DA FARMACIALIZAÇÃO DO JUDICIÁRIO:
BREVES CONSIDERAÇÕES
Judiciary as pharmacy: brief considerations
Revista de Processo | vol. 270/2017 | p. 279 - 310 | Ago / 2017
DTR\2017\2588
_____________________________________________________________________________________
Zillá
Oliva Roma
Mestre em
Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
– Assistente Jurídico do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
zilla.oliva@gmail.com
Área
do Direito: Civil;
Processual
Resumo:
Este artigo tem por objeto abordar o
acesso à Justiça e a judicialização do direito fundamental social à saúde,
fenômeno este que denomino farmacialização do Judiciário. Far-se-ão
algumas considerações críticas acerca da forma por meio da qual se dá o acesso
à Justiça deste tipo de pedido, majoritariamente por meio do ajuizamento de
ações individuais, visando-se ao fornecimento gratuito de medicamentos e
tratamentos médicos por parte do Estado. É nisso que consistirá o presente
estudo.
Palavras-chave:
Acesso à Justiça - Judicialização da política - Direito à saúde -
Controle jurisdicional de políticas públicas
Abstract:
This article aims to address the
access to Justice and the judicialization of the fundamental social right to
health, a phenomenon which I call Judiciary as pharmacy. It will be done some
critical remarks on the way through which this kind of demand accesses the
Justice, mostly through the filing of individual actions for the free supply of
medicines and medical treatment from the State. This is what this study
consists in.
Keywords:
Access to Justice - Judicialization of politics - Right to health -
Judicial control of public policies - Judiciary as pharmacy.
Sumário:
1De ordem
geral - 2Do controle jurisdicional de políticas públicas - 3Considerações
finais - 4Referências
1
De ordem geral
1.1
Do acesso à Justiça
O conceito de
acesso à Justiça deve ser sempre contextualizado conforme os fins preconizados
pelo modelo de Estado no qual inserido. Assim, este princípio/garantia/direito1,
disposto no art. 5º, inc. XXXV2, da Constituição Federal, no Brasil,
deve servir, sobretudo, para concretizar os objetivos fundamentais da República
Federativa, insculpidos no ambicioso art. 3º da Carta Política3,
precipuamente relacionados à prestação dos direitos fundamentais de segunda
geração/dimensão4, que consistem em direitos econômicos, sociais,
culturais, partindo do ideal de que o Estado deve atuar positivamente para
intervir na ordem socioeconômica5.
Assim, o
ângulo por meio do qual o acesso à Justiça é analisado depende da filosofia
política adotada pelo Estado. Daí se infere que seu conceito não é estanque,
muito menos universal.
Atualmente, o
acesso à Justiça é compreendido de forma ampla, qualificando a função
jurisdicional6, não sendo mais visto como um mero demandar. Como
menciona Fredie Didier Junior7, “O conteúdo desta garantia era
entendido, durante muito tempo, apenas como a estipulação do direito de ação e
do juiz natural. Sucede que a mera afirmação destes direitos em nada garante a
sua efetiva concretização. É necessário ir-se além. Surge, assim, a noção de
tutela jurisdicional qualificada. Não basta a simples garantia formal do dever
do Estado de prestar a justiça; é necessário adjetivar esta prestação estatal,
que já de ser rápida efetiva e adequada”.
Ainda, esse
acesso deve garantir uma tutela jurisdicional adequada à realidade do direito
material veiculado, assegurando o procedimento, a espécie de cognição, a
natureza do provimento e os meios executórios adequados às peculiaridades da
situação fática apresentada em juízo.
Neste ponto,
Luiz Guilherme Marinoni8 visualiza a adequação processual como uma
imposição do direito fundamental à efetividade do processo: “A compreensão
desse direito depende da adequação da técnica processual a partir das
necessidades do direito material. Se a efetividade requer a adequação e a
adequação deve trazer efetividade, o certo é que os dois conceitos podem ser
decompostos para melhor explicar a necessidade de adequação da técnica às
diferentes situações de direito substancial”.
Ainda, o
magistrado não pode furtar-se de seu dever institucional (vedação do non
liquet9), de modo que, uma vez instado a dirimir algum conflito,
em sede de processo existente e válido, não poderá se abster de adentrar o meritum
causae simplesmente porque a lide apresenta, v.g., um conflito de
largos contornos.
Em suma, o
conteúdo do comando constitucional ora analisado pode ser tomado sob acepções
diversas, a depender do ângulo por meio do qual é analisado, merecendo
releitura atualizada e contextualizada para que seja preservada sua utilidade e
importância, principalmente com o intuito de moldá-lo às novas necessidades da
massificada e conflituosa sociedade contemporânea.
1.2
Da judicialização da política
No contexto do
acesso à Justiça, os conflitos multiplexos/policêntricos têm tido cada vez mais
acesso ao Judiciário, desaguando no fenômeno da judicialização da política10
no Brasil. Trata-se de conflitos de largo espectro (político, social,
econômico), polarizando grandes massas de interesses metaindividuais (difusos,
coletivos strictu sensu, individuais homogêneos), nos quais a decisão deverá
operar efeitos em face de segmentos da sociedade, quando não dela como um todo.
Assim, na
expressão judicialização da política, o termo política não se
refere ao sentido partidário, mas sim ao fato de que controvérsias envolvendo
especialmente políticas públicas programadas ou implantadas pelo Poder Público
têm acessado a Justiça11. Como menciona Rodolfo de Camargo Mancuso,
esse fenômeno “radica, remotamente, na recusa, na leniência ou na oferta
insatisfatória de prestações primárias que deveriam ser disponibilizadas pelo
Poder Público à população”12.
A
judicialização consiste, assim, na possibilidade de questões de larga
repercussão política, social e/ou econômica serem decididas pelo Judiciário, no
lugar das instâncias políticas tradicionais para executar esse mister
(Congresso Nacional e Poder Executivo)13.
Como aponta
Rodolfo de Camargo Mancuso14, “A conflitiva sociedade de massa em
que hoje vivemos não mais encontra meio satisfatório de expressão de suas
angústias, expectativas e frustrações nas instâncias executiva e legislativa,
donde vir bater às portas do Judiciário, fazendo-se representar por entes
exponenciais adrede credenciados por certas normas de regência. Todavia, nem
sempre as demandas coletivas têm encontrado ambiente receptivo – e, pior, muita
vez vêm manejadas em modo inadequado – em parte por conta da própria formação
tradicional de nossos operadores do Direito, pouco afeiçoados às peculiaridades
daquelas ações”.
Assim, os
cidadãos ingressam no Judiciário quando não obtêm o que desejam por via
administrativa ou legislativa. Em se tratando de demandas coletivas, é sabido
que ainda há bastante dificuldade em seu trato por parte dos operadores do
Direito e que o Judiciário, muitas das vezes, prefere sustentar a existência de
supostos óbices formais para adentrar o mérito do pedido, principalmente em
razão do processo judicial ainda ser compreendido sob o prisma tradicional e
bilateral.
Nesse sentido,
ressalta Márcio Flávio Mafra Leal15 que “(...) a maneira clássica do
Poder Judiciário não reconhecer direitos e interesses difusos e coletivos é
adotar a solução ‘técnica’, que esconde todas essas pré-compreensões já
mencionadas num mecanismo pouco comprometedor: é a ‘impossibilidade jurídica do
pedido’, ‘ilegitimidade de parte’, ‘a falta de interesse de agir’. Buscam
desesperadamente o ‘indivíduo’ no conflito, pois sem ele não se consegue
trabalhar a ideia de ação judicial”.
Pois bem. O
gradativo acesso à Justiça de interesses de largo espectro social, notadamente
relacionados aos direitos fundamentais sociais, pode ser justificado com base
nas disfunções do sistema político, que não tem se mostrado devidamente
competente para lidar com as reivindicações legítimas que se apresentam na
sociedade, de modo que a população acaba procurando no instrumental jurídico as
soluções para todas as deficiências sociais.
Portanto, a
judicialização recorrente no Brasil é oriunda não de um exercício deliberado de
vontade política pelo Poder Judiciário, mas sim do modelo constitucional que o
país adotou, consistindo, em verdade, num fenômeno resultante de uma
transformação cultural profunda pela qual passaram os países que se organizam
politicamente em torno do regime democrático16.
Exemplo de
como a agenda do país se deslocou do Legislativo ao Judiciário é o fato de que
as audiências públicas e o julgamento acerca das pesquisas com células-tronco
embrionárias pelo STF tiveram muito mais visibilidade e debate público que o
processo legislativo que resultou na edição da referida lei.
Nesses casos,
é natural que o comando judicial venha a se projetar extra autos, não
por vontade do magistrado, mas sim porque essa eficácia expandida se mostra
inevitável, não se tratando de ativismo judicial, nos moldes reprobatórios que
se lhe tem emprestado.
E em se
tratando desse tipo de judicialização, José Reinaldo de Lima Lopes ressalta que
não basta o mero reconhecimento judicial do direito reclamado: “(...) a solução
natural não é um ato de adjudicação (típico do Judiciário), mas uma política
pública. Trata-se de uma solução que requer não apenas um reconhecimento de um
direito subjetivo e de um dar/entregar ou obrigar a dar/entregar alguma coisa
ou alguma quantia em dinheiro, mas um fazer ou prover um serviço público
(contínuo, ininterrupto, impessoal etc.)”17.
Nesse sentido,
a adjudicação judicial tradicional não se mostra compatível com a tutela
jurisdicional de direitos e interesses metaindividuais, especialmente os
difusos, vez que proferida em processo bilateral e retrospectivo, que se baseia
no modelo de custo-benefício/perdedor-ganhador/tudo ou nada/soma
zero, no qual uma coisa não pode pertencer concomitantemente a mais de uma
pessoa, engendrando justiça retributiva18.
1.3
Da judicialização do direito fundamental à saúde
Os direitos
fundamentais sociais, constantes do art. 6º da Carta Política,
consubstanciam-se em direitos constitucionais subjetivos, ou seja, dotados de
eficácia plena e de exigibilidade imediata, conforme dispõe o § 1º do art. 5º
deste diploma, segundo o qual “as normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata”. Ainda, esses direitos não são apenas os
constantes da Constituição Federal, podendo estar previstos também em tratados
internacionais, conforme soa o art. 5º, § 2º, da Carta Política brasileira.
Com efeito,
após o fenômeno da constitucionalização dos direitos fundamentais, tornaram-se
eles estrutura básica do Estado e da sociedade19, transformando-se
em elementos limitadores da ação estatal, de modo que esta, para ser legítima,
deve refletir e harmonizar os valores políticos e jurídicos reconhecidos
constitucionalmente.
E,
teoricamente, sendo as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais
de aplicação imediata (art. 5º, § 1º, CF/1988 (LGL\1988\3)) 20, pode-se
dizer que o direito à saúde deve ser entendido como imediatamente executável.
Todavia, como
os direitos sociais demandam regulamentação e investimento para se tornarem
concretizáveis, na classificação do direito constitucional acerca da eficácia
das normas constitucionais, trata-se de normas constitucionais de
eficácia/aplicabilidade limitada21, supostamente programática22,
porquanto impõem ao Poder Público o dever jurídico de implementá-los mediante o
planejamento de políticas públicas adequadas, cuja execução, como sabido,
envolve a edição de normas legais e regulamentares, e a prestação material de
serviços públicos, demandando a alocação e o dispêndio de recursos financeiros.
José Afonso da
Silva23, numa tentativa de explicar a compatibilidade do art. 5º, §
1º, da Constituição Federal – que dispõe que os direitos fundamentais são de
aplicação imediata – com a classificação atribuída às normas constitucionais
fixando o dever jurídico do Poder Público de assegurar prestações materiais
visando à concretização de direitos fundamentais sociais, sustenta: “Então, em
face dessas normas, que valor tem o disposto no § 1º, do art. 5º, que declara
todas de aplicação imediata? Em primeiro lugar, significa que elas são
aplicáveis até onde possam, até onde as instituições ofereçam condições para
seu atendimento. Em segundo lugar, significa que o Poder Judiciário, sendo
invocado a propósito de uma situação concreta nelas garantida, não pode deixar
de aplicá-las, conferindo ao interessado o direito reclamado, segundo as
instituições existentes”.
Contudo,
inviável se tachar de programática toda norma constitucional que causar
“incômodo” ao Estado, com o intuito de o desincumbir de seus deveres. O Supremo
Tribunal Federal, ao julgar diversos recursos e incidentes envolvendo o direito
à saúde (a título de exemplo, recurso extraordinário 271.286-AgR, agravo
regimental no agravo de instrumento 550.530, recurso extraordinário 368.564,
agravo regimental na suspensão de tutela antecipada 175, agravo regimental no
agravo de instrumento 734.487), entendeu que uma norma constitucional
programática não pode equivaler a uma promessa inconsequente.
No que toca ao
direito à saúde, nos moldes em que constituído (arts. 6º, 196 e seguintes,
CF/1988 (LGL\1988\3)), carecia de legislação e providências administrativas
para completar sua conformação. Assim, adveio a Lei Federal 8.080/1990 (Lei do
SUS), seu decreto regulamentador e outras normas correlatas, legislativas e
administrativas, nos âmbitos federal, estaduais e municipais, permitindo a
dispensação gratuita de fármacos como um direito social prestacional,
tutelável, pois, na esfera jurisdicional.
Assim,
passíveis de apreciação, e procedência, pedidos deduzidos em juízo relacionados
ao fornecimento de tratamentos médicos pelo SUS, vez que a faceta do programa
governamental de dispensação de medicamentos à população já possui
regulamentação suficiente, mostrando-se imediatamente judicializável.
Contudo, o
ajuizamento de ações relativas ao direito à saúde ocorre em maior parte pela
ausência do tratamento prescrito pelo médico na rede pública de saúde, nos
protocolos e diretrizes das políticas públicas existentes, sobre o que se
passará a tratar.
1.4
Do fenômeno da farmacialização do Judiciário
Como
mencionado, a busca judicial por tratamentos médicos gratuitos a serem
oferecidos pelo Estado ocorre majoritariamente quando o medicamento visado não
consta do rol de itens de dispensação obrigatória do SUS.
Nesse ponto,
ante o modo pelo qual ocorre o fenômeno ora retratado, esta autora passou a
denominá-lo de farmacialização do Judiciário, porque, na maioria das
vezes, nesses processos, o tratamento judicial é muito parecido com o
procedimento adotado em drogarias, nas quais o cidadão/paciente apresenta sua
receita médica e o farmacêutico/atendente entrega/vende o medicamento, com a
diferença de que, na rede pública de saúde, não há pagamento na forma direta,
mas tão somente na indireta, no que toca à arrecadação tributária.
O fenômeno da farmacialização
do Judiciário envolve, portanto, diversas partes, principalmente a Fazenda
Pública, o Poder Judiciário e o Poder Executivo.
Há, aliás,
inúmeras demandas judiciais veiculando esse tipo de pedido nos quais não há nem
mesmo produção de prova pericial, bastando, para a concessão do provimento
jurisdicional pretendido, a prova da recusa da Administração Pública em
fornecer o item pleiteado, bem como o relatório médico indicando a necessidade
do tratamento pleiteado.
Contudo, essa
expressão (farmacialização do Judiciário), cunhada originariamente pela
ora autora durante pesquisas realizadas durante o mestrado, não possui tom
exclusivamente pejorativo. Quer-se com ela, tão somente, retratar o fenômeno do
ajuizamento de um infindável número de ações individuais buscando a concessão
de medicamentos não constantes das listas de dispensação obrigatória do SUS
pelo Estado, casos em que raramente se tem a dilação probatória para se aferir
a real necessidade do tratamento requerido, bem como a atual condição clínica
do paciente/cidadão.
Com efeito, em
determinados casos, o fornecimento gratuito desses medicamentos por parte do
Estado pode gerar efeitos perversos nas políticas públicas de saúde então
existentes, provocando prejuízos à sociedade como um todo. Isso porque, como
regra, tais fármacos não são disponibilizados na rede pública de saúde, o que
enseja gastos públicos para além dos anteriormente previstos à consecução das
políticas públicas de saúde.
Nesse
contexto, vislumbra-se, claramente, a demonstração prática da “lógica do
cobertor curto”, cunhada por Octávio Luiz Motta Ferraz, segundo a qual, ao
puxar o cobertor para cobrir a cabeça, acaba-se desprotegendo os pés. No caso
das decisões judiciais determinando o fornecimento de tratamentos médicos, os
recursos para financiá-los beneficiariam outras milhares de pessoas, “puxando o
cobertor”, deixariam estes outros pacientes desamparados, “descobertos”.
Atualmente, há
um assoberbamento de demandas judiciais, buscando prestações de saúde pelo
Estado, julgadas procedentes, provocando a prolação de sentenças aditivas24
e transformando o Judiciário em ordenador de despesas estatais, atuando como um
verdadeiro administrador público.
Ainda, ante a
conhecida escassez de recursos, a consequência destes provimentos judiciais não
significa, ao contrário do que se imagina, a ampliação do acesso aos serviços
de saúde a camadas sociais anteriormente excluídas, mas sim uma parcial
substituição das prioridades de investimento estatal, antes estabelecidas por
especialistas em saúde pública do Executivo.
Como ressalta
Octávio Luiz Motta Ferraz25, “como as camadas mais desfavorecidas da
população ainda encontram obstáculos importantes no acesso à Justiça, essa
atitude implica não só problemas de eficiência, mas também riscos à equidade na
distribuição dos recursos escassos da saúde”.
Todavia, por
outro lado, sabe-se que, no caso específico da saúde, a atuação judicial acaba
sendo bastante delicada, porque decisões envolvendo alocação de recursos
públicos são enquadradas como “escolhas trágicas” (tragic choices) que,
segundo Guido Calabresi e Philip Bobbit26, geram conflitos: de um
lado, entre aqueles valores pelos quais a sociedade determina os beneficiários
da distribuição de determinados bens e o perímetro da escassez e, de outro
lado, os valores humanísticos que prezam pela vida e o bem-estar.
Cass Sunstein27,
no mesmo sentido, entende que, em muitas das vezes, os magistrados não percebem
estarem diante de health-health trade-offs, ou seja, não notam que, ao
proferir decisões obrigando o Estado a fornecer medicamentos para um paciente,
estão, concomitante e possivelmente, restringindo o direito à saúde de outros
pacientes, para os quais eventualmente não sobrarão mais recursos.
Noutro viés, a
farmacialização do Judiciário acaba sendo fomentada pela indústria
farmacêutica, que negocia com profissionais da área médica a distribuição de
bônus (comissão sobre as vendas, viagens, cursos no exterior etc.) no caso de
receitarem medicamentos por si produzidos que, como se sabe, não costumam
constar das listas de dispensação obrigatória do SUS.
Sob outro
ângulo, o Poder Judiciário também acaba sendo bastante afetado, principalmente
em razão do elevado número de demandas afetas ao tema.
Neste
diapasão, sendo a Constituição Federal de 1988 de cunho garantista, e constando
de seu art. 196 que o direito à saúde é direito de todos e dever estatal, e de
seu art. 5º, inc. XXXV, que qualquer lesão ou ameaça de lesão a direito é
passível de apreciação pelo Judiciário, não há dúvidas acerca da tendência
quase que certeira da procedência deste tipo de demanda.
Em verdade, em
se tratando de direito à saúde, sabe-se que há situações em que o paciente não
pode esperar pela vontade política de implementar determinadas ações de saúde
pública, motivo pelo qual muitos magistrados acabam concedendo o
medicamento/tratamento pleiteado em ação judicial individual, justamente em
razão da pressão psicológica e ético-moral que recai sobre o Judiciário,
principalmente em se tratando de doenças mais graves e/ou avançadas28.
É de ser
mencionado que o ajuizamento de ações individuais buscando o fornecimento de
medicamentos gera um impacto aparentemente menor que a propositura de uma
demanda coletiva, de modo que aquela forma de judicialização acaba fomentando a
justiça de misericórdia, pela qual o magistrado determina o fornecimento
do tratamento, em certas vezes, mais por motivos emocionais que verdadeiramente
técnicos29.
O Poder
Executivo, por sua vez, também acaba sendo atingido porque, de forma
insuficiente ou não, programou políticas públicas a serem implementadas em
longo prazo, que demandaram tempo e estudo, as quais tendem a ser atingidas
pela mudança de alocação dos recursos determinada pelo Judiciário.
Nesse ponto,
Luís Roberto Barroso30 explica que “(...) ao lado de intervenções
meritórias, tem havido uma profusão de decisões extravagantes ou emocionais em
matéria de medicamentos e terapias, que põem em risco a própria continuidade
das políticas públicas de saúde, desorganizando a atividade administrativa e
comprometendo a alocação dos escassos recursos públicos”.
Ainda, a
concessão judicial individual de medicamentos ou tratamentos
médico-hospitalares não consiste em promoção de política pública, vez que,
neste caso, ocorre a mera satisfação de direitos subjetivos individuais, não se
visando ao bem da sociedade como um todo, como preconiza o art. 3º da
Constituição Federal.
Diferente
seria se, através de ações coletivas, mais propriamente ações civis públicas,
houvesse revisão de políticas públicas, com sua correção ou implementação de
outras.
Isso porque,
em que pese não haver dúvidas de que o Judiciário se encontra em delicada
situação quando chamado para tutelar direitos fundamentais na forma individual
– não podendo ignorar que dependem de políticas públicas complexas –, o direito
à saúde deve ser interpretado como um direito à igualdade de condições, ou
seja, como equidade no acesso aos serviços de saúde que determinada sociedade
pode fornecer com os recursos disponíveis, o que somente ocorre por meio da
implementação de políticas públicas.
2
Do controle jurisdicional de políticas públicas
Como sabido,
os atos da Administração Pública são suscetíveis de controle por variados
órgãos e modalidades. Isso porque ela se sustenta sobre dois pilares: a
indisponibilidade e a supremacia do interesse público.
Assim, a
sujeição das atividades (atos, condutas e opções) administrativas do Poder
Público ao mais amplo controle, incluindo o controle judicial, é corolário do
Estado de Direito, no qual a lei, manifestação da vontade do povo, deve pautar
sua atividade.
Com efeito, da
ideia de controle judicial dos atos administrativos advém, ipso facto, o
controle judicial de políticas públicas, vez que estas são nada menos que atos
administrativos por meio dos quais o Estado coordena os meios a sua disposição
para o fim de harmonizar as atividades estatais e privadas, visando à
realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados.
No caso
específico do direito à saúde, sua judicialização se dá principalmente quando
inexiste política pública que atenda às necessidades do cidadão. Eventualmente
também se ajuíza uma demanda para coagir o ente público a cumprir programas de
saúde já existentes. Assim, da análise da jurisprudência afeta ao tema do
direito à saúde, infere-se que os litígios judiciais a ele relativos decorrem
basicamente das seguintes situações: (i) o SUS não fornece o medicamento
requerido em razão da falta de registro, negando-o a ANVISA em virtude de se
tratar de medicamento experimental, conforme o teor do art. 19-T, incs. I e II,
da Lei Federal 12.401/201131 ou (ii) o SUS não fornece regularmente
os medicamentos já constantes das listas de dispensação obrigatória.
Neste último
caso, a solução se torna mais fácil, vez que já existe política pública
contendo a obrigação do Estado disponibilizar certos fármacos à população. A
situação mais delicada é a primeira mencionada, quando o cidadão pleiteia
medicamento não constante das listas de dispensação obrigatória do SUS, quer
quando há registro na ANVISA, quer quando não há.
Com efeito,
inúmeros cidadãos pleiteiam, junto ao Poder Judiciário, cada vez mais, o
fornecimento gratuito por parte do Estado (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios) de medicamentos, próteses, órteses, realização de exames médicos e
cirurgias, suplementos vitamínicos, tratamentos médico-hospitalares, dentre
outros, quanto não logram obtê-los por via administrativa, sustentando,
usualmente, que as políticas públicas existentes não atendem as suas
necessidades.
No contexto da
judicialização do direito à saúde, o CEBEPEJ (Centro Brasileiro de Estudos e
Pesquisas Judiciais), juntamente à FGV (Fundação Getúlio Vargas), realizou
ampla pesquisa de jurisprudência, a respeito do assunto ora estudado, dos
Estados de São Paulo e Minas Gerais, tendo tirado as seguintes conclusões32:
(i) ações individuais de efeitos coletivos/ações pseudoindividuais são quase
inexistentes; (ii) ações coletivas têm baixíssima incidência; (iii) preponderam
as ações individuais, alimentando o fenômeno da litigância repetitiva, com
todas suas desvantagens (acúmulo de trabalho, decisões contraditórias, condução
atomizada de questões que poderiam ser agrupadas num tratamento único e
uniforme); (iv) ausência de iniciativa dos legitimados às ações coletivas para
aglutinarem as inúmeras demandas repetitivas, com pedidos idênticos e em face
do mesmo réu, ajuizando uma única ação coletiva (seja em defesa de direitos
coletivos, seja de direitos individuais homogêneos); e (v) a substituição da
proposta anterior pela propositura canhestra de demandas de natureza
individual, querendo que se passem por ações coletivas (ações pseudocoletivas).
A crítica a
ser feita quanto ao resultado desta pesquisa é de que o poder do Judiciário, no
caso das demandas relacionadas ao direito à saúde, não deveria ser apenas de
reparar, individualmente, os danos causados por uma política pública deficiente
ou equivocada, mas sim de forçar sua revisão, o que se tornaria possível em
sede de processo coletivo.
2.1
Eventuais faixas de insindicabilidade judicial
Como críticas
principais à judicialização do direito à saúde, tem-se: (i) a falta ou
insuficiência de informação e conhecimento dos magistrados para intervirem em
políticas públicas, também no que toca à alocação de recursos, que são escassos33;
(ii) a ausência de legitimidade democrática dos juízes para alocar estes
recursos; e (iii) a promoção de iniquidade social no que tange à distribuição
dos recursos públicos.
Por primeiro,
no debate sobre a tutela jurisdicional dos direitos sociais, um dos principais
argumentos contrários a essa judicialização, ou ao menos a favor de uma
judicialização restrita desses direitos, é a suposta ausência de informação e
conhecimento dos magistrados para intervirem em políticas públicas.
Sabe-se que a
efetivação dos direitos sociais se dá, originariamente, por meio da formulação
de políticas públicas, não da mera adjudicação pelo Poder Judiciário, porque,
ao menos em tese, incumbe ao processo político a tarefa de alocar recursos
escassos, por possuir maior “qualidade decisória”34. Neste contexto,
para promover a dignidade das pessoas por meio da concretização dos direitos
sociais, faz-se necessário empregar recursos públicos, que são escassos frente
aos compromissos estatais.
Nessa linha de
raciocínio, o magistrado, por meio da adjudicação, obriga os entes federados a
empregarem recursos do modo que bem entende, sem ter informações e conhecimento
suficientes para avaliar a oportunidade e a conveniência desta decisão
(critérios para se aferir a adequação de um ato administrativo), de modo que
não há análise dos custos de oportunidade em demandas individuais que
representam o que se deixou de ganhar em A por ter se decidido investir em B35.
Essa crítica
se faz frequentemente porque o Poder Judiciário é aparelhado originariamente
para dirimir lides individuais, não de espectro coletivo, restando
aparentemente remota a possibilidade de proferir decisões que ocasionem
consequências econômicas razoáveis no contexto das políticas públicas.
Isso porque
uma decisão judicial condenando o Estado a fornecer determinados medicamentos a
uma pessoa ou a um grupo de pessoas possui, de fato, o condão de minar esforços
de um planejamento de política pública de médio e longo prazo que beneficiaria
um maior número de pessoas, abrangendo um maior leque de enfermidades.
Virgílio
Afonso da Silva36 entende se tratar de ativismo judicial
despreparado, ocasionado pela lógica credor-devedor do sistema liberal, que
orienta as decisões judiciais a respeito desse assunto em sede de ações individuais.
A crítica
relacionada à ausência de informações por parte do Judiciário para intervir em
assuntos políticos também pode ser chamada de crítica de capacidade
instrumental ou crítica instrumental, vez que, dado o aparato instrumental
conferido ao Judiciário (inércia, princípio do dispositivo, independência do
processo político, necessidade de fundamentação principiológica, instrumentos
processuais vinculados à solução retrospectiva de conflitos bilaterais,
preclusão, vedação de decisão ultra, extra ou infra petita etc.),
em tese, este Poder não conseguiria lidar com macrolides.
Em verdade, a
judicialização da política seria um falso problema surgido do dogma positivista
da legalidade, segundo o qual a lei é fonte irrefutável e absoluta do Direito.
Segundo Elival
da Silva Ramos, ativismo judicial consiste na conduta jurisdicional que excede
os limites legais, ou seja, no “(...) exercício da função jurisdicional para
além dos limites impostos pelo próprio ordenamento que incumbe,
institucionalmente, ao Poder Judiciário fazer atuar, resolvendo litígios de
feições subjetivas (conflitos de interesse) e controvérsias jurídicas de
natureza objetiva (conflitos normativos)”.
E continua,
dizendo que o Poder Legislativo é o mais atingido pelo ativismo judicial, que
“tanto pode ter o produto da legiferação irregularmente invalidado por decisão
ativista (em sede de controle de constitucionalidade), quanto o seu espaço de
conformação normativa invadido por decisões excessivamente criativas.”37
Luís Roberto
Barroso38 entende que ativismo judicial é a escolha de interpretar a
Constituição de modo a expandir seu sentido e alcance, restando associado a uma
participação mais intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins
constitucionais.
Contudo, data
venia, não se deve entender que o ativismo judicial decorre do fato do
Judiciário procurar conferir o maior alcance possível às normas
constitucionais, porque, em verdade, é isso que se espera deste Poder,
principalmente em razão do princípio da máxima efetividade das normas
constitucionais (princípio da interpretação efetiva), que consiste em atribuir
sentido de maior eficácia a normas constitucionais, usando todas suas
potencialidades.
Disso se
conclui que, quando o Judiciário determina que a Administração Pública realize
determinadas prestações materiais para os cidadãos, não atua nos moldes do
ativismo judicial, mas, tão somente, adequa a atuação jurisdicional aos
comandos insculpidos na Constituição Federal, em razão da constante
judicialização de direitos fundamentais sociais.
Noutros
termos, a omissão de providências legislativas e administrativas reclamadas ao
Poder Público para concretizar normas assecuratórias de direitos fundamentais
sociais, de cunho prestacional, autorizaria o Judiciário a convolá-las em
normas de eficácia plena e aplicabilidade imediata, o que dá amparo a decisões
condenatórias em face do ente federativo omisso.
Foi neste
contexto das críticas à atuação judicial em sede de tutela do direito à saúde,
em razão da suposta falta de capacidade institucional e de conhecimentos, que
adveio a Recomendação 31/2010 do Conselho Nacional de Justiça39,
como produto da audiência pública de saúde promovida pelo STF (audiência 04, em
28.04.2009), por meio da qual sugeriu aos Tribunais “a adoção de medidas
visando melhor subsidiar os magistrados e demais operadores do direito, para
assegurar maior eficiência na solução das demandas judiciais envolvendo a
assistência à saúde”.
O CNJ também
editou a Resolução 107/2010, por meio da qual instituiu o Fórum Nacional do
Judiciário para monitoramento e resolução das demandas de assistência à saúde.
De certa
forma, sente-se falta de uma especialização mínima dos magistrados no tema do
direito à saúde, envolvendo todos os aspectos de sua judicialização. Nesse ponto,
conforme o art. 93, inc. II, c, da Constituição Federal, a aferição do
merecimento dos juízes deve dar-se conforme seu desempenho e pelos critérios
objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição, bem como pela
frequência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de
aperfeiçoamento40.
Assim, uma boa
ideia seria oferecer cursos oficiais de aperfeiçoamento sobre essa temática, o
que, aliás, restou definido pelos membros do Comitê Técnico de Formação e
Pesquisa (CTAF) 41 e da Escola Nacional de Formação e
Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM)42, que determinaram a
realização de pesquisa sobre a judicialização do direito à saúde,
objetivando-se estudar o tema com base nas políticas públicas de saúde já
previstas na legislação, de modo a assegurar o cumprimento das obrigações
assumidas pelo Estado por meio de decisões judiciais.43
Em
continuação, no que toca à dita falta de legitimidade democrática dos juízes
para decidir sobre o destino dos recursos públicos, argumenta-se que, num Estado
democrático, decisões relacionadas à alocação de verbas estatais devem ser
tomadas, com participação e contestação públicas, pelas instâncias políticas,
cujos membros foram democraticamente eleitos pelo povo (Legislativo como locus
por excelência do processo político), o que não ocorre com os integrantes
do Judiciário, que ingressam na carreira por meio de aprovação em concurso
público de provas e títulos ou, nas instâncias superiores, pelo quinto
constitucional.
Tratar-se-ia,
pois, da aplicação da teoria democrática, argumento que repousa na seguinte
premissa: “se o povo é o destinatário das políticas públicas e se é ele, povo,
que contribui para tanto por meio do recolhimento tributário, é ninguém menos
que ele, povo, quem deve decidir em que aplicar os recursos públicos”44.
Mas há
contrapontos ao argumento da teoria democrática, destacando-se o fato de que
(i) as decisões judiciais são melhor fundamentadas que aquelas tomadas pelos
outros Poderes, conforme exigido pelo art. 93, inc. IX, da Constituição
Federal; e (ii) o contraditório, marcando o debate processual, se mostra capaz
de levar ao magistrado argumentos mais consistentes sobre o interesse sub
judice.
Ainda, o
processo judicial é um instrumento para levar ao debate público direitos de
minorias que, por meio de processos políticos convencionais, provavelmente
nunca seriam ouvidas. Assim, o Judiciário mostra-se como locus adequado
para se definirem políticas públicas. Owen Fiss 45 sustenta que a
função do juiz não é falar pela maioria46, mas, sobretudo, conferir
significado aos valores constitucionais, buscando o que é justo, aduzindo que
não cabe confundir majoritarismo com atividade jurisdicional, com o que se
concorda.
Ainda que haja
vozes resistentes quanto a esta nova função do Judiciário, o controle
jurisdicional sobre políticas públicas é uma realidade. Contudo, a atuação
judicial não pode ser absolutamente ilimitada, devendo pautar-se em critérios
previamente estabelecidos.
No julgamento
da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 45, o Supremo Tribunal
Federal, em que pese ter extinguido o processo em razão da superveniente perda
do objeto, asseverou que a efetivação do direito à saúde se vincula à garantia
de proteção ao mínimo existencial, devendo-se interpretar com reservas a
alegação de reserva do possível, também conhecido como reserva do
financeiramente possível, por parte do Estado.
Neste julgado,
o STF elencou os limites básicos à intervenção judicial em políticas públicas,
a saber: (i) a razoabilidade da pretensão deduzida perante o Poder Judiciário,
que deve envolver o mínimo existencial; (ii) a irrazoabilidade da
conduta da Administração Pública; e (iii) a suficiente disponibilidade
orçamentário-financeira (cláusula da reserva do possível).
Esse
julgamento acabou consistindo num controle de constitucionalidade de lei
orçamentária, caso violasse comandos constitucionais, especialmente direitos
fundamentais47. Ada Pellegrini Grinover entende que “a observação
destes limites é suficiente para coibir os excessos na intervenção judicial em
políticas públicas”.
Noutros
termos, entende-se que, em sendo observadas tais restrições, não se
consubstanciaria num ativismo judicial despreparado, mas sim num controle de
constitucionalidade dos atos da Administração48, atos esses
exteriorizados na forma de políticas públicas.
Em relação ao
primeiro limite elencado, tem-se por pretensão razoável aquela que se pauta no
princípio da proporcionalidade, ou seja, quando prima pelo justo equilíbrio
entre os meios empregados e os fins a serem alcançados. José Joaquim Gomes
Canotilho49 denomina o princípio da proporcionalidade como
“princípio da proibição de excesso”, subdividindo-o em três subprincípios: (i)
adequação/conformidade; (ii) necessidade/exigibilidade; e (iii)
proporcionalidade strictu sensu. Assim, para aferir se a pretensão
deduzida em juízo é razoável, devem ser aplicados os subprincípios numa ordem
lógica e sucessiva, de modo que uma medida pode ser adequada, porém inexigível,
logo, pois, desproporcional.
Em se tratando
do direito à saúde, a jurisprudência nacional é mansa e pacífica no sentido de
que o fato de um medicamento não estar incluído em programa oficial de
distribuição de fármacos não pode comprometer seu fornecimento a quem dele
precise.
Assim,
eventual ausência do cumprimento de formalidade burocrática não pode
obstaculizar o fornecimento de medicação indispensável à cura e/ou à minoração
do sofrimento de portadores de moléstia grave que não dispõem de condições
financeiras para custear o tratamento.
Em
continuação, por pretensão que se refira ao mínimo existencial, deve-se
entender aquilo que é essencial para a vida de uma pessoa, consistindo no
núcleo duro central do princípio da dignidade humana50. Segundo Ana
Paula de Barcellos51, constitui-se pelas condições básicas à
existência e corresponde à parcela do princípio da dignidade da pessoa humana à
qual se deve reconhecer eficácia jurídica e simétrica, podendo ser
judicialmente exigida em caso de inobservância.
Contudo, não
há definição única e/ou propriamente adequada, porque o mínimo existencial
vai depender da situação apresentada em juízo, variando conforme o caso
concreto. Em geral, consiste no direito à educação básica, à saúde básica, ao
saneamento básico, à assistência social, à tutela do meio ambiente e ao acesso
ao Judiciário52. Trata-se, assim, de conceito indeterminado, mas
determinável no caso concreto.
Gustavo Amaral53,
acompanhando posição esposada por Lobo Torres e Robert Alexy, afirma que “a
determinação concreta do mínimo existencial seria fugidia e variável
histórica e geograficamente. Haveria, portanto, uma ampla zona de transição
entre o mínimo existencial e o ‘não mínimo’”. E conclui: “Caberá ao
aplicador ponderar (...), de modo que se a essencialidade for maior que a
excepcionalidade, a prestação deve ser entregue, caso contrário, a escolha
estatal será legítima”.
Nessa seara,
Kazuo Watanabe54 distingue três tipos de interesses/direitos
fundamentais sociais sob a perspectiva de sua justiciabilidade imediata: (i) os
correspondentes ao núcleo básico do princípio da dignidade humana; (ii) os
previstos em normas constitucionais de densidade suficiente, de modo que
passíveis de judicialização independentemente de prévia ponderação pelo
Executivo e pelo Legislativo, ainda que não se refiram ao mínimo existencial; e
(iii) os demais direitos fundamentais sociais, previstos em normas
constitucionais de cunho programático. Assim, apenas as duas primeiras
categorias mencionadas seriam imediatamente judicializáveis.
Por fim,
independentemente de se tratar ou não do mínimo existencial, nos termos
mencionados, como bem anotado por Ana Carolina Lopes Olsen55, esse mínimo
jamais poderá ser entendido como o máximo a ser prestado pelo
Estado: “(...) além da fundamentalidade formal reconhecida aos direitos
sociais, não se pode deixar de observar que sua fundamentalidade material
extravasa o conteúdo do mínimo existencial. Afinal, preocupou-se o constituinte
com a dignidade da pessoa humana (como um todo, e não em sua versão minimalista),
com o valor social do trabalho, com a construção de uma sociedade livre, justa
e solidária, com a erradicação da pobreza e da marginalidade, e, finalmente,
com a promoção do bem de todos (CF (LGL\1988\3), arts. 1º e 3º)”.
Assim, o mínimo
existencial não representa o máximo a ser prestado pelo Estado, mas
sim o padrão mínimo a ser observado por ele.
No que toca ao
segundo limite arrolado, tem-se por irrazoável a conduta desvirtuada dos fins
estatais. Nesse ponto, a razoabilidade é mais fácil de ser sentida que
definida. É o princípio que, cada vez mais, se mostra fundamental ao Estado de
Direito contemporâneo, no âmbito de todos os Poderes estatais (o Legislativo,
no tocante à constitucionalidade das leis; o Executivo, no tocante à
discricionariedade dos atos administrativos; o Judiciário, que deve pautar suas
decisões também nesse princípio).
A
razoabilidade, portanto, possui a função de desenvolver a hermenêutica
constitucional, transcendendo, pois, os limites do positivismo jurídico,
permeando todo o Direito, com ele se confundindo.
Assim, em que
pese de difícil conceituação, pode-se considerar uma conduta como irrazoável
quando não se pauta no bom senso, nos valores de justiça e isonomia.
Já a cláusula
da reserva do possível56 pode ser considerada um limite
fático ou jurídico. Trata-se de limite fático quando compreendida em termos
absolutos, pois, como sabido, os recursos estatais são finitos. Por outro lado,
são infinitas as necessidades sociais, precipuamente em razão dos direitos
fundamentais de segunda geração/dimensão (dare, facere, praestare), o
que traz a necessidade da Administração Pública tomar delicadas decisões.
Como
argumentam Octávio Luiz Motta Ferraz e Fabiola Sulpino Vieira57,
“ainda que soubéssemos exatamente que políticas são eficazes para se garantir o
mais alto grau de saúde possível a toda a população, seria impossível
implementar todas essas políticas”.
Já a reserva
do possível como limite jurídico se relaciona à necessidade de autorização
orçamentária para se despender recursos públicos. Isso porque a Constituição
Federal de 1988 transformou o orçamento público num relevante instrumento de
governo, tanto para o desenvolvimento econômico, quanto para o sociopolítico58,
tendo estabelecido um encadeamento de três leis que se sucedem e se
complementam: a Lei do Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA). Nesse sistema, todos os
programas governamentais devem estar em harmonia com o plano plurianual, nos
termos do art. 165, § 4º, da Constituição Federal, e a LDO deverá estar em
harmonia com o PPA, nos termos do art. 166, § 4º, da Carta Política.
Nesses moldes,
em face do princípio da legalidade da despesa pública, o administrador deve
observar as autorizações e limites constantes das leis orçamentárias (art. 167,
inc. II, CF/1988 (LGL\1988\3)), sob pena de crime de responsabilidade (art. 85,
inc. VI, CF/1988 (LGL\1988\3)). Ao mesmo tempo em que se deve atentar aos
limites orçamentários, deve-se visar à consecução dos fins estatais. Como
menciona Fernando Facury Scaff59, o legislador e o administrador não
têm liberdade/discricionariedade total para incluir nesse sistema de
planejamento o que bem entenderem.
Assim, para
que o Judiciário determine o fornecimento gratuito de medicamentos por parte do
Estado, deve ter alguma noção do impacto orçamentário para saber se, de fato,
haveria condições do ente federado cumprir a ordem judicial. É certo, contudo,
que a alegação de falta de disponibilidade financeira por parte do Estado não costuma
impressionar os magistrados, porquanto notória a ausência de compromisso com as
peças orçamentárias, bem como se sabe da ampla possibilidade de remanejar os
recursos públicos.
Sabe-se que os
entes federados frequentemente invocam a cláusula da reserva do possível numa
tentativa de se esquivar do cumprimento de políticas públicas ou de decisões
judiciais. Como assinala Ana Paula Barcellos60, “na ausência de um
estudo mais aprofundado, a reserva do possível funcionou muitas vezes
como o mote mágico, porque assustador e desconhecido, que impedia qualquer
avanço na sindicabilidade dos direitos sociais”.
Nessa
hipótese, em que pese ser de difícil comprovação, a eles caberá demonstrar essa
ausência de recursos, quer relativa, quer absoluta, também conhecida como exaustão
orçamentária. Ada Pellegrini Grinover61 entende que caberá a
eles fazer prova do alegado, em analogia ao art. 6º, inc. VIII, do CDC
(LGL\1990\40) e nos termos do art. 373 do CPC/2015 (LGL\2015\1656).
Nesse
contexto, não se deve admitir a intervenção judicial a qualquer custo, porque
prestações positivas, embora sempre reivindicáveis, não são passíveis de
satisfação integral e permanente.
Todavia, ao se
fazer uma análise mais realista, sabe-se que decisões judiciais na seara da
saúde são especialmente delicadas, uma vez que se trata da vida. Assim, é
compreensível a preocupação dos juízes sobre o risco dos direitos fundamentais
serem negligenciados sob o pretexto de se tratarem de normas programáticas62,
isto é, sem eficácia plena, o que faz com que desconsiderem, na maioria das
decisões, a questão orçamentária63.
No caso de
suposta incapacidade financeira do Poder Público, devidamente comprovada, José
Reinaldo de Lima Lopes64 sugere que o Judiciário profira uma decisão
progressiva, fixando metas e prazos ao Estado para que realize novos
investimentos, à semelhança do que faz nos processos de falência, recuperação
judicial de empresas e alimentos.
Pois bem. Da
análise dos três critérios mencionados, elencados como limites do Judiciário no
controle de políticas públicas, questiona-se: são suficientes para estabelecer
claros limites a esta intervenção?
A resposta é
negativa, restando nítida a necessidade de se fazer uma análise casuística da
demanda, a depender da natureza dos direitos envolvidos. Por exemplo, o mínimo
existencial em se tratando do direito à saúde é diferente do mínimo
existencial em relação ao direito à educação. Além disso, o que um
magistrado tem por bom senso pode não ser exatamente o que outro membro do
Judiciário entenda, dentre diversos outros aspectos. Destarte, não há claros
limites ao controle judicial de políticas públicas.
Por fim,
sustenta-se que a tutela judicial do direito à saúde, na forma como vem
ocorrendo, gera iniquidade na distribuição dos recursos, porque não beneficia
principalmente os mais pobres, que acabaram ficando à margem do sistema, de
modo que apenas uma pequena parcela, já favorecida, da população é protegida,
pois facilmente supera os custos do processo (físicos, financeiros, sociais,
culturais, de informação etc.).
Em suma, como
se justificaria a grande quantidade de decisões judiciais determinando como o
orçamento público65 deve ser gasto, sobrepondo-se tais provimentos
às decisões tomadas pelos gestores públicos?
À medida que
se foram estreitando as faixas de insindicabilidade judicial dos atos e
condutas da Administração Pública, ocasionou-se uma potencialização da
abordagem judicial, reconhecendo-se ao Judiciário, cada vez mais, legitimidade
para participar das escolhas primárias do Estado e das opções políticas feitas
na gestão da coisa pública.
Pode-se
afirmar, ainda, que é o próprio processo judicial, com o devido contraditório,
que legitima a intervenção em políticas públicas, bem como a independência
funcional dos magistrados. Assim, a legitimação do Judiciário decorre da força
normativa da Constituição e das leis, além de se tratar de um poder inerte e
imparcial, estando sua autoridade fundamentada, ao menos na teoria, em sua
capacidade de fundamentar racional e adequadamente suas decisões. É ai, pois,
que reside sua legitimidade para coparticipar do processo de criação do
Direito: na sua capacidade de justificar suas decisões com fulcro na
Constituição.
2.2
Outras críticas ao controle jurisdicional de política pública
Outro óbice
bastante empregado para se criticar a intervenção judicial em políticas
públicas é a suposta impossibilidade do Judiciário se imiscuir nos atos
administrativos, que são realizados conforme análise da conveniência e da
oportunidade pelo administrador público, de modo discricionário.
Em síntese, o
ato administrativo é passível de ser controlado pelo Poder Judiciário,
inclusive seu mérito que, embora de cunho discricionário, deve observar a
legalidade lato sensu, que envolve o Direito como um todo (normas e
princípios), de modo a se adequar aos escopos constitucionais, especificamente
para que os princípios que regem a Administração, como a moralidade, a
legalidade, a impessoalidade, a publicidade e a eficiência, sejam devidamente
observados.
Nesse contexto
é que surge o controle judicial de políticas públicas, podendo ser
compreendidas como um conjunto de atos administrativos (tomada de decisões,
planejamento e execução dos programas).
O Judiciário
possui legitimidade para intervir em assuntos políticos quando (i) for
identificada uma disfunção política da Administração Pública66,
devendo impedir a inércia dos demais Poderes para concretizar as garantias
constitucionais67, e (ii) for capaz de fundamentar racionalmente
suas decisões com fulcro na Constituição Federal.
O controle da
legalidade e da adequação das políticas públicas pode ser realizado pelo Poder
Judiciário, quando provocado e sempre a posteriori, por meio de qualquer
espécie de demanda, sendo certo que, para efeitos processuais, é a natureza do
provimento que realmente releva.
Assim,
qualquer tipo de ação pode ser utilizada para provocar o Judiciário a exercer o
controle das políticas públicas, não importando sua espécie: se meramente
declaratória, se constitutiva ou condenatória, se mandamental ou executiva lato
sensu.
E o direito à
saúde, tendo natureza bidimensional, ou seja, possuindo uma dimensão coletiva e
uma individual, é pedido juridicamente admissível tanto na forma de ação
individual, estando o cidadão como detentor de direito subjetivo a medicamentos
gratuitos, quanto na forma de ação coletiva (ação civil pública), quando um
legitimado pleiteia correção ou implementação de política pública visando
alcançar todos os beneficiários do SUS (em tese, a população como um todo).
3
Considerações finais
Um dos
direitos fundamentais sociais que têm tido excessivo acesso à Justiça é o
direito à saúde, via demandas individuais, por meio das quais inúmeros cidadãos
buscam o fornecimento gratuito de medicamentos por parte do Estado, fármacos
estes não incluídos nas listas oficiais dos programas oferecidos pelo governo.
Na esmagadora
maioria das vezes, o Judiciário defere o pedido da parte autora, determinando o
fornecimento do fármaco, de modo que, no plano macro, equivale à metáfora do
“cobertor curto”, na qual, ao puxar o cobertor para cobrir a cabeça, acaba-se
desprotegendo os pés. Ou seja, acaba-se deixando outros milhares de cidadãos
desamparados, “descobertos”. Isso porque tão somente as pessoas que logram
superar os custos do processo (físicos, emocionais, financeiros, sociais,
culturais, de informação etc.) têm a chance de conseguir outros medicamentos,
além do que, muito provavelmente, os recursos públicos necessários ao
cumprimento das inúmeras ordens judiciais seriam retirados dos programas de
saúde já existentes.
O que se
deveria incentivar é a revisão ou implementação de políticas públicas de saúde
pela via judicial, especificamente em sede de processo coletivo (ação civil
pública), não a adjudicação judicial tradicional em face de demandas
individuais sem a projeção de efeitos extra autos.
4
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1 O acesso à
Justiça pode ser visto como um direito fundamental, vez que, ao mesmo tempo em
que declara a existência de interesse dos cidadãos, é por meio dele que outros direitos
fundamentais poderão ser concretizados (norma declaratória). Sob a ótica de
garantia, ele assegura o exercício do interesse (norma assecuratória). Já como
princípio, deve reger a interpretação e o desenvolvimento do ordenamento
jurídico.
2 Art. 5º,
inc. XXXV, CF/88 (LGL\1988\3). “A lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”. BRASIL. Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
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3 Art. 3º,
CF/88 (LGL\1988\3). “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa
do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir
o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais e regionais e; IV – promover o bem de todos,
sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação”. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Disponível em: [www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm].
4 É preferível
empregar o vocábulo “dimensão” em se tratando de direitos fundamentais, porque
seu estudo deve ser orientado por uma visão integral, marcada pela
indivisibilidade e pela interdependência dos direitos clássicos de liberdade e
dos direitos sociais, econômicos e culturais. Nesse ponto, compactuamos da
opinião de Paulo Bonavides, segundo o qual “o vocábulo ‘dimensão’ substitui com
vantagem lógica e qualitativa, o termo ‘geração’, caso este último venha a
induzir apenas sucessão cronológica e, portanto suposta caducidade dos direitos
das gerações antecedentes, o que não é verdade”. BONAVIDES, Paulo. Curso de
direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 571-572.
5 Também são
chamados de direitos prestacionais, classificados pela doutrina em (i) direitos
à proteção; (ii) direitos à organização e procedimento; e (iii) direitos
prestacionais em sentido estrito ou, simplesmente, direitos fundamentais
sociais.
6 O
complemento infraconstitucional do acesso à Justiça se encontra no art. 140 do
Código de Processo Civil, segundo o qual “O juiz não se exime de decidir sob a
alegação de lacuna ou obscuridade do ordenamento jurídico”. “No julgamento da
lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à
analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito”. BRASIL. Lei n.
13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em:
[www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm]. O art. 4º da
Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) reitera esse dever,
dispondo que “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a
analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. BRASIL. Decreto-lei
n. 4.657, de 4 de setembro de 1942. Disponível em:
[www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm].
7 DIDIER
JUNIOR, Fredie. Direito à inafastabilidade do Poder Judiciário. In:
LEÃO, Adroaldo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo (coords.). Direitos
constitucionalizados. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 172.
8 MARINONI,
Luiz Guilherme. O direito à efetividade da tutela jurisdicional na perspectiva
da teoria dos direitos fundamentais. Revista de Direito Processual Civil.
n. 28, v. 8, Curitiba, abr.-jun. 2003.
10 Também
chamada de governo dos juízes, judiciarismo, judiciocracia, ativismo
judicial, judicização do fato político.
11 Por
exemplo, a política de recursos hídricos e geração de energia (construção de
hidrelétrica de Belo Monte) e de irrigação do semiárido mediante a captação das
águas do Rio São Francisco.
12 MANCUSO,
Rodolfo de Camargo. Acesso à Justiça: condicionantes legítimas e
ilegítimas. 2. ed. São Paulo: RT, 2015. p. 83.
13 Com efeito,
esses conflitos multiplexos envolvem, por exemplo, a política carcerária, o
meio ambiente (art. 225, CF/88 (LGL\1988\3), “meio ambiente ecologicamente
equilibrado”), o direito à moradia (art. 6º, CF/88 (LGL\1988\3)), o direito à
educação, também a crianças especiais (arts. 6º, 205 e seguintes, CF/88
(LGL\1988\3)), o direito à saúde (arts. 6º, 196 e seguintes, CF/88
(LGL\1988\3)), o direito à probidade administrativa na gestão governamental
(art. 37, caput, CF/88 (LGL\1988\3)), entre outros.
14 MANCUSO,
Rodolfo de Camargo. A projetada participação equânime dos colegitimados à
propositura da ação civil pública: da previsão normativa à realidade forense. Revista
dos Tribunais. n. 796, fev. 2002.
15 LEAL,
Márcio Flávio Mafra. A ação civil pública e a ideologia do Poder Judiciário: o
caso do Distrito Federal. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul.
n. 35, 1995.
16 “Ademais,
há fatores políticos que condicionam o grau de judicialização vivenciado por
uma dada sociedade. Dentre eles, podemos mencionar: a) o grau de
(in)efetividade dos direitos fundamentais (núcleo compromissório da
Constituição); b) o nível de profusão legislativa com o consequente
aumento da regulamentação social; c) o nível de litigiosidade que se
observa em cada sociedade. Na medida em que aumentam os indicadores de
inefetividade dos Direitos Fundamentais, os índices de produção legislativa, e
da litigiosidade social, também aumentará o nível de judicialização.” TOMAZ DE
OLIVEIRA, Rafael. Judicialização não é sinônimo de ativismo judicial. Revista
Consultor Jurídico. 01.12.2012. Disponível em:
[www.conjur.com.br/2012-dez-01/diario-classe-judicializacao-nao-sinonimo-ativismo-judicial].
Acesso em: 02.12.2015.
17 LOPES, José
Reinaldo de Lima. Direitos sociais: teoria e prática. São Paulo: Método,
2006. p. 120.
18 Ana Cláudia
Vergamini Luna enfatiza a necessidade das ações judiciais que impliquem o
controle de políticas públicas não serem vistas sob a ótica do tudo ou nada,
porque seu resultado deve beneficiar toda a sociedade, não trazer vitória ou
derrota para um dos litigantes. LUNA, Ana Claudia Vergamini. Direitos sociais:
controle jurisdicional de políticas públicas, limites e possibilidades.
Dissertação (Mestrado). Faculdade de Direito da USP, São Paulo, 2012.
19 CANOTILHO,
José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7.
ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 379.
20 “Todas as
normas definidoras de direitos fundamentais, sem exceção, têm aplicabilidade
imediata, independentemente de concretização legislativa, o que permite que o
titular do direito desfrute da posição jurídica por ele consagrada. Na hipótese
de eventual omissão estatal, impeditiva de gozo desses direitos, pode e deve o
Judiciário, como Poder apto a proporcionar a realização concreta dos comandos
normativos quando provocado por qualquer meio processual adequado, suprir
aquela omissão, completando o preceito consignador de direitos diante do caso
concreto.” CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Controle judicial das omissões do Poder
Público. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 664.
21 Para José
Afonso da Silva, a clássica distinção acerca da eficácia das normas
constitucionais estabelecido pelo Direito Constitucional estadunidense (self-executing
provisions e not self-executing provisions) não se mostra
adequado, sustentando que estas normas, em verdade, se classificariam em três
categorias: eficácia plena, eficácia contida e eficácia limitada, sendo que nos
dois primeiros grupos teriam elementos suficientes para incidir imediatamente
sobre a matéria que lhes constitui objeto, com a diferença de que, no que toca
às normas de eficácia contida, poderia haver sua restrição por legislação
superveniente. Já as normas de eficácia limitada careceriam de plenas condições
técnico-jurídicas para a direta e imediata regulação da matéria que pretende
disciplinar.
22 José Joaquim
Gomes Canotilho se refere a quatro modelos de positivação dos direitos
econômicos e sociais: (i) normas programáticas; (ii) normas de organização;
(iii) normas que atuam como garantias institucionais; e (iv) normas que
asseguram autênticos direitos públicos subjetivos. Este último consubstancia
normas constitucionais de eficácia plena. Os dois modelos intermediários tratam
de normas de eficácia limitada de cunho preceptivo. Predomina o primeiro
modelo, que usa normas constitucionais de eficácia limitada de natureza
programática na positivação de direitos sociais, quando se menciona que “as
normas consagradoras de direitos sociais, econômicos e culturais são, segundo
alguns autores, normas programáticas”.
23 SILVA, José
Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 8. ed. São Paulo:
Malheiros, 2012. p. 165.
24 Entende-se
por sentença aditiva aquela que implica aumento de custos ao erário,
obrigando-o a reconhecer um direito social não previsto originalmente no
orçamento. SCAFF, Fernando Facury. Sentenças aditivas, direitos sociais e
reserva do possível. In: SARLET, Ingo Wolfgang; TIMM, Luciano Benetti
(orgs.). Direitos Fundamentais: orçamento e reserva do possível.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 133.
25 FERRAZ,
Octávio Luiz Motta. Direito à saúde, escassez e Judiciário. Folha de São
Paulo, 10.08.2007. Disponível em:
[www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1008200709.htm].
26 CALABRESI,
Guido; BOBBIT, Philip. Tragic choices. New York: W. W. Norton Company,
1978. p. 18.
27 SUNSTEIN,
Cass. Health-health trade-offs. Free Markets and social justice. New
York: Oxford University Press, 1997. p. 298.
28 “É
preferível antecipar a esperança da vida do que (sic) abreviar o caminho
da morte” (Rel. Des. Gaspar Rubik – AI n. 9872, Tribunal de Justiça de Santa
Catarina.)
29 “A imagem
de que o juiz, ao conceder um tratamento, está salvando um paciente da omissão
estatal não corresponde à realidade do que é a judicialização da saúde.
Diversos estudos acadêmicos têm apontado que grande parte das ações judiciais
pedem tratamentos para os quais existem alternativas disponíveis no sistema de
saúde, e tratamentos sem nenhuma comprovação científica, em fase experimental
ou para um uso diferente daquele para o qual foram registrados na Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (o chamado off-label). Em outras palavras, os
juízes estão concedendo tratamentos cuja necessidade, segurança e eficácia são,
no mínimo, duvidosas.” FERRAZ, Octávio Luiz Motta; WANG, Daniel Wei Liang.
Fosfoetanolamina – A proteção judicial à medicina sem base em evidência. JOTA,
08 nov. 2015. Disponível em:
[http://jota.info/a-protecao-judicial-a-medicina-sem-base-em-evidencia]. Acesso
em: 08 dez. 2015.
30 BARROSO,
Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.
Atualidades jurídicas. Revista do Conselho Federal da OAB. n. 4,
jan.-fev. 2009.
31 Art. 19-T.
“São vedados, em todas as esferas de gestão do SUS: I – o pagamento, o
ressarcimento ou o reembolso de medicamento, produto e procedimento clínico ou
cirúrgico experimental, ou de uso não autorizado pela Agência Nacional de
Vigilância Sanitária – ANVISA; II – a dispensação, o pagamento, o ressarcimento
ou o reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na
Anvisa.” Brasil. Lei n. 12.401, de 28 de abril de 2011. Disponível em:
[www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12401.htm]. Acesso em:
23.12.2014.
32 GRINOVER,
Ada Pellegrini; SICA, Ligia Paula Pires Pinto (coords.). Avaliação da prestação
jurisdicional coletiva e individual a partir da judicialização da saúde. São
Paulo: CEBEPEJ; FGV, 2014.
33 Para as
instâncias políticas, o Judiciário intervém demais. Para o mercado, é muito
oneroso. Para a sociedade, não funciona.
34 BUCCI,
Maria Paula Dallari. Políticas públicas e direito administrativo. Revista de
Informação Legislativa. n. 133, v. 34, Brasília, 1997.
35
VASCONCELOS, Manuel Antonio S.; GARCIA, Manuel E. Fundamentos da economia.
São Paulo: Saraiva, 2002. p. 70.
36 AFONSO DA
SILVA, Virgílio. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e
eficácia. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 596.
37 RAMOS,
Elival da Silva. Ativismo judicial: parâmetros dogmáticos. São Paulo:
Saraiva, 2010. p. 129.
38 BARROSO,
Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.
Atualidades Jurídicas. Revista do Conselho Federal da OAB. n. 4,
jan.-fev. 2009.
39 Brasil.
Conselho Nacional de Justiça. Recomendação nº 31, de 30 de março de 2010.
Disponível em: [www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento="1195]."
Acesso em: 13.08.2014.
40 Aliás,
mister mencionar que o art. 29 do Código de Ética da Magistratura preceitua que
um dos fundamentos do direito dos jurisdicionados e da sociedade em geral é a
exigência de conhecimento e de capacitação permanente dos magistrados,
visando-se à prestação de um serviço de qualidade pela Justiça.
41 Criado pela
Resolução 6 da ENFAM, de 28 de abril de 2014, o Comitê Técnico de Formação e
Pesquisa é formado por trinta e três magistrados indicados pelas escolas
judiciais e da magistratura federal para exercer mandato de dois anos,
funcionando como órgão auxiliar do Conselho Superior na definição de diretrizes
e conteúdos programáticos dos cursos oficiais.
42 A Resolução
159/2012 do CNJ (DJE/CNJ 208, de 13.11.2012, p. 3-4), dispondo sobre a formação
de magistrados e servidores do Judiciário, determinou que a regulamentação de
cursos oficiais para o ingresso, formação inicial e o aperfeiçoamento de
magistrados e servidores compete à Escola Nacional de Formação e
Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM), no âmbito das justiças estaduais e
federal, à Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do
Trabalho (ENAMAT), na justiça trabalhista e ao Centro de Estudos Judiciários da
Justiça Militar da União (CEJUM), na justiça militar. Disponível em:
[www.cnj.jus.br]. Acesso em: 28.10.2014.
43 Brasil.
Superior Tribunal de Justiça. Judicialização da saúde será tema da primeira
pesquisa da ENFAM e escolas judiciais. Disponível em:
[www.enfam.jus.br/2015/03/judicializacao-da-saude-sera-tema-da-primeira-pesquisa-da-enfam-e-escolas-judiciais/].
Acesso em: 06.06.2015.
44 SABINO,
Marco Antonio da Costa. Quando o Judiciário ultrapassa seus limites
constitucionais e institucionais: o caso da saúde. In: GRINOVER, Ada
Pellegrini; WATANABE, Kazuo (coords.). O controle jurisdicional de políticas
públicas. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 363.
45 FISS, Owen.
Um novo processo civil: estudos norte-americanos sobre jurisdição,
constituição e sociedade. Trad. Daniel Porto Godinho da Silva. Coord. Carlos
Alberto de Salles. São Paulo: RT, 2004. p. 36-37.
46 Aliás, um
dos grandes papéis de uma Constituição é proteger valores e direitos
fundamentais, mesmo que contra a vontade circunstancial de quem tem mais votos.
47 Brasil.
Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.
45. Rel. Min. Celso de Mello, j. 29.04.2004, p. 04.05.2004. Disponível em:
[www.stf.jus.br]. Acesso em: 10.07.2014.
48 Outros
conflitos de largo espectro político e social também já têm critérios definidos
para que se considere necessária uma intervenção judicial para o fim de se
implementar uma reforma estrutural. Segundo aponta Carlos Alexandre de Azevedo
Campos, citado na petição da ADPF 347 (proposta em maio de 2015 pelo Partido
Socialista e Liberdade – PSOL, que requereu ao STF que declarasse a situação
atual do sistema penitenciário brasileiro, que viola preceitos fundamentais
constitucionais e, em especial, dos presos), para reconhecer o estado de coisas
inconstitucional, exige-se a presença dos seguintes requisitos: (i) vulneração
massiva e generalizada de direitos fundamentais de um número significativo de
pessoas; (ii) prolongada omissão das autoridades no cumprimento de suas
obrigações para garantia e promoção dos direitos; (iii) a superação das
violações de direitos pressupõe a adoção de medidas complexas por uma
pluralidade de órgãos, envolvendo mudanças estruturais, que podem depender da
alocação de recursos públicos, correção das políticas públicas existentes ou
formulação de novas políticas, dentre outras medidas; e (iv) potencialidade de
congestionamento da justiça, se todos os que tiverem os seus direitos violados
acorrerem individualmente ao Poder Judiciário. BRASIL. Supremo Tribunal
Federal. Informativo 798. Disponível em:
[www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo798.htm]. Acesso em:
10.12.2015.
49 CANOTILHO,
José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1992. p.
617.
50 O art. 7º
do PL 8.058/2014 dispõe que “se o pedido envolver o mínimo existencial ou bem
da vida assegurado em norma constitucional de maneira completa e acabada, o
juiz poderá antecipar a tutela, nos termos do art. 273 do Código de Processo
Civil (...) Parágrafo único. (…) Considera-se mínimo existencial, para efeito
desta lei, o núcleo duro, essencial, dos direitos fundamentais sociais
garantidos pela Constituição Federal, em relação ao específico direito
fundamento invocado, destinado a assegurar a dignidade humana”.
51 BARCELLOS,
Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o
princípio da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 248,
252-253, passim.
52 ROCHA
JUNIOR, Paulo Sergio Duarte da. Controle jurisdicional de políticas públicas.
Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Direito da USP, São Paulo, 2009.
53 AMARAL,
Gustavo. Direito, escassez e escolha. São Paulo: Renovar, 2001. p. 213-216.
54 WATANABE,
Kazuo. Controle jurisdicional das políticas públicas: mínimo existencial e
demais direitos fundamentais imediatamente judicializáveis. In:
GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo (coords.). O controle
jurisdicional de políticas públicas. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
p. 224.
55 OLSEN, Ana
Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais. Curitiba: Juruá, 2008. p.
324.
56 Explica
Fernando Facury Scaff que “os economistas possuem uma expressão bastante
interessante, denominada ‘limite do orçamento’, que depois foi trasladada para
o Direito, a partir de uma decisão do Tribunal Constitucional Alemão, com o
nome de ‘reserva do possível’. O significado é o mesmo: todo orçamento possui
um limite que deve ser utilizado de acordo com as exigências de harmonização da
economia geral”. Sentenças aditivas, Direitos sociais e Reserva do Possível. In:
SARLET, Ingo Wolfgang; TIMM, Luciano Benetti (orgs.). Direitos Fundamentais:
orçamento e reserva do possível. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2010. p. 169.
57 Brasil.
Supremo Tribunal Federal. Direito à saúde, recursos escassos e equidade: os
riscos da interpretação judicial dominante. Disponível em: [www.stf.jus.br].
Acesso em: 10.05.2015.
58 Os
instrumentos orçamentários previstos na Constituição Federal são, por
excelência, as expressões jurídicas de políticas públicas.
59 SCAFF,
Fernando Facury. Reserva do possível, mínimo existencial e direitos humanos. Interesse
Público. n. 32, vl. 7, jul.-ago. 2005. p. 220, passim.
60 BARCELLOS,
Ana Paula. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio
da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 237.
61 GRINOVER,
Ada Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário. Revista
de Processo (RePro). v. 164, São Paulo, 2008.
62 Podemos
conceber como programáticas as “normas constitucionais através das quais o
constituinte, em vez de regular, direta e imediatamente, determinados
interesses, limitou-se a traçar-lhes os princípios para serem cumpridos pelos
seus órgãos (legislativos, executivos, jurisdicionais e administrativos), como
programas das respectivas atividades, visando à realização dos fins sociais do
Estado”. TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Curso de direito constitucional.
São Paulo: Conceito, 2011. p. 324.
63 “(...) não
havendo comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa
estatal, inexistirá empecilho jurídico para que o judiciário determine a
inclusão de determina política pública nos planos orçamentários do ente
público.” (REsp 1.041.197/MS, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j.
25.08.2009.)
64 “Políticas
são conjuntos integrados de iniciativas e ações unificadas por um propósito
final (meta) e propósito de caráter coletivo que se avalia pela redução do
risco. Isto é, uma solução que me parece adequada e que contornaria com
bastante racionalidade a decisão tudo-ou-nada é a decisão progressiva, pela
qual o juiz, à semelhança do que faz nos processos de falência, de recuperação
judicial de empresas ou mesmo de alimentos, permite às partes chegarem a um
acordo em que aos poucos se ajusta a conduta do Estado ao pedido.” LOPES, José
Reinaldo de Lima. Em torno da reserva do possível. In: SARLET, Ingo
Wolfgang. TIMM, Luciano Benetti (orgs.). Direitos fundamentais: orçamento
e reserva do possível. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 189.
65 Art. 167,
CF/1988 (LGL\1988\3): “São vedados: (...) II – a realização de despesas ou a
assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários ou
adicionais; (...) VI – a transposição, o remanejamento ou a transferência de
recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro,
sem prévia autorização legislativa”.
66 “Uma
primeira premissa para este controle da sindicabilidade judicial das políticas
públicas é a identificação de uma ‘disfunção política’ da administração ou do
legislativo, ou seja, um desvio do natural curso do interesse público, uma fuga
do dever-poder que está na base do plexo de competências atribuído a cada um
dos órgãos estatais como (re)presentantes do povo brasileiro e do projeto
constitucional de sociedade”. ZANETI JUNIOR, Hermes. A teoria da separação de
poderes e o Estado Democrático Constitucional: Funções de governo e funções de
garantia. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo (coords.). O
controle jurisdicional de políticas públicas. 2. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2013.
67 Em 20 e 21
de novembro, o Conselho da Justiça Federal (CJF) sediou em Brasília o seminário
“Como a mediação e a arbitragem podem ajudar no acesso e na agilização da
Justiça”, no qual Ada Pellegrini Grinover defendeu que a judicialização em
geral decorre da insatisfação do povo com o que não obtém por via
administrativa: “Por que tudo vai ao Judiciário? Porque as instituições não
funcionam. Vai-se ao juiz por necessidade, porque não se coloca à mão do povo
meios de solucionar o problema. A judicialização é a insatisfação da população
com aquilo que podia obter administrativamente. O juiz brasileiro substitui-se
ao administrador”. GRINOVER, Ada Pellegrini. A judicialização é a insatisfação do
povo com o que não obtém administrativamente. Migalhas. 21.11.2014.
Disponível em: [www.migalhas.com.br/]. Acesso em: 23.11.2015.
9 Non
liquet (do latim non liquere, “não está claro”) é uma expressão
oriunda do direito romano, no qual era aplicada nos casos em que o juiz não
encontrava resposta clara, deixando de julgar a causa.