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6 de junho de 2021

Não se pode penhorar valores que estão na conta bancária pessoal do marido da devedora, sendo que ele não constou do título executivo, pelo simples fato de serem casados em regime de comunhão parcial de bens

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-694-stj-1.pdf


EXECUÇÃO - Não se pode penhorar valores que estão na conta bancária pessoal do marido da devedora, sendo que ele não constou do título executivo, pelo simples fato de serem casados em regime de comunhão parcial de bens 

Não é possível a penhora de ativos financeiros da conta bancária pessoal de terceiro, não integrante da relação processual em que se formou o título executivo, pelo simples fato de ser cônjuge da parte executada com quem é casado sob o regime da comunhão parcial de bens. Situação hipotética: Luciana comprou itens de vidraçaria de uma loja, mas não pagou. A loja ajuizou ação de cobrança contra Luciana, tendo a sentença condenado a ré a pagar o valor devido. Após o trânsito em julgado, o banco ingressou com cumprimento de sentença contra Luciana. Não se localizou qualquer bem em nome da devedora. Diante disso, a exequente pediu a penhora de ativos financeiros (dinheiro) que estavam na conta bancária de Pedro, marido de Luciana. Essa penhora é indevida. STJ. 3ª Turma. REsp 1.869.720/DF, Relator p/ acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27/04/2021 (Info 694). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Luciana comprou itens de vidraçaria de uma loja, mas não pagou. A loja ajuizou ação de cobrança contra Luciana, tendo a sentença condenado a ré a pagar o valor devido. Após o trânsito em julgado, o banco ingressou com cumprimento de sentença contra Luciana. Não se localizou qualquer bem em nome de Luciana. Diante disso, foram penhorados R$ 70 mil que estavam na conta bancária de Pedro. E quem é Pedro? Marido de Luciana, casado com ela sob o regime da comunhão parcial de bens. Vale ressaltar, contudo, que Pedro não integrou a relação processual em que se formou o título executivo (não foi parte na ação de cobrança). Pedro apresentou, então, embargos de terceiro afirmando que o dinheiro (ativo financeiro) foi penhorado em sua conta bancária pessoal. Logo, o dinheiro seria dele. Alegou, ainda, que o banco credor não comprovou que a devedora se utilizaria da referida conta bancária para realizar as suas movimentações financeiras. O banco contra-argumentou dizendo que haveria uma presunção de que o dinheiro seria revertido em favor da unidade familiar diante da presunção de que ambos os cônjuges administram o patrimônio comum. Logo, caberia ao embargante (Pedro) demonstrar que o ativo financeiro penhorado não seria utilizado em prol da família. A questão chegou até o STJ. 

O debate jurídico reside no seguinte ponto: é possível a penhora de ativos financeiros da conta bancária pessoal de terceiro, não integrante da relação processual em que se formou o título executivo, pelo simples fato de ser cônjuge da parte executada, com quem é casado sob o regime da comunhão parcial de bens? NÃO. 

Inicialmente, é importante esclarecer que, se a obrigação foi contraída por um dos cônjuges na constância do casamento em benefício da unidade familiar, é possível, em regra, que ambos os cônjuges sejam acionados para pagar a dívida. O fundamento para isso está na interpretação do art. 1.658 do Código Civil: 

Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes. 

Contudo, no caso concreto acima narrado, o cônjuge Pedro não participou do processo de conhecimento, de modo que não pode ser surpreendido, já na fase de cumprimento de sentença, com a penhora de bens em sua conta-corrente exclusiva. O regime de bens adotado pelo casal não torna o cônjuge solidariamente responsável de forma automática por todas as obrigações contraídas pelo parceiro (por força das inúmeras exceções legais contidas nos artigos 1.659 a 1.666 do Código Civil) nem autoriza que seja desconsiderado o cumprimento das garantias processuais que são inerentes ao devido processo legal, tais como o contraditório e a ampla defesa. Além disso, revela-se medida extremamente gravosa impor a terceiro, que nem sequer participou do processo de conhecimento, o ônus de, ao ser surpreendido pela constrição de ativos financeiros bloqueados em sua conta-corrente pessoal, atravessar verdadeira saga processual por meio de embargos de terceiro na busca de realizar prova negativa de que o cônjuge devedor não utiliza sua conta-corrente para realizar movimentações financeiras ou ocultar patrimônio. Não é, portanto, admitida a penhora de ativos financeiros de quem não é executado tão somente por ser casado com a devedora, diante da completa inexistência de indícios de que a executada se valia da conta pessoal de seu cônjuge para realizar movimentação financeira no intuito de eximir-se de suas obrigações. 

Em suma: Não é possível a penhora de ativos financeiros da conta bancária pessoal de terceiro, não integrante da relação processual em que se formou o título executivo, pelo simples fato de ser cônjuge da parte executada com quem é casado sob o regime da comunhão parcial de bens. STJ. 3ª Turma. REsp 1.869.720/DF, Relator p/ acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27/04/2021 (Info 694). 

DOD PLUS – JULGADOS CORRELATOS 

A explicação do julgado acabou. No entanto, se ainda tiver um tempinho, compare o entendimento acima com os seguintes julgados correlatos: 

Mesmo que o contrato com a escola particular esteja apenas no nome da mãe, o pai também responderá solidariamente pelas dívidas 

A execução de título extrajudicial por inadimplemento de mensalidades escolares de filhos do casal pode ser redirecionada ao outro consorte, ainda que não esteja nominado nos instrumentos contratuais que deram origem à dívida. Ex: mãe assina contrato com a escola e termo de confissão de dívida se comprometendo a pagar as mensalidades; em caso de atraso, a escola poderá ingressar com execução tanto contra a mãe como contra o pai do aluno, considerando que existe uma solidariedade legal do casal quanto às despesas com a educação do filho (arts. 1.643 e 1.644 do CC). STJ. 3ª Turma. REsp 1472316-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 05/12/2017 (Info 618). 

Tratando-se de condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais, não é possível exigir do cônjuge meeiro, que não integrou a relação processual da lide originária, a comprovação de que a dívida executada não foi contraída em benefício do casal ou da família 

Havendo penhora de bem indivisível (ex: um apartamento), a meação do cônjuge alheio à execução deve recair sobre o produto da alienação do bem. Para impedir que a penhora recaia sobre a sua meação, o cônjuge meeiro deve comprovar que a dívida executada não foi contraída em benefício da família. Precedentes. 

No entanto, tratando-se de dívida proveniente da condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais em demanda da qual o cônjuge meeiro não participou, é inegável o direito deste à reserva de sua meação. Os honorários advocatícios consagram direito do advogado contra a parte que deu causa ao processo, não se podendo exigir do cônjuge meeiro, que não integrou a relação processual da lide originária, a comprovação de que a dívida executada não foi contraída em benefício do casal ou da família. Exemplo: João ajuizou ação ordinária contra Pedro, tendo o pedido sido julgado improcedente. O autor foi condenado a pagar R$ 200 mil de honorários advocatícios em favor de Pedro. Marcos (advogado de Pedro) ingressou com execução contra João cobrando os R$ 200 mil. O juiz determinou a penhora de uma sala comercial que está em nome de João. Raquel, esposa de João, apresentou embargos de terceiro contra essa penhora. Sua quota-parte deverá ser preservada, não sendo necessário que ela comprove que essa dívida contraída foi exclusiva do marido. STJ. 3ª Turma. REsp 1670338-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 04/02/2020 (Info 664).

 Penhora de valores depositados em conta bancária conjunta 

Se forem penhorados valores que estão depositados em conta-corrente conjunta solidária, o cotitular da conta, que não tenha relação com a penhora, pode tentar provar que a totalidade do dinheiro objeto da constrição pertencia a ele. Se conseguir fazer isso, o numerário será integralmente liberado. Se não conseguir, presume-se que os valores constantes da conta pertencem em partes iguais aos correntistas, de forma que se mantém penhorada apenas a parte do cotitular que tenha relação com a penhora (cotitular devedor/executado). Ex: João ingressou com execução contra Luciana. Foram penhorados R$ 100 mil da conta conjunta solidária. Pedro, marido de Luciana, apresentou embargos de terceiro afirmando que os valores penhorados pertenciam exclusivamente a ele. Se ele tivesse conseguido provar isso, teria todo o dinheiro liberado. Como não conseguiu fazer essa prova, o juiz deverá considerar que apenas metade da quantia pertence a ele, liberando R$ 50 mil. Assim, em se tratando de conta-corrente conjunta solidária, na ausência de comprovação dos valores que integram o patrimônio de cada um, presume-se a divisão do saldo em partes iguais, de forma que os atos praticados por quaisquer dos titulares em suas relações com terceiros não afetam os demais correntistas. STJ. 3ª Turma.nREsp 1510310-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/10/2017 (Info 613). STJ. 4ª Turma. REsp 1184584-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/4/2014 (Info 539). 

Obs: a 1ª e a 2ª Turmas do STJ - que julgam dívidas tributárias - possuem entendimento diverso. Elas entendem que é possível, sim, penhorar todo o valor depositado na conta conjunta, ainda que somente um dos correntistas seja responsável tributário pelo pagamento do tributo. Veja: 

No caso de conta conjunta, cada um dos correntistas é credor de todo o saldo depositado de forma solidária, assim, o valor depositado pode ser penhorado em garantia da execução, ainda que somente um dos correntistas seja responsável tributário pelo pagamento do tributo. STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 1177841/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 01/06/2020. 

As duas turmas de Direito Público do STJ entendem que é possível a penhora da integralidade das quantias depositadas em conta corrente conjunta, ainda que um dos titulares não seja responsável pela dívida. STJ. 2ª Turma. REsp 1851710/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 20/02/2020.



10 de maio de 2021

(PENHORA) - Para que haja o leilão judicial da integralidade de bem imóvel indivisível - pertencente ao executado em regime de copropriedade -, basta a penhora da quota-parte titularizada pelo devedor, não sendo necessária a penhora do bem por inteiro

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-692-stj.pdf 


EXECUÇÃO (PENHORA) - Para que haja o leilão judicial da integralidade de bem imóvel indivisível - pertencente ao executado em regime de copropriedade -, basta a penhora da quota-parte titularizada pelo devedor, não sendo necessária a penhora do bem por inteiro 

É admitida a alienação integral do bem indivisível em qualquer hipótese de propriedade em comum, resguardando-se, ao coproprietário ou cônjuge alheio à execução, o equivalente em dinheiro da sua quota-parte no bem. STJ. 3ª Turma. REsp 1.818.926/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/04/2021 (Info 692). 

O que acontece com o bem penhorado? 

Se o bem penhorado for dinheiro, ele é transferido ao credor, quitando-se a obrigação. Se o bem penhorado for coisa diferente de dinheiro, ele poderá ser: 

a) adjudicado (ocorre quando a propriedade do bem penhorado é transferida para o exequente como forma de pagamento da dívida que está sendo cobrada em juízo); 

b) alienado; 

c) concedido em usufruto ao exequente. 

Expropriação 

Quando acontece uma dessas três situações acima, dizemos que houve a “expropriação”, conforme previsto no art. 825 do CPC/2015: 

Art. 825. A expropriação consiste em: I - adjudicação; II - alienação; III - apropriação de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

João e Pedro, irmãos, são proprietários de um apartamento. Cada um deles tem 50% deste imóvel, ou seja, a quota-parte de cada irmão é 50%. João está sendo executado e o juiz determinou a penhora do bem. Vale ressaltar que o apartamento é um bem indivisível e que Pedro não tem nenhuma relação com essa dívida, não figurando no polo passivo da execução. 

Neste caso, o que fazer? Este bem penhorado poderá ser alienado para pagar a dívida? 

SIM. No entanto, a lei determina que o coproprietário que não tem nada a ver com a execução não poderá ser prejudicado e, por isso, após o bem ser vendido, ele receberá a sua quota-parte do imóvel em dinheiro. É o que diz o art. 843 do CPC/2015: 

Art. 843. Tratando-se de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem. 

Assim, em nosso exemplo, o apartamento será vendido e 50% do que for arrecadado (produto da alienação do bem) será entregue a Pedro. O restante servirá para pagar a dívida. 

 (Juiz TJ/AC 2019 Vunesp) A execução por quantia certa fundada em título executivo extrajudicial tem como instrumento típico de coerção a realização da expropriação de bens do executado, que se inicia através da penhora, sobre a qual é correto asseverar que em se tratando de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem. (certo) 

É admitida a alienação integral do bem indivisível em qualquer hipótese de propriedade em comum, resguardando-se, ao coproprietário ou cônjuge alheio à execução, o equivalente em dinheiro da sua quota-parte no bem. STJ. 3ª Turma. REsp 1.818.926/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/04/2021 (Info 692). 

Vale ressaltar que o CPC garante ao coproprietário o direito de preferência na arrematação do bem, caso não queira perder sua propriedade mediante a compensação financeira: 

Art. 843 (...) § 1º É reservada ao coproprietário ou ao cônjuge não executado a preferência na arrematação do bem em igualdade de condições. 

Se o coproprietário não quiser exercer esse direito de preferência, mesmo assim seu patrimônio permanecerá hígido considerando que terá direito à sua quota-parte com base no valor da avaliação do imóvel. Isso porque o § 2º do art. 843 afirma que se o bem penhorado tiver um coproprietário que é alheio à dívida que está sendo executada, este bem só poderá ser vendido por um preço que dê para pagar pelo menos a quota-parte deste coproprietário: 

Art. 843 (...) § 2º Não será levada a efeito expropriação por preço inferior ao da avaliação na qual o valor auferido seja incapaz de garantir, ao coproprietário ou ao cônjuge alheio à execução, o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação. 

Desse modo, “o coproprietário não devedor e o cônjuge ou companheiro não devedor nem responsável patrimonial secundário têm direito a receber sua cota-parte tomando por base o valor da avaliação do bem, e não o valor da expropriação. E, caso a expropriação não atinja sequer o valor que deve ser entregue a esses sujeitos, não deverá ser realizada.” (NEVES, Daniel Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 11ª ed., Salvador: Juspodivm, 2019, p. 1146). 

O cônjuge ou coproprietário precisa ingressar com embargos de terceiro na execução para garantir os direitos acima explicados? 

NÃO. A lei já lhes confere proteção automática, tanto pela preferência na arrematação do bem, como pela preservação integral do seu patrimônio, se convertido em dinheiro. É suficiente que o coproprietário, seja ele cônjuge ou não, seja oportunamente intimado da penhora e da alienação judicial, na forma dos arts. 799, 842 e 889 do Código, a fim de que lhes seja oportunizada a manifestação no processo, em respeito aos postulados do devido processo legal e do contraditório. 

Penhora não pode avançar sobre o quinhão do coproprietário 

Vale ressaltar que já na fase de penhora, deverá ficar bem delimitado que a constrição recai apenas sobre a quota-parte do devedor. A penhora não pode ultrapassar o patrimônio do executado ou de eventuaisresponsáveis pelo pagamento do débito, seja qual for a natureza dos bens alcançados. Assim, mesmo em se tratando de bem indivisível, a penhora deve ficar restrita à quota-parte pertencente ao devedor, pois somente esta está afetada à execução e, uma vez liquidada, é que se destinará ao pagamento do credor.

 




Filigrana doutrinária: Quota-parte do coproprietário / cônjuge alheio à execução - Daniel Amorim Assumpção Neves

 “o coproprietário não devedor e o cônjuge ou companheiro não devedor nem responsável patrimonial secundário têm direito a receber sua cota-parte tomando por base o valor da avaliação do bem, e não o valor da expropriação. E, caso a expropriação não atinja sequer o valor que deve ser entregue a esses sujeitos, não deverá ser realizada.” 


NEVES, Daniel Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 11ª ed., Salvador: Juspodivm, 2019, p. 1146. 

5 de maio de 2021

RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE BEM IMÓVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO DE EX-CÔNJUGE PENDENTES. DEFESA DA MEAÇÃO. RESERVA DE METADE DO VALOR DE AVALIAÇÃO. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA DESCONSIDERADA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.728.086 - MS (2018/0051190-0) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE BEM IMÓVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO DE EX-CÔNJUGE PENDENTES. DEFESA DA MEAÇÃO. RESERVA DE METADE DO VALOR DE AVALIAÇÃO. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA DESCONSIDERADA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 

1. Debate-se a extensão da proteção da meação reservada a ex-cônjuge na hipótese de execução de título extrajudicial. 

2. O novo diploma processual, além de estender a proteção da fração ideal para os demais coproprietários de bem indivisível, os quais não sejam devedores nem responsáveis legais pelo adimplemento de obrigação contraída por outro coproprietário, ainda delimitou monetariamente a alienação judicial desses bens. 

3. A partir do novo regramento, o bem indivisível somente poderá ser alienado se o valor de alienação for suficiente para assegurar ao coproprietário não responsável 50% (cinquenta por cento) do valor de avaliação do bem (art. 843, § 2º, do CPC/2015). 

4. Essa nova disposição legal, de um lado, referenda o entendimento de que o bem indivisível será alienado por inteiro, ampliando a efetividade dos processos executivos; de outro, amplia a proteção de coproprietários inalcançáveis pelo procedimento executivo, assegurando-lhes a manutenção integral de seu patrimônio, ainda que monetizado. 

5. Estando pendente o julgamento dos embargos de terceiros opostos por ex-cônjuge meeira, até que se decida sua eventual responsabilidade pela dívida do devedor primário, é prudente, em juízo cautelar, que se mantenha à disposição do Juízo competente valor correspondente à meação, nos termos da nova legislação processual. 

6. Recurso especial provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 27 de agosto de 2019 (data do julgamento). 

RELATÓRIO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: Cuida-se de recurso especial interposto por Maria Teresinha Gomes fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, no qual impugna acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 53): 

AGRAVO – AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – PRELIMINAR ARGUIDA EM CONTRARRAZÕES – ESPOSA DO EXECUTADO – TERCEIRO – MEEIRA DO IMÓVEL – ARTIGO 996, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – PREAMBULAR REJEITADA – RESGUARDO MEAÇÃO DA ESPOSA DO DEVEDOR – LEVANTAMENTO – VALOR DA ARREMATAÇÃO – AGRAVO IMPROVIDO. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu, em casos análogos, que o resguardo da meação da esposa do executado será sobre o valor da arrematação. 

Nas razões do presente recurso especial, a recorrente alega violação do art. 843, § 2º, do atual Código de Processo Civil. Sustenta que, segundo o novo regramento, o direito de terceiro alheio aos efeitos da execução deve ser resguardado na proporção de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da avaliação do bem. Narra que não se está discutindo acerca da possibilidade, ou não, da meação, mas sim quanto ao valor do bem, o qual entende ser o de sua avaliação, e não da arrematação. 

Contrarrazões ofertadas (e-STJ, fls. 121-134). 

É o relatório. 

VOTO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR): Cinge-se a controvérsia a verificar se, diante da atual disposição contratual, a reserva da meação passa a incidir sobre o valor de avaliação do imóvel excutido ou do valor da efetiva arrematação. 

De início, ressalta-se a aplicabilidade do CPC/2015 a este recurso, ante os termos do Enunciado Administrativo n. 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016. Verifica-se também que o presente recurso especial foi interposto nos autos de agravo de instrumento, protocolado no Tribunal de origem, contra decisão que autorizou o levantamento de 50% (cinquenta por cento) do valor de arrematação de imóvel do qual a recorrente era coproprietária, cujo leilão também se deu sob a vigência do atual diploma adjetivo. 

Assim, não há dúvidas acerca da incidência do Código de Processo Civil de 2015 para disciplinar a hipótese em questão. 

Compulsando os autos do presente recurso, nota-se que o agravo de instrumento foi interposto contra decisão do Juízo de primeiro grau que deferiu o levantamento de 50% (cinquenta por cento) do valor da arrematação da Fazenda Caieté em favor do exequente, reservando tão somente o valor restante para proteção da meação, direito ainda sub judice em embargos de terceiros ofertados pela ora recorrente. 

Desde o referido agravo de instrumento, a recorrente sustenta que o novo diploma processual estabelece ao coproprietário, a qualquer título, o direito à reserva da metade do valor de avaliação do bem, na hipótese de a responsabilidade patrimonial alcançar bem de terceiro. 

Com efeito, no que tange à proteção do patrimônio de terceiros, o Código de Processo Civil de 2015 inovou nosso sistema executivo, ao delimitar legalmente a extensão da responsabilidade de cônjuges, companheiros e coproprietários. No que tange aos cônjuges e companheiros, uma leitura apressada do novo dispositivo legal pode aparentar que o atual dispositivo somente aclarou interpretação que já vinha sendo aplicada pelos Tribunais pátrios. 

Isso porque, de fato, o legislador, na ânsia de assegurar maior efetividade ao processo executivo, já havia estabelecido a admissibilidade de excussão de bem indivisível de propriedade do casal, para responder por dívida exclusiva de apenas um dos cônjuges. Nesses casos, o art. 655-B do CPC/1973 determinava que a meação recairia sobre o produto da alienação do bem. 

O referido dispositivo disciplinava nos seguintes termos: 

Art. 655-B. Tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem. 

Noutros termos, o Código de Processo Civil revogado já viabilizava a venda integral de bem indivisível pertencente ao casal. Ao interpretar a referida regra, o STJ agasalhou a interpretação de que a meação, ao recair sobre o valor da alienação, corresponderia à reserva de 50% (cinquenta por cento) do valor efetivamente apurado na arrematação, tal qual aplicou o Tribunal a quo na hipótese dos autos. 

Nesse sentido (sem destaques no original): 

RECURSO ESPECIAL - EMBARGOS DE TERCEIRO - PENHORA DE BEM IMÓVEL - MULHER CASADA - DEFESA DA MEAÇÃO - EXCLUSÃO EM CADA BEM - HASTA PÚBLICA - POSSIBILIDADE - RESERVA DE METADE DO VALOR AFERIDO NA ALIENAÇÃO JUDICIAL. 1. Sendo a dívida pessoal de um dos cônjuges, haja vista que o ato ilícito do qual derivou o título executivo judicial foi praticado somente pelo marido e não reverteu em benefício da sociedade conjugal, somente o patrimônio deste garante a execução. Assim, cuidando-se de devedor casado e havendo bens comuns a garantia fica reduzida ao limite da sua meação, nos termos do art. 3º da Lei 4.121/62. 2. A execução não é ação divisória, pelo que inviável proceder a partilha de todo o patrimônio do casal de modo a atribuir a cada qual os bens que lhe cabem por inteiro. Deste modo, a proteção da meação da mulher casada deve ser aferida sobre cada bem de forma individualizada e não sobre a totalidade do patrimônio do casal. 3. Não se pode olvidar que embora a execução seja regida pelo princípio da menor onerosidade ao devedor, reveste-se de natureza satisfativa e deve levar a cabo o litígio. Destarte, com o fito de evitar a eternização do procedimento executório, decorrente da inevitável desestimulação da arrematação a vista da imposição de um condomínio forçado na hipótese de se levar à praça apenas a fração ideal do bem penhorado que não comporte cômoda divisão, assentou-se a orientação doutrinária e jurisprudencial no sentido de que, em casos tais, há de ser o bem alienado em sua totalidade, assegurando-se, todavia, ao cônjuge não executado a metade do produto da arrematação, protegendo-se, deste modo, a sua meação. 4. Conquanto seja legítima a pretensão da recorrente de ver assegurada a proteção de sua meação sobre cada bem de forma individualizada, importante garantir a efetividade do procedimento executório, pelo que, considerando-se que, in casu, recaiu a penhora sobre imóvel que não comporta cômoda divisão, há de se proceder a alienação do bem em hasta pública por inteiro reservando-se à mulher a metade do preço alcançado. 5. Recurso especial parcialmente provido. (REsp n. 708.143/MA, Rel. Min. Jorge Scartezzini, Quarta Turma, DJ 26/2/2007, p. 596) 

Todavia, o atual diploma processual, para além de ratificar entendimento há muito adotado pela jurisprudência deste Tribunal Superior, alargando-o para alcançar quaisquer coproprietários, estipulou ainda limite monetário para a alienação do bem indivisível. A esse respeito, o art. 843 do CPC/2015 determina (sem destaques no original): 

Art. 843. Tratando-se de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem. § 1º É reservada ao coproprietário ou ao cônjuge não executado a preferência na arrematação do bem em igualdade de condições. § 2º Não será levada a efeito expropriação por preço inferior ao da avaliação na qual o valor auferido seja incapaz de garantir, ao coproprietário ou ao cônjuge alheio à execução, o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação. 

Acerca da novidade legislativa, Daniel Amorim Assumpção Neves afirma que 

"[a] única interpretação possível do dispositivo legal é de que o coproprietário não devedor e o cônjuge ou companheiro não devedor nem responsável patrimonial secundário têm direito a receber sua quota-parte tomando por base o valor da avaliação do bem, e não o valor da expropriação. E, caso a expropriação não atinja sequer o valor que deve ser entregue a esses sujeitos, não deverá ser realizada" (Manual de direito processual civil. 10ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 1157). 

Essa nova disposição traduz, portanto, uma continuidade no movimento de ampliação da efetividade do procedimento executivo, porém introduz também uma ampliação da proteção do direito de terceiro, não devedor nem responsável pelo pagamento do débito. Desse modo, a excussão patrimonial deverá observar o valor de reserva da meação, o qual será computado sobre o valor integral da avaliação do bem, de maneira que a eventual alienação por valor inferior será suportada pelo credor que promover a execução, e não pelo coproprietário não devedor. 

Nesse contexto, também não se pode olvidar que o cônjuge ou companheiro também poderá ser responsável pelo pagamento da dívida sempre que o benefício alcançado pelo devedor tenha se revertido em "coisas necessárias à economia doméstica" (art. 1.643 c/c 1.644, ambos do CC/2002). Sendo assim, havendo nos autos debate acerca do aproveitamento dos benefícios decorrentes da obrigação exequenda em favor da entidade familiar, é imprescindível a decisão final dos embargos de terceiros para se reconhecer o direito da recorrente à proteção de sua meação. 

No caso, ainda não houve decisão final sobre os embargos de terceiros, de modo que o acórdão recorrido tão somente analisou a questão suscitada pela recorrente em decorrência da autorização ao credor para levantamento de quantia insuficiente para assegurar a reserva prevista no art. 843, § 2º, do CPC/2015. Faz-se, portanto, necessária a reforma do julgado recorrido, a fim de que, no exercício do poder de cautela, seja reservado percentual do valor de avaliação do imóvel condizente com a atual disposição legal, até ulterior decisão dos embargos de terceiros. 

Com esses fundamentos, dou provimento ao recurso especial, para determinar a reserva de 50% (cinquenta por cento) do valor de avaliação do imóvel arrematado, mantendo-se a autorização de levantamento, por ora, restrita ao saldo remanescente. 

É como voto. 

1 de maio de 2021

Filigrana Doutrinária: Art. 655-B, CPC/73; Penhora de bem indivisível e meação do cônjuge alheio à execução - Fernando da Fonseca Gajardoni

“O motivo que levou a jurisprudência a admitir a alienação integral do bem indivisível – o qual certamente acabou por também convencer o legislador reformador – é evidente: bastante reduzida seria a procura pelo bem, caso o arrematante/adjudicante só pudesse adquirir o domínio de parcela do bem, mantendo, assim, o estado de indivisão da coisa e o condomínio com terceiro não executado (o cônjuge do devedor), no mais das vezes pessoa desconhecida. Aliás, seria uma dupla perda de tempo, obrigando o credor/ arrematante/adjudicante a ajuizar ação de dissolução de condomínio, justamente para se chegar naquela mesma fase processual anterior, que é a da alienação do bem em sua totalidade. Óbvio que a solução anterior era totalmente inadequada, para todos os envolvidos, inclusive com discussões sobre o uso exclusivo do bem por um em detrimento do outro. Aliás, se uma das finalidades da penhora é a alienação do bem para que o seu equivalente monetário venha a satisfazer o crédito do exequente (art. 708, I, do CPC), não havia sentido para que se impusessem óbices à efetiva transformação dos bens do devedor em dinheiro, ainda que, com isso, o cônjuge, em certas condições e preservado o direito ao recebimento de parcela de produto, fosse atingido”. 

GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Penhora e expropriação de bem indivisível: pela evolução da jurisprudência do STJ em prol da interpretação potencializada do art. 655-b do CPC. In: O papel da jurisprudência no STJ. São Paulo: RT, 2014, p. 919-934.

30 de abril de 2021

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA. BEM IMÓVEL INDIVISÍVEL EM REGIME DE COPROPRIEDADE. ALIENAÇÃO JUDICIAL DO BEM POR INTEIRO. POSSIBILIDADE. ART. 843 DO CPC/2015. CONSTRIÇÃO. LIMITES. QUOTA-PARTE TITULARIZADA PELO DEVEDOR.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.818.926 - DF (2019/0154861-7) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA. BEM IMÓVEL INDIVISÍVEL EM REGIME DE COPROPRIEDADE. ALIENAÇÃO JUDICIAL DO BEM POR INTEIRO. POSSIBILIDADE. ART. 843 DO CPC/2015. CONSTRIÇÃO. LIMITES. QUOTA-PARTE TITULARIZADA PELO DEVEDOR. 

1. Cumprimento de sentença em 10/04/2013. Recurso especial interposto em 01/04/2019 e concluso ao gabinete em 21/08/2019. 

2. O propósito recursal consiste em dizer se, para que haja o leilão judicial da integralidade de bem imóvel indivisível – pertencente ao executado em regime de copropriedade –, é necessária a prévia penhora do bem por inteiro ou, de outro modo, se basta a penhora da quota-parte titularizada pelo devedor. 

3. O Código de Processo Civil de 2015, ao tratar da penhora e alienação judicial de bem indivisível, ampliou o regime anteriormente previsto no CPC/1973. 

4. Sob o novo quadro normativo, é autorizada a alienação judicial do bem indivisível, em sua integralidade, em qualquer hipótese de copropriedade. Ademais, resguarda-se ao coproprietário alheio à execução o direito de preferência na arrematação do bem ou, caso não o queira, a compensação financeira pela sua quota-parte, agora apurada segundo o valor da avaliação, não mais sobre o preço obtido na alienação judicial (art. 843 do CPC/15). 

5. Nesse novo regramento, a oposição de embargos de terceiro pelo cônjuge ou coproprietário que não seja devedor nem responsável pelo adimplemento da obrigação se tornou despicienda, na medida em que a lei os confere proteção automática. Basta, de fato, que sejam oportunamente intimados da penhora e da alienação judicial, na forma dos arts. 799, 842 e 889 do CPC/15, a fim de que lhes seja oportunizada a manifestação no processo, em respeito aos postulados do devido processo legal e do contraditório. 

6. Ainda, a fim de que seja plenamente resguardado o interesse do coproprietário do bem indivisível alheio à execução, a própria penhora não pode avançar sobre o seu quinhão, devendo ficar adstrita à quota-parte titularizada pelo devedor. 

7. Com efeito, a penhora é um ato de afetação, por meio do qual são individualizados, apreendidos e depositados bens do devedor, que ficarão à disposição do órgão judicial para realizar o objetivo da execução, que é a satisfação do credor. 

8. Trata-se, pois, de um gravame imposto pela atuação jurisdicional do Estado, com vistas à realização coercitiva do direito do credor, que, à toda evidência, não pode ultrapassar o patrimônio do executado ou de eventuais responsáveis pelo pagamento do débito, seja qual for a natureza dos bens alcançados. 

9. Recurso especial conhecido e provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso especial nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 13 de abril de 2021(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recurso especial interposto por NORIYUKI TAKAHASHI e HARUMI KIMURA TAKAHASHI, com fundamento, exclusivamente, na alínea "a" do permissivo constitucional. 

Ação: de indenização, em fase de cumprimento de sentença, ajuizada pelos recorrentes em desfavor de WRJ ENGENHARIA LTDA e LUCILENE MALAQUIAS DA CUNHA PINHO. 

Decisão interlocutória: indeferiu o pedido formulado pelos recorrentes para que fosse levado a leilão judicial a integralidade do imóvel cuja quota-parte de 50%, pertencente à executada WRJ ENGENHARIA LTDA, fora penhorada nos autos. 

Acórdão: negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelos recorrentes, nos termos da seguinte ementa (e-STJ fl. 348): 

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMÓVEL. COPROPRIEDADE. CONDOMÍNIO INDIVISÍVEL. PENHORA. FRAÇÃO IDEAL DE TITULARIDADE DO DEVEDOR EXPROPRIAÇÃO. ALIENAÇÃO JUDICIAL. INTEGRALIDADE DO BEM. IMPOSSIBILIDADE. PRESERVAÇÃO DA COTAPARTE DO CO-PROPRIETÁRIO. OBSERVÂNCIA À PENHORA CONSUMADA. IMPRESCINDIBILIDADE. 1. A constrição judicial incidente sobre a parte do imóvel detido em condomínio indiviso pertencente ao condômino executado é legalmente resguardada, não sobejando possível, contudo, diante do alcance da penhora consumada, a expropriação, via alienação judicial, da integralidade da coisa como se houvesse sido penhorada na sua completude, pois implica a desconsideração do ato constritivo e os limites da medida constritiva, afetando o direito do coproprietário sem que antes tivesse oportunidade de salvaguardar seus interesses (CPC, art. 843). 2. Agravo conhecido e desprovido. Unânime". 

Embargos de declaração: opostos pelos recorrentes, foram rejeitados. 

Recurso especial: alega violação do art. 843 do CPC/15, aos argumentos de que: (i) referido dispositivo legal autoriza o leilão de bem imóvel indivisível, devendo a quota-parte do coproprietário recair sobre o produto da alienação do bem; (ii) a norma não exige que haja a penhora da integralidade do bem para que este seja levado à leilão. 

Juízo de admissibilidade: o recurso foi admitido pelo TJDFT. 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): O propósito recursal consiste em dizer se, para que haja o leilão judicial da integralidade de bem imóvel indivisível – pertencente ao executado em regime de copropriedade –, é necessária a prévia penhora do bem por inteiro ou, de outro modo, se basta a penhora da quota-parte titularizada pelo devedor. 

I. DA EXPROPRIAÇÃO DE BEM INDIVISÍVEL. ARTS. 655-B DO CPC/73 E 843 DO CPC/2015. 

1. Desde a vigência do Código de Processo Civil de 1973, busca o legislador tornar o procedimento de satisfação dos créditos mais efetivo, prestigiando, por meio da remoção de óbices formais e da ampliação das medidas executivas, a tutela do direito em favor do credor. 

2. Dentre as diversas reformas empreendidas no Código revogado, procurou o legislador, por meio de dispositivo da Lei 11.382/06, resolver, no âmbito legal, antigo problema que já enfrentava a jurisprudência dos Tribunais, referente à penhora e alienação de bem indivisível – isto é, aquele que, uma vez fracionado, sofre alteração da substância, diminuição considerável do valor ou prejuízo no uso, ex vi do art. 87 do CC/02 –, pertencente ao executado em regime de copropriedade. 

3. À época, a solução legal se focou na questão do devedor casado, incorporando-se ao CPC/73 o art. 655-B, que passou a autorizar a alienação, por inteiro, do bem indivisível de propriedade comum do devedor e seu cônjuge, protegendo-se a meação deste ao lhe ser destinado parte do valor auferido com a venda. 

4. Veja-se o que dispunha o artigo: “Art. 655-B. Tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem”. 

5. Consoante elucida a doutrina, o objetivo da norma em comento foi, à toda evidência, o de estimular a aquisição do bem indivisível no procedimento de alienação judicial, haja vista que a alternativa – qual seja, a criação de um condomínio entre o cônjuge alheio à execução e o adquirente – despertaria pouco ou quase nenhum interesse entre possíveis licitantes. 

6. Realmente, como já anotava Humberto THEODORO JÚNIOR, a alienação judicial de simples cota ideal do bem comum representa reduzida liquidez, pois é “evidente o quase nenhum interesse despertado entre os possíveis licitantes numa hasta pública em tais condições; e quando algum raro interessado aparece só o faz para oferecer preço muito inferior àquele que se apuraria na alienação total do bem” (Curso de direito processual civil, vol. II, 48ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 318). 

7. Na mesma linha de intelecção, lecionou Fernando da Fonseca GAJARDONI: 

“O motivo que levou a jurisprudência a admitir a alienação integral do bem indivisível – o qual certamente acabou por também convencer o legislador reformador – é evidente: bastante reduzida seria a procura pelo bem, caso o arrematante/adjudicante só pudesse adquirir o domínio de parcela do bem, mantendo, assim, o estado de indivisão da coisa e o condomínio com terceiro não executado (o cônjuge do devedor), no mais das vezes pessoa desconhecida. Aliás, seria uma dupla perda de tempo, obrigando o credor/ arrematante/adjudicante a ajuizar ação de dissolução de condomínio, justamente para se chegar naquela mesma fase processual anterior, que é a da alienação do bem em sua totalidade. Óbvio que a solução anterior era totalmente inadequada, para todos os envolvidos, inclusive com discussões sobre o uso exclusivo do bem por um em detrimento do outro. Aliás, se uma das finalidades da penhora é a alienação do bem para que o seu equivalente monetário venha a satisfazer o crédito do exequente (art. 708, I, do CPC), não havia sentido para que se impusessem óbices à efetiva transformação dos bens do devedor em dinheiro, ainda que, com isso, o cônjuge, em certas condições e preservado o direito ao recebimento de parcela de produto, fosse atingido” (Penhora e expropriação de bem indivisível: pela evolução da jurisprudência do STJ em prol da interpretação potencializada do art. 655-b do CPC. In: O papel da jurisprudência no STJ. São Paulo: RT, 2014, p. 919-934, grifou-se). 

8. Sob o mesmo móvel de proporcionar mais efetividade à execução, ao passo em que se concilia o interesse de quem dela não participa, o Código de Processo Civil de 2015 conservou a norma ora em análise, e, indo além, a ampliou, a fim de abranger outras situações condominiais que não aquela decorrente do regime de casamento. 

9. Com efeito, atualmente, por força do art. 843 do CPC/2015, é admitida a alienação integral do bem indivisível em qualquer hipótese de propriedade em comum, resguardando-se, ao coproprietário ou cônjuge alheio à execução, o equivalente em dinheiro da sua quota-parte no bem. 

10. A propósito, para maior elucidação, confira-se a redação do dispositivo em vigor: 

“Art. 843. Tratando-se de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem. 

§ 1º É reservada ao coproprietário ou ao cônjuge não executado a preferência na arrematação do bem em igualdade de condições. 

§ 2º Não será levada a efeito expropriação por preço inferior ao da avaliação na qual o valor auferido seja incapaz de garantir, ao coproprietário ou ao cônjuge alheio à execução, o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação”. (grifou-se) 

11. É de se notar, aliás, que o novo diploma processual, para além de estender as hipóteses em que admitida a expropriação de bem indiviso quando há coproprietário alheio à execução, também reforçou a proteção a esse terceiro que não é devedor nem responsável pelo pagamento do débito. 

12. Por um lado, a Lei agora expressamente garante ao coproprietário direito de preferência na arrematação do bem, caso não queira perder sua propriedade mediante a compensação financeira (§ 1º). 

13. Não exercendo tal direito, preserva-se hígido, ainda, o seu patrimônio, mediante a liquidação da sua quota-parte com base no valor da avaliação do imóvel (§ 2º), não mais segundo o preço obtido na alienação judicial, como ocorria no regime anterior. 

14. Deveras, como já se pronunciou essa Corte, “essa nova disposição legal (...) amplia a proteção de coproprietários inalcançáveis pelo procedimento executivo, assegurando-lhes a manutenção integral de seu patrimônio, ainda que monetizado” (REsp 1.728.086/MS, 3ª Turma, DJe 03/09/2019, grifou-se). 

II. DA DISPENSABILIDADE DOS EMBARGOS DE TERCEIRO E DOS LIMITES DA PENHORA. 

15. Sob esse novo quadro normativo, introduzido pelo CPC/2015, desponta ainda outro aspecto relevante acerca da alienação de bem indivisível: a oposição de embargos de terceiro pelo cônjuge ou coproprietário alheio à execução se tornou dispensável, na medida em que a lei lhes confere proteção automática, tanto pela preferência na arrematação do bem, como pela preservação integral do seu patrimônio, se convertido em dinheiro. 

16. É suficiente, de fato, que o coproprietário, seja ele cônjuge ou não, seja oportunamente intimado da penhora e da alienação judicial, na forma dos arts. 799, 842 e 889 do Código, a fim de que lhes seja oportunizada a manifestação no processo, em respeito aos postulados do devido processo legal e do contraditório. 17. Por oportuno, calhar anotar que o art. 674, § 2º, do CPC/2015, ao tratar da legitimidade e do interesse para a oposição de embargos de terceiro, faz referência à defesa do cônjuge ou companheiro quanto aos bens próprios ou de sua meação. Todavia, o dispositivo expressamente ressalva o disposto no art. 843 do Código, indicando, de forma indubitável, a desnecessidade dos embargos do cônjuge ou companheiro quando se tratar da hipótese de constrição de bem indivisível comum. 

18. Confira-se: 

“Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro. § 1º Os embargos podem ser de terceiro proprietário, inclusive fiduciário, ou possuidor. § 2º Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos: I - o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843 (....)” (grifou-se) 

19. A propósito, ressalte-se que, embora não mencionados no texto do art. 674, § 2º, a ressalva feita ao cônjuge ou companheiro estende-se também aos demais coproprietários de bem indivisível, cuja quota-parte restará invariavelmente protegida, por força do art. 843 do Códex, independentemente de embargos. 

20. De fato, “independentemente do ajuizamento de embargos de terceiro, havendo penhora e alienação de bem indivisível, a meação do cônjuge ou o quinhão de condômino serão preservados (...). Em situações tais, com o escopo de evitar outras impugnações e conferir maior eficácia à execução, optou o legislador por dispensar o ajuizamento de embargos de terceiro, conferindo proteção automática ao cônjuge ou condômino” (BAIOCCO, Elton. In Código de Processo Civil Comentado, Coordenador-Geral José Sebastião Fagundes Cunhas, 1ª ed. em e-book. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, grifou-se). 

21. Com o mesmo entendimento, veja-se também: 

“Defesa da meação. Imóvel divisível. A intimação da penhora de bem imóvel divisível propicia ao cônjuge ou companheiro alheio à execução defender sua meação mediante embargos do executado ou embargos de terceiro. Em se tratando de penhora sobre imóvel indivisível, o cônjuge/companheiro alheio à execução não precisará opor embargos de terceiro para livrar sua meação, pois o produto da alienação lhe será destinado, conforme determina o CPC 843. [...] Reserva da meação/da parte ideal. A providência da norma é de evitar-se o ajuizamento de embargos de terceiro (CPC 674) pelo cônjuge ou companheiro meeiro de imóvel indivisível (...). Com o esvaziamento dos embargos de terceiro, garante-se a meação do cônjuge e evitam-se outras impugnações, de modo a tornar a execução mais célere e eficaz (...). A garantia da meação do cônjuge foi ainda mais reforçada pelo fato de que expressamente se exige, agora, que o valor da expropriação alcance a quota parte daquele (...). O atual CPC estendeu a possibilidade da reserva à parte ideal do coproprietário, nas mesmas condições em que ocorre a reserva da meação” (NERY JÚNIOR, Nelson; ANDRADE, Rosa Maria Nery de. Código de Processo Civil comentado, 3ª ed. em e-book. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 1806 e 1.807, grifou-se) 

“Além das pessoas referidas no art. 799 do CPC/2015, devem ser intimados, também, o cônjuge, se presentes as circunstâncias referidas no art. 842 do CPC/2015, e o coproprietário de bem indivisível, quando penhorada fração ideal (art. 889, II do CPC/2015). A intimação, nos casos do cônjuge e do coproprietário, deve ser observada sob pena de violação ao devido processo legal (art. 5.º, LIV da Constituição). Ora, no caso, autoriza a lei, a alienação de quota-parte de terceiro não executado, e o direito do terceiro incidirá sobre o produto da alienação, que tomará por base o valor da avaliação (cf. art. 843, § 2.º do CPC/2015). Impõe-se, portanto, a intimação prévia dessas pessoas (...). As intimações referidas devem ser realizadas com pelo menos cinco dias de antecedência da alienação judicial (cf. art. 889, II e ss., do CPC/2015), considerando-se ineficaz a alienação em relação àquele que deveria ter sido cientificado, caso não realizada a intimação (cf. art. 804 do CPC/2015)” (MEDINA, José Miguel Garcia. Código de processo civil comentado, 4. Ed. em e-book. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020). 

22. Entrementes, impõe destacar que o pleno resguardo do interesse do coproprietário do bem indivisível – inclusive para o fim de tornar desnecessária a oposição de embargos de terceiro –, exige, também, que a própria penhora não avance sobre seu quinhão, limitando-se à quota-parte titularizada pelo devedor. 

23. De fato, não se pode olvidar que “a penhora é um ato de afetação porque sua imediata consequência, de ordem prática e jurídica, é sujeitar os bens por ela alcançados aos fins da execução, colocando-os à disposição do órgão judicial para, à custa e mediante sacrifício desses bens, realizar o objetivo da execução, que é a função pública de dar satisfação ao credor” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, vol. II, 48ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 440, grifou-se). 

24. O ato da penhora, efetivamente, importa individualização, apreensão e depósito dos bens do devedor (arts. 838 e 839 do CPC/15), e, uma vez aperfeiçoado, acarreta a indisponibilidade sobre os bens afetados à execução. Trata-se, à toda evidência, de um gravame imposto pela atuação jurisdicional do Estado, com vistas à realização coercitiva do direito do credor. 

25. Nessa ordem de ideias, é indubitável que esse gravame judicial não pode ultrapassar o patrimônio do executado ou de eventuais responsáveis pelo pagamento do débito, seja qual for a natureza dos bens alcançados. 

26. Daí porque, mesmo em se tratando de bem indivisível, a penhora deve cingir-se à quota-parte pertencente ao devedor, pois somente esta está afetada à execução e, uma vez liquidada, é que se destinará ao pagamento do credor. 

27. Ao coproprietário do bem indivisível até pode ser imposta a extinção do condomínio e a conversão de seu direito real de propriedade pelo equivalente em dinheiro – como visto, por uma necessidade de conferir eficiência ao processo executivo –, porém, até que isso ocorra, quando ultimada a alienação judicial, sua parcela do bem deve permanecer livre e desembaraçada. 

28. Em resumo, como afirma Humberto THEODORO JÚNIOR, “a penhora (...) não vai além da quota ideal do executado. O imóvel é alienado judicialmente por inteiro, como meio de liquidar a quota penhorada” (op. cit., p. 512). 

III. DA HIPÓTESE DOS AUTOS. 

29. A par dessas considerações, verifica-se que, na hipótese dos autos, houve a penhora da fração de 50% de uma loja comercial pertencente à executada WRJ ENGENHARIA LTDA, sendo a fração remanescente de titularidade de terceiro alheio à presente execução (Habra Engenharia Indústria e Comércio Ltda). 

30. Os direitos sobre a quota-parte da executada foram levados a leilão judicial, o qual, todavia, restou frustrado, por ausência de licitantes interessados. 

31. Em razão disso, os credores, ora recorrentes, requereram que o imóvel fosse integralmente submetido à hasta pública, com espeque no já mencionado art. 843 do CPC/15; porém, o pedido foi indeferido pelo juiz do 1º grau de jurisdição. 

32. Em segundo grau, o indeferimento do pedido foi mantido pelo TJDFT, nos seguintes termos: 

“Deflui do preceptivo legal trasladado que afigura-se possível a alienação judicial de imóvel indivisível, desde que a constrição judicial incida sobre a integralidade do bem. Nesse caso, deve ser resguardado ao co-proprietário estranho à execução o produto obtido com a alienação, na proporção de seu domínio. [...] Do alinhado germina a compreensão de que, na hipótese, não se afigura possível a alienação da integralidade do imóvel penhorado, tendo em vista que a penhora recaíra apenas sobre a fração ideal de titularidade da primeira agravada, devendo ser preservada, portanto, a parte do outro co-proprietário, titular de 50% (cinquenta por cento) do domínio. Com efeito, a penhora, no caso, incidira somente sobre esse quinhão, tornando inviável que, no momento da expropriação, seja alienado como se a penhora tivesse alcançado a integralidade da coisa” (e-STJ fls. 351-352, grifou-se). 

33. Como se observa, entendeu o Tribunal de origem que o fato de a penhora ter recaído apenas sobre a quota-parte da executada constituiria óbice à posterior alienação judicial do bem em sua integralidade. 

34. Ocorre que, consoante discorrido neste voto, outra não poderia ser a extensão da penhora que não a precisa parcela pertencente à devedora. 

35. Com efeito, como apenas o quinhão desta responde pela presente execução, não poderia a penhora recair sobre o bem por inteiro, porquanto isso implicaria injusto e desnecessário gravame à quota da coproprietária, até que fosse efetivada a alienação judicial e, com isso, se lhe entregasse o equivalente monetário. 

36. Dessa maneira, não subsiste, na espécie, o mencionado impedimento à alienação do imóvel como um todo, sendo de rigor, portanto, o acolhimento do presente recurso especial. 

Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial e DOU-LHE PROVIMENTO, para autorizar a alienação judicial da integralidade do imóvel cuja fração de 50% foi penhorada nos autos. 

Filigrana Doutrinária: Art. 655-B, CPC/73; Penhora de bem indivisível e meação do cônjuge alheio à execução - Humberto Theodoro Júnior

a alienação judicial de simples cota ideal do bem comum representa reduzida liquidez, pois é “evidente o quase nenhum interesse despertado entre os possíveis licitantes numa hasta pública em tais condições; e quando algum raro interessado aparece só o faz para oferecer preço muito inferior àquele que se apuraria na alienação total do bem”.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, vol. II, 48ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 318. 

24 de abril de 2021

É admitida a alienação integral do bem indivisível em qualquer hipótese de propriedade em comum, resguardando-se, ao coproprietário ou cônjuge alheio à execução, o equivalente em dinheiro da sua quota-parte no bem.

 REsp 1.818.926/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 13/04/2021.

Penhora. Bem imóvel indivisível em regime de copropriedade. Alienação judicial do bem por inteiro. Possibilidade. Art. 843 do CPC/2015. Constrição. Limites. Quota-parte titularizada pelo devedor.

O CPC/2015, ao tratar da penhora e alienação judicial de bem indivisível, ampliou o regime anteriormente previsto no CPC/1973.

Sob o novo quadro normativo, é autorizada a alienação judicial do bem indivisível, em sua integralidade, em qualquer hipótese de copropriedade. Ademais, resguarda-se ao coproprietário alheio à execução o direito de preferência na arrematação do bem ou, caso não o queira, a compensação financeira pela sua quota-parte, agora apurada segundo o valor da avaliação, não mais sobre o preço obtido na alienação judicial (art. 843 do CPC/2015).

Nesse novo regramento, a oposição de embargos de terceiro pelo cônjuge ou coproprietário que não seja devedor nem responsável pelo adimplemento da obrigação se tornou despicienda, na medida em que a lei os confere proteção automática. Basta, de fato, que sejam oportunamente intimados da penhora e da alienação judicial, na forma dos arts. 799, 842 e 889 do CPC/2015, a fim de que lhes seja oportunizada a manifestação no processo, em respeito aos postulados do devido processo legal e do contraditório.

Ainda, a fim de que seja plenamente resguardado o interesse do coproprietário do bem indivisível alheio à execução, a própria penhora não pode avançar sobre o seu quinhão, devendo ficar adstrita à quota-parte titularizada pelo devedor.

Trata-se, pois, de um gravame imposto pela atuação jurisdicional do Estado, com vistas à realização coercitiva do direito do credor, que, à toda evidência, não pode ultrapassar o patrimônio do executado ou de eventuais responsáveis pelo pagamento do débito, seja qual for a natureza dos bens alcançados.

23 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: Cota-parte de proprietário ou cônjuge não responsáveis - Daniel Amorim Assumpção Neves

 “o coproprietário não devedor e o cônjuge ou companheiro não devedor nem responsável patrimonial secundário têm direito a receber sua cota-parte tomando por base o valor da avaliação do bem, e não o valor da expropriação. E, caso a expropriação não atinja sequer o valor que deve ser entregue a esses sujeitos, não deverá ser realizada.” 

NEVES, Daniel Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 11ª ed., Salvador: Juspodivm, 2019, p. 1146. 

18 de abril de 2021

PENHORA - A quota-parte do coproprietário ou cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da avaliação do bem indivisível

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/11/info-655-stj.pdf


PENHORA - A quota-parte do coproprietário ou cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da avaliação do bem indivisível 

Imagine que um determinado imóvel indivisível pertença a duas pessoas. Uma delas está sendo executada e a outra não tem nenhuma relação com essa dívida cobrada. Esse bem é penhorado. Esse imóvel poderá ser alienado, no entanto, depois de vendido deverá ser entregue ao coproprietário não responsável o valor de sua quota-parte. É o que prevê o caput do art. 843 do CPC/2015: Art. 843. Tratando-se de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem. Vale ressaltar, no entanto, que o bem indivisível somente poderá ser alienado se o valor de alienação for suficiente para assegurar ao coproprietário não responsável 50% do valor de avaliação do bem: Art. 843 (...) § 2º Não será levada a efeito expropriação por preço inferior ao da avaliação na qual o valor auferido seja incapaz de garantir, ao coproprietário ou ao cônjuge alheio à execução, o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação. STJ. 3ª Turma. REsp 1.728.086-MS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/08/2019 (Info 655). 

O que acontece com o bem penhorado? 

Se o bem penhorado for dinheiro, ele é transferido ao credor, quitando-se a obrigação. Se o bem penhorado for coisa diferente de dinheiro, ele poderá ser: a) adjudicado (ocorre quando a propriedade do bem penhorado é transferida para o exequente como forma de pagamento da dívida que está sendo cobrada em juízo); b) alienado; c) concedido em usufruto ao exequente. 

Expropriação 

Quando acontece uma dessas três situações acima, dizemos que houve a “expropriação”, conforme previsto no art. 825 do CPC/2015: 

Art. 825. A expropriação consiste em: I - adjudicação; II - alienação; III - apropriação de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

João e Pedro, irmãos, são proprietários de um apartamento. Cada um deles tem 50% deste imóvel, ou seja, a quota-parte de cada irmão é 50%. João está sendo executado e o juiz determinou a penhora do bem. Vale ressaltar que o apartamento é um bem indivisível e que Pedro não tem nenhuma relação com essa dívida, não figurando no polo passivo da execução. 

Neste caso, o que fazer? Este bem penhorado poderá ser alienado para pagar a dívida? 

SIM. No entanto, a lei determina que o coproprietário que não tem nada a ver com a execução não poderá ser prejudicado e, por isso, após o bem ser vendido, ele receberá a sua quota-parte do imóvel em dinheiro. É o que diz o art. 843 do CPC/2015: 

Art. 843. Tratando-se de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem. 

Assim, em nosso exemplo, o apartamento será vendido e 50% do que for arrecadado (produto da alienação do bem) será entregue a Pedro. O restante servirá para pagar a dívida. 

Avaliação 

Antes de o bem penhorado ser alienado, é necessário realizar uma avaliação. O § 2º do art. 843 afirma que se o bem penhorado tiver um coproprietário que é alheio à dívida que está sendo executada, este bem só poderá ser vendido por um preço que dê para pagar pelo menos a quotaparte deste coproprietário: 

Art. 843 (...) § 2º Não será levada a efeito expropriação por preço inferior ao da avaliação na qual o valor auferido seja incapaz de garantir, ao coproprietário ou ao cônjuge alheio à execução, o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação. 

Desse modo, “o coproprietário não devedor e o cônjuge ou companheiro não devedor nem responsável patrimonial secundário têm direito a receber sua cota-parte tomando por base o valor da avaliação do bem, e não o valor da expropriação. E, caso a expropriação não atinja sequer o valor que deve ser entregue a esses sujeitos, não deverá ser realizada.” (NEVES, Daniel Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 11ª ed., Salvador: Juspodivm, 2019, p. 1146). 

Utilizando nosso exemplo: 

O apartamento foi avaliado em R$ 1 milhão. Isso significa que a quota-parte de Pedro, segundo a avalição, corresponde à R$ 500 mil. Se o apartamento for vendido por R$ 1 milhão e 400 mil, Pedro receberá R$ 700 mil (50%). Por outro lado, se o apartamento for alienado por R$ 800 mil, Pedro receberá R$ 500 mil (50% da avaliação). Por fim, se o maior lance pelo apartamento for R$ 400 mil, ele não poderá ser vendido. Isso porque não daria para cumprir o § 2º do art. 843 e pagar a quota-parte de Pedro, calculada com base no valor da avaliação (R$ 1 milhão). Assim, o coproprietário alheio à execução deverá receber, no mínimo, a sua quota-parte calculada com base na avaliação. Pode receber mais (se o imóvel for vendido a um preço superior ao da avaliação). No entanto, não pode receber menos. 

A quota-parte do coproprietário ou cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da avaliação do bem indivisível. O bem indivisível somente poderá ser alienado se o valor de alienação for suficiente para assegurar ao coproprietário não responsável 50% do valor de avaliação do bem (art. 843, § 2º, do CPC/2015). STJ. 3ª Turma. REsp 1.728.086-MS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/08/2019 (Info 655).

A quota-parte do coproprietário ou cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da avaliação do bem indivisível.

 REsp 1.728.086-MS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 27/08/2019, DJe 03/09/2019

Execução. Penhora de bem indivisível. Defesa da quota-parte. Reserva da metade do valor de avaliação. CPC/2015. Alteração legislativa.


O art. 843, caput, do CPC/2015, determina que "Tratando-se de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem". Todavia, o § 2º do mesmo dispositivo disciplina que "não será levada a efeito expropriação por preço inferior ao da avaliação na qual o valor auferido seja incapaz de garantir, ao coproprietário ou ao cônjuge alheio à execução, o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação". Segundo a doutrina, a única interpretação possível do dispositivo é de que "o coproprietário não devedor e o cônjuge ou companheiro não devedor nem responsável patrimonial secundário têm direito a receber sua quota-parte tomando por base o valor da avaliação do bem, e não o valor da expropriação. E, caso a expropriação não atinja sequer o valor que deve ser entregue a esses sujeitos, não deverá ser realizada". Essa nova disposição introduz, portanto, uma ampliação da proteção do direito de terceiro, não devedor nem responsável pelo pagamento do débito. Desse modo, a excussão patrimonial deverá observar o valor de reserva da meação, o qual será computado sobre o valor integral da avaliação do bem, de maneira que a eventual alienação por valor inferior será suportada pelo credor que promover a execução, e não pelo coproprietário não devedor.