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8 de janeiro de 2022

É admissível a celebração de “contrato de parceria” entre salões de beleza e profissionais do setor, desde que não haja a intenção de burlar normas trabalhistas

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/12/info-1036-stf.pdf


CONTRATO DE TRABALHO É admissível a celebração de “contrato de parceria” entre salões de beleza e profissionais do setor, desde que não haja a intenção de burlar normas trabalhistas 

1) É constitucional a celebração de contrato civil de parceria entre salões de beleza e profissionais do setor, nos termos da Lei 13.352, de 27 de outubro de 2016; 

2) É nulo o contrato civil de parceria referido, quando utilizado para dissimular relação de emprego de fato existente, a ser reconhecida sempre que se fizerem presentes seus elementos caracterizadores. 

STF. Plenário. ADI 5625/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Nunes Marques, julgado em 27 e 28/10/2021 (Info 1036).  

REVISÃO SOBRE A LEI 13.352/2016 

Neste julgado, o STF analisou a constitucionalidade da Lei nº 13.352/2016. Antes de analisar o que foi decidido, acho importante fazer uma breve revisão sobre o que dispõe a Lei nº 13.352/2016. Se estiver sem tempo, você pode ir diretamente para a explicação do julgado. 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Maria é dona de um pequeno salão de beleza de bairro (microempresa). Renata, que é cabeleireira, procura Maria e faz uma proposta: ela ficaria trabalhando no salão como “autônoma” (sem assinar CTPS), utilizando os equipamentos e a estrutura do local e, em troca, o valor pago pelas clientes seria dividido entre as duas, metade para cada. Determinado dia, elas se desentendem e Renata, com raiva, procura a Justiça do Trabalho. Seria muito provável que, nesta situação, fosse reconhecido que havia, no caso, uma relação de emprego e Maria seria condenada a assinar a CTPS de Renata e a pagar-lhe todos os direitos trabalhistas inerentes a esse vínculo. A Lei nº 13.352/2016 foi editada com o objetivo de tentar alterar este panorama, permitindo que os salões contratem profissionais de beleza como “autônomos”, sem vínculo empregatício. 

O que prevê a Lei nº 13.352/2016? 

A Lei nº 13.352/2016 prevê que os salões de beleza poderão celebrar... - contratos de parceria, - por escrito, - com cabeleireiros, barbeiros, esteticistas, manicures, pedicures, depiladores e maquiadores - por meio dos quais esses profissionais trabalharão no salão, - sem vínculo empregatício, - recebendo uma quota-parte dos valores pagos pelos clientes - e a outra quota-parte ficará com o salão. A Lei nº 13.352/2016 deixa expresso que “o profissional-parceiro não terá relação de emprego ou de sociedade com o salão-parceiro enquanto perdurar a relação de parceria”. 

Nomenclatura 

No contrato de parceria, os salões serão chamados de “salão-parceiro” e os profissionais de “profissionalparceiro”. 

Percentual fica para o salão e outro para o profissional 

Do valor pago pelos clientes, uma parte ficará com o salão e outra para o profissional que realizou o serviço. Essa divisão dos percentuais de cada um deverá ser fixada no contrato de parceria. Segundo dados da Associação Nacional do Comércio de Artigos de Higiene Pessoal e Beleza (Anabel), os donos dos salões de beleza costumam repassar aos profissionais entre 30% e 60% do valor dos serviços prestados. 

Qual é a natureza jurídica do valor que fica para o salão? 

A cota-parte que ficará pelo salão-parceiro ocorrerá a título de: 

• atividade de aluguel de bens móveis e de utensílios para o desempenho das atividades de serviços de beleza; e/ou

• serviços de gestão, de apoio administrativo, de escritório, de cobrança e de recebimentos de valores transitórios recebidos de clientes das atividades de serviços de beleza. 

Em outras palavras, o salão-parceiro recebe uma parte do pagamento pelo fato de ceder a sua estrutura física e/ou por oferecer ao profissional todo o apoio administrativo para que este realize seus serviços. 

Qual é a natureza jurídica do valor que fica para o profissional? 

A cota-parte destinada ao profissional-parceiro será feita como retribuição pelo fato de ele ter realizado os serviços de beleza em favor dos clientes. Assim, o profissional receberá uma espécie de “comissão” e não “salário”, considerando que não é empregado. 

Quem deverá ficar responsável por receber os pagamentos dos clientes: o salão ou o profissional? 

O salão. O salão-parceiro será responsável pela centralização dos pagamentos e recebimentos decorrentes das atividades de prestação de serviços de beleza realizadas pelo profissional-parceiro. 

Retenções que deverão ser feitas pelo salão 

Depois de receber o pagamento e antes de repassar ao profissional a sua parte, o salão-parceiro deverá fazer as seguintes retenções: a) sua cota-parte percentual; b) valores relativos aostributos e contribuições sociais e previdenciárias devidos pelo profissional-parceiro incidentes sobre a cota-parte que a este couber na parceria. 

Na receita bruta do salão não entra o valor que é repassado ao profissional 

A cota-parte destinada ao profissional-parceiro não será considerada para calcular a receita bruta do salão-parceiro, ainda que este adote o sistema de emissão de nota fiscal unificada ao consumidor. 

O profissional-parceiro deve ficar responsável apenas pelos serviços de beleza, não podendo ser utilizado para serviços administrativos 

O profissional-parceiro não poderá assumir as responsabilidades e obrigações decorrentes da administração da pessoa jurídica do salão-parceiro, de ordem contábil, fiscal, trabalhista e previdenciária incidentes, ou quaisquer outras relativas ao funcionamento do negócio. 

Qualificação dos profissionais-parceiros perante o Fisco 

Os profissionais-parceiros poderão ser qualificados, perante as autoridades fazendárias, como pequenos empresários, microempresários ou microempreendedores individuais. 

Requisitos do contrato de parceria 

O contrato de parceria deverá ser: a) feito por ato escrito; b) homologado pelo sindicato da categoria profissional e laboral e, na ausência desses, pelo órgão local competente do Ministério do Trabalho e Emprego; c) celebrado perante duas testemunhas, que também assinarão o pacto. 

Obs: o profissional-parceiro poderá celebrar o contrato como pessoa física (microempreendedor individual) ou como pessoa jurídica (pequenos empresários ou microempresários). Mesmo que inscrito como pessoa jurídica, o profissional-parceiro será assistido pelo seu sindicato de categoria profissional e, na ausência deste, pelo órgão local competente do Ministério do Trabalho e Emprego. 

Cláusulas obrigatórias do contrato de parceria 

Em todos os contratos de parceria deverão constar as seguintes cláusulas: 

I - o percentual das retenções que serão feitas pelo salão-parceiro dos valores recebidos por cada serviço prestado pelo profissional-parceiro; 

II - a obrigação, por parte do salão-parceiro, de reter e recolher os tributos e contribuições devidos pelo profissional-parceiro em decorrência da atividade deste na parceria; 

III - as condições e a periodicidade dos valores que serão pagos ao profissional-parceiro de acordo com o tipo de serviço oferecido; 

IV - os direitos do profissional-parceiro quanto ao uso de bens materiais necessários ao desempenho das atividades profissionais, bem como sobre o acesso e circulação nas dependências do estabelecimento; 

V - a possibilidade de rescisão unilateral do contrato, no caso de não subsistir interesse na sua continuidade, mediante aviso prévio de, no mínimo, 30 dias; 

VI - as responsabilidades de ambas as partes com a manutenção e higiene de materiais e equipamentos, das condições de funcionamento do negócio e do bom atendimento dos clientes; 

VII - a obrigação, por parte do profissional-parceiro, de que ele deverá manter a regularidade de sua inscrição perante as autoridades fazendárias. 

Vínculo empregatício 

Regra: Como regra, o profissional-parceiro não terá relação de emprego com o salão-parceiro enquanto perdurar a relação de parceria. 

Exceções: A Lei prevê, no entanto, algumas exceções em que ficará configurado o vínculo empregatício entre a pessoa jurídica do salão-parceiro e o profissional-parceiro. Isso ocorre em duas situações: I - quando não existir contrato de parceria formalizado na forma descrita pela Lei; II - quando o profissional-parceiro desempenhar funções diferentes das descritas no contrato de parceria. 

Obs: estas são exceções legais, ou seja, previstas expressamente na Lei. É provável, contudo, que a jurisprudência trabalhista construa outras hipóteses em que será permitido o reconhecimento do vínculo empregatício. 

Fiscalização pela Superintendência do Trabalho 

A Superintendência do Trabalho irá fiscalizar a execução desses contratos de parceria, podendo fazer autuações e impor multas, na forma disposta no Título VII da CLT. 

Vigência 

A Lei nº 13.352/2016 possuía vacatio legis de 90 dias e entrou em vigor no dia 26/01/2017. 

DECISÃO DO STF SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 13.352/2016 

ADI 

A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade (Contratuh) ajuizou ADI contra a Lei nº 13.352/2016. Segundo a entidade, a lei foi criada com o intuito de possibilitar a contratação de profissionais de beleza na forma de pessoa jurídica, alterando a norma – Lei nº 12.592/2012 – que regulamentou as categorias profissionais da área de beleza, criando, ainda, a base de tributação do “salão parceiro” e do “profissional parceiro”. A confederação alegou que a legislação atacada estaria contrariando a Constituição Federal e normas internacionais do trabalho ratificadas pelo Brasil, tendo em vista que a transformação dos profissionais em pessoas jurídicas teria o objetivo de burlar os direitos trabalhistas previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), além de reduzir a proteção social e possibilitar a precarização do trabalho, violando a dignidade da pessoa humana e a valorização do trabalho (arts. 1º, III e IV, e 170, da CF/88). 

O STF julgou procedente o pedido? Essa lei é inconstitucional? 

NÃO. A Lei nº 13.352/2016, conhecida como Lei do Salão-Parceiro, consagrou, formalmente, o contrato de parceria entre salão de beleza e profissionais do ramo da estética, bem como permitiu que os trabalhadores envolvidos saíssem da informalidade. A norma impugnada previu situação de igualdade contratual com elevação do patamar dos trabalhadores do segmento da beleza de forma isonômica e paritária. Ademais, permitiu remuneração mais vantajosa que o salário previamente fixado, além de reconhecer alta dignificação profissional. Não caracterizada, portanto, qualquer violação dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho. Os contratos de parceria que dissimulem vínculos empregatícios serão nulos à luz do princípio da primazia da realidade, consagrado no art. 9º da CLT: 

Art. 9º Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação. 

Nessas situações, o vínculo empregatício será reconhecido in concreto pelas autoridades públicas, com todas as consequências legais daí resultantes. 

Tese fixada pelo STF: 1) É constitucional a celebração de contrato civil de parceria entre salões de beleza e profissionais do setor, nos termos da Lei 13.352, de 27 de outubro de 2016; 2) É nulo o contrato civil de parceria referido, quando utilizado para dissimular relação de emprego de fato existente, a ser reconhecida sempre que se fizerem presentes seus elementos caracterizadores. STF. Plenário. ADI 5625/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Nunes Marques, julgado em 27 e 28/10/2021 (Info 1036). 

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado na ADI, declarando a constitucionalidade da Lei nº 13.352/2016. Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin (relator) e Rosa Weber.