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8 de junho de 2021

Os pactos adjacentes coligados ao contrato de sublocação comercial não retira a aplicabilidade da Lei n. 8.245/1991.

 REsp 1.475.477-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/05/2021

Contrato de sublocação firmado entre distribuidora de combustíveis e posto de revenda. Contratos coligados. Manutenção da natureza jurídica. Lei n. 8.245/1991 (Lei de locações). Aplicabilidade.

Os pactos adjacentes coligados ao contrato de sublocação comercial não retira a aplicabilidade da Lei n. 8.245/1991.


No caso, as partes firmaram um "Contrato de Sublocação de Posto de Serviço", por meio do qual a parte locou o imóvel com equipamentos nele instalados para operação de posto de gasolina e diversos pactos subjacentes à locação, tais como a utilização da marca da distribuidora de combustíveis, à qual foi assegurado o direito de escolha dos locais de colocação dos letreiros e anúncios para divulgação de seus produtos, a cláusula de exclusividade e a cota mínima de aquisição de produtos.

Os contratos mistos podem ser definidos como aqueles resultantes da junção de elementos específicos de contratos diversos, levando à criação de um contrato singular, com características próprias e inconfundíveis em relação aos contratos reunidos, ou seja, os elementos dos contratos distintos se unem, perdendo sua autonomia, para formarem um contrato novo.

A questão fundamental quanto aos contratos mistos é determinar qual a sua disciplina jurídica, de modo que, para resolver o impasse, a doutrina especializada propõe 3 (três) soluções: a) teoria da combinação, na qual há decomposição de cada contrato que formou o misto, com aplicação da respectiva norma; b) teoria da absorção, a qual estabelece que todo contrato misto possui uma espécie contratual que prepondera sobre as demais, de maneira que suas normas é que regerão toda a relação jurídica; e c) teoria analógica, segundo a qual a tarefa do intérprete é procurar o contrato típico do qual mais se aproxima o contrato atípico em análise, com vistas a se aplicar a norma que disciplina aquele.

Por sua vez, nos contratos coligados ou conexos há uma justaposição de modalidades diversas de contratos, de tal forma que cada um destes mantém sua autonomia, preservando suas características próprias, haja vista que o objetivo da junção desses contratos é possibilitar uma atividade econômica específica, isto é, há uma mera combinação de contratos completos com um propósito econômico específico.

Diversamente dos contratos mistos, a coligação de contratos não implica, em regra, muitas dificuldades no que tange ao direito aplicável à espécie, exatamente por não perderem sua individualidade, devendo ser observado o conjunto de regras próprias dos modelos ajustados.

É notório que as relações jurídicas para a comercialização de derivados de petróleo possuem uma complexidade diferenciada e envolvem, via de regra, valores consideráveis, o que justifica a coligação de diversos contratos típicos para formação de um instrumento robusto e seguro que possa regular de forma satisfatória o negócio jurídico e viabilize a finalidade econômica pretendida.

Assim, o fato de o contrato de sublocação possuir outros pactos adjacentes não retira sua autonomia nem o desnatura, notadamente quando as outras espécies contratuais a ele se coligam com o único objetivo de concretizar e viabilizar sua finalidade econômica, de modo que as relações jurídicas dele decorrentes serão regidas pela Lei n. 8.245/1991.

Dessa forma, não se pode afastar a incidência da referida lei, pois há apenas uma justaposição dos contratos coligados, aplicando-se a norma de cada um deles de forma harmônica, ou seja, havendo o inadimplemento dos aluguéis, abre-se a possibilidade de a locadora ajuizar a ação de despejo, da mesma forma que, se houvesse, por exemplo, a mora no pagamento dos produtos adquiridos em virtude do contrato de compra e venda, seriam aplicáveis as regras específicas desse instituto jurídico, com a possibilidade de propositura da competente ação de cobrança.

11 de maio de 2021

É admissível a exclusão de prenome da criança na hipótese em que o pai informou, perante o cartório de registro civil, nome diferente daquele que havia sido consensualmente escolhido pelos genitores.

 REsp 1.905.614-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/05/2021, DJe 06/05/2021.

Atribuição de nome ao filho. Poder familiar. Bilateralidade e consensualidade. Autotutela. Inadmissão. Ato do pai que, desrespeitando consenso dos genitores, acresce unilateralmente prenome à criança por ocasião do registro. Deveres de lealdade e boa-fé. Violação. Ato ilícito. Configuração. Exercício abusivo do poder de família. Exclusão do prenome indevidamente acrescido. Ausência de comprovação da má-fé, intuito de vingança ou propósito de atingir à genitora. Irrelevância. Conduta censurável em si mesma.


É admissível a exclusão de prenome da criança na hipótese em que o pai informou, perante o cartório de registro civil, nome diferente daquele que havia sido consensualmente escolhido pelos genitores.

O direito ao nome é um dos elementos estruturantes dos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana, pois diz respeito à própria identidade pessoal do indivíduo, não apenas em relação a si, como também em ambiente familiar e perante a sociedade.

Conquanto a modificação do nome civil seja qualificada como excepcional e as hipóteses em que se admite a alteração sejam restritivas, esta Corte tem reiteradamente flexibilizado essas regras, permitindo-se a modificação se não houver risco à segurança jurídica e a terceiros.

Nomear o filho é típico ato de exercício do poder familiar, que pressupõe bilateralidade, salvo na falta ou impedimento de um dos pais, e consensualidade, ressalvada a possibilidade de o juiz solucionar eventual desacordo entre eles, inadmitindo-se, na hipótese, a autotutela.

O ato do pai que, conscientemente, desrespeita o consenso prévio entre os genitores sobre o nome a ser de dado ao filho, acrescendo prenome de forma unilateral por ocasião do registro civil, além de violar os deveres de lealdade e de boa-fé, configura ato ilícito e exercício abusivo do poder familiar, sendo motivação bastante para autorizar a exclusão do prenome indevidamente atribuído à criança.

É irrelevante apurar se o acréscimo unilateralmente promovido pelo genitor por ocasião do registro civil da criança ocorreu por má-fé, com intuito de vingança ou com o propósito de, pela prole, atingir à genitora, circunstâncias que, se porventura verificadas, apenas servirão para qualificar negativamente a referida conduta.

10 de abril de 2021

RESPONSABILIDADE CIVIL (PERDA DE UMA CHANCE): O termo inicial da prescrição da pretensão de obter o ressarcimento pela perda de uma chance decorrente da ausência de apresentação de agravo de instrumento é a data do conhecimento do dano

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-689-stj.pdf

Exemplo hipotético: João contratou Marcelo para ajuizar uma ação ordinária contra o plano de saúde. Foi ajuizada a ação, mas o juiz negou o pedido de tutela provisória de urgência. Marcelo, sem uma razão justificável, deixou de interpor agravo de instrumento. Em 06/06/2016, transcorreu in albis o prazo recursal. O processo continuou tramitando, no entanto, Marcelo sempre se mostrava negligente e sem compromisso para com seu cliente. Assim, em 07/07/2017, João revogou os poderes conferidos a Marcelo e contratou outro advogado para acompanhar o processo. O termo inicial do prazo prescricional para a ação de indenização pela perda de uma chance é 07/07/2017. 

No caso, não é razoável considerar como marco inicial da prescrição a data limite para a interposição do agravo de instrumento, haja vista inexistirem elementos nos autos - ou a comprovação por parte do causídico - de que o cliente tenha sido cientificado da perda de prazo para apresentar o recurso cabível. Portanto, o prazo prescricional não pode ter início no momento da lesão ao direito da parte (dia em que o advogado perdeu o prazo), mas sim na data do conhecimento do dano, aplicando-se excepcionalmente a actio nata em sua vertente subjetiva. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.622.450/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/03/2021 (Info 689). 

O que é a teoria da perda de uma chance? 

Trata-se de teoria inspirada na doutrina francesa (perte d’une chance). Na Inglaterra é chamada de lossof-a-chance. Segundo esta teoria, se alguém, praticando um ato ilícito, faz com que outra pessoa perca uma oportunidade de obter uma vantagem ou de evitar um prejuízo, esta conduta enseja indenização pelos danos causados. Em outras palavras, o autor do ato ilícito, com a sua conduta, faz com que a vítima perca a oportunidade de obter uma situação futura melhor. Com base nesta teoria, indeniza-se não o dano causado, mas sim a chance perdida. 

A teoria da perda de uma chance é adotada no Brasil? 

SIM, esta teoria é aplicada pelo STJ, que exige, no entanto, que o dano seja REAL, ATUAL e CERTO, dentro de um juízo de probabilidade, e não mera possibilidade, porquanto o dano potencial ou incerto, no espectro da responsabilidade civil, em regra não é indenizável (REsp 1.104.665-RS, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 9/6/2009). Em outros julgados, fala-se que a chance perdida deve ser REAL e SÉRIA, que proporcione ao lesado efetivas condições pessoais de concorrer à situação futura esperada (AgRg no REsp 1220911/RS, Segunda Turma, julgado em 17/03/2011). 

O dano resultante da aplicação da teoria da perda de uma chance pode ser classificado como dano emergente ou como lucros cessantes? 

Trata-se de uma terceira categoria. Com efeito, a teoria da perda de uma chance visa à responsabilização do agente causador não de um dano emergente, tampouco de lucros cessantes, mas de algo intermediário entre um e outro, precisamente a perda da possibilidade de se buscar posição mais vantajosa, que muito provavelmente se alcançaria, não fosse o ato ilícito praticado. (REsp 1190180/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/11/2010) 

Enunciado da V Jornada de Direito Civil do CJF: 

Enunciado 444, CJF: “A responsabilidade civil pela perda de chance não se limita à categoria de danos extrapatrimoniais, pois, conforme as circunstâncias do caso concreto, a chance perdida pode apresentar também a natureza jurídica de dano patrimonial. A chance deve ser séria e real, não ficando adstrita a percentuais apriorísticos”. 

Como o tema já foi cobrado em provas: 

 (Promotor de Justiça - MPE-SC - 2014) A responsabilidade civil pela perda de chance não se limita à categoria de danos extrapatrimoniais, pois, conforme as circunstâncias do caso concreto, a chance perdida pode apresentar também a natureza jurídica de dano patrimonial. (certo) 

 (Juiz de Direito Substituto - TJDFT - CESPE - 2014) A perda de uma chance, caracterizada pela violação direta ao bem juridicamente protegido, qual seja, a chance concreta, real, com alto grau de probabilidade de gerar um benefício ou de evitar um prejuízo, consubstancia modalidade autônoma de indenização. (certo) 

 (Procurador do Trabalho MPT 2020 banca própria) Segundo a teoria da perda de uma chance, fica obrigado a indenizar aquele que obsta a probabilidade real de alguém obter um lucro ou evitar um prejuízo, desde que a perda da oportunidade de ganho ou de evitar um prejuízo sob o aspecto do dano material seja séria e real, devendo haver prova do nexo causal entre o ato do ofensor e a perda de uma chance. Seu fundamento legal encontra-se no artigo 402 do Código Civil. (certo) 

 (Procurador do Trabalho MPT 2020 banca própria) Caracterizada a perda de uma chance, a compensação devida à vítima deverá corresponder à integralidade do lucro perdido ou do prejuízo sofrido. (errado) 

Feita esta breve revisão sobre o tema, imagine a seguinte situação hipotética: 

João contratou Marcelo para ajuizar uma ação ordinária contra o plano de saúde. Foi ajuizada a ação, mas o juiz negou o pedido de tutela provisória de urgência. Contra essa decisão interlocutória caberia a interposição de agravo de instrumento (art. 1.015, I, do CPC). Ocorre que Marcelo, sem uma razão justificável, deixou de interpor o recurso. Em 06/06/2016, transcorreu in albis o prazo recursal. O processo continuou tramitando, no entanto, Marcelo sempre se mostrava negligente e sem compromisso para com seu cliente. Assim, em 07/07/2017, João revogou os poderes conferidos a Marcelo e contratou outro advogado para acompanhar o processo. 

Ação de indenização 

João descobriu que Marcelo perdeu o prazo para interpor o recurso. Diante disso, ele deseja ingressar com ação contra seu antigo advogado pedindo o pagamento de indenização pela perda de uma chance. Surgiram, no entanto, dúvidas a respeito da prescrição. 

Qual é o prazo prescricional, neste caso? 

10 anos, nos termos do art. 205 do Código Civil: 

Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor. 

Consoante a orientação desta Corte, nas ações de indenização do mandante contra o mandatário, incide o prazo prescricional de dez anos previsto no artigo 205 do CC. STJ. 3ª Turma. AgRg no REsp 1.460.668/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 15/10/2015. 

Nas controvérsias relacionadas à responsabilidade contratual, aplica-se a regra geral (art. 205 CC/02) que prevê dez anos de prazo prescricional e, quando se tratar de responsabilidade extracontratual, aplica-se o disposto no art. 206, § 3º, V, do CC/02, com prazo de três anos. Para o efeito da incidência do prazo prescricional, o termo “reparação civil” não abrange a composição da toda e qualquer consequência negativa, patrimonial ou extrapatrimonial, do descumprimento de um dever jurídico, mas, de modo geral, designa indenização por perdas e danos, estando associada às hipóteses de responsabilidade civil, ou seja, tem por antecedente o ato ilícito. Por observância à lógica e à coerência, o mesmo prazo prescricional de dez anos deve ser aplicado a todas as pretensões do credor nas hipóteses de inadimplemento contratual, incluindo o da reparação de perdas e danos por ele causados. STJ. 2ª Seção. EREsp 1.280.825/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/6/2018. 

O termo inicial do prazo será 07/06/2016, um dia depois de esgotado o prazo para o recurso, ou seja, data em que ocorreu o dano? 

NÃO. 

Em regra, o termo inicial da prescrição é data da violação do direito (teoria da actio nata) 

Na legislação civil brasileira, prevalece a noção clássica de que o termo inicial da prescrição se dá com o próprio nascimento da ação (actio nata), sendo este determinado pela violação de um direito atual, suscetível de ser reclamado em juízo. Tanto é assim que o Código Civil de 2002, em seu art. 189, dispõe expressamente que “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.” Sob essa ótica, o prazo prescricional é contado, em regra, a partir do momento em que configurada lesão ao direito subjetivo, sendo desinfluente para tanto ter ou não seu titular conhecimento pleno do ocorrido ou da extensão dos danos (art. 189 do CC/2002). 

Exceções 

Tal regra, contudo, é mitigada em duas situações: 

a) nas hipóteses em que a própria legislação vigente estabeleça que o cômputo do lapso prescricional se dê a partir de termo inicial distinto (como ocorre, por exemplo, nas ações que se originam de fato que deva ser apurado no juízo criminal - art. 200 do Código Civil) e 

b) nas excepcionalíssimas situações em que, pela própria natureza das coisas, seria impossível ao autor pleitear a reparação do dano considerando que ele ainda não sabe que ocorreu. Ex: uma pessoa que se submete a transfusão de sangue, vindo a descobrir, anos mais tarde, ter sido naquela oportunidade contaminada pelo vírus HIV. 

A primeira exceção mencionada não apresenta grandes dificuldades de aplicação, pois a regra jurídica explicita o diferenciado termo inicial do prazo prescricional. Por sua vez, a segunda deve ser admitida com mais cautela e vem sendo solucionada na jurisprudência do STJ a partir da aplicação pontual da chamada teoria da actio nata em seu viés subjetivo, que, em síntese, confere ao conhecimento da lesão pelo titular do direito subjetivo violado a natureza de pressuposto indispensável ao início do prazo de prescrição. Nesse sentido: 

Aplicação excepcional da teoria da “actio nata” em seu viés subjetivo, segundo a qual, antes do conhecimento da violação ou lesão ao direito subjetivo pelo seu titular, não se pode considerar iniciado o cômputo do prazo prescricional. STJ. 3ª Turma. REsp 1605483/MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 23/02/2021. 

(...) 13. Pelo viés objetivo da teoria da actio nata, a prescrição começa a correr com a violação do direito, assim que a prestação se tornar exigível. 14. Por outro lado, segundo a vertente subjetiva da actio nata, a contagem do prazo prescricional exige a efetiva inércia do titular do direito, a qual somente se verifica diante da inexistência de óbices ao exercício da pretensão e a partir do momento em que o titular tem ciência inequívoca do dano, de sua extensão, e da autoria da lesão. (...) STJ. 3ª Turma. REsp 1736091/PE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 14/05/2019. 

No caso concreto, deve-se aplicar a segunda exceção: teoria da actio nata em seu viés subjetivo 

No caso, não é razoável considerar como marco inicial da prescrição a data limite para a interposição do agravo de instrumento, haja vista inexistirem elementos nos autos - ou a comprovação por parte do causídico - de que o cliente tenha sido cientificado da perda de prazo para apresentar o recurso cabível. A relação entre advogado e cliente se baseia na confiança recíproca e na legítima expectativa de que o profissional defenderá com zelo o mandato que lhe foi outorgado, conforme o art. 16 do Código de Ética e Disciplina da OAB, motivo pelo qual não se pode exigir do outorgante (cliente) o conhecimento de eventual erro ou da negligência do patrono (outorgado) durante a tramitação do processo. Como a relação contratual entre as partes se encerrou em 07/07/2017, é possível concluir que apenas neste momento o cliente lesionado teve (ou poderia ter tido) ciência da atuação negligente do advogado anterior. Tal conclusão se deve pelo fato de que o novo patrono, nomeado com base na confiança, deve ter tido a devida diligência que se espera do profissional da advocacia e, com isso, levado ao conhecimento do cliente as condições do processo e outras eventuais circunstâncias. Portanto, na hipótese, o prazo prescricional não pode ter início no momento da lesão ao direito da parte (dia em que o advogado perdeu o prazo), mas sim na data do conhecimento do dano, aplicando-se excepcionalmente a actio nata em sua vertente subjetiva. 

Nesse sentido confira esse trecho da ementa: 

(...) 3. O prazo prescricional é contado, em regra, a partir do momento em que configurada lesão ao direito subjetivo, sendo desinfluente para tanto ter ou não seu titular conhecimento pleno do ocorrido ou da extensão dos danos (art. 189 do CC/2002). 4. O termo inicial do prazo prescricional, em situações específicas, pode ser deslocado para o momento de conhecimento da lesão ao seu direito, aplicando-se excepcionalmente a actio nata em seu viés subjetivo. 5. Na hipótese, não é razoável considerar como marco inicial da prescrição a data limite para a interposição do agravo de instrumento, visto inexistirem elementos nos autos - ou a comprovação do advogado - evidenciando que o cliente tenha sido cientificado da perda de prazo para apresentar o recurso cabível. STJ. 3ª Turma. REsp 1622450/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/03/2021. 

Em suma: O termo inicial da prescrição da pretensão de obter o ressarcimento pela perda de uma chance decorrente da ausência de apresentação de agravo de instrumento é a data do conhecimento do dano. STJ. 3ª Turma. REsp 1.622.450/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/03/2021 (Info 689). 

Se não tivesse havido rompimento do contrato de prestação de serviços advocatícios, qual seria o termo inicial do prazo prescricional? 

Caso não tivesse ocorrido o rompimento do contrato de prestação de serviços advocatícios durante o transcurso da demanda judicial, os danos resultantes de má atuação de advogado apenas teriam se consolidado definitivamente com o trânsito em julgado, momento em que o prazo prescricional para obter o ressarcimento começaria a fluir: 

A prescrição da ação para reparação por danos causados por advogado, em patrocínio judicial, flui do trânsito em julgado do provimento jurisdicional resultante do erro profissional apontado. STJ. 3ª Turma. REsp 645.662/SP, Rel. Min. Humberto Gomes De Barros, julgado em 28/6/2007.

9 de abril de 2021

Página de Repetitivos e IACs Organizados por Assunto inclui reconhecimento de usucapião extraordinária

 A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) atualizou a base de dados de Repetitivos e IACs Organizados por Assunto. Foram incluídas informações a respeito do julgamento dos Recursos Especiais (REsp) 1.667.842 e REsp 1.667.843, classificados em direito civil, no assunto usucapião.

Os recursos estabelecem a possibilidade de reconhecimento de usucapião extraordinária mesmo quando a área for inferior ao módulo estabelecido em lei municipal.

Plataforma

Os usuários podem acompanhar o passo a passo dos recursos repetitivos no STJ por meio da página Repetitivos e Incidentes de Assunção de Competência, mantida pelo Núcleo de Gerenciamento de Precedentes (Nugep). O espaço traz informações atualizadas relacionadas à tramitação – como afetação, desafetação e suspensão de processos, entre outras.

A página Repetitivos e IACs Organizados por Assunto disponibiliza os acórdãos já publicados (acórdãos dos recursos especiais julgados no tribunal sob o rito dos artigos 1.036 a 1.041 e do artigo 947 do Código de Processo Civil), organizando-os de acordo com o ramo do direito e por assuntos específicos.​

8 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: suppressio; boa-fé objetiva; proteção da confiança - Marco Aurélio Bezerra de Melo

“Em outras palavras, a configuração do suppressio tem como pressuposto a inércia do titular do direito durante um período de tempo considerável, circunstância que conduz à existência de uma renúncia tácita, a uma caducidade similar ao que ocorre na decadência com a diferença de que nesta há um prazo específico estabelecido na lei ou negócio jurídico e aquela é aferida de acordo com as circunstâncias do caso sob a incidência da boa-fé objetiva e da tutela de confiança. (...) 

Enfim, a confiança é tutelada, pois a inércia do credor por um período de tempo significativo gera no parceiro contratual a convicção de que não será mais exercido determinado direito (...)”

MELO; Marco Aurélio Bezerra de. Direito Civil: Contratos, 2ª ed., Forense, Rio de Janeiro, 2018, pp. 87/88.

5 de abril de 2021

Indenização por morte. DPVAT. Seguro de vida. Identidade. Impenhorabilidade. CPC/1973, art. 649, VI (CPC/2015, art. 833, VI). Incidência.

REsp 1.412.247-MG, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/03/2021 

Os valores pagos a título de indenização pelo "Seguro DPVAT" aos familiares da vítima fatal de acidente de trânsito gozam da proteção legal de impenhorabilidade ditada pelo art. 649, VI, do CPC/1973 (art. 833, VI, do CPC/2015), enquadrando-se na expressão "seguro de vida".

"O Seguro DPVAT tem a finalidade de amparar as vítimas de acidentes causados por veículos automotores terrestres ou pela carga transportada, ostentando a natureza de seguro de danos pessoais, cujo escopo é eminentemente social, porquanto transfere para o segurador os efeitos econômicos do risco da responsabilidade civil do proprietário em reparar danos a vítimas de trânsito, independentemente da existência de culpa no sinistro" (REsp 876.102/DF, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 22/11/2011, DJe 01/02/2012).

Sob uma perspectiva teleológica da proteção conferida ao "seguro de vida" pelo art. 649, VI, do CPC/1973 (art. 833, VI, do CPC/2015), os valores pagos pelo "seguro DPVAT" devem receber o mesmo tratamento, evidenciando cobertura que, conquanto obrigatória, em tudo se identifica com a indenização paga em razão do "seguro de pessoa" previsto pelo art. 789 e ss. do CC/2002.

De fato, a indenização paga pelo "seguro DPVAT", sobretudo quando ocorre a morte da vítima do acidente automobilístico, também tem objetivo de atenuar os efeitos que a ausência do falecido pode ensejar às finanças de sua família, revelando indubitável natureza alimentar.

Conforme a doutrina, "ao instituir a impenhorabilidade do seguro de vida, quis o legislador assegurar a efetividade da proteção patrimonial que o segurado [ou, no caso do DPVAT, a própria lei instituidora] desejou destinar aos beneficiários; o valor devido pela empresa seguradora a esse título não é penhorável por dívidas destes nem do espólio ou do autor da herança, porque em qualquer dessas hipóteses tal intuito estaria frustrado".

Forçoso concluir que o "seguro de vida" e o "seguro DPVAT", previsto nas Leis Federais n. 6.194/1974 e 8.374/1991, longe de evidenciar natureza e objetivos distintos, em verdade guardam estreita semelhança, sobretudo no que se refere à finalidade de sua indenização, motivo pelo qual é inafastável, tanto para um quanto para o outro, a impenhorabilidade ditada pela lei processual - ubi eadem ratio ibi eadem dispositioNão se trata, pois, de aplicação analógica do dispositivo legal, senão o enquadramento do "seguro DPVAT" dentro da previsão contida na lei processual.

Plano de pecúlio. Inadimplência. Longo período. Entidade de previdência privada. Recusa de pagamento do pecúlio por morte. Legitimidade.

 REsp 1.691.792-RS, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/03/2021 

É legítima a recusa da entidade de previdência privada ao pagamento do pecúlio por morte no caso de inadimplemento das parcelas contratadas por longo período, independente da ausência de prévia interpelação para o encerramento do contrato.

Inicialmente, não resta dúvida de que o entendimento firmado pela Segunda Seção - no sentido de que "[o] mero atraso no pagamento de prestação do prêmio do seguro não importa em desfazimento automático do contrato, para o que se exige, ao menos, a prévia constituição em mora do contratante pela seguradora, mediante interpelação" (REsp 316.552/SP, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, Segunda Seção, julgado em 09/10/2002, DJ 12/04/2004, p. 184) - também se aplica ao caso do contrato de previdência privada com plano de pecúlio por morte.

O mero inadimplemento das prestações não basta para a caracterização da mora do segurado, sendo necessária a interpelação para a desconstituição da relação contratual. Entretanto, diante de um longo período de inadimplemento - aproximadamente 7 (sete) anos, sem prova de circunstância excepcional que se afigure apta a justificar o descumprimento da obrigação, não há falar em "mero inadimplemento", senão a inequívoca manifestação de desinteresse na continuidade da relação contratual.

No julgamento do REsp 842.408/RS, examinando situação semelhante, entendeu a Terceira Turma desta Corte que "indenizar segurado inadimplente há mais de um ano é agredir a boa-fé (Art. 1.443 do CCB/1916) e a lógica do razoável. Pouco importa se o inadimplemento decorreu de suposta redução do limite de crédito do segurado. Nem há como impor ao banco onde realizados os débitos o dever de acompanhar os compromissos financeiros de seu cliente 'distraído' (fl. 201). Um atraso de 15 meses não pode ser qualificado como 'mero atraso no pagamento de prestação do prêmio do seguro' (REsp 316.552). A ausência de interpelação por parte da seguradora não garante, no caso, o direito à indenização securitária".

Plano de saúde coletivo. Falecimento do titular. Beneficiária agregada. Pretensão de manutenção do benefício. Possibilidade. Art. 30, § 2º, da Lei n. 9.656/1998.

REsp 1.841.285/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/03/2021

No caso de morte do titular, os membros do grupo familiar - dependentes e agregados - podem permanecer como beneficiários no plano de saúde coletivo, desde que assumam o pagamento integral.

Na hipótese de falecimento do titular do plano de saúde coletivo, seja este empresarial ou por adesão, a Terceira Turma decidiu que nasce para os dependentes já inscritos o direito de pleitear a sucessão da titularidade, nos termos dos arts. 30 ou 31 da Lei n. 9.656/1998, a depender da hipótese, desde que assumam o seu pagamento integral (REsp 1.871.326/RS, julgado em 01/09/2020, DJe 09/09/2020).

Apesar de o § 3º do art. 30, que trata da hipótese de permanência em caso de morte do beneficiário titular, fazer uso da expressão "dependentes", o § 2º assegura a proteção conferida pelo referido art. 30, de manutenção do plano de saúde nas hipóteses de rompimento do contrato de trabalho do titular, obrigatoriamente, a todo o grupo familiar, sem fazer nenhuma distinção quanto aos agregados.

Na linha desse raciocínio, não há como fazer uma interpretação puramente literal e isolada do § 3º do art. 30 da Lei n. 9.656/1998; a interpretação há de ser feita em harmonia com o direito instituído pelo § 2º, garantindo, assim, que, no caso de morte do titular, os membros do grupo familiar - dependentes e agregados - permaneçam como beneficiários no plano de saúde, desde que assumam o pagamento integral, na forma da lei.

Ademais, de acordo com o art. 2º, I, "b" da Resolução ANS 295/2012, beneficiário dependente é o beneficiário de plano privado de assistência à saúde cujo vínculo contratual com a operadora depende da existência de relação de dependência ou de agregado a um beneficiário titular


4 de abril de 2021

Sucessão causa mortis. União estável. Bem particular. Frutos civis. Comunicabilidade exclusivamente durante a constância da união estável. Data da celebração do contrato de locação e período de sua vigência. Irrelevância.

 REsp 1.795.215/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/03/2021

O montante recebido a título de aluguéis de imóvel particular do "de cujus" não se comunica à companheira supérstite após a data da abertura da sucessão.

Inicialmente, o art. 1.660, V, do CC dispões que se comunicam os frutos dos bens particulares de cada cônjuge ou companheiro percebidos durante a constância da união ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.

No que concerne à divisão dos frutos civis após a extinção do casamento ou da união estável, esta Corte Superior já teve a oportunidade de se manifestar no sentido de que o direito à meação se dá com relação aos valores que foram auferidos durante a constância da convivência.

Na oportunidade, ficou assentado que "o reconhecimento da incomunicabilidade daquela rubrica [ocorre] apenas quando percebidos os valores em momento anterior ou posterior ao casamento".

Vale dizer, o que autoriza a comunicabilidade dos frutos é a data da ocorrência do fato que dá ensejo à sua percepção, ou, em outros termos, o momento em que o titular adquiriu o direito ao seu recebimento.

No particular, a meação, quanto aos valores reclamados, cinge-se aos aluguéis relativos ao período aquisitivo compreendido no curso da união estável, a qual teve como termo final a data do falecimento do companheiro, proprietário exclusivo do imóvel locado.

Impende destacar que a Lei n. 8.245/1991 (Lei do Inquilinato) dispõe, em seu art. 10, que, "morrendo o locador, a locação transmite-se aos herdeiros".

Isso significa que, a partir da data do falecimento do locador - momento em que houve a transmissão dos direitos e deveres decorrentes do contrato de locação aos herdeiros -, todo e qualquer vínculo, ainda que indireto, apto a autorizar a recorrente a partilhar dos aluguéis (como aquele previsto na norma do inc. V do art. 1.660 do CC) foi rompido, cessando, por imperativo lógico, seu direito à meação sobre eles.

Ademais, a data da celebração do contrato de locação ou o termo final de sua vigência em nada influenciam na resolução da questão, pois os aluguéis somente podem ser considerados pendentes se deveriam ter sido recebidos na constância da união estável ou casamento e não o foram.

Nesse contexto, portanto, somente podem ser considerados eventuais aluguéis vencidos e não pagos ao tempo do óbito do proprietário, circunstância que, caso verificada, autorizaria sua integração à meação da companheira.

29 de março de 2021

Para Terceira Turma, direito real de habitação não admite extinção de condomínio nem cobrança de aluguel

 Na sucessão por falecimento, a extinção do condomínio em relação a imóvel sobre o qual recai o direito real de habitação contraria a própria essência dessa garantia, que visa proteger o núcleo familiar. Também por causa dessa proteção constitucional e pelo caráter gratuito do direito real de habitação, não é possível exigir do ocupante do imóvel qualquer contrapartida financeira em favor dos herdeiros que não usufruem do bem.

A tese foi reafirmada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia declarado a extinção do condomínio e condenado a companheira do falecido e a filha do casal, que permaneciam no imóvel, ao pagamento de aluguel mensal às demais herdeiras.

Apesar de reconhecer o direito real de habitação da companheira, o TJSP entendeu que essa prerrogativa não impede a extinção do condomínio formado com as demais herdeiras, filhas de casamento anterior do falecido. Em consequência, o tribunal determinou a alienação do imóvel, com a reserva do direito real de habitação. 

Moradia digna

A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que o direito real de habitação reconhecido ao cônjuge ou companheiro sobrevivente decorre de imposição legal (artigos 1.831 do Código Civil e 7º, parágrafo único, da Lei 9.278/1996) e tem natureza vitalícia e personalíssima, o que significa que ele pode permanecer no imóvel até a morte.

"Sua finalidade é assegurar que o viúvo ou viúva permaneça no local em que antes residia com sua família, garantindo-lhe uma moradia digna", afirmou a ministra, lembrando que esse direito também é reconhecido aos companheiros – mesmo após a vigência do Código Civil de 2002, o qual, segundo o STJ, não revogou da Lei 9.278/1996.

De acordo com a relatora, a intromissão do Estado na livre capacidade das pessoas de disporem de seu patrimônio só se justifica pela proteção constitucional garantida à família. Dessa forma, apontou, é possível, em exercício de ponderação de valores, a mitigação de um deles – relacionado aos direitos de propriedade – para assegurar o outro – a proteção do grupo familiar.

Nancy Andrighi também destacou que o artigo 1.414 do Código Civil é expresso em relação ao caráter gratuito do direito real de habitação. Para a ministra, de fato, seria um contrassenso atribuir ao viúvo a prerrogativa de permanecer no imóvel e, ao mesmo tempo, exigir dele uma contrapartida pelo uso do bem.

Irmãs

Em seu voto, a ministra chamou a atenção para o fato de que o TJSP condenou não só a companheira do falecido ao pagamento de aluguéis, mas também a filha do casal – que é irmã por parte de pai das demais herdeiras. Nesse ponto, a ministra destacou que o artigo 1.414 do Código Civil assegura ao detentor do direito real a prerrogativa de habitar na residência não apenas em caráter individual, mas com a sua família.

"Sendo assim, não podem os herdeiros exigir remuneração da companheira sobrevivente, nem da filha que com ela reside no imóvel", concluiu a magistrada ao reformar o acórdão do TJSP e julgar improcedentes os pedidos de extinção do condomínio e arbitramento de aluguéis.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1846167