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5 de abril de 2022

Em ação coletiva proposta por associação, é imprescindível a autorização expressa dos associados e a juntada da lista de representados à inicial, mostrando-se razoável permitir que a parte autora regularize sua representação processual no caso de ajuizamento de ação coletiva em momento anterior ao julgamento do RE 573.232/SC, em 14/05/2014

Processo

REsp 1.977.830-MT, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 22/03/2022, DJe 25/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Ação coletiva. Associação. Legitimidade ativa ad causam. Representação processual. Autorização expressa dos associados e respectiva lista juntada à inicial. Necessidade. Precedente do STF. Feito ajuizado antes do julgamento do RE 573.232/SC. Abertura de prazo para regularização processual da parte autora. Possibilidade. Situação excepcional.

 

DESTAQUE

Em ação coletiva proposta por associação, é imprescindível a autorização expressa dos associados e a juntada da lista de representados à inicial, mostrando-se razoável permitir que a parte autora regularize sua representação processual no caso de ajuizamento de ação coletiva em momento anterior ao julgamento do RE 573.232/SC, em 14/05/2014.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 573.232/SC, em 14/5/2014, firmou entendimento de que a atuação das associações não enseja substituição processual, mas representação específica, consoante o disposto no art. 5º, XXI, da Constituição Federal, sendo necessária, para tanto, autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial.

Com efeito, alinhando-se ao aludido precedente da Suprema Corte, o STJ reconhece que, em ação coletiva proposta por associação, é imprescindível a autorização expressa dos associados e a juntada da lista de representados à inicial, não sendo suficiente a previsão genérica, em estatuto, da legitimidade da associação para defender os interesses de seus associados.

Outrossim, sobreleva notar que, nada obstante o Supremo Tribunal Federal não tenha modulado os efeitos temporais de sua decisão, deve-se considerar que o precedente em tela se formou em momento posterior ao ajuizamento da subjacente ação coletiva, ocorrido em 13/11/2013, e a sentença somente foi prolatada em junho de 2017.

Em caso análogo, esta Corte Superior já se posicionou no sentido de que, a despeito da necessidade de aplicação do entendimento firmado pelo STF, apresenta-se razoável, antes da extinção do feito sem a resolução do mérito, permitir que a parte autora regularize sua representação processual.

18 de agosto de 2021

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS AJUIZADA POR FILIADO EM DESFAVOR DE SINDICATO E DE ADVOGADO. LEVANTAMENTO E APROPRIAÇÃO INDEVIDA DE QUANTIA POR PATRONO EM DEMANDA JUDICIAL. CAUSÍDICO QUE PRESTA ASSISTÊNCIA JURÍDICA AOS SINDICALIZADOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DA ENTIDADE SINDICAL

RECURSO ESPECIAL Nº 1.920.332 - SP (2020/0183158-3) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

RECORRENTE : SINDICATO DOS MOTORISTAS E SERVIDORES DA P.M.S.P 

RECORRIDO : AUGUSTO OLIVEIRA DA SILVA 

EMENTA 

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS AJUIZADA POR FILIADO EM DESFAVOR DE SINDICATO E DE ADVOGADO. LEVANTAMENTO E APROPRIAÇÃO INDEVIDA DE QUANTIA POR PATRONO EM DEMANDA JUDICIAL. CAUSÍDICO QUE PRESTA ASSISTÊNCIA JURÍDICA AOS SINDICALIZADOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DA ENTIDADE SINDICAL PELOS ATOS PRATICADOS PELO ADVOGADO, NO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. INCIDÊNCIA DOS ARTS. 932, III, E 933 DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E DESPROVIDO. 

1. O propósito recursal consiste em aferir a responsabilidade do sindicato pelos prejuízos causados ao filiado em razão de levantamento e apropriação indevida de valores por advogado indicado pela entidade sindical. 

2. Nos termos dos arts. 932, III, e 933 do Código Civil, o empregador ou comitente responde de forma objetiva pela conduta culposa ou dolosa que o empregado ou preposto pratica no exercício de seu trabalho ou por ocasião deste. 

2.1. Para a configuração da referida responsabilidade objetiva indireta, é prescindível a existência de um contrato típico de trabalho, sendo suficiente que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem. 

3. Comprovada a relação jurídica entre o sindicato e o autor do dano – profissional este colocado à disposição dos sindicalizados para prestar-lhes assistência jurídica, responde a entidade sindical de forma objetiva e solidária pelos atos ilícitos praticados pelo advogado no exercício do trabalho que lhe competir, ou em razão dele. 

4. Recurso especial conhecido e desprovido. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 08 de junho de 2021 (data do julgamento). MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, 

RELATÓRIO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: 

Cuida-se de recurso especial interposto por Sindicato dos Motoristas e Servidores da P. M. S. P., fundamentado na alínea a do permissivo constitucional. 

Depreende-se dos autos que Augusto Oliveira da Silva propôs ação em desfavor do sindicato recorrente e de Everton Ferreira, buscando a condenação dos réus à restituição do montante levantado e retido indevidamente por seu ex-patrono e ao pagamento de danos morais. 

Na inicial, o autor alegou que, em 12/11/2012, ao se dirigir ao departamento jurídico do Sindicato para obter informações sobre o andamento da ação judicial que os sindicalizados haviam promovido contra a Prefeitura Municipal de São Paulo, por meio de assistência jurídica do requerido, o advogado ora demandado solicitou que o autor revogasse os poderes dos antigos patronos e assinasse nova procuração, ocasião em que foi postulado o levantamento da quantia que lhe cabia no referido processo. Aduziu que, em fevereiro de 2018, constatou, por meio da sua nova procuradora, que o valor foi creditado diretamente na conta-corrente do corréu, mas nenhuma quantia lhe foi repassada. 

O Juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente o feito para condenar solidariamente o sindicato e o advogado corréu ao pagamento de R$ 41.182,67 (quarenta e um mil, cento e oitenta e dois reais e sessenta e sete centavos), atualizados monetariamente a partir do ajuizamento da ação e acrescidos de juros de mora desde a citação, bem como de danos morais no importe de R$ 8.000,00 (oito mil reais). 

Interpostas apelações pelas partes, a Trigésima Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento aos recursos do sindicato e do autor e não conheceu do apelo do advogado corréu. 

O acórdão está assim ementado (e-STJ, fls. 142-143): 

APELAÇÕES AÇÃO DE COBRANÇA CUMULADA COM PEDIDO INDENIZATÓRIO POR DANOS MORAIS SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES AS PRETENSÕES DO AUTOR, CONDENANDO SOLIDARIAMENTE O SINDICATO E O CAUSÍDICO CORRÉUS A PAGAR-LHE R$ 41.182,67, CIFRA POR ESTE LEVANTADA NOS AUTOS Nº 0441447-05.1993 E NÃO REPASSADA AO MANDANTE, BEM COMO A INDENIZAR-LHE POR DANOS MORAIS EM R$ 8.000,00, QUANTIAS A SEREM MONETARIAMENTE CORRIGIDAS E ACRESCIDAS DE JUROS DE MORA APELO DO ADVOGADO QUE NÃO SUPERA JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE, POR HAVER DEIXADO TRANSCORRER “IN ALBIS” O PRAZO ASSINALADO PARA SUPLEMENTAR O PREPARO, IMPONDO-SE O RECONHECIMENTO DA DESERÇÃO INCONTROVERSO O INDEVIDO APOSSAMENTO, PELO PATRONO INDICADO PELO SINDICATO AO AUTOR PARA PRESTAR-LHE ASSISTÊNCIA JURÍDICA, DE CRÉDITO A ESTE PERTENCENTE DEPOSITADO NOUTROS AUTOS EMBORA O SINDICATO SE INDIGNE COM O RECONHECIMENTO DA SOLIDARIEDADE PELOS PREJUÍZOS EXPERIMENTADOS PELO REQUERENTE, FATO É QUE, AO RECOMENDAR AO SINDICALIZADO OS SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS PRESTADOS PELO REVEL, ASSUMIU, PERANTE AQUELE, CORRESPONSABILIDADE PELA INTEGRIDADE DA ATUAÇÃO PROFISSIONAL DESTE, POR FORÇA DO QUE ESTABELECEM OS ARTIGOS 932, INCISO III, E 933 DO CÓDIGO CIVIL. ENTIDADE ASSOCIATIVA QUE SE BENEFICIOU DO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS E, DADO O CARÁTER INSTITUCIONAL- PROTETIVO DO SINDICATO PARA COM OS SEUS ASSOCIADOS, NÃO TEM LUGAR A PRETENSÃO DE SE ISENTAR DE CORRESPONSABILIDADE PELAS REPERCUSSÕES NEGATIVAS GERADAS PELA CONDUTA ANTIÉTICA DO PROFISSIONAL QUE A ESTES CONFIA. NOUTROS TERMOS, NA CONDIÇÃO DE COMITENTE NA PRESTAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA, PATROCINANDO A CAUSA POR MEIO DE PREPOSTOS SEUS, DEVE RESPONDER SOLIDARIAMENTE PELOS PREJUÍZOS DECORRENTES DE DESÍDIA NO DEVER DE FISCALIZAÇÃO DA RELAÇÃO DE MANDATO, DERIVADO DA OBRIGAÇÃO GERAL DE ZELAR PELA CORRETA CONSECUÇÃO DOS SERVIÇOS PRESTADOS A SEUS ASSOCIADOS, DIRETAMENTE OU POR MEIO DE SEUS PREPOSTOS NO QUE TANGE ÀS AS ARGUIÇÕES DEDUZIDAS NA INSURGÊNCIA DO AUTOR, SINTETIZADAS NA TESE DE INSUFICIÊNCIA DO “QUANTUM” ARBITRADO, JULGO ADEQUADA AOS PARÂMETROS DE PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE A IMPORTÂNCIA ELEITA NO PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO, DE R$ 8.000,00 NEGO PROVIMENTO AOS RECURSOS DO SINDICATO RÉU E DO AUTOR E NÃO CONHEÇO DO APELO INTERPOSTO PELO ADVOGADO CORRÉU. 

Opostos embargos de declaração pelo sindicato, foram rejeitados (e-STJ, fls. 159-164). 

Daí a interposição do presente recurso especial (e-STJ, fls. 167-176), no qual o Sindicato dos Motoristas e Servidores da P. M. S. P. alega violação dos arts. 932, III, e 933 do Código Civil; e 32 da Lei n. 8.906/1994. 

Sustenta, em síntese, que "não pode responder solidariamente com pagamento da condenação fixada, pois não foi responsável pelo soerguimento dos valores nos autos e sim o corréu Everton, sendo que falta a entidade sindical a qualidade de atividade de escritório de advocacia" (e-STJ, fl. 171). 

Afirma que "a indicação de um mero profissional para tutelar as ações dos associados não pode originar uma obrigação civil que é inerente do advogado" (e-STJ, fl. 171). 

Ressalta, por fim, que "não é empregador do advogado, o mesmo não é seu serviçal e, outrossim, jamais agiu como preposto autorizado do sindicato, portanto, restou claro e demonstrada a inexistência da responsabilidade solidária" (e-STJ, fl. 172). 

Contrarrazões apresentadas às fls. 188-192 (e-STJ). 

Em juízo prévio de admissibilidade, o Tribunal de origem inadmitiu o recurso especial dando azo à interposição do AREsp n. 1.733.836-SP, o qual foi provido para determinar sua reautuação. 

É o relatório. 

VOTO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR): Enfatiza-se, de início, que o recurso especial foi interposto contra decisão publicada após a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, sendo analisados os pressupostos de admissibilidade recursais à luz do regramento nele previsto (Enunciado Administrativo n. 3/STJ). 

O propósito recursal consiste em aferir a responsabilidade do sindicato pelos prejuízos causados ao filiado em razão de levantamento e apropriação indevida de valores por advogado indicado pela entidade sindical. 

Segundo consta da inicial, o autor do presente feito, ora recorrido, promoveu ação em desfavor da Prefeitura Municipal de São Paulo, por meio da assistência jurídica do Sindicato dos Motoristas e Servidores da P. M. S. P., a qual tramita perante a Vara da Fazenda Pública do Foro Central de São Paulo. 

Ao se dirigir às dependências da entidade sindical, a fim de obter informações acerca do andamento do feito, o demandante foi orientado pelo advogado Everton Ferreira a revogar os poderes dos antigos patronos e assinar nova procuração, conferindo-lhe poderes para atuar naquela demanda. 

Entretanto, o referido causídico levantou o numerário que cabia ao autor no referido processo, e não lhe repassou nenhuma quantia. 

Diante do ocorrido, o autor ajuizou ação contra o Sindicato e o advogado, a qual foi julgada parcialmente procedente para condenar solidariamente os réus ao pagamento de R$ 41.182,67 (quarenta e um mil, cento e oitenta e dois reais e sessenta e sete centavos), referentes à retenção indevida, e R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de danos morais. 

O fundamento utilizado pela Corte local para manter a condenação do sindicato foi de que, "ao recomendar aos sindicalizados os serviços advocatícios prestados pelo revel, assumiu, perante aquele, corresponsabilidade pela integridade da atuação profissional deste, por força do que estabelecem os artigos 932, inciso III, e 933 do Código Civil" (e-STJ, fl. 147). 

Feito esse breve resumo dos fatos, passo à análise da questão de fundo do presente recurso especial. 

De início, revela-se incontroverso nos autos que o sindicato recorrente indicou o Dr. Everton Ferreira para prestar assistência jurídica ao sindicalizado, bem como que o referido advogado se apropriou indevidamente de quantia que cabia apenas ao autor, ora recorrido, nos autos do cumprimento de sentença de n. 0411447-05.1993.8.26.0053, manejado contra a Prefeitura Municipal de São Paulo. 

Aliás, estes fatos não foram sequer impugnados pelos réus em contestação. 

Quanto à relação entre o patrono e o sindicato, a situação foi bem esclarecida pelo Tribunal de origem, conforme se verifica dos seguintes trechos do acórdão recorrido (e-STJ, fls. 147-148 - original sem grifo): 

Em prosseguimento, embora o sindicato se indigne com o reconhecimento da solidariedade pelos prejuízos experimentados pelo requerente, fato é que, ao recomendar ao sindicalizado os serviços advocatícios prestados pelo revel, assumiu, perante aquele, corresponsabilidade pela integridade da atuação profissional deste, por força do que estabelecem os artigos 932, inciso III, e 933 do Código Civil. Averígua-se que, ao tempo dos fatos, encontrava-se estabelecida entre os réus verdadeira parceria, através da qual os serviços advocatícios oferecidos pelo sindicato e prestados pelo corréu consubstanciavam benefício aos funcionários sindicalizados e importante atrativo para a sindicalização de novos funcionários da categoria. O próprio instrumento de mandato na ocasião outorgado pelo autor a Everton Ferreira para representá-lo naquela contenda do labor, copiado a fls. 12, é expresso ao identificá-lo como “contratado do SINDICATO DOS MOTORISTAS E SERVIDORES DA PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO”, a evidenciar, assim, a simbiose entre sua atuação naqueles autos e o serviço de assistência jurídica prestado pela pessoa jurídica corré aos seus sindicalizados. O cenário avistado, destarte, impede que o imbróglio em análise seja apreendido como mero episódio esporádico, fruto de ocasional prestação defeituosa de serviços, para os fins de afastar do sindicato o dever de fiscalizar a regularidade da atuação dos profissionais que elege para prestar assistência jurídica aos sindicalizados em questões relacionadas ao labor. Indubitavelmente o primeiro apelante se beneficiou do contrato de prestação de serviços advocatícios e, dado o caráter institucional-protetivo do sindicato para com os seus associados, não tem lugar a pretensão de se isentar de corresponsabilidade pelas repercussões negativas geradas pela conduta antiética do profissional que a estes confia. Noutros termos, na condição de comitente na prestação da assistência judiciária, patrocinando a causa por meio de prepostos seus, deve responder solidariamente pelos prejuízos decorrentes de desídia no dever de fiscalização da relação de mandato, derivado da obrigação geral de zelar pela correta consecução dos serviços prestados a seus associados, diretamente ou por meio de seus prepostos. Sendo certa a apropriação indevida de crédito pertencente ao autor pelo patrono indicado pelo sindicato, remanescendo incontroversos o dano e o nexo de causalidade, e tendo sido evidenciado o status de garante legal ostentado pela entidade representativa de classe de trabalhadores pela atuação dos profissionais que elege para prestar assistência jurídica, justificando adoção do modelo jurídico da responsabilidade por fato de terceiro e, assim, aferição objetiva de sua culpa, exsurge inexorável seu dever solidário de reparar os efeitos danosos do ato ilícito. 

Tal o quadro delineado, entendo que não assiste razão ao recorrente. 

É certo que, nos termos do art. 32 do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, Lei n. 8.906/1994, o advogado responde civilmente pelos atos que, no exercício da profissão, praticar com dolo ou culpa. 

Dessa forma, incontroversa a conduta dolosa do advogado constituído, diante do levantamento de quantia depositada em favor do autor e da ausência de repasse do montante ao credor, assegurado à vítima o direito de indenização. 

Cinge-se a controvérsia, contudo, apenas quanto à existência, ou não, de responsabilidade do sindicato recorrente pelos danos decorrentes do ato ilícito perpetuado pelo advogado em desfavor do sindicalizado. 

A responsabilidade civil, em princípio, é individual, ou seja, cada pessoa responde por seus próprios atos (art. 942 do Código Civil). Entretanto, em certos casos – conforme leciona Rui Stoco, "para que justiça se faça, é necessário levar mais longe a indagação, a saber, se é possível desbordar da pessoa causadora do prejuízo e alcançar outra pessoa, à qual o agente esteja ligado por uma relação jurídica e, em consequência, possa ela ser convocada a responder. Dessarte, a responsabilidade por fato de outrem não ocorre sem que haja uma razão lógico-jurídica, nem indiscriminadamente" (Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 10ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 1.270). 

No que diz respeito à responsabilidade civil por fato de terceiro, ensinam Elpídio Donizetti e Felipe Quintella: 

Há casos em que o Direito estabelece a responsabilidade civil de uma pessoa pelo fato de um terceiro, por haver uma relação entre essa pessoa e o terceiro, que determina a transcendência da responsabilidade. A responsabilidade civil independente de culpa pelo fato de terceiro também costuma ser denominada responsabilidade objetiva indireta, justamente pelo fato de a lei determinar a responsabilidade de uma pessoa, independentemente de culpa – por isso, objetiva –, pelo fato de outra pessoa – por isso, indireta (Curso didático de direito civil. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 427). 

Nesse particular, o art. 932 do Código Civil prevê alguns casos excepcionais em que a pessoa deve suportar as consequências do fato de outrem. Vejamos: 

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos; V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia. 

O art. 933 do mesmo diploma, por sua vez, preceitua que todos os responsáveis designados no dispositivo anterior responderão pelo ato praticado pelos terceiros, mesmo que não haja culpa, sendo a responsabilidade civil, portanto, objetiva e solidária (art. 942, parágrafo único, do CC). 

Por outro lado, ainda que a responsabilidade dos pais, tutores, curadores, empregadores e etc seja objetiva, para a configuração do dever de indenizar destas pessoas, é necessária a comprovação de que os filhos, tutelados, curatelados, empregados e prepostos tenham agido com culpa ou dolo, conforme já decidido por esta Corte Superior: 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL POR FATO DE OUTREM (EMPREGADOR). ART. 932, II, CC/2002. ACIDENTE DE TRÂNSITO CAUSADO POR PREPOSTO. FALECIMENTO DO MARIDO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. AÇÃO PENAL. CAUSA IMPEDITIVA DA PRESCRIÇÃO. ART. 200 DO CC/2002. OCORRÊNCIA. 1. Impera a noção de independência entre as instâncias civil e criminal, uma vez que o mesmo fato pode gerar, em tais esferas, tutelas a diferentes bens jurídicos, acarretando níveis diversos de intervenção. Nessa seara, o novo Código Civil previu dispositivo inédito em seu art. 200, reconhecendo causa impeditiva da prescrição: "quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva". 2. Estabeleceu a norma, em prestígio à boa-fé, que o início do prazo prescricional não decorre da violação do direito subjetivo em si, mas, ao revés, a partir da definição por sentença, no juízo criminal, que apure definitivamente o fato. A aplicação do art. 200 do Código Civil tem valia quando houver relação de prejudicialidade entre as esferas cível e penal - isto é, quando a conduta originar-se de fato também a ser apurado no juízo criminal -, sendo fundamental a existência de ação penal em curso (ou ao menos inquérito policial em trâmite). 3. Na hipótese, houve ação penal com condenação do motorista da empresa ré, ora recorrida, à pena de 02 (dois) anos de detenção, no regime aberto, além da suspensão da habilitação, por 06 (seis) meses, como incurso no art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro, c/c art. 121, § 3°, do Código Penal, sendo que a causa petendi da presente ação civil foi o ilícito penal advindo de conduta culposa do motorista da empresa recorrida. 4. O novo Código Civil (art. 933), seguindo evolução doutrinária, considera a responsabilidade civil por ato de terceiro como sendo objetiva, aumentando sobejamente a garantia da vítima. Malgrado a responsabilização objetiva do empregador, esta só exsurgirá se, antes, for demonstrada a culpa do empregado ou preposto, à exceção, por evidência, da relação de consumo. 5. Assim, em sendo necessário - para o reconhecimento da responsabilidade civil do patrão pelos atos do empregado - a demonstração da culpa anterior por parte do causador direto do dano, deverá, também, incidir a causa obstativa da prescrição (CC, art. 200) no tocante à referida ação civil ex delicto, caso essa conduta do preposto esteja também sendo apurada em processo criminal. Dessarte, tendo o acidente de trânsito - com óbito da vítima - ocorrido em 27/3/2003, o trânsito em julgado da ação penal contra o preposto em 9/1/2006 e a ação de indenização por danos materiais e morais proposta em 2/7/2007, não há falar em prescrição. 6. É firme a jurisprudência do STJ de que "a sentença penal condenatória não constitui título executivo contra o responsável civil pelos danos decorrentes do ilícito, que não fez parte da relação jurídico-processual, podendo ser ajuizada contra ele ação, pelo processo de conhecimento, tendente à obtenção do título a ser executado" (REsp 343.917/MA, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/10/2003, DJ 03/11/2003, p. 315), como ocorre no presente caso. 7. Recurso especial provido. (REsp n. 1.135.988/SP, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 8/10/2013, DJe 17/10/2013 - original sem grifo) 

Sob essa perspectiva, tem-se que o empregado ou preposto que pratica ato ilícito no exercício de seu trabalho ou por ocasião deste, impõe ao seu empregador ou comitente a responsabilidade objetiva indireta. Isso em razão do vínculo existente entre ambos. 

Em relação à responsabilidade dos empregadores ou comitantes, Flávio Tartuce afirma que "a incidência do inciso III do art. 932 independe da existência de uma relação de emprego ou de trabalho, bastando a presença de uma relação jurídica baseada na confiança, denominada relação de pressuposição" (Manual de responsabilidade civil. São Paulo: Método, volume único, 2018, p. 403). 

No mesmo sentido, ao comentar a responsabilidade prevista no art. 932, III, do CC, ensina Daniel Carnacchioni que "há necessidade de relação entre o autor direto do fato e o responsável, não necessariamente de emprego ou trabalho" (Manual de Direito Civil. Salvador: JusPodivm, volume único, 2021, p. 919). 

Nesse cenário, denota-se que o empregador ou comitente tem responsabilidade objetiva pela conduta culposa ou dolosa que o empregado ou preposto pratica no exercício de seu trabalho ou por ocasião deste, sendo prescindível, para o reconhecimento do vínculo de preposição, que exista um contrato típico de trabalho entre eles, sendo suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem. 

Nesse sentido: 

RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRABALHO. FUNCIONÁRIO DE EMPRESA ATINGIDO POR DISPARO DE COLEGA DE TRABALHO. VIGILANTE PRESTADOR DE SERVIÇO TERCEIRIZADO. VINCULO DE PREPOSIÇÃO. RECONHECIMENTO. CULPA PRESUMIDA DA PREPONENTE. INEXISTÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO PELA RÉ. CULPA IN ELIGENDO E CULPA IN VIGILANDO. RECURSO PROVIDO. APLICAÇÃO DO DIREITO À ESPÉCIE. FIXAÇÃO DA CONDENAÇÃO. I - Na linha da jurisprudência deste Tribunal, "para o reconhecimento do vínculo de preposição não é preciso que exista um contrato típico de trabalho; é suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem". II - Nos termos do enunciado nº 341 da súmula/STF, "é presumida a culpa do patrão ou do comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto". III - Além de não ter a ré cuidado de afastar referida presunção, os fatos registrados no acórdão revelam a ocorrência de culpa in eligendo e in vigilando. (REsp n. 284.586/RJ, Relator o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, julgado em 25/3/2003, DJ de 28/4/2003, p. 203) RESPONSABILIDADE CIVIL. USINA. TRANSPORTE DE TRABALHADORES RURAIS. MOTORISTA PRESTADOR DE SERVIÇO TERCEIRIZADO. VÍNCULO DE PREPOSIÇÃO. RECONHECIMENTO. - Para o reconhecimento do vínculo de preposição, não é preciso que exista um contrato típico de trabalho; é suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem. Precedentes. Recurso especial não conhecido. (REsp n. 304.673/SP, Relator o Ministro Barros Monteiro, Quarta Turma, julgado em 25/9/2001, DJ de 11/3/2002, p. 257) 

Na espécie, ficou consignado no acórdão que o próprio instrumento de mandato outorgado pelo autor ao Dr. Everton Ferreira, é expresso ao identificá-lo como “contratado do Sindicato dos motoristas e servidores da prefeitura municipal de São Paulo”, a evidenciar, assim, a simbiose entre sua atuação naqueles autos e o serviço de assistência jurídica prestado pela pessoa jurídica ré aos seus sindicalizados. 

Ademais, o causídico peticionava nos autos da demanda promovida pelos sindicalizados em desfavor do ente público, em papel com timbre do sindicato ora recorrente. 

Constata-se, portanto, que as instâncias ordinárias, soberanas na análise das provas, concluíram que o recorrente atuou na condição de comitente na prestação da assistência judiciária ao sindicalizado, patrocinando a causa por meio de seus prepostos. 

Para Arnaldo Rizzardo, o termo comitente, empregado no inciso III do art. 932, significa a pessoa que dá ordens e instruções a empregado, preposto ou serviçais (Responsabilidade civil. 8ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 255). 

Dessa forma, sendo incontroverso que os danos causados ao autor foram decorrentes do ato ilícito perpetrado por profissional, não apenas indicado, mas que mantinha relação jurídica com o sindicato, a fim de atuar na defesa dos interesses de seus associados, de rigor a aplicação dos arts. 932, III, e 933 do Código Civil. 

Ainda que pela sistemática do atual Código Civil não se exija que os responsáveis descritos no art. 932 tenham agido com culpa na escolha (in iligendo) ou na fiscalização (in vigilando), é certo que, no caso concreto, o ora recorrente, em observância ao princípio da boa-fé objetiva – que exige de entidade sindical uma maior cautela na escolha dos profissionais que atuam na defesa dos interesses de seus associados, atraiu para si a responsabilidade pela contratação do advogado responsável pela condução do processo. 

Outrossim, diante do vínculo de confiança existente entre o sindicato e o sindicalizado, notadamente em relação ao profissional indicado por aquele, o insurgente também possuía o dever de fiscalizar e acompanhar os atos praticados pelo advogado corréu. 

Essa é a compreensão que se extrai da lição de Sérgio Cavalhieri Filho: 

A chamada responsabilidade por fato de outrem - expressão originária francesa - é responsabilidade por fato próprio omissivo, porquanto as pessoas que respondem a esse título terão sempre concorrido para o dano por falta de cuidado ou vigilância. Assim, não muito próprio falar em fato de outrem. O ato do autor material do dano é apenas a causa imediata, sendo a omissão daquele que tem o dever de guarda ou vigilância a causa mediata, que nem por isso deixa de ser causa eficiente. [...] Em apertada síntese, a responsabilidade pelo fato de outrem constitui-se pela infração do dever de vigilância. Não se trata, em outras palavras, de responsabilidade por fato alheio, mas por fato próprio decorrente da violação do dever de vigilância (Programa de responsabilidade civil. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 236). 

Em face disso, configurada a relação jurídica entre o sindicato e o autor do dano – profissional este colocado à disposição dos sindicalizados para prestar-lhes assistência jurídica, responde a entidade sindical de forma objetiva e solidária pelos atos ilícitos praticados pelo advogado no exercício do trabalho que lhe competir, ou em razão dele (arts. 932, III, e 933 do Código Civil). 

Ante o exposto, conheço do recurso especial e nego-lhe provimento. 

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, majoro a verba honorária em 3% sobre o valor da condenação, a ser paga em favor dos advogados do autor, ora recorrido. 

É como voto. 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA Número Registro: 2020/0183158-3 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.920.332 / SP Números Origem: 1075841-48.2018.8.26.0100 10758414820188260100 PAUTA: 08/06/2021 JULGADO: 08/06/2021 Relator Exmo. Sr. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. DURVAL TADEU GUIMARÃES Secretária Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA AUTUAÇÃO RECORRENTE : SINDICATO DOS MOTORISTAS E SERVIDORES DA P.M.S.P ADVOGADO : ALEXANDRE ÂNGELO DO BOMFIM - SP202713 RECORRIDO : AUGUSTO OLIVEIRA DA SILVA ADVOGADO : CRISTINA DA COSTA BARROS - SP259651 INTERES. : EVERTON FERREIRA ADVOGADO : EVERTON FERREIRA - SP258919 ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Mandato CERTIDÃO Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator. 

14 de agosto de 2021

Os empregados de entidades sindicais podem associar-se entre si para a criação de entidade de representação sindical própria

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/08/info-1020-stf.pdf


ASSOCIAÇÃO SINDICAL - Os empregados de entidades sindicais podem associar-se entre si para a criação de entidade de representação sindical própria 

O parágrafo único do art. 526 da CLT proibia que os empregados de sindicato fossem filiados a sindicatos. A Lei nº 11.295/2006 revogou esse parágrafo único a fim de permitir o direito de sindicalização para os empregados de entidade sindical. A alteração promovida pela Lei nº 11.295/2006 é compatível com a liberdade de associação sindical prevista no art. 8º da CF/88. STF. Plenário. ADI 3890/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 7/6/2021 (Info 1020). 

O caso concreto foi o seguinte: 

O parágrafo único do art. 526 da CLT proibia que os empregados de sindicato fossem filiados a sindicatos: 

Art. 526 (...) Parágrafo único. Aplicam-se aos empregados dos sindicatos os preceitos das leis de proteção do trabalho e de previdência social, excetuado o direito de associação em sindicato. 

A Lei nº 11.295/2006 revogou esse parágrafo único a fim de permitir o direito de sindicalização para os empregados de entidade sindical. A Confederação Nacional do Comércio – CNC ajuizou ADI em face da Lei nº 11.295/2006. Segundo a entidade autora, os empregados de entidades sindicais não configuram categoria profissional, tampouco os órgãos sindicais para os quais esses trabalhadores prestam serviço qualificam-se como entidades integrantes de uma categoria econômica. Argumentava que essas entidades sindicais não teriam com quem celebrar acordos e convenções coletivas de trabalho, uma vez que as entidades sindicais não formam uma categoria econômica, nem possuem representação sindical. Além disso, sustentou que a Lei nº 11.295/2006 seria interferência do Estado na organização sindical ao criar categoria profissional, em afronta ao caput do art. 8º da Constituição Federal. 

Antes de adentrar ao mérito do julgado, é importante indagar: a CNC possui legitimidade para propor essa ADI? 

SIM. A Confederação Nacional do Comércio (CNC), como entidade integrante da estrutura sindical brasileira em grau máximo (confederação) tem legitimidade ad causam, representando, em âmbito nacional, os interesses corporativos das categorias econômicas do comércio, a abranger os segmentos de bens, serviços e turismo. Trata-se, portanto, de entidade de classe de âmbito nacional, nos termos do art. 103, IX, da CF/88: 

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: (...) IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. 

Ainda sobre esse tema: a CNC é um legitimado universal ou precisa comprovar a pertinência temática? 

Precisa comprovar a pertinência temática. Explicando melhor. A jurisprudência do STF construiu a tese de que alguns dos legitimados do art. 103 da CF/88 poderiam ajuizar ações diretas de inconstitucionalidade questionando leis ou atos normativos que tratassem sobre todo e qualquer assunto. Tais legitimados seriam, portanto, legitimados ativos universais. Por outro lado, o STF afirmou que os demais legitimados, ao proporem a ADI, deveriam comprovar que possuem legítimo interesse na ação. São, por isso, chamados de legitimados ativos especiais. Este legítimo interesse que precisa ser demonstrado é chamado de pertinência temática. 

LEGITIMADOS ATIVOS DA ADI E ADC 

UNIVERSAIS (NEUTROS) 

São aqueles que podem propor ADI e ADC contra leis ou atos normativos que versem sobre qualquer matéria, sem a necessidade de comprovar interesse específico no julgamento da ação. 

Quem são os legitimados universais: • Presidente da República; • Mesa do Senado e Mesa da Câmara; • Procurador-Geral da República; • Conselho Federal da OAB • Partido político com representação no CN. 

ESPECIAIS (NÃO UNIVERSAIS) 

São aqueles que somente podem propor ADI e ADC contra leis ou atos normativos que tratem sobre matérias que digam respeito às funções ou objetivos do órgão ou entidade. O autor especial terá que provar o seu interesse específico no julgamento daquela ação. Terá que ser provada a pertinência temática entre a norma impugnada e os objetivos do autor da ação. 

Quem são os legitimados especiais: • Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do DF; • Governador de Estado/DF; • Confederação sindical; • Entidade de classe de âmbito nacional. 

A entidade de classe de âmbito nacional, por ser um legitimado especial, deverá provar que a legislação questionada guarda relação de pertinência temática com as finalidades institucionais dessa entidade (STF. Plenário. ADI 2903, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 01/12/2005). No caso concreto ora analisado (ADI 3890), o STF entendeu que existe pertinência temática entre o conteúdo da lei impugnada e as finalidades institucionais da CNC, pois a modificação legislativa em questão impacta diretamente a atividade das entidades sindicais associadas à autora, criando em relação a estas, inclusive, o dever de recolhimento das contribuições sindicais dos seus empregados em favor dos respectivos sindicatos a que vierem se associar. 

Sobre o mérito, o que o STF decidiu? A Lei nº 11.295/2006 é inconstitucional? 

NÃO. O Plenário do STF julgou improcedente o pedido de declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 11.295/2006 e afirmou que: 

Os empregados de entidades sindicais podem associar-se entre si para a criação de entidade de representação sindical própria. STF. Plenário. ADI 3890/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 7/6/2021 (Info 1020). 

A liberdade de associação sindical possui duas dimensões: • dimensão coletiva: assegura aos trabalhadores em geral o direito à criação de entidades sindicais (art. 8º, caput, I e II, da CF/88); • dimensão individual: consagra a liberdade dos interessados em aderirem ou não ao sindicato ou desfiliarse conforme sua vontade. 

A Lei nº 11.295/2006, ao garantir o direito de sindicalização aos empregados de organismos sindicais, nada mais fez do que explicitar uma liberdade conferida àquele grupo de trabalhadores pelo próprio texto constitucional. Cabe destacar que o parágrafo único do art. 526 da CLT, em sua redação original, vedava aos empregados das entidades sindicais o exercício do direito de associação sindical. No entanto, o STF entende que esse dispositivo nem havia sido recepcionado pela CF/88, motivo pelo qual esse dispositivo normativo já estava tacitamente revogado antes mesmo da edição da Lei nº 11.295/2006. Assim, a Lei nº 11.295/2006, ao garantir o direito de sindicalização aos empregados de organismos sindicais, apenas assegurou uma liberdade conferida àquele grupo de trabalhadores pelo próprio texto constitucional