva definición, interpretación y ejecución de los
derechos de propiedad. Específicamente, la reforma judicial está orientada a
aumentar la eficiencia y equidad en la resolución de conflictos, mejorando el
acceso a la justicia y la promoción del desarrollo del sector privado”
(DAKOLIAS, María. El sector judicial en America Latina y el Caribe: Elementos
de Reforma. Documento Técnico para o Banco Mundial. n. 319S. Washington D.C:
World Bank, 1997. p. XI).
8 FREITAS,
Graça Maria Borges. Reforma do Judiciário, o discurso econômico e os desafios
da formação do magistrado hoje. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg. v. 42. n.
72. Belo Horizonte. jul.-dez. 2005. p. 34.
9 CUNHA,
Luciana Gross; ALMEIDA, Frederico de. Justiça e desenvolvimento econômico na
reforma do judiciário. Trabalho apresentado no evento sobre Direito e
Desenvolvimento: um diálogo entre os BRICs, promovido pela DIREITO FGV,
Universidade de Winsconsin e ABDI. São Paulo. nov. 2010. p. 10-11.
10 A
reforma do judiciário, além do seu importante impacto sobre o funcionamento da
justiça e o exercício da cidadania, apresenta uma importante contribuição para
o desenvolvimento do mercado de crédito, e para a expansão da produção e do investimento.
Os contratos, por mais completos que sejam, não conseguem prever todas as
possíveis contingências futuras. Mecanismos eficientes de resolução de
conflitos garantem que esse processo de complementação contratual ocorra de
forma célere e sem elevados custos adicionais para ambas as partes. Se os
marcos legal e institucional que estruturam esses mecanismos sinalizarem um
processo moroso, custoso e com incentivo para ação protelatória por qualquer
uma das partes, o custo esperado das transações econômicas aumenta, sobretudo
nos mercados de crédito, induzindo um menor nível de investimento, produção e
geração de empregos. (grifos no original)
11 “A
morosidade dos processos judiciais e a baixa eficácia de suas decisões retardam
o desenvolvimento nacional, desestimulam investimentos, propiciam a
inadimplência, geram impunidade e solapam a crença dos cidadãos no regime
democrático” (trecho do Pacto de estado em favor de um judiciário mais rápido e
republicano, 2004).
12 “(...) É
que; aqui e alhures não se calam as vozes contra a morosidade da justiça. O
vaticínio tornou-se imediato: ‘justiça retardada é justiça denegada’ e com esse
estigma arrastou-se o Poder Judiciário, conduzindo o seu desprestígio a índices
alarmantes de insatisfação aos olhos do povo. (...) Esse o desafio da comissão:
resgatar a crença no judiciário e tornar realidade a promessa constitucional de
uma justiça pronta e célere. Como vencer o volume de ações e recursos gerado
por uma litigiosidade desenfreada, máxime num país cujo ideário da nação abre
as portas do judiciário para a cidadania ao dispor-se a analisar toda lesão ou
ameaça a direito? (...) Como prestar justiça célere numa parte desse mundo de
Deus, onde de cada cinco habitantes um litiga judicialmente? (...)” (Justificativa
do Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil. p. 7).
13 “Como
desincumbir-se da prestação da justiça em um prazo razoável diante de um
processo prenhe de solenidades e recursos? (...). No afã de atingir esse escopo
deparamo-nos com o excesso de formalismos processuais, e com um volume
imoderado de ações e de recursos. (...)” (Justificativa do Anteprojeto do Novo
Código de Processo Civil. p. 7).
14 A
eficiência é colocada dentre as normas fundamentais que deverão nortear a
aplicação das regras processuais, conforme texto do art. 6 do Novo CPC: Ao
aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às
exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana
e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade
e a eficiência”. Sobre essa norma, a qual Fredie Didier denomina “princípio da
eficiência”, referido autor argumenta que se projeta sobre a Administração
Judiciária, na medida em que o Judiciário se sujeitaria ao princípio da eficiência
administrativa e ao quanto disposto pelo art. 37 da Constituição, e sobre o
processo jurisdicional em si, impondo uma gestão eficiente do processo, para
que o juiz seja entendido como um administrador de processos a quem se impõe a
necessidade de “a) obter o máximo de um fim com o mínimo de recursos (efficiency);
b) de, com um meio, atingir o fim ao máximo (effectiveness)” (DIDIER
Jr., Fredie. Apontamentos para a concretização do princípio da eficiência do
proceso. Novas Tendências do Processo Civil – Estudos sobre o Projeto do
Novo CPC. FREIRE, Alexandre; NUNES, Dierle; DIDIER Jr., Fredie; MEDINA, José
Miguel Garcia; FUX, Luiz; CAMARGO, Luiz Henrique Volpe; OLIVEIRA, Pedro Miranda
de. Salvador: JusPodium, 2015).
15 ALVES,
Paulo Eduardo; ASPERTI, Maria Cecília de Araujo; COSTA, Susana Henriques da;
GABBAY, Daniela Monteiro. Why the “haves” come out ahead in Brazil? Revisiting
speculations concerning repeat players and one-shooters in the Brazilian
litigation setting. Artigo debatido na conferência Law & Society. maio
2015.
16 CUNHA,
Luciana Gross; GABBAY, Daniela Monteiro (coords.). Litigiosidade, morosidade
e litigância repetitiva: uma análise empírica. São Paulo: Saraiva, 2013.
(Série Direito e Desenvolvimento).
17 Art. 976. É
cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando
houver, simultaneamente: I – efetiva repetição de processos que contenham
controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito; II – risco de ofensa
à isonomia e à segurança jurídica.
18 Art. 1.036.
Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com
fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de
acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento
Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça.
19 MARINONI,
Luiz Guilherme. Elaboração dos conceitos de ratio decidendi (fundamentos
determinantes da decisão) e obiter dictum no direito brasileiro. Instituto de
Processo Comparado – Núcleo de Direito Processual Comparado. set. 2012.
Disponível em:
[http://institutodeprocesso.com.br/marinoni-elaboracao-dos-conceitos-de-ratio-decidendi-fundamentos-determinantes-da-decisao-e-obiter-dictum-no-direito-brasileiro/].
Acesso em: 28 mar. 2015.
20 Dierle
Nunes também coloca uma preocupação com o tempo de maturação do precedente
judicial, na medida em que se torna uma técnica voltada primordialmente para a
otimização do tramite do processo: “Padrões decisórios não podem empobrecer o
discurso jurídico, nem tampouco serem formados sem o prévio dissenso
argumentativo e um contraditório dinâmico, que imporia ao seu prolator buscar o
esgotamento momentâneo dos argumentos potencialmente aplicáveis à espécie. Não
se trata de mais um julgado, mas de uma decisão que deve implementar uma
interpretação idônea e panorâmica da temática ali discutida. Seu papel deve ser
o de uniformizar e não o de prevenir um debate” (Padronizar decisões sem
empobrecer o discurso jurídico?. Consultor Jurídico. Edição de 06 ago.
2006. Disponível em: [www.conjur.com.br]. Acesso em: 28 mar. 2015).
21 Os
litigantes habituais do Judiciário brasileiro são listados periodicamente pelo
Conselho Nacional de Justiça no relatório “100 maiores litigantes”. O último
relatório é de 2012 e aponta que mais de 36% de todos os processos ajuizados na
Justiça Federal, Estadual e Trabalhista envolvem no polo passivo ou ativo algum
dos litigantes listados. O relatório está disponível em:
[www.cnj.jus.br/images/pesquisas-judiciarias/Publicacoes/100_maiores_litigantes.pdf].
Acesso em: 23 mar. 2015.
22 GALANTER,
Marc. Why the haves come out ahead? Speculations on the limits of legal change.
Law and Society Review. v. 9. n. 1. p. 95-160, 1974. Republicação (com
correções) em Law and Society. Dartmouth. Aldershot: Cotterrell, 1994.
p. 165-230.
23 As
vantagens dos litigantes repetitivos mapeadas por Marc Galanter podem ser assim
sintetizadas: (i) acúmulo de inteligência e expertise para atuar
preventivamente, estruturando melhor suas operações e seus contratos, por
litigarem com frequência; (ii) mais fácil acesso a especialistas e mais
possibilidades de realização de economia em escala; (iii) mais chances de se
engajarem em relações informais com agentes institucionais que poderão lhes render
vantagens no acesso e na tramitação burocrática dessas instituições (e.g.
cartorários, escreventes etc.); (iv) interesse em manter uma reputação de
negociador como forma de reafirmar sua posição no processo de negociação, ao
contrário do litigante ocasional, que não tem uma reputação a manter (dado que
não se envolve nesse tipo de disputa com frequência) e que mais dificilmente se
compromete a negociar; (v) possibilidade de assumir riscos. Quanto maior for o
risco para o litigante ocasional, mais provável que ele adote uma estratégia
“minimax” (minimizar a probabilidade que envolva o maior risco). No entanto,
como os riscos são relativamente menores para os litigantes repetitivos, eles
podem adotar estratégias pensadas para maximização do ganho em escala na série
de demandas (repetitivas) em que estão envolvidos; (vi) possibilidade de
abdicar de ganhos imediatos em favor de uma estratégia para instigar mudanças
legislativas, possuindo interesses e recursos para influenciar o processo
legislativo (e.g. lobby); e (vii) possibilidade de atuar para mudar os
precedentes jurisprudenciais buscando um resultado mais vantajoso em casos
futuros, ainda que isso implique uma perda de possíveis ganhos imediatos
(GALANTER, Marc, 1974. p. 97-98).
24 De um total
de 1.128 temas, conforme pesquisa realizada no site do Superior Tribunal de
Justiça em 1 de julho de 2016. A relação total dos temas está disponível em:
[www.stj.jus.br/webstj/Processo/Repetitivo/relatorio2.asp].
25 Fala-se já
na necessidade de repensar as noções essenciais ao princípio do devido processo
legal, tidas como próprias do processo individual, de modo a compatibilizar
interesses individuais e supra-individuais no processo: “Às causas em bloco não
se pode aplicar o due process of law com o mesmo delineamento que incide sobre
as demandas puramente individuais, com idêntica definição das partes, dos ônus,
deveres e direitos processuais, com as mesmas construções doutrinária e legal
sobre as regras de estabilização da demanda e de distribuição dos ônus da
defesa e da prova, por exemplo, bem como a regulamentação dos limites objetivos
e subjetivos da coisa julgada, tais quais dispostos no vigente CPC
(LGL\2015\1656)” (BASTOS, Antonio Adonias Aguiar. O devido processo legal nas
causas repetitivas. Anais do Conpedi. Manaus, 2015. p. 4950. Disponível
em:
[www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/salvador/antonio_adonias_aguiar_bastos.pdf].
Acesso em: 30 jun. 2015).
26 Leonardo
Carneiro da Cunha defende, inclusive, que o amicus curiae tenha
legitimidade para recorrer da decisão firmada no caso paradigma: “Já se viu que
a definição da tese jurídica pelo tribunal deve ser precedida de amplo debate,
sendo possível a intervenção do amicus curiae. Este, também se viu, ostenta
interesse institucional de contribuir para a prolação da melhor decisão
possível, oferecendo ao órgão julgador elementos técnicos que possam contribuir
para a formação de seu convencimento. Ora, se o amicus curiae tem legitimidade
e interesse de intervir, deve-lhe ser franqueada a possibilidade de recorrer se
a decisão afetar ou atingir, em qualquer medida, o interesse institucional que
justifica sua intervenção. Se se lhe permite participar da discussão e
contribuir com a formação do convencimento judicial, tal participação e
contribuição podem – e devem – estender-se para o âmbito recursal, a fim de que
o órgão ad quem considere os elementos fornecidos que eventualmente tenham sido
desprezados, desconsiderados ou rejeitados pelo órgão a quo”. (Anotações
sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas previsto no projeto do
novo código de processo civil. Revista de Processo. v. 193. São Paulo,
mar. 2011. p. 12.
27 Art. 489.
São elementos essenciais da sentença:I – o relatório, que conterá os nomes das
partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o
registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;
II – os
fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;
III – o
dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe
submeterem.
§ 1.º Não se
considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória,
sentença ou acórdão, que:
I – se limitar
à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua
relação com a causa ou a questão decidida;
II – empregar
conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua
incidência no caso;
III – invocar
motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV – não
enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese,
infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V – se limitar
a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos
determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles
fundamentos;
VI – deixar de
seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte,
sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação
do entendimento.
28 Art. 979. A
instauração e o julgamento do incidente serão sucedidos da mais ampla e
específica divulgação e publicidade, por meio de registro eletrônico no
Conselho Nacional de Justiça.§ 1.º Os tribunais manterão banco eletrônico de
dados atualizados com informações específicas sobre questões de direito submetidas
ao incidente, comunicando-o imediatamente ao Conselho Nacional de Justiça para
inclusão no cadastro.
§ 2.º Para
possibilitar a identificação dos processos abrangidos pela decisão do
incidente, o registro eletrônico das teses jurídicas constantes do cadastro
conterá, no mínimo, os fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos
normativos a ela relacionados.
§ 3.º
Aplica-se o disposto neste artigo ao julgamento de recursos repetitivos e da
repercussão geral em recurso extraordinário.