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15 de fevereiro de 2022

Se os bens alienados em garantia não pertencem ao avalista que está em recuperação judicial, o credor não pode invocar o art. 49, § 3º para alegar que o crédito é extraconcursal e querer expropriar os bens do avalista sem respeitar o plano de recuperação

 STJ. 3ª Turma. REsp 1.953.180-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 25/11/2021 (Info 720).

Se os bens alienados em garantia não pertencem ao avalista que está em recuperação judicial, o credor não pode invocar o art. 49, § 3º para alegar que o crédito é extraconcursal e querer expropriar os bens do avalista sem respeitar o plano de recuperação

Caso julgado

X celebra contrato de mútuo com o banco

Banco exige duas garantias

que 10 caminhões de X ficassem alienados em garantia ao banco

que outra empresa (Y) figurasse como avalista

Posteriormente, X  entrou em recuperação judicial

Diante de inadimplemento, o banco ingressou com execução de título executivo extrajudicial cobrando a dívida

instituição financeira propôs a execução unicamente contra a avalista - Y

Nessa execução foram penhorados bens da avalista - Y

Antes que a execução terminasse, da avalista (Y) também ingressou em recuperação judicial.

O Juízo da Vara de Falências e Recuperação Judicial expediu ofício ao Juízo da execução encaminhando a decisão que deferiu o processamento da recuperação judicial da Avalista (Y), requerendo a suspensão dos atos expropriatórios com relação aos bens da Avalista

Banco alegou que seu crédito não se submete aos efeitos da recuperação judicial da avalista, pois, além de estar garantido pelo aval, também está por alienação fiduciária em garantia - manutenção constrições

Tese não foi acolhida, pois caso os bens alienados em garantia fossem da avalista (Y), poderiam ser perseguidos pelo credor (banco) fora da recuperação judicial dela.

No entanto, sendo os bens alienados em garantia de propriedade do devedor principal (X), o crédito em relação à avalista em recuperação judicial não pode ser satisfeito com outros bens de sua propriedade, que estão submetidos ao pagamento de todos os demais credores

crédito extraconcursal e garantia

não se submete aos efeitos da recuperação judicial - art. 49, § 3º da Lei nº 11.101/2005

Mas os bens dados em garantia não eram da avalista. Logo, isso não interfere na recuperação judicial da avalista

Não pertencendo os bens alienados em garantia ao avalista em recuperação judicial, não podem ser expropriados outros bens de sua titularidade, pois devem servir ao pagamento de todos os credores

credores fiduciários estão excluídos dos efeitos da recuperação judicial somente em relação ao montante alcançado pelos bens alienados em garantia

Se a alienação do bem dado em garantia for suficiente para quitar o débito, extingue-se a obrigação

Por outro lado, se o valor apurado com a venda do bem não for bastante para extinguir a obrigação, o restante do crédito em aberto não mais poderá ser exigido fora da recuperação judicial do devedor, pois não mais existirá a característica que diferenciava o credor titular da posição de proprietário fiduciário dos demais – valor remanescente não é considerado crédito extraconcursal e deverá estar sujeito às regras da recuperação judicial.

Logo, não faz sentido pretender excluir da recuperação judicial bens da avalista que não são os que estão em alienação fiduciária

Art. 49, § 3º, Lei nº 11.101/2005: “Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial”

Se a empresa em recuperação tinha um contrato de alienação fiduciária com o credor fiduciário, este credor tinha, como garantia da dívida, a propriedade fiduciária, de modo que o crédito do banco não está submetido aos efeitos do plano de credores

a empresa em recuperação judicial deve continuar pagando as prestações da mesma forma que já estava ajustada no contrato e, se atrasar, o banco poderá propor a ação de busca e apreensão

O que diferencia o credor garantido por alienação fiduciária dos demais credores é a propriedade do bem alienado em garantia. Assim, é o objeto da garantia que traça os limites da extraconcursalidade do crédito

(...) Via de regra, o credor garantido por alienação fiduciária em garantia não se submete à recuperação judicial, conforme expressamente dispõe o art. 49, § 3º, da LRF. Logo, em caso de venda do bem pelo proprietário fiduciário, o produto da venda não será repassado para a empresa em recuperação. Entretanto, caso o bem alienado fiduciariamente seja de valor insuficiente para satisfazer a integralidade da obrigação garantida, o saldo poderá ser habilitado na recuperação, à qual se sujeitará. (A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 82).

9 de maio de 2021

EXECUÇÃO. AVALISTA. CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE GARANTIA REAL. NECESSIDADE DE CITAÇÃO. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.475.257 - MG (2014/0207179-2) 

RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. AVALISTA. CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE GARANTIA REAL. NECESSIDADE DE CITAÇÃO. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. 

1. O cônjuge que apenas autorizou seu consorte a prestar aval, nos termos do art. 1.647 do Código Civil (outorga uxória), não é avalista. Dessa forma, não havendo sido prestada garantia real, não é necessária sua citação como litisconsorte, bastando a mera intimação, como de fato postulado pelo exequente (art. 10, § 1º, incisos I e II, do CPC de 1973). 

2. Recurso especial a que se nega provimento. 

ACÓRDÃO 

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi (Presidente) e Raul Araújo votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão. 

Brasília (DF), 10 de dezembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Trata-se de recurso especial interposto de acórdão que recebeu a seguinte ementa (e-STJ fl. 160): 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE EXECUÇÃO - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - AVAL - INCLUSÃO DO CÔNJUGE NO POLO PASSIVO - IMPOSSIBILIDADE - NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. Nos termos do art. 1647 do Código Civil, é necessária a autorização do outro cônjuge para prestação de aval, como se deu nesta seara. Contudo, por ser o aval garantia de natureza pessoal, não pode ser o cônjuge que presta consentimento, considerado avalista e por conseqüência, não se pode pretender a sua inclusão no pólo passivo da Ação de Execução. 

Alega-se ofensa ao art. 10 do Código de Processo Civil de 1973, bem como dissídio. 

Sustenta-se que "a não inclusão do cônjuge, bem como a não formação do litisconsórcio passivo necessário eivam de nulidade instransponível na Ação executiva proposta pelo Recorrido, devendo o presente Recurso Especial ser acolhido, no sentido de determinar a extinção do feito". 

Contrarrazões às e-STJ fls. 185/189. 

Destaco que a decisão recorrida foi publicada antes da entrada em vigor da Lei n. 13.105 de 2015, estando o recurso sujeito aos requisitos de admissibilidade do Código de Processo Civil de 1973, conforme Enunciado Administrativo 2/2016 desta Corte. 

É o relatório. 

VOTO 

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI (Relatora): A questão jurídica tratada no presente recurso especial diz respeito à necessidade de citação do cônjuge que concede a outorga uxória em aval quando da execução do avalista, na condição de litisconsorte necessário. 

O Tribunal solucionou a questão jurídica tratada nos seguintes termos (e-STJ fls. 161/162): 

Compulsando os autos, vê-se que o agravante propôs exceção de pré-executividade pugnando pela inclusão de sua esposa no pólo passivo da ação de execução proposta pelo Banco Safra S/A, pois, a seu aviso, a não-formação do litisconsórcio passivo gerará nulidade na ação executiva. Tal pedido que foi negado pelo Juizo a quo. Dal o presente agravo de instrumento. Vejo que não assiste razão ao agravante. Em principio, o art. 1647 do Código Civil, disciplina a matéria trazida à apreciação: "Art.1.647: Ressalvado o disposto no artigo 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I - Alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II - Pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - Prestar fiança ou aval; IV - Fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação." Dessa feita, exceto no regime de separação absoluta, o cônjuge precisa da autorização do outro cônjuge para se prestar aval, como é o caso dos autos. Tal consentimento foi devidamente prestado pela esposa do agravante, Patrícia Loureiro Campos, como se vê a f. 31-TJMG. Ocorre que não pode pretender o avalista a inclusão de sua esposa no pólo passivo da demanda executiva, pois o aval é uma garantia de pagamento de titulo de crédito que tem natureza pessoal e, com isso, o pagamento somente pode ser imputado a ele, avalista. (...) Dessa feita, por se tratar de obrigação de natureza pessoal, não pode o cônjuge que presta consentimento ser também considerado avalista. Por conseqüência, não pode figurar no pólo passivo da ação de execução. 

Entendo que o referido posicionamento não merece reformas. O art. 10 do Código de Processo Civil de 1973, invocado como norma violada, assim dispõe: 

Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do outro para propor ações que versem sobre direitos reais imobiliários. § 1o Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para as ações: I - que versem sobre direitos reais imobiliários; II - resultantes de fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou de atos praticados por eles; III - fundadas em dívidas contraídas pelo marido a bem da família, mas cuja execução tenha de recair sobre o produto do trabalho da mulher ou os seus bens reservados; IV - que tenham por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus sobre imóveis de um ou de ambos os cônjuges. § 2o Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos praticados. 

O aval é ato jurídico de prestação de garantia. 

Poderia eventualmente ser praticado por ambos os cônjuges, na condição de avalistas. 

Mas consta do acórdão recorrido que foi praticado apenas pelo executado, assinando a sua esposa unicamente na condição de outorgante da autorização para a prestação da garantia. Trata-se da condição prevista no art. 1.647 do Código Civil: 

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - prestar fiança ou aval; IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação. Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada. 

Assim, tal como bem observou a Corte local, não há que se falar em litisconsórcio necessário porque o cônjuge do avalista não é avalista ou tampouco praticou ato visando à garantia. 

Não desconheço o precedente desta Corte nos autos do RESP 212.447/MS, de seguinte ementa: 

EXECUÇÃO. LEGITIMIDADE DE PARTE PASSIVA AD CAUSAM DA MULHER DO AVALISTA, QUE ANUIU À CONSTITUIÇÃO DA GARANTIA HIPOTECÁRIA, COMPROMETENDO INCLUSIVE A SUA MEAÇÃO. - O garante de dívida alheia equipara-se ao devedor. Quem deu a garantia deve figurar no pólo passivo da execução, quando se pretenda tornar aquela efetiva. Precedentes. - Caso em que, ademais, os executados nomearam o bem hipotecado à penhora. Litisconsórcio passivo necessário entre o garante hipotecário e seu cônjuge. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 212.447/MS, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 17/08/2000, DJ 09/10/2000, p. 152) 

Em que pese o referido precedente tratar de legitimidade passiva ad causam em execução de cédula de crédito comercial em que o cônjuge recorrente não figura como emitente nem avalista, tem-se a peculiaridade de que foi anuente de hipoteca, gravame de direito real que atrai a incidência do art. 10, § 1º, I, do Código de Processo Civil de 1973, não tratado no presente caso e tampouco invocado pelo ora recorrente nas razões de seu especial. 

O mesmo ocorre nos seguintes precedentes, em que há garantia real ou penhora de imóvel: 

PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL HIPOTECÁRIA. EXECUÇÃO. NECESSIDADE DE CITAÇÃO DO CÔNJUGE DAQUELE QUE PRESTA AVAL NO TÍTULO. AUSÊNCIA. NULIDADE. 1. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que "não viola a disciplina processual o acórdão que anula o processo de execução de título executivo extrajudicial com garantia pignoratícia e hipotecária, pela ausência da citação do cônjuge do executado (REsp 87.853/MA, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, DJ de 15.12.1997) 2. Precedentes: REsp 468.333/MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 1º/12/2009, DJe de 14/12/2009; REsp 49669/RS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 14/11/2000, DJ de 12/2/2001; REsp 212.447/MG, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, DJ de 9.10.2000. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag 1165048/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 05/08/2011) 

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA DE BEM IMOVEL. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DO CONJUGE. 1. SEGUNDO ORIENTAÇÃO QUE VEIO A PREVALECER NESTA QUARTA TURMA, NO CASO DA PENHORA RECAIR SOBRE BEM IMOVEL TORNA-SE IMPRESCINDIVEL A INTIMAÇÃO DO CONJUGE, SOB PENA DE NULIDADE. 2. ANTE A FORMAÇÃO DE LITISCONSORCIO NECESSARIO, FICA O MARIDO-EXECUTADO LEGITIMADO PARA ARGUIR A EVENTUAL FALTA DA INTIMAÇÃO DE SUA MULHER EM SEDE DE EMBARGOS A EXECUÇÃO. 3. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (REsp 11.699/PR, Rel. Ministro BUENO DE SOUZA, QUARTA TURMA, julgado em 06/06/1994, DJ 01/08/1994, p. 18651) 

Veja-se que no último precedente citado se fala em intimação do cônjuge, e não citação. 

No caso, o exequente postulou a intimação do cônjuge, conforme se depreende do pedido inicial da execução à e-STJ fl. 22 dos autos. 

Assim, não há que se declarar a extinção da execução como pretende a recorrente. 

Não sendo a hipótese dos autos, em que a instituição financeira apresenta sua inicial postulando o pagamento ou a indicação de bens à penhora, suficiente o pedido inicial de intimação. 

Ainda que transpostos os referidos óbices, não seria o caso de extinção do feito, como pretende a recorrente, mas mero retorno dos autos à origem para emenda à inicial, o que não é o caso. No mesmo sentido: 

PROCESSUAL CIVIL. EMENDA À INICIAL. MODIFICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR E DO PEDIDO, APÓS OFERECIDA A CONTESTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DETERMINAÇÃO, EX OFFICIO, DE QUE O AUTOR PROMOVA A CITAÇÃO DO LITISCONSORTE PASSIVO NECESSÁRIO. POSSIBILIDADE. ART. 47 DO CPC/1973. NORMA DE CARÁTER DE ORDEM PÚBLICA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência do STJ não se admite a emenda da inicial após o oferecimento da contestação quando tal diligência ensejar a modificação do pedido ou da causa de pedir. Isso porque a regra prevista no art. 284 do CPC/1973 deve ser compatibilizada com o disposto no art. 264 do CPC/1973, que impede ao autor, após a citação, modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu; e, em nenhuma hipótese, permite a alteração do pedido ou da causa de pedir após o saneamento do processo. 2. In casu, a emenda da inicial para possibilitar a inclusão no polo passivo da demanda de litisconsorte necessário não enseja modificação do pedido ou da causa de pedir. 3. Ademais, é assente o entendimento do STJ de que o litisconsórcio necessário é regido por norma de ordem pública, cabendo ao juiz determinar, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, a integração à lide do litisconsorte passivo. 4. Nos termos do art. 47 do Código de Processo Civil de 1973 há o litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. 5. O litisconsórcio necessário, à exceção das hipóteses de imposição legal, encontra sua razão de ser na natureza da relação jurídica de direito material deduzida em juízo, que implica produção dos efeitos da decisão de mérito de forma direta na esfera jurídica de todos os integrantes dessa relação. 6. Agravo Interno não provido. (AgInt no REsp 1593819/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/10/2016, REPDJe 03/05/2017, DJe 08/11/2016) 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DETERMINAÇÃO DE EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL. DESCUMPRIMENTO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. PROVIMENTO NEGADO. 1. Nos termos do art. 284 do Código de Processo Civil, impõe-se o indeferimento da petição inicial se a parte autora, intimada à emendá-la, não leva a efeito tal incumbência. 2. Preclusa a matéria relacionada à necessidade de aditamento da petição inicial por força do reconhecimento da existência de litisconsórcio passivo necessário, outra alternativa não restava à impetrante, senão promover a emenda da petição inicial do mandado de segurança. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no RMS 27.720/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 12/05/2015, DJe 21/05/2015) 

Improsperável, a meu entender, a pretensão de reforma do acórdão recorrido para extinguir o feito de execução. 

Em face do exposto, nego provimento ao recurso especial. 

É como voto. 

24 de abril de 2021

EXECUÇÃO. AVALISTA. CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE GARANTIA REAL. NECESSIDADE DE CITAÇÃO. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.475.257 - MG (2014/0207179-2) 

RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. AVALISTA. CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE GARANTIA REAL. NECESSIDADE DE CITAÇÃO. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. 

1. O cônjuge que apenas autorizou seu consorte a prestar aval, nos termos do art. 1.647 do Código Civil (outorga uxória), não é avalista. Dessa forma, não havendo sido prestada garantia real, não é necessária sua citação como litisconsorte, bastando a mera intimação, como de fato postulado pelo exequente (art. 10, § 1º, incisos I e II, do CPC de 1973). 

2. Recurso especial a que se nega provimento. 

ACÓRDÃO 

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi (Presidente) e Raul Araújo votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão. 

Brasília (DF), 10 de dezembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Trata-se de recurso especial interposto de acórdão que recebeu a seguinte ementa (e-STJ fl. 160): 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE EXECUÇÃO - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - AVAL - INCLUSÃO DO CÔNJUGE NO POLO PASSIVO - IMPOSSIBILIDADE - NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. Nos termos do art. 1647 do Código Civil, é necessária a autorização do outro cônjuge para prestação de aval, como se deu nesta seara. Contudo, por ser o aval garantia de natureza pessoal, não pode ser o cônjuge que presta consentimento, considerado avalista e por conseqüência, não se pode pretender a sua inclusão no pólo passivo da Ação de Execução. 

Alega-se ofensa ao art. 10 do Código de Processo Civil de 1973, bem como dissídio. 

Sustenta-se que "a não inclusão do cônjuge, bem como a não formação do litisconsórcio passivo necessário eivam de nulidade instransponível na Ação executiva proposta pelo Recorrido, devendo o presente Recurso Especial ser acolhido, no sentido de determinar a extinção do feito". 

Contrarrazões às e-STJ fls. 185/189. 

Destaco que a decisão recorrida foi publicada antes da entrada em vigor da Lei n. 13.105 de 2015, estando o recurso sujeito aos requisitos de admissibilidade do Código de Processo Civil de 1973, conforme Enunciado Administrativo 2/2016 desta Corte. 

É o relatório. 

VOTO MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI (Relatora): A questão jurídica tratada no presente recurso especial diz respeito à necessidade de citação do cônjuge que concede a outorga uxória em aval quando da execução do avalista, na condição de litisconsorte necessário. 

O Tribunal solucionou a questão jurídica tratada nos seguintes termos (e-STJ fls. 161/162): 

Compulsando os autos, vê-se que o agravante propôs exceção de pré-executividade pugnando pela inclusão de sua esposa no pólo passivo da ação de execução proposta pelo Banco Safra S/A, pois, a seu aviso, a não-formação do litisconsórcio passivo gerará nulidade na ação executiva. Tal pedido que foi negado pelo Juizo a quo. Dal o presente agravo de instrumento. Vejo que não assiste razão ao agravante. Em principio, o art. 1647 do Código Civil, disciplina a matéria trazida à apreciação: "Art.1.647: Ressalvado o disposto no artigo 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I - Alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II - Pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - Prestar fiança ou aval; IV - Fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação." Dessa feita, exceto no regime de separação absoluta, o cônjuge precisa da autorização do outro cônjuge para se prestar aval, como é o caso dos autos. Tal consentimento foi devidamente prestado pela esposa do agravante, Patrícia Loureiro Campos, como se vê a f. 31-TJMG. Ocorre que não pode pretender o avalista a inclusão de sua esposa no pólo passivo da demanda executiva, pois o aval é uma garantia de pagamento de titulo de crédito que tem natureza pessoal e, com isso, o pagamento somente pode ser imputado a ele, avalista. (...) Dessa feita, por se tratar de obrigação de natureza pessoal, não pode o cônjuge que presta consentimento ser também considerado avalista. Por conseqüência, não pode figurar no pólo passivo da ação de execução. 

Entendo que o referido posicionamento não merece reformas. 

O art. 10 do Código de Processo Civil de 1973, invocado como norma violada, assim dispõe: 

Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do outro para propor ações que versem sobre direitos reais imobiliários. § 1o Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para as ações: I - que versem sobre direitos reais imobiliários; II - resultantes de fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou de atos praticados por eles; III - fundadas em dívidas contraídas pelo marido a bem da família, mas cuja execução tenha de recair sobre o produto do trabalho da mulher ou os seus bens reservados; IV - que tenham por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus sobre imóveis de um ou de ambos os cônjuges. § 2o Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos praticados. 

O aval é ato jurídico de prestação de garantia. Poderia eventualmente ser praticado por ambos os cônjuges, na condição de avalistas. Mas consta do acórdão recorrido que foi praticado apenas pelo executado, assinando a sua esposa unicamente na condição de outorgante da autorização para a prestação da garantia. Trata-se da condição prevista no art. 1.647 do Código Civil: 

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: 

I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; 

II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; 

III - prestar fiança ou aval; 

IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação. 

Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada. 

Assim, tal como bem observou a Corte local, não há que se falar em litisconsórcio necessário porque o cônjuge do avalista não é avalista ou tampouco praticou ato visando à garantia. Não desconheço o precedente desta Corte nos autos do RESP 212.447/MS, de seguinte ementa: 

EXECUÇÃO. LEGITIMIDADE DE PARTE PASSIVA AD CAUSAM DA MULHER DO AVALISTA, QUE ANUIU À CONSTITUIÇÃO DA GARANTIA HIPOTECÁRIA, COMPROMETENDO INCLUSIVE A SUA MEAÇÃO. - O garante de dívida alheia equipara-se ao devedor. Quem deu a garantia deve figurar no pólo passivo da execução, quando se pretenda tornar aquela efetiva. Precedentes. - Caso em que, ademais, os executados nomearam o bem hipotecado à penhora. Litisconsórcio passivo necessário entre o garante hipotecário e seu cônjuge. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 212.447/MS, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 17/08/2000, DJ 09/10/2000, p. 152) 

Em que pese o referido precedente tratar de legitimidade passiva ad causam em execução de cédula de crédito comercial em que o cônjuge recorrente não figura como emitente nem avalista, tem-se a peculiaridade de que foi anuente de hipoteca, gravame de direito real que atrai a incidência do art. 10, § 1º, I, do Código de Processo Civil de 1973, não tratado no presente caso e tampouco invocado pelo ora recorrente nas razões de seu especial. 

O mesmo ocorre nos seguintes precedentes, em que há garantia real ou penhora de imóvel: 

PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL HIPOTECÁRIA. EXECUÇÃO. NECESSIDADE DE CITAÇÃO DO CÔNJUGE DAQUELE QUE PRESTA AVAL NO TÍTULO. AUSÊNCIA. NULIDADE. 1. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que "não viola a disciplina processual o acórdão que anula o processo de execução de título executivo extrajudicial com garantia pignoratícia e hipotecária, pela ausência da citação do cônjuge do executado (REsp 87.853/MA, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, DJ de 15.12.1997) 2. Precedentes: REsp 468.333/MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 1º/12/2009, DJe de 14/12/2009; REsp 49669/RS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 14/11/2000, DJ de 12/2/2001; REsp 212.447/MG, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, DJ de 9.10.2000. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag 1165048/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 05/08/2011) 

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA DE BEM IMOVEL. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DO CONJUGE. 1. SEGUNDO ORIENTAÇÃO QUE VEIO A PREVALECER NESTA QUARTA TURMA, NO CASO DA PENHORA RECAIR SOBRE BEM IMOVEL TORNA-SE IMPRESCINDIVEL A INTIMAÇÃO DO CONJUGE, SOB PENA DE NULIDADE. 2. ANTE A FORMAÇÃO DE LITISCONSORCIO NECESSARIO, FICA O MARIDO-EXECUTADO LEGITIMADO PARA ARGUIR A EVENTUAL FALTA DA INTIMAÇÃO DE SUA MULHER EM SEDE DE EMBARGOS A EXECUÇÃO. 3. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (REsp 11.699/PR, Rel. Ministro BUENO DE SOUZA, QUARTA TURMA, julgado em 06/06/1994, DJ 01/08/1994, p. 18651) 

Veja-se que no último precedente citado se fala em intimação do cônjuge, e não citação. No caso, o exequente postulou a intimação do cônjuge, conforme se depreende do pedido inicial da execução à e-STJ fl. 22 dos autos. Assim, não há que se declarar a extinção da execução como pretende a recorrente. Não sendo a hipótese dos autos, em que a instituição financeira apresenta sua inicial postulando o pagamento ou a indicação de bens à penhora, suficiente o pedido inicial de intimação. 

Ainda que transpostos os referidos óbices, não seria o caso de extinção do feito, como pretende a recorrente, mas mero retorno dos autos à origem para emenda à inicial, o que não é o caso. No mesmo sentido: 

PROCESSUAL CIVIL. EMENDA À INICIAL. MODIFICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR E DO PEDIDO, APÓS OFERECIDA A CONTESTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DETERMINAÇÃO, EX OFFICIO, DE QUE O AUTOR PROMOVA A CITAÇÃO DO LITISCONSORTE PASSIVO NECESSÁRIO. POSSIBILIDADE. ART. 47 DO CPC/1973. NORMA DE CARÁTER DE ORDEM PÚBLICA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência do STJ não se admite a emenda da inicial após o oferecimento da contestação quando tal diligência ensejar a modificação do pedido ou da causa de pedir. Isso porque a regra prevista no art. 284 do CPC/1973 deve ser compatibilizada com o disposto no art. 264 do CPC/1973, que impede ao autor, após a citação, modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu; e, em nenhuma hipótese, permite a alteração do pedido ou da causa de pedir após o saneamento do processo. 2. In casu, a emenda da inicial para possibilitar a inclusão no polo passivo da demanda de litisconsorte necessário não enseja modificação do pedido ou da causa de pedir. 3. Ademais, é assente o entendimento do STJ de que o litisconsórcio necessário é regido por norma de ordem pública, cabendo ao juiz determinar, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, a integração à lide do litisconsorte passivo. 4. Nos termos do art. 47 do Código de Processo Civil de 1973 há o litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. 5. O litisconsórcio necessário, à exceção das hipóteses de imposição legal, encontra sua razão de ser na natureza da relação jurídica de direito material deduzida em juízo, que implica produção dos efeitos da decisão de mérito de forma direta na esfera jurídica de todos os integrantes dessa relação. 6. Agravo Interno não provido. (AgInt no REsp 1593819/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/10/2016, REPDJe 03/05/2017, DJe 08/11/2016) 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DETERMINAÇÃO DE EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL. DESCUMPRIMENTO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. PROVIMENTO NEGADO. 1. Nos termos do art. 284 do Código de Processo Civil, impõe-se o indeferimento da petição inicial se a parte autora, intimada à emendá-la, não leva a efeito tal incumbência. 2. Preclusa a matéria relacionada à necessidade de aditamento da petição inicial por força do reconhecimento da existência de litisconsórcio passivo necessário, outra alternativa não restava à impetrante, senão promover a emenda da petição inicial do mandado de segurança. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no RMS 27.720/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 12/05/2015, DJe 21/05/2015) 

Improsperável, a meu entender, a pretensão de reforma do acórdão recorrido para extinguir o feito de execução. Em face do exposto, nego provimento ao recurso especial. 

É como voto. 

18 de abril de 2021

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. INADIMPLEMENTO. REGIME JURÍDICO APLICÁVEL. DECRETO-LEI 911/69. INSCRIÇÃO DO NOME DO AVALISTA EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO DE CRÉDITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.824 - RS (2019/0251597-0) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. INADIMPLEMENTO. REGIME JURÍDICO APLICÁVEL. DECRETO-LEI 911/69. INSCRIÇÃO DO NOME DO AVALISTA EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO DE CRÉDITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 

1. Ação ajuizada em 18/04/2016. Recurso especial interposto em 16/05/2019 e concluso ao Gabinete em 26/08/2019. Julgamento: Aplicação do CPC/2015. 

2. O propósito recursal consiste em definir se o credor fiduciário, na hipótese de inadimplemento do contrato, é obrigado a promover a venda do bem alienado fiduciariamente, na forma do art. 1.364 do CC/02, antes de proceder à inscrição dos nomes dos devedores em cadastros de proteção ao crédito. 

3. No ordenamento jurídico brasileiro, coexiste um duplo regime jurídico da propriedade fiduciária: a) o regime jurídico geral do Código Civil, que disciplina a propriedade fiduciária sobre coisas móveis infungíveis, sendo o credor fiduciário qualquer pessoa natural ou jurídica; b) o regime jurídico especial, formado por um conjunto de normas extravagantes, dentre as quais o Decreto-Lei 911/69, que trata da propriedade fiduciária sobre coisas móveis fungíveis e infungíveis, além da cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou de títulos de crédito, restrito o credor fiduciário à pessoa jurídica instituição financeira. 

4. Hipótese dos autos que envolve cédula de crédito bancário com alienação fiduciária de veículo em garantia firmada com instituição financeira, a atrair o regime do DL 911/69. 

5. Nos termos expressos do art. 5º do DL 911/69, é facultado ao credor fiduciário, na hipótese de inadimplemento ou mora no cumprimento das obrigações contratuais pelo devedor, optar pela excussão da garantia ou pela ação de execução. 

6. De todo modo, independentemente da via eleita pelo credor, a inscrição dos nomes dos devedores solidários em bancos de dados de proteção ao crédito, em razão do incontroverso inadimplemento do contrato, não se reveste de qualquer ilegalidade, tratando-se de exercício regular do direito de crédito. 

7. Recurso especial conhecido e não provido, com majoração dos honorários advocatícios. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso especial, com majoração dos honorários advocatícios, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 05 de maio de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): 

Cuida-se de recurso especial interposto por ODANIR BRUNO SARTORI, com fundamento, exclusivamente, na alínea "a" do permissivo constitucional. 

Ação: declaratória c/c pedido de obrigação de fazer, ajuizada pelo recorrente em face de BANCO VOLKSWAGEN S.A. 

Em breve síntese, alega o autor que, na condição de então sócio da empresa Concresart Tecnologia em Concreto LTDA, firmou com o Banco réu, em 30/08/2011, contrato de abertura de crédito fixo com garantia de alienação fiduciária, no qual figurou como avalista. 

No entanto, em fevereiro de 2016 – após a sua retirada do quadro societário, em maio de 2013 –, a empresa entrou em recuperação judicial e se tornou inadimplente com relação às parcelas do contrato, o que ocasionou a inscrição do nome do autor em cadastros de restrição ao crédito. 

Ante esses fatos, argumenta o autor que, por se tratar de contrato garantido por alienação fiduciária, cabia ao Banco réu primeiramente efetivar a venda do bem com vistas ao pagamento da dívida e, assim, apurar eventual saldo devedor, na forma do art. 1.364 do CC/02, para só então proceder à negativação do nome do avalista. 

Dessa maneira, requer a exclusão das anotações já realizadas e que seja determinado ao réu que não efetue a inscrição do nome do autor em cadastro de restrição ao crédito no tocante ao contrato em apreço antes de promovida a venda do bem alienado fiduciariamente. 

Sentença: julgou procedente o pedido, para declarar o direito do autor, ora recorrente, de não ter o seu nome incluído em rol de inadimplentes antes de observado o procedimento de excussão da garantia, confirmando a decisão que, em sede de tutela antecipada, determinou a exclusão das anotações negativas. 

Acórdão: deu provimento à apelação interposta pelo recorrido para julgar improcedentes os pedidos iniciais, nos termos da seguinte ementa: 

“APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO. 1. Inexiste obrigação de o credor buscar antes a garantia real e depois a pessoal. Inaplicabilidade do artigo 1.364 do Código Civil no caso concreto. 2. Em sendo o débito devido, pois, regular a inscrição em órgão(s) de proteção ao crédito, inexistindo ato ilícito, razão pela qual não há falar-se em indenização por danos morais. Exercício regular de direito. APELO PROVIDO” (e-STJ fl. 92). 

Recurso especial: alega violação do art. 1.364 do CC/02, reiterando que, na hipótese de inadimplemento de contrato garantido por alienação fiduciária, o credor, a fim de buscar a satisfação de seu crédito, deve obrigatoriamente promover a venda do bem alienado e aplicar o preço obtido no pagamento e/ou abatimento parcial da dívida. Defende que, antes desse procedimento, que permite apurar eventual débito remanescente, não é lícita a inclusão do nome do devedor em órgãos de restrição ao crédito. 

Juízo de admissibilidade: o recurso foi admitido pelo TJ/RS. 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): 

O propósito recursal consiste em definir se o credor fiduciário, na hipótese de inadimplemento do contrato, é obrigado a promover a venda do bem alienado fiduciariamente antes de proceder à inscrição dos nomes dos devedores em cadastros de proteção ao crédito. 

I. DA DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA 

1. O debate trazido a julgamento gira em torno da interpretação do art. 1.364 do CC/02, segundo o qual “vencida a dívida, e não paga, fica o credor obrigado a vender, judicial ou extrajudicialmente, a coisa a terceiros, a aplicar o preço no pagamento de seu crédito e das despesas de cobrança, e a entregar o saldo, se houver, ao devedor”. 

2. A partir de tal dispositivo legal, o ora recorrente defende que a venda do bem alienado fiduciariamente é obrigatória, pois somente após implementada é que se poderia constatar eventual saldo devedor remanescente, que, de seu turno, legitimaria a inscrição do nome do devedor e seus avalistas em cadastros de restrição ao crédito. 

3. O Tribunal de origem, no entanto, rejeitou essa linha argumentativa, ao entendimento de que “inexiste obrigação de o credor buscar antes a garantia real e depois a pessoal, até porque lhe é de direito promover a execução do crédito da maneira que lhe pareça mais exitosa, restando inaplicável o referido artigo do códex no caso presente” (e-STJ fl. 94). 

II. DO DUPLO REGIME JURÍDICO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA 

4. Em linhas gerais, o negócio fiduciário é aquele mediante o qual um sujeito (fiduciante), a fim de garantir uma obrigação, transmite a propriedade de uma coisa ou a titularidade de um direito a outro (fiduciário), que, se cumprido o encargo, devolve o bem ou o direito ao transmitente. Considera-se fiduciária, assim, a propriedade resolúvel de coisa ou direito que o devedor fiduciante, com escopo de garantia, transfere ao credor fiduciário. 

5. No ordenamento jurídico brasileiro, a matéria é disciplinada pelo Código Civil e por uma profusa legislação extravagante. Por isso, aponta a doutrina a coexistência de um duplo regime jurídico da propriedade fiduciária: a) o regime jurídico geral do Código Civil, que disciplina a propriedade fiduciária sobre coisas móveis infungíveis, sendo o credor fiduciário qualquer pessoa natural ou jurídica; b) o regime jurídico especial, formado por um conjunto de normas extravagantes, basicamente divididas em: (b1) Decreto-Lei 911/69, acrescido do art. 66-B da Lei 4.728/65 (Lei do Mercado de Capitais), atualizados pela redação da Lei 10.931/2004, tratando de propriedade fiduciária sobre coisas móveis fungíveis e infungíveis, além da cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou de títulos de crédito, restrito o credor fiduciário à pessoa jurídica instituição financeira; (b2) Lei 9.514/97, também modificada pela Lei 10.931/2004, que trata da propriedade fiduciária imobiliária, seja o credor instituição financeira ou não (Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald. Curso de Direito Civil: direitos reais, 14ª ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2018, p. 557). 

6. Aliás, a coexistência de ambos os regimes jurídicos e a solução de eventual conflito de leis foi enfrentada pela Lei 10.931/2004, que acrescentou o art. 1.368-A ao Código Civil para esclarecer que “as demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária” (vale dizer, aquelas que não tratam de negócio fiduciário envolvendo bem móvel infungível e firmado entre quaisquer pessoas, naturais ou jurídicas) “submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial”. 

III. DO REGIME JURÍDICO APLICÁVEL À HIPÓTESE DOS AUTOS: DECRETO-LEI 911/69 

7. Essa distinção acerca da disciplina legal da propriedade fiduciária segundo a sua natureza mostra-se relevante no presente julgamento pois permite concluir, de início, que o dispositivo legal invocado pelo recorrente, a saber, o art. 1.364 do CC/02, não é aplicável à relação jurídica travada entre as partes. 

8. Com efeito, verifica-se que a hipótese dos autos trata de aval prestado pelo recorrente em cédula de crédito bancário com alienação fiduciária de veículo em garantia, que fora firmada junto ao Banco recorrido (e-STJ fl. 65). 

9. Dessa maneira, em se tratando de alienação fiduciária de coisa móvel infungível envolvendo instituição financeira, o regime jurídico aplicável é aquele do Decreto-Lei 911/69, devendo as disposições gerais do Código Civil incidir apenas em caráter supletivo. 

10. Essa aplicação supletiva do Código Civil, todavia, não se faz necessária na espécie, haja vista que o DL 911/69 contém disposição expressa que faculta ao credor fiduciário, na hipótese de inadimplemento ou mora no cumprimento das obrigações contratuais pelo devedor, optar por recorrer diretamente à ação de execução, caso não prefira retomar a posse do bem e vendê-lo a terceiros. 

11. Nesse sentido é o contido no art. 5º do DL 911/69, in verbis: 

Art. 5º. Se o credor preferir recorrer à ação executiva, direta ou a convertida na forma do art. 4º, ou, se for o caso ao executivo fiscal, serão penhorados, a critério do autor da ação, bens do devedor quantos bastem para assegurar a execução” (grifou-se). 

12. Logo, já se constata que não prospera o argumento do recorrente quanto à obrigatoriedade de o credor proceder à excussão da garantia na hipótese de inadimplemento do contrato garantido por alienação fiduciária. 

IV. DO EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO PELO CREDOR 

13. Não obstante, cabe salientar que, independentemente de optar o credor pela venda do bem alienado fiduciariamente a terceiros ou pela execução direta, a inscrição do nome dos devedores solidários em bancos de dados de proteção ao crédito, na hipótese de inadimplemento, não se reveste de qualquer ilegalidade, tratando-se de exercício regular de direito do credor. 

14. Com efeito, a partir do inadimplemento das obrigações pactuadas pelo devedor, nasce para o credor uma série de prerrogativas, não apenas atreladas à satisfação do seu crédito em particular – do que é exemplo a excussão da garantia ou a cobrança da dívida –, mas também à proteção do crédito em geral no mercado de consumo. 

15. Inclusive, destaca a doutrina, o próprio CDC, ao invés de proibir, aceita e disciplina as atividades desenvolvidas pelos bancos de dados de proteção ao crédito, sinalizando, ademais, a sua relevância para a atividade econômica no país, tão dependente do crédito. 

16. Nesse sentido, veja-se a precisa lição de Leonardo ROSCOE BESSA: “Como evidenciado nos itens anteriores, coletar, armazenar e divulgar informações pessoais são atos, em tese, ofensivos à privacidade. Do mesmo modo, difundir, por qualquer meio, a notícia de que alguém não cumpre pontualmente com suas obrigações caracteriza ofensa à honra. Admite-se, excepcionalmente, que os bancos de dados de proteção ao crédito, considerando a presença de outros valores em jogo – em síntese, a importância do crédito para o indivíduo e para a economia nacional, bem como o direito à informação –, realizem, observados determinados requisitos legais, o tratamento de informações pessoais negativas. Desde que atendidos rigorosamente os limites impostos pelo ordenamento jurídico, há exercício regular de direito. O direito brasileiro aceita – e controla – a existência dos bancos de dados de proteção ao crédito. Desse modo, os atos praticados pelas entidades que os administram, desde que atendidos, rigorosamente, os limites impostos pelo ordenamento jurídico, são lícitos, não configurando ofensa à dignidade do consumidor (direito à privacidade e à honra)” (Manual de Direito do Consumidor, 5ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 320). 

17. Assim, em conclusão, independentemente da via eleita pelo credor para a satisfação de seu crédito, não há ilicitude na inscrição do nome do devedor e seu avalista nos órgãos de proteção ao crédito, ante o incontroverso inadimplemento da obrigação. 

Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial e NEGO-LHE PROVIMENTO. 

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/15, considerando o trabalho adicional imposto ao advogado da parte recorrida em virtude da interposição deste recurso, majoro os honorários advocatícios fixados anteriormente em R$ 2.000,00 (e-STJ fl. 95) para R$ 3.000,00.