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4 de agosto de 2021

EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1.340.444 - RS: Embargos de Declaração e omissão

EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1.340.444 - RS (2012/0178500-1)

Corte Especial, STJ; Unânime; 16/06/2021

EMENTA PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO RELATIVA À ADOÇÃO DE FUNDAMENTOS DIVERSOS NOS VOTOS PROFERIDOS. INEXISTÊNCIA. VÍCIO QUE SE CARACTERIZA SOMENTE QUANDO NÃO FOR ANALISADA QUESTÃO CONTROVERTIDA RELEVANTE PARA A SOLUÇÃO DA LIDE. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. JURISPRUDÊNCIA OSCILANTE. INAPLICABILIDADE. 

1. A parte embargante, em longa exposição, sustenta que não ocorreu a prescrição, porque deve prevalecer o entendimento de que houve "prejudicialidade superveniente", isto é, o fato de a UFRGS, ao discutir, nos Embargos à Execução da Obrigação de Fazer, o tema relacionado à compensação do índice de 28,86% com reajustes concedidos por legislação posterior, ter feito surgir situação que interferiu no termo inicial da prescrição para a Execução da Obrigação de Pagar Quantia Certa. 

2. Sustenta que a análise dessa situação foi realizada em apenas cinco dos votos proferidos nos autos, configurando-se omissão porque não houve pronunciamento dos outros sete Ministros que julgaram o Recurso Especial. 

3. Ademais, apresenta a existência de um segundo ponto omisso, consistente na necessidade de aplicar o art. 927, § 3º, do CPC, para atribuir efeitos prospectivos ao julgamento, de modo a impedir que o entendimento firmado seja aplicado ao caso concreto. 

4. A parte embargante formula argumentação caracterizada pelo emprego de retórica proporcionalmente tão sofisticada quanto artificiosa. 

5. A questão controvertida diz respeito à prescrição da pretensão executória nas obrigações de fazer e de pagar quantia certa, reconhecidas de modo autônomo em demanda coletiva. 

6. A decisão proferida pelo órgão colegiado apresentou-se composta por votos que contêm – todos – manifestação sobre a questão litigiosa, cada um, a seu modo, ostentando fundamentação adequada para a solução da lide. Evidentemente, a ratio decidendi apresentada em cada um dos votos não necessariamente é coincidente em todos (seja na posição vencedora, seja na vencida). 

7. Não há como confundir, por mais engenhosa que tenha sido a argumentação da parte embargante, "questão" ou "ponto controvertido" (submetido a julgamento) com as razões adotadas individualmente pelos membros componentes do órgão colegiado. 

8. A esse respeito, vale mencionar que o STJ já esclareceu que a existência de fundamentos diversos nos votos dos integrantes do órgão colegiado não enseja a constatação dos vícios do art. 1.022 do CPC quando for possível verificar, relativamente ao dispositivo, a formação de entendimento majoritário. Nesse sentido: EDcl no AgRg na MC 25.470/RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, DJe de 16/3/2017; EDcl no REsp 829.458/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe de 28/10/2016. 

9. Não bastasse isso, o próprio embargante reconheceu que há entre os votos vencedores declarados o expresso enfrentamento da questão da (inexistência) de prejudicialidade (originária ou superveniente) entre as execuções de fazer e pagar quantia, verbis (fl. 3.365, e-STJ): 

"(...) a decisão final dos embargos àquela execução de fazer, é claro, não poderia ser extra petita. Ou seja, não poderia resolver questões alheias à execução da obrigação de fazer (de implantar o percentual que àquela altura fosse reconhecido como devido). As demais questões relativas à execução de pagar quantia (que poderiam ser levantadas nos embargos da Fazenda a serem apresentados na execução para pagar quantia), portanto, não poderiam ser decididas na execução da obrigação de fazer. Com efeito, se o ente coletivo (Sindicato/ADUFRGS) sequer tinha legitimidade para exigir em nome dos docentes o cumprimento da obrigação de pagar, igualmente não tinha legitimidade para defender teses em nome dos professores nos embargos da Fazenda à obrigação de pagar. A falta de legitimidade do ente coletivo para a execução da obrigação de pagar tem como consequência que aquilo que viesse a ser decidido na execução da obrigação de fazer iniciada pelo ente coletivo não poderia ser oposto aos docentes em suas respectivas execuções de obrigação de pagar. Não há, portanto, real prejudicialidade entre questões discutidas na execução da obrigação de fazer e questões em tese possivelmente arguíveis na execução da obrigação de pagar” (fls. 3.340, e-STJ) (grifei). 

10. Como todos os votos do colegiado, vencidos e vencedores, compõem o acórdão para todos os fins legais (art. 941, § 3°, do CPC/2015), certo afirmar que inexiste a propalada omissão (como reconhecido pelo próprio embargante), afastando-se a necessidade de que TODOS os Ministros enfrentem expressamente os mesmos argumentos e tomem suas decisões com base em iguais fundamentos. Afinal, nosso modelo de julgamento colegiado nos Tribunais é plural (serial), em que são agregados os votos dos componentes do órgão colegiado, na sua expressão individual, vindo ao final a conclusão de cada um, computada aritmeticamente (ainda que por fundamentos diversos), compor o acórdão. 

11. A hipótese igualmente não comporta a aplicação do art. 927, § 3º, do CPC, pois o embargante reputa como "oscilante" a jurisprudência do STJ na última década, não havendo, portanto, "posição dominante" que tenha sido superada com o julgamento do presente recurso. Acrescente-se que foi justamente a referida oscilação na jurisprudência que constituiu o motivo determinante para a afetação do julgamento do Recurso Especial à Corte Especial. 

12. Embargos de Declaração rejeitados. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça: "A Corte Especial, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Og Fernandes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Francisco Falcão, Nancy Andrighi, Laurita Vaz, João Otávio de Noronha e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator. 

8 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Fundamentação / Motivação de decisão e vedação à decisão padronizada / genérica - Alexandre Freitas Câmara

 "É que incumbe ao órgão jurisdicional proferir urna decisão que seja a solução do caso concreto, personalizada, e não ter decisões prontas, produzidas para utilização em larga escala, sem respeitar as características de cada caso concreto que seja deduzido em juízo. Isto é extremamente importante especialmente (mas não apenas) no que diz respeito às demandas de massa, repetitivas. É que não obstante o caráter repetitivo que ostentam, todas elas têm características individuais que são irrepetíveis, e que precisam ser consideradas pelo órgão jurisdicional no momento de se proferir a decisão. 

CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro, 4' ed. ver. e atual. Atlas, São Paulo, 2018, p. 284 

7 de maio de 2021

DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO. ART. 489, §1º, VI, DO CPC/15. INOBSERVÂNCIA DE SÚMULA, JURISPRUDÊNCIA OU PRECEDENTE CONDICIONADA À DEMONSTRAÇÃO DE DISTINÇÃO OU SUPERAÇÃO. APLICABILIDADES ÀS SÚMULAS E PRECEDENTES VINCULANTES, MAS NÃO ÀS SÚMULAS E PRECEDENTES PERSUASIVOS.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.698.774 - RS (2017/0173928-2) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE DIVÓRCIO E PARTILHA DE BENS. DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO. ART. 489, §1º, VI, DO CPC/15. INOBSERVÂNCIA DE SÚMULA, JURISPRUDÊNCIA OU PRECEDENTE CONDICIONADA À DEMONSTRAÇÃO DE DISTINÇÃO OU SUPERAÇÃO. APLICABILIDADES ÀS SÚMULAS E PRECEDENTES VINCULANTES, MAS NÃO ÀS SÚMULAS E PRECEDENTES PERSUASIVOS. PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA ABERTA. REGIME MARCADO PELA LIBERDADE DO INVESTIDOR. CONTRIBUIÇÃO, DEPÓSITOS, APORTES E RESGATES FLEXÍVEIS. NATUREZA JURÍDICA MULTIFACETADA. SEGURO PREVIDENCIÁRIO. INVESTIMENTO OU APLICAÇÃO FINANCEIRA. DESSEMELHANÇAS ENTRE OS PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA ABERTA E FECHADA, ESTE ÚLTIMO INSUSCETÍVEL DE PARTILHA. NATUREZA SECURITÁRIA E PREVIDENCIÁRIA DOS PLANOS PRIVADOS ABERTOS VERIFICADA APÓS O RECEBIMENTO DOS VALORES ACUMULADOS, FUTURAMENTE E EM PRESTAÇÕES, COMO COMPLEMENTAÇÃO DE RENDA. NATUREZA JURÍDICA DE INVESTIMENTO E APLICAÇÃO FINANCEIRA ANTES DA CONVERSÃO EM RENDA E PENSIONAMENTO AO TITULAR. PARTILHA POR OCASIÃO DO VÍNCULO CONJUGAL. NECESSIDADE. ART. 1.659, VII, DO CC/2002 INAPLICÁVEL À HIPÓTESE. PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES EQUIVOCADAS E JUNTADA DE DOCUMENTOS DE DECLARAÇÕES DE IMPOSTO DE RENDA FALSEADAS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DA MATÉRIA. SÚMULA 7/STJ. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO APENAS PELO DISSENSO JURISPRUDENCIAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 284/STF. 

1- Ação ajuizada em 28/09/2007. Recurso especial interposto em 13/02/2017 e atribuído à Relatora em 09/08/2017. 

2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se o dever de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, previsto no art. 489, §1º, VI, do CPC/15, abrange também o dever de seguir julgado proferido por Tribunal de 2º grau distinto daquele a que o julgador está vinculado; (ii) se o valor existente em previdência complementar privada aberta na modalidade VGBL deve ser partilhado por ocasião da dissolução do vínculo conjugal; (iii) se a apresentação de declaração de imposto de renda com informação incorreta tipifica litigância de má-fé; (iv) se é possível partilhar valor existente em conta bancária alegadamente em nome de terceiro. 

3- A regra do art. 489, §1º, VI, do CPC/15, segundo a qual o juiz, para deixar de aplicar enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, deve demonstrar a existência de distinção ou de superação, somente se aplica às súmulas ou precedentes vinculantes, mas não às súmulas e aos precedentes apenas persuasivos, como, por exemplo, os acórdãos proferidos por Tribunais de 2º grau distintos daquele a que o julgador está vinculado. 

4- Os planos de previdência privada aberta, operados por seguradoras autorizadas pela SUSEP, podem ser objeto de contratação por qualquer pessoa física e jurídica, tratando-se de regime de capitalização no qual cabe ao investidor, com amplíssima liberdade e flexibilidade, deliberar sobre os valores de contribuição, depósitos adicionais, resgates antecipados ou parceladamente até o fim da vida, razão pela qual a sua natureza jurídica ora se assemelha a um seguro previdenciário adicional, ora se assemelha a um investimento ou aplicação financeira. 

5- Considerando que os planos de previdência privada aberta, de que são exemplos o VGBL e o PGBL, não apresentam os mesmos entraves de natureza financeira e atuarial que são verificados nos planos de previdência fechada, a eles não se aplicam os óbices à partilha por ocasião da dissolução do vínculo conjugal apontados em precedente da 3ª Turma desta Corte (REsp 1.477.937/MG). 

6- Embora, de acordo com a SUSEP, o PGBL seja um plano de previdência complementar aberta com cobertura por sobrevivência e o VGBL seja um plano de seguro de pessoa com cobertura por e sobrevivência, a natureza securitária e previdenciária complementar desses contratos é marcante no momento em que o investidor passa a receber, a partir de determinada data futura e em prestações periódicas, os valores que acumulou ao longo da vida, como forma de complementação do valor recebido da previdência pública e com o propósito de manter um determinado padrão de vida. 

7- Todavia, no período que antecede a percepção dos valores, ou seja, durante as contribuições e formação do patrimônio, com múltiplas possibilidades de depósitos, de aportes diferenciados e de retiradas, inclusive antecipadas, a natureza preponderante do contrato de previdência complementar aberta é de investimento, razão pela qual o valor existente em plano de previdência complementar aberta, antes de sua conversão em renda e pensionamento ao titular, possui natureza de aplicação e investimento, devendo ser objeto de partilha por ocasião da dissolução do vínculo conjugal por não estar abrangido pela regra do art. 1.659, VII, do CC/2002. 

8- Definido, pelo acórdão recorrido, que a prestação de informações equivocadas e a sucessiva juntada de diferentes declarações de imposto de renda se deu com o propósito específico de ocultar informações relacionadas ao patrimônio e, consequentemente, influenciar no desfecho da partilha de bens, disso resultando a condenação da parte em litigância de má-fé, é inviável a modificação do julgado para exclusão da penalidade em razão do óbice da Súmula 7/STJ. 

9- É imprescindível a indicação no recurso especial do dispositivo legal sobre o qual se baseia a divergência jurisprudencial, não sendo cognoscível o recurso interposto apenas com base na alínea “c” do permissivo constitucional em razão do óbice da Súmula 284/STF. 

10- Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nestar parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 1º de setembro de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator): Cuida-se de recurso especial interposto por I L E, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, em face de acórdão do TJ/RS que, por unanimidade, deu parcialmente provimento ao recurso de apelação que havia sido por ela interposto. 

Recurso especial interposto e m: 13/02/2017. Atribuído ao gabinete e m: 09/08/2017. 

Ação: de divórcio cumulada com partilha de bens, ajuizada pela recorrente em face de W E, recorrido. 

Sentença: julgou parcialmente procedentes os pedidos, para decretar o divórcio, afastar o recorrido do lar conjugal e partilhar, igualitariamente, a relação de bens que enumera (fls. 324/329, e-STJ). 

Acórdão: por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso de apelação da recorrente, nos termos da seguinte ementa: 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVÓRCIO. SEPARAÇÃO DE FATO. MANUTENÇÃO DA DELIMITAÇÃO PROCEDIDA NA SENTENÇA. PARTILHA DO PRODUTO DA VENDA DE BENS ALIENADOS DEPOIS DA RUPTURA. ADEQUAÇÃO. EXCLUSÃO DO VEÍCULO ADQUIRIDO DEPOIS DO DESENLACE. CABIMENTO. COMUNICABILIDADE DO SALDO DEPOSITADO JUNTO AO PLANO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. NÃO COMPROVAÇÃO DE QUE OS VALORES DEPOSITADOS EM CONTA BANCÁRIA PERTENCIAM A TERCEIROS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONFIGURAÇÃO. CONDENAÇÃO, DE OFÍCIO. REDISTRIBUIÇÃO DA SUCUMBÊNCIA. DESCABIMENTO. 1. Corretamente reconhecida na origem a ocorrência da separação de fato do casal na data do ajuizamento da ação de separação judicial pelo apelado (em apenso), ainda que o pedido liminar de seu afastamento do lar conjugal tenha sido deferido um mês depois. 2. Integra a partilha o produto da venda do veículo GM/Blazer e da motocicleta Honda/Biz, uma vez que a alienação de tais bens ocorreu posteriormente ao desenlace, sem comprovação de posterior repasse da meação em favor do apelado. 3. Tendo em vista que o veículo Ford/Fiesta foi objeto de arrendamento mercantil contratado pela recorrente depois do desenlace, merece acolhimento seu pedido de exclusão do acervo partilhável. Sentença reformada, no ponto. 4. São partilháveis os valores empregados no curso da relação em previdência privada em nome do recorrente, pois tais valores, a exemplo do que ocorre com aqueles recolhidos na conta vinculada do FGTS durante o relacionamento, são comunicáveis. 5. Não se desincumbiu a recorrente de comprovar sua tradução de que os valores depositados em sua conta bancária pertenciam de fato a seus genitores, mas que, em razão da idade avançada, eram por si administrados, com o que deve ser mantida a determinação de partilha desses valores. 6. Caso em que resta configurado o agir de má-fé da recorrente, que apresentou ao feito, após a prolação da sentença, documento adulterado e contendo informações falsas, com a intenção de comprovar suas alegações. Caracterização das hipóteses previstas nos incisos II e V do art. 80 do NCPC. Condenação, de ofício, ao pagamento de multa, conforme art. 81 do NCPC. 7. Não há falar em decaimento mínimo experimentado pela recorrente, sendo ajustada a redistribuição da sucumbência estabelecida na sentença. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. CONDENAÇÃO, DE OFÍCIO, POR LITIGÃNCIA DE MÁ-FÉ. (fls. 479/493, e-STJ). 

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram rejeitados por unanimidade (fls. 519/531, e-STJ). 

Recurso especial: alega-se: (i) violação ao art. 489, §1º, VI, do CPC/15, ao fundamento de que teriam sido colacionados diversos julgados de Tribunais de Justiça, que deveriam ser observados pelo acórdão recorrido, salvo na hipótese de distinção ou de superação de entendimento; (ii) violação ao art. 1.659, VII, do CC/2002, ao fundamento de que o valor existente em previdência complementar privada aberta possuiria natureza personalíssima e não poderia ser objeto de partilha por ocasião da dissolução do vínculo conjugal; (iii) violação aos arts. 80, II e V, e 81, ambos do CPC/15, ao fundamento de que a apresentação de declaração de imposto de renda com informação incorreta seria mero equívoco e não tipificaria a litigância de má-fé; (iv) dissídio jurisprudencial quanto à possibilidade ou não de partilha de valor existente em conta bancária alegadamente em nome de terceiro (fls. 537/564, e-STJ). 

Ministério Público Federal: opinou pelo desprovimento do recurso especial (fls. 652/658, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator): Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se o dever de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, previsto no art. 489, §1º, VI, do CPC/15, abrange também o dever de seguir julgado proferido por Tribunal de 2º grau distinto daquele a que o julgador está vinculado; (ii) se o valor existente em previdência complementar privada aberta na modalidade VGBL deve ser partilhado por ocasião da dissolução do vínculo conjugal; (iii) se a apresentação de declaração de imposto de renda com informação incorreta tipifica litigância de má-fé; (iv) se é possível partilhar valor existente em conta bancária alegadamente em nome de terceiro. 

DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO E DE OBSERVÂNCIA DE SÚMULA, JURISPRUDÊNCIA OU PRECEDENTE. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 489, §1º, VI, DO CPC/15. 

01) Nas razões de seu recurso especial, alega a recorrente que teria invocado, na apelação, uma série de julgados abonadores de sua tese de impossibilidade de partilha da previdência complementar privada aberta, proferidos pelo TJ/SP e pelo TJ/DFT, que não teriam sido observados pelo TJ/RS por ocasião do julgamento do referido recurso. 

02) Argumenta a recorrente, em razão disso, que teria ocorrido violação ao art. 489, §1º, VI, do CPC/15, na medida em que somente seria lícito ao TJ/RS afastar-se do entendimento contido nos julgados do TJ/SP e do TJ/DFT se houvesse fundamentação relacionada à distinção em relação à hipótese em exame ou à superação do entendimento materializado naqueles julgados. 

03) O dispositivo legal alegadamente violado possui o seguinte conteúdo: 

Art. 489. São elementos essenciais da sentença: (...) §1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (...) VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. 

04) Examinando-se o conteúdo do referido dispositivo legal, verifica-se que a nova lei processual exige do juiz um ônus argumentativo diferenciado na hipótese em que pretenda ele se afastar da orientação firmada em determinadas espécies de julgados, a saber, que demonstre a existência de distinção entre a hipótese que lhe fora submetida e o paradigma invocado ou de superação do entendimento firmado no paradigma invocado. 

05) Denota-se, pois, que o art. 489, §1º, VI, do CPC/15, possui, em sua essência, uma indissociável relação com o sistema de precedentes tonificado pela nova legislação processual, razão pela qual a interpretação sobre o conteúdo e a abrangência daquele dispositivo deve levar em consideração que o dever de fundamentação analítica do julgador, no que se refere à obrigatoriedade de demonstrar a existência de distinção ou de superação, limita-se às súmulas e aos precedentes de natureza vinculante, mas não às súmulas e aos precedentes apenas persuasivos. 

06) Quanto ao ponto, anote-se a precisa lição de Daniel Amorim Assumpção Neves: 

No inciso VI do §1º do art. 489 do CPC, há previsão de que não se considera fundamentada decisão que deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou de superação do entendimento. Lamenta-se a utilização do termo jurisprudência ao lado de súmula e precedente, não se devendo misturar a abstração e generalidade da jurisprudência com o caráter objetivo e individualizado da súmula e do precedente. De qualquer forma, como a aplicabilidade do dispositivo legal é limitada à eficácia vinculante do julgamento ou da súmula, a remissão à jurisprudência perde o sentido e torna-se inaplicável. Diferentemente do que ocorre com o inciso antecedente, o inciso VI do §1º do art. 489 do CPC não se aplica a súmulas e precedentes meramente persuasivos (Enunciado 11 da ENFAM: “Os precedentes a que se referem os incisos V e VI do §1º do art. 489 do CPC/2015 são apenas os mencionados no art. 927 e no inciso IV do art. 332”), porque, nesse caso, o juiz pode simplesmente deixar de aplicá-los por discordar de seu conteúdo, não cabendo exigir-se qualquer distinção ou superação que justifique a sua decisão. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. 4ª Ed. Salvador: JusPodivm, 2019. p. 883/884). 

07) Na hipótese em exame, dado que a recorrente invocou, para o julgamento da apelação perante o TJ/RS, apenas julgados proferidos pelo TJ/SP e pelo TJ/DFT no mesmo sentido de sua tese recursal de impossibilidade de partilha da previdência complementar privada aberta, o acórdão recorrido não estava obrigado a considerá-los por ocasião do julgamento da apelação e, por via de consequência, também não estava obrigado a estabelecer qualquer distinção ou superação do entendimento firmado pelo TJ/SP e pelo TJ/DFT, razão pela qual não há que se falar em violação ao art. 489, §1º, VI, do CPC/15. 

PARTILHA DE VALOR EXISTENTE EM PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PRIVADA ABERTA NA MODALIDADE VGBL POR OCASIÃO DO DIVÓRCIO. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 1.659, VII, DO CC/2002. 

08) Em seu recurso especial, a recorrente alega que o valor de R$ 105.000,00 (cento e cinco mil reais) que possuía em previdência complementar privada aberta na modalidade VGBL por ocasião do divórcio não seria suscetível de partilha, na medida em que se trataria de verba de natureza alimentar e personalíssima, originada de seu esforço pessoal e para a qual não teria havido contribuição alguma do recorrido, tratando-se de valor incomunicável porque seria apenas destinada a garantir a sua renda após determinada idade. 

09) Ao enfrentar o tema, o acórdão recorrido assim se posicionou: 

Com relação ao valor depositado ao tempo da separação junto ao Banco do Brasil oriundo de plano de previdência privada, com a devida vênia, tenho que não assiste razão à recorrente ao postular sua exclusão da partilha, uma vez que, a exemplo do que ocorre com aqueles valores recolhidos na conta vinculada do FGTS durante o relacionamento, são comunicáveis.No ponto, é aplicável, por analogia, a orientação consolidada em recente precedente da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, referente ao julgamento do Recurso Especial nº. 1.399.199/RS, em que se reconheceu o direito à meação sobre os valores aplicados em conta do FGTS auferidos durante a constância da relação, ainda que o saque não tenha sido realizado imediatamente à separação do casal, ou seja, ainda que não tenham sido levantados pelo titular da conta vinculada antes da ruptura: (...) Sendo assim, e considerando que, no caso, o plano de previdência foi contratado durante o casamento (em 25.07.2006, fI. 275; saldo de R$ 105.000,00 em 31.12.2006, fl. 289), incide, portanto, a presunção de esforço comum do casal para a realização dos depósitos mensais, de modo que a manutenção do reconhecimento judicial da comunicabilidade do valor existente ao tempo da separação é medida imperativa. 

10) O dispositivo alegadamente violado possui o seguinte teor: 

Art. 1.659. Excluem-se da comunhão: (...) VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes. 

11) De início, anote-se que a hipótese em exame versa sobre previdência privada aberta, tratando-se de situação distinta da previdência privada fechada que foi objeto de recente exame por esta Corte, oportunidade em que se concluiu se tratar de bem incomunicável e insuscetível de partilha. 

12) Com efeito, por ocasião do julgamento do REsp 1.477.937/MG, 3ª Turma, DJe 20/06/2017, concluiu-se que a previdência privada fechada é fonte de renda semelhante às pensões, meio-soldos e montepios (art. 1.659, VII, do CC/2002), de natureza personalíssima e equiparável, por analogia, à pensão mensal decorrente de seguro por invalidez, adotando-se, naquela oportunidade, as seguintes razões de decidir: 

O Brasil, mercê de adotar um sistema misto, priorizou o sistema estatal, o conhecido Regime Geral de Previdência Social, a cargo do INSS, de caráter público e compulsório, que prevê benefícios limitados a um teto legal máximo, aptos a permitir a manutenção dos meios necessários à sobrevivência do trabalhador, sem, contudo, garantir idêntico padrão de vida que gozava o trabalhador na ativa. Ao lado da previdência pública há o chamado Regime Complementar, privado e facultativo, gerido por entidades abertas e fechadas de previdência, visando atender a pretensão daqueles que almejam uma renda maior na inatividade. Daí a importância da previdência complementar, qual seja, de atender o interesse daqueles que almejam gozar de uma velhice com maior conforto a partir de um patamar econômico similar ao desfrutado na ativa, por meio da percepção de valores superiores ao limite imposto pela previdência social obrigatória, manifestamente insuficiente para manter determinado padrão de vida almejado. A previdência privada possibilita, portanto, a constituição de reservas de contingências futuras e incertas da vida por meio de entidades organizadas de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, sem fins lucrativos. (...) O sistema previdenciário privado é previsto tanto constitucionalmente (art. 202 da CF/1988), com destaque para a EC nº 20/1998, como infraconstitucionalmente, por meio da edição da Lei Complementar nº 109/2001. As entidades fechadas de previdência complementar, diferentemente das abertas (tema alheio aos autos), disponibilizam os planos de benefícios de natureza previdenciária apenas aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas aos quais os empregados estão atrelados, sem se confundir, contudo, com relação laboral. Nos fundos de previdência privada fechada ou fundos de pensão, a rentabilidade e o superávit revertem integralmente ao plano de previdência (§ 1º art. 35 Lei Complementar nº 109/2001) oferecidos por empresas públicas ou privadas, e fiscalizados pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar - PREVIC, autarquia vinculada ao Ministério da Previdência Social. Sua contratação é facultativa, visando a constituição de reservas que garantam benefício de caráter previdenciário (art. 2º da LC 109/2001), consoante previsto em estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades previdenciárias. Como se percebe, o aporte é desvinculado do contrato de trabalho do participante (REsp nº 1.207.071/RJ, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em DJe 8/8/2012), e por tal motivo não integra a remuneração do participante (art. 202, § 2º, da CF/1988). Consigne-se que a Lei nº 10.243/2001 incluiu o inciso VI no § 2º do art. 458 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que afasta do conceito de salário o instituto da previdência privada. (...) Por sua vez, não faria sentido possibilitar a partilha do benefício, visto que o princípio nuclear da previdência complementar fechada é justamente o equilíbrio financeiro e atuarial. Aliás, ressalta-se que tal verba não pode sequer ser levantada ou resgatada ao bel prazer do participante, que deve perder o vínculo empregatício com a patrocinadora ou completar os requisitos para tanto, sob pena de violação de normas previdenciárias e estatutárias. E, apenas a título de argumentação, admitir a possibilidade de resgate antecipado de renda capitalizada, em desfavor de uma massa de participantes e beneficiários de um fundo, significaria lesionar terceiros de boa-fé que assinaram previamente o contrato sem tal previsão. Ademais, não se pode negar que o equilíbrio atuarial, preceito elementar e inerente ao sistema previdenciário, é permeado de cálculos extremamente complexos, que consideram para a saúde financeira da entidade, inúmeras variáveis, tais como a expectativa de vida, o número de participantes, o nível de remuneração atual e o percentual de substituição do benefício complementar. Acrescer o regime de casamento ao cálculo desequilibraria o sistema como um todo, criando a exigência de que os regulamentos e estatutos das entidades previdenciárias passassem a considerar o regime de bens de união estável ou casamento dos participantes no cálculo atuarial, o que não faz o menor sentido por não se estar tratando de uma verba tipicamente trabalhista, mas, sim, de pensão, cuja natureza é distinta. Por outro lado, eventuais mudanças na forma de cálculo que possam comprometer o equilíbrio financeiro e atuarial devem ser evitadas por desafiar ampla comprovação da sua indispensabilidade, à luz do ato jurídico perfeito e da segurança jurídica, os quais impõem cautela e discernimento em tais alterações. 

13) O regime de previdência privada aberta, entretanto, é substancialmente distinto da previdência privada fechada que foi objeto de exame no referido precedente. 

14) Com efeito, a previdência privada aberta, que é operada por seguradoras autorizadas pela SUSEP – Superintendência de Seguros Privados, pode ser objeto de contratação por qualquer pessoa física ou jurídica, tratando-se de regime de capitalização no qual cabe ao investidor, com amplíssima liberdade e flexibilidade, deliberar sobre os valores de contribuição, depósitos adicionais, resgates antecipados ou parceladamente até o fim da vida. 

15) Diante dessas feições muito próprias, a comunicabilidade e partilha de valor aportado em previdência privada aberta, cuja natureza jurídica ora se assemelha a um seguro previdenciário adicional, ora se assemelha a um investimento ou aplicação financeira, é objeto de profunda divergência doutrinária. 

16) De um lado, há quem sustente a incomunicabilidade e consequente exclusão dos referidos valores da partilha decorrente da dissolução do vínculo conjugal. Nesse sentido, leciona Rolf Madaleno: 

Os fundos de pensão privada correspondem à aposentadoria ou benefício a ser pago diante da incapacidade, ou em decorrência da morte do contribuinte e por isso são classificados como tendo natureza pessoal e incomunicável, por se tratar de um direito inerente à pessoa, embora o contribuinte possa indicar quem ele quer que seja(m) seu(s) beneficiário(s), servindo como eficiente instrumento para gerar valores ao beneficiário indicado, que não passam pelo inventário do instituidor. Por sua natureza a previdência privada estaria excluída do patrimônio comum no regime da comunhão parcial (CC, art. 1.659, VII) e na comunhão universal de bens (CC, art. 1.668, V), comunicando-se, no entanto, no regime da participação final nos aquestos, que não previu sua exclusão e tampouco atribuiu caráter personalíssimo ao benefício advindo da previdência privada, observando João Andrades Carvalho, em comentário feito ainda ao tempo de vigência do Código Civil de 1916, que “a lei exclui do condomínio todo bem que tiver origem na individualidade, isto é, que seja marcado fundamentalmente pela pessoalidade ou que tenha destino nessa mesma direção”. Há quem defenda a comunicação da previdência privada por haver sido adquirida com valores provenientes do esforço comum durante a união, constituindo-se, portanto, em típico ativo financeiro, devendo por isso ser partilhado no divórcio, ou na dissolução da união estável como um bem patrimonial. Mas, se for considerado um bem patrimonial a ser dividido no divórcio ou na dissolução da convivência, ocorrendo o óbito do titular da previdência, ela também poderia ser reclamada como bem sucessível do espólio, para sua divisão entre todos os coerdeiros. Contudo, este raciocínio não é aplicado porque uma das maiores vantagens da previdência privada reside na liberalidade conferida na indicação do beneficiário. Na ausência de apontamento do beneficiário alguns entendimentos jurisprudenciais aplicam o artigo 792 do Código Civil, pagando metade do pecúlio ao cônjuge não separado e o restante aos herdeiros do participante, conforme a ordem da vocação hereditária. Pertinente destacar ser a previdência privada uma extensão da previdência social, cujo principal propósito é manter o padrão de vida das pessoas em situação de necessidade. Tem a natureza jurídica de um seguro, não sendo visto como uma extensão do direito sucessório, pois basta perguntar se eventual renúncia de herdeiro ao direito sucessório também atingiria o plano de previdência privada. (MADALENO, Rolf. Planejamento sucessório in Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões, Belo Horizonte, n. 1, jan./fev. 2014, p. 24/25). 

17) Em sentido oposto, propondo a comunicabilidade e consequente inclusão dos referidos valores da partilha decorrente da dissolução do vínculo conjugal, ensina Flávio Tartuce: O presente autor continua seguindo o entendimento segundo o qual os fundos de previdência privada constituem aplicações financeiras, devendo ocorrer sua comunicação finda a união, tese que sempre foi defendida por José Fernando Simão. Conforme apontado pelo coautor em edições anteriores desta obra, “antes de se atingir a idade estabelecida no plano, a previdência privada não passa de aplicação financeira como qualquer outra. Não há pensão antes desse momento e, portanto, não há incomunicabilidade. Isso porque, sequer há certeza de que, ao fim do plano, efetivamente os valores se converterão em renda ou serão sacados pelo titular. Trata-se de opção dos cônjuges o investimento em previdência privada, em fundos de ações ou de renda fixa. Assim, as decisões transcritas permitem a fraude ao regime, bastando que, para tanto, em vez de um dos cônjuges adquirir um imóvel ou investir em fundos (bens partilháveis ao fim do casamento), invista na previdência privada para se ver livre da partilha. Quando há a conversão da aplicação em renda e o titular passa a receber o benefício, este sim será incomunicável por ter caráter de pensão”. (TARTUCE, Flávio. Direito Civil. Vol. 5: direito de família. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 187/188). 

18) Como se percebe, os planos de previdência privada aberta, de que são exemplos o VGBL e o PGBL, não apresentam os mesmos entraves de natureza financeira e atuarial que são verificados nos planos de previdência fechada e que foram apontados no precedente desta 3ª Turma (REsp 1.477.937/MG) como óbices à partilha, pois, na previdência privada aberta, há ampla flexibilidade do investidor, que, repise-se, poderá escolher livremente como e quando receber, aumentar ou reduzir contribuições, realizar aportes adicionais, resgates antecipados ou parcelados a partir da data que porventura indicar. 

19) De outro lado, conquanto o PGBL seja classificado como “plano de previdência complementar aberta com cobertura por sobrevivência” (Circular SUSEP nº 338/2007) e o VGBL seja tipificado como “plano de seguro de pessoa com cobertura por e sobrevivência” (Circular SUSEP nº 339/2007), não se pode olvidar que tais contratos assumiram funções substancialmente distintas daquelas para as quais foram concebidos. 

20) Com efeito, a natureza securitária e previdenciária complementar desses contratos é evidentemente marcante no momento em que o investidor passa a receber, a partir de determinada data futura e em prestações periódicas, os valores que acumulou ao longo da vida, como forma de complementação do valor recebido da previdência pública e com o propósito de manter um determinado padrão de vida. 

21) Entretanto, no período que antecede a percepção dos valores, ou seja, durante as contribuições e formação do patrimônio, com múltiplas possibilidades de depósitos, de aportes diferenciados e de retiradas, inclusive antecipadas, a natureza preponderante do contrato de previdência complementar aberta é de investimento, semelhantemente ao que ocorreria se os valores das contribuições e dos aportes fossem investidos em fundos de renda fixa ou na aquisição de ações e que seriam objeto de partilha por ocasião da dissolução do vínculo conjugal ou da sucessão. 

22) Sublinhe-se que o hipotético tratamento diferenciado entre os investimentos realizados em previdência privada complementar aberta (incomunicáveis) e os demais investimentos (comunicáveis) possuiria uma significativa aptidão para gerar profundas distorções no regime de bens do casamento e também na sucessão, uma vez que bastaria ao investidor direcionar seus aportes para essa modalidade para frustrar a meação dos cônjuges ou a legítima dos herdeiros. 

23) A esse respeito, anote-se a lição de Ana Luiza Maia Nevares: 

Já em relação ao VGBL e ao PGBL, há muitos debates sobre a natureza de tais investimentos. Segundo boa parte da doutrina e da jurisprudência, é indiscutível o caráter securitário do VGBL e do PGBL, o que significa dizer que tais planos são tidos como espécie de seguro, sendo, inclusive, regulados pela Superintendência de Seguros Privados – SUSEP. Por tal razão, argumenta-se que não incide imposto de transmissão causa mortis sobre o capital segurado, não ingressando este no inventário. No entanto, em alguns Estados, como o Rio de Janeiro, há lei estadual que expressamente institui a incidência do imposto de transmissão causa mortis sobre tais recursos (Lei Estadual do Rio de Janeiro, n. 7174/15, art. 23). A questão, de fato, é tormentosa, uma vez que o VGBL e o PGBL, embora tenham natureza securitária, constituem capital de titularidade do segurado, que o administra da maneira que lhe convém, podendo sacá-lo a qualquer tempo. Enquanto tal capital não resta convertido em renda periódica, a previdência privada é um investimento como outro qualquer, razão pela qual não só devem ser tributados, como também devem ser contabilizados para fim de colação ou de partilha decorrente do regime de bens. Realmente, de outra maneira, seria fácil burlar a legítima, bastando que o autor da herança aplicasse todos os seus recursos financeiros em um VGBL, por exemplo, destinando-o a apenas um dos herdeiros necessários em caso de falecimento, ou mesmo burlar o regime de bens, na hipótese em que um cônjuge aplicasse os recursos do casal em investimento como o ora mencionado, nomeando um terceiro como beneficiado. (NEVARES, Ana Luiza Maia. Perspectivas para o planejamento sucessório in Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões, Belo Horizonte, n. 18, nov./dez. 2016, p. 19/20). 

24) Diante desse cenário, é correto afirmar que os valores aportados em planos de previdência privada aberta, antes de sua conversão em renda e pensionamento ao titular, possuem natureza de aplicação e investimento, devendo ser objeto de partilha por ocasião da dissolução do vínculo conjugal por não estarem abrangidos pela regra do art. 1.659, VII, do CC/2002. 

DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA COM INFORMAÇÃO INCORRETA E LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 80, II E V, E 81, AMBOS DO CPC/15. INADMISSIBILIDADE DO RECURSO. SÚMULA 7/STJ. 

25) Alega o recorrente, ademais, que a simples informação errônea de determinados dados em declaração de imposto de renda seria mero equívoco e não configuraria litigância de má-fé, razão pela qual o acórdão recorrido teria violado os arts. 80, II e V, e 81, ambos do CPC/15, transcritos adiante in verbis: 

Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que: (...) II – alterar a verdade dos fatos; (...) V – proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; (...) Art. 81. De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou. 

26) Ocorre que, examinando-se a fundamentação adotada pelo acórdão recorrido, constata-se que o TJ/RS identificou que a prestação de informações equivocadas e a sucessiva juntada de diferentes declarações de imposto de renda se deu com o propósito específico de ocultar informações relacionadas ao patrimônio e, consequentemente, influenciar no desfecho da partilha de bens. 

27) A esse respeito, confiram-se as razões de decidir expendidas no acórdão recorrido: 

A duas, porque, com a intenção de confortar sua alegação de que tais valores não integram seu patrimônio pessoal, não sendo por si declarados ao Fisco, a recorrente acostou ao feito, após a prolação da sentença (ou seja, de forma extemporânea), uma cópia da declaração de renda apresentada no exercício 2007, que foi recebida pelo agente receptor em 29.04.2007, com indicação de não se tratar de retificadora (fls. 285/291), na qual não há discriminação da importância ora questionada. Contudo, enquanto a “declaração de bens e direitos” deveria constar da “página 4 de 6”, o fato é que a discriminação dos bens constou da “página 1 de 1” (fl. 289), ocorrência que revela ter havido posterior manipulação dos dados informativos, situação que se confirma diante do desalinho constatado entre a evolução patrimonial indicada na “página 6 de 6” (R$ 837.189,94 em 31.12.2005 e R$ 906.672,91 em 31.12.2006, fl. 290) e a situação dos bens informada na aludida “página 1 de 1” (R$ 321.555,24 em 31.12.2005 e R$ 348.588,64 em 31.12.2006, fl. 289). Observo, por oportuno, que, relativamente ao exercício 2007, foi apresentada ao feito uma terceira cópia da declaração de renda da recorrente, juntamente com sua peça inicial, esta classificada como retificadora e recebida pelo agente receptor SERPRO em 24.09.2007 (fl. 29), ou seja, depois do desenlace. No tópico atinente à “declaração de bens e direitos”, constante da “página 4 de 6”, não há referência à importância ora questionada, impressionando, no entanto, que a informação respeitante à totalidade dos bens e à evolução patrimonial (R$ 271.555,24 em 31.12.2005 e R$ 258.588,64, fI. 33) tampouco corresponde àquela constante da declaração que foi acostada ao feito pela recorrente após a prolação da sentença (R$ 321.555,24 em 31.12.2005 e R$ 348.588,64 em 31.12.2006, fI. 289), extraindo-se desse contexto o seu inequívoco agir de má-fé, por alterar a verdade dos fatos, industriando um documento com informação falsa, e por proceder de modo temerário (incisos II e V do art. 80 do NCPC), comportamento processual pelo qual deve ser responsabilizada. 

28) A partir do exame da prova produzida nos autos, pois, o acórdão recorrido concluiu ter havido adulteração dolosa de informações em declaração de imposto de renda com a finalidade de influenciar o resultado da partilha, tratando-se de circunstância fática insuscetível de reexame no âmbito do recurso especial em razão do óbice da Súmula 7/STJ. 

DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL SOBRE PARTILHA DE VALOR EM CONTA BANCÁRIA ALEGADAMENTE DE TERCEIRO. INADMISSIBILIDADE DO RECURSO. SÚMULA 284/STF E SÚMULA 7/STJ. 

29) Finalmente, a recorrente também alega que teria havido a indevida partilha de valor existente em conta bancária alegadamente em nome de terceiro, sendo que o recurso especial, quanto ao ponto, está assentado somente na alínea “c” do permissivo constitucional, ao fundamento de que esse entendimento destoaria de julgado proferido pelo TJ/BA supostamente sobre a mesma matéria. 

30) Ocorre que a jurisprudência desta Corte se consolidou no sentido de que é imprescindível a indicação no recurso especial do dispositivo legal sobre o qual se baseia a divergência jurisprudencial, não sendo cognoscível o recurso interposto apenas com base na alínea “c” do permissivo constitucional em razão do óbice da Súmula 284/STF. A esse respeito: AgRg no REsp 1.346.588/DF, Corte Especial, DJe 17/03/2014 e EDcl no AREsp 806.419/SP, 3ª Turma, DJe 22/2/2016). 

31) De outro lado, não se pode olvidar que o acórdão recorrido, ao apreciar a questão, assim decidiu: 

A uma, porque prova documental alguma foi produzida na instrução pela insurgente a fim de comprovar sua tradução de que esses valores pertenciam, de fato, aos seus genitores, mas que, em razão da idade avançada deles, eram por si administrados, motivo por que figuraria como titular secundária da conta bancária, a qual sequer especificou (número e agência) em suas manifestações, não apresentando nenhum registro bancário nesse sentido. 

32) Como se verifica, o acórdão recorrido concluiu ser partilhável o valor porque não houve prova de que a conta seria de titularidade de terceiros (genitores da recorrida), tratando-se de matéria insuscetível de reexame no âmbito do recurso especial em virtude do óbice da Súmula 7/STJ. 

CONCLUSÃO 

33) Forte nessas razões, CONHEÇO EM PARTE do recurso especial e, nessa extensão, NEGO-LHE PROVIMENTO, deixando de majorar os honorários por se tratar de sentença proferida na vigência do CPC/73 (EAREsp 1.255.986/PR, Corte Especial, DJe 06/05/2019).