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26 de fevereiro de 2022

Ao credor fiduciário é dada a faculdade de executar a integralidade de seu crédito judicialmente, desde que o título que dá lastro à execução esteja dotado de todos os atributos necessários

Processo

REsp 1.965.973-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/02/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO BANCÁRIO

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Execução judicial lastreada em Cédula de Crédito Bancário. Alienação fiduciária. Lei n. 9.514/1997. Pacto adjeto. Possibilidade de execução.

 

DESTAQUE

Ao credor fiduciário é dada a faculdade de executar a integralidade de seu crédito judicialmente, desde que o título que dá lastro à execução esteja dotado de todos os atributos necessários.


INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia a definir se o credor de dívida garantida por alienação fiduciária de imóvel está obrigado a promover a execução extrajudicial de seu crédito na forma determinada pela Lei n. 9.514/1997.

Sobre o tema, vale ressaltar que a Cédula de Crédito Bancário, desde que satisfeitas as exigências do art. 28, § 2º, I e II, da Lei n. 10.931/2004, de modo a lhe conferir liquidez e exequibilidade, e desde que preenchidos os requisitos do art. 29 do mesmo diploma legal, é título executivo extrajudicial.

Assim, o só fato de estar a dívida lastreada em título executivo extrajudicial e não haver controvérsia quanto à sua liquidez, certeza e exigibilidade, ao menos no bojo da exceção de pré-executividade, é o quanto basta para a propositura da execução, seja ela fundada no art. 580 do Código de Processo Civil de 1973, seja no art. 786 do Código de Processo Civil de 2015.

A constituição de garantia fiduciária como pacto adjeto ao financiamento instrumentalizado por meio de Cédula de Crédito Bancário em nada modifica o direito do credor de optar por executar o seu crédito de maneira diversa daquela estatuída na Lei n. 9.514/1997 (execução extrajudicial).

A propositura de execução de título extrajudicial, aliás, aparenta ser a solução mais eficaz em determinados casos, diante da existência de questão altamente controvertida, tanto da doutrina quanto na jurisprudência dos tribunais, referente à possibilidade de o credor fiduciário exigir o saldo remanescente se o produto obtido com a venda extrajudicial do bem imóvel dado em garantia não for suficiente para a quitação integral do seu crédito, ou se não houver interessados em arrematar o bem no segundo leilão, considerando o disposto nos §§ 5º e 6º do art. 27 da Lei n. 9.514/1997.

Com efeito, ao credor fiduciário é dada a faculdade de executar a integralidade de seu crédito judicialmente, desde que o título que dá lastro à execução esteja dotado de todos os atributos necessários - liquidez, certeza e exigibilidade.

19 de setembro de 2017

CONTRATO DE COMPRA E VENDA COM PREÇO A FIXAR. Preço não definido e ausência de título executivo. Revista dos Tribunais Sul, vol. 2, p. 99 - 132, Nov - Dez/2013

CONTRATO DE COMPRA E VENDA COM PREÇO A FIXAR

Preço não definido e ausência de título executivo
Revista dos Tribunais Sul | vol. 2/2013 | p. 99 - 132 | Nov - Dez / 2013
DTR\2014\1715
_____________________________________________________________________________________
José Miguel Garcia Medina
Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor Titular da Universidade Paranaense. Professor Associado da Universidade Estadual de Maringá.

Área do Direito: SE

Sumário:  
Parecer - Parte I.Sobre os instrumentos de contrato de "compra e venda de feijão soja" - Parte II.Sobre a prorrogação da data de fixação do preço, avençada (segundo afirma a Exequente) sob condição suspensiva que não teria sido implementada - Parte III.Sobre os meios processuais de que se pode valer a Consulente, para demonstrar, doravante, os vícios existentes no processo


Oferecido à V.T.I.E.C. pelo Professor José Miguel Garcia Medina
1 - Contrato de compra e venda com preço a fixar. Preço não definido. Título executivo. Inexistência.
2 - Efeito devolutivo da apelação. Omissão sobre temas alegados em primeiro grau e examinados na sentença. Cabimento de embargos de declaração e, não sanado o vício, de recurso especial.
3 - Termo inicial para a oposição dos embargos à execução. Observância ao critério estabelecido pelo pronunciamento judicial que ordenou a citação. Nemo potest venire contra factum proprium.
4 - Decisão que julga exceção de pré-executividade. Conteúdo dos embargos.

(i) Síntese da situação jurídica existente

V.T.I.E.C., através de seu advogado J.E.S., honra-me com consulta acerca da correção da tese jurídica sustentada em v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso,1 que admitiu, como títulos executivos extrajudiciais, instrumentos contratuais e documentos ostentados por A.B. em "ação de execução para entrega de coisa incerta" movida contra a ora Consulente, bem como contra P.G.V.N., O.S.V., V.A.L., R.C.C.S., J.C.M.C., R.C.S. e I.C.C.2
Interessa ter bem claros, para a correta compreensão da Consulta, os eventos a seguir indicados:
1.º) A.B. ajuizou, contra a Consulente e outros acima indicados, "ação de execução para entrega de coisa incerta", lastreada nos seguintes documentos:3
a) instrumentos particulares de contratos "de compra e venda de feijão soja" realizados entre as partes e formalizados através dos instrumentos contratuais de f., dos quais, em sua maioria, consta que a Exequente deveria, em 26.10.2008, realizar a fixação do preço do produto, a fim de que se apurasse a existência de valor remanescente a ser pago pela Exequente à vendedora ou de "quantidade adicional do produto, proporcional à diferença obtida a menor" a ser entregue pela vendedora à Exequente; e, também, b) vários documentos denominados "Extrato do Contrato", acompanhando cada um dos instrumentos contratuais, todos aparentemente emitidos pela Exequente em 28.11.2008;
c) declaração de vontade firmada por ambas as partes, por escrito, para "confirmação de fixação de basis", em relação a pelo menos um dos contratos (cf. f.);4
d) correspondência eletrônica (e-mail), como dá conta o documento juntado pela Exequente às f., referente a roll-over realizado pelas partes por intermédio da S. C. em relação ao contrato CTR (…);5
e) declaração unilateral de vontade da Exequente, consistente em notificação extrajudicial (f. dos autos) enviada pela Exequente à Consulente (e não aos demais executados) para que esta entregasse o produto ali descrito. Tal notificação foi empregada pela Exequente para demonstrar que esta teria fixado o preço (cf. f. dos autos);6
f) escrituras públicas de "estipulação de garantia hipotecária" (cf. f. ss.);7
g) posteriormente, em reforço à documentação juntada com a petição inicial, a Exequente apresentou, ainda, declaração da S. C., no sentido de que as partes teriam renegociado o vencimento da fixação do preço para julho de 2009 (f. e f. dos autos), renegociação essa realizada sob condição suspensiva que não teria sido implementada (sobre tratar-se de condição suspensiva, cf. o que afirma a Exequente às f. e f. dos autos).8
2.º) O MM. Juízo a quo determinou a citação dos executados para entregar a coisa objeto da execução, "ou, depositando-a, oferecer embargos" (f. dos autos).
3.º) O Executado P.G.V.N. opôs exceção de pré-executividade, à qual foi atribuído efeito suspensivo. Contra a decisão que concedeu efeito suspensivo à exceção de pré-executividade, P.G.V.N. interpôs agravo de instrumento.9 Tal recurso foi acolhido, extinguindo-se a execução em relação ao agravante. Contra o acórdão proferido, no caso, pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, a Exequente interpôs recurso especial, que aguarda julgamento do Superior Tribunal de Justiça.10
4.º) A ora Consulente também opôs exceção de pré-executividade, assentada em vários fundamentos.11
5.º) A exceção de pré-executividade oposta pela Consulente foi acolhida pelo Juízo a quo.12 Considerou a r. sentença que, no caso, a dívida cobrada é inexigível, pois ambas as partes deixaram de cumprir a cláusula referente à fixação do preço. Além disso, reconheceu a r. sentença que as partes prorrogaram a data de fixação do preço do produto. Afirmou, também, que a petição inicial não foi acompanhada de cálculo que demonstrasse a extensão da dívida cobrada.13
6.º) Contra a r. sentença, a Exequente interpôs apelação, à qual foi dado provimento.14 Afirmou-se, no v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, que não haveria, nos autos, provas robustas de que teria realmente ocorrido "a prorrogação do prazo contratual para promover a fixação do preço da soja comercializada".15 Não há, no v. acórdão, contudo, resposta ao argumento de que a Exequente também se encontra em mora, por não ter fixado o preço nos termos estabelecidos nos contratos.16
7.º) A Consulente opôs, então, embargos de declaração,17 que aguardam julgamento.18

(ii) Quesitos

Em razão dos fatos narrados no item precedente, são-nos apresentadas as seguintes questões:
"1) Quais os limites do efeito devolutivo da apelação interposta pela Exequente? Deve o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso examinar outros fundamentos expostos na sentença que extinguiu a execução?
2) A execução é lastreada em títulos executivos? No caso, a obrigação inserta nos instrumentos contratuais é certa, líquida e exigível?
3) Podem a Consulente e outros executados opor embargos à execução?
4) Caso admissível a oposição de embargos pela Consulente, pode ser discutida a ocorrência de prorrogação da data de fixação do preço? Ou isso deveria ser feito em outra ação?
5) O Sr. P.G.V.N., tendo sido excluído da execução, pode voltar a ser incluído no polo passivo, se convertida a ação em execução por quantia certa?"

(iii) Documentos que acompanham a Consulta

Acompanham a consulta cópias das f. a f. e f. a f. dos autos, bem como cópia da petição de embargos de declaração opostos contra o v. acórdão que julgou a apelação interposta pela Exequente.
Segue, em anexo, meu parecer a respeito dos quesitos apresentados, em que analiso os mais relevantes elementos da demanda, que consistem na base da solução jurídica que, a meu ver, é apropriada ao caso.

A correta interpretação do que consta dos instrumentos contratuais que servem (ou deveriam servir) como títulos executivos é imprescindível, para que se responda à Consulta formulada. Na Parte I do presente Parecer, exporei o que se pode extrair dos documentos apresentados pela Exequente com sua petição inicial, em si mesmos considerados, a fim de se verificar se, no caso, há ou não título executivo, bem como se a obrigação veiculada é certa, líquida e exigível. Na Parte II, tratarei da questão atinente à prorrogação da data de fixação do preço do produto, aspecto que foi o foco principal do v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso. Por fim, na Parte III, examinarei os possíveis caminhos processuais que podem ser percorridos pela Consulente, face ao que tiver sido exposto nas Partes I e II do Parecer.

Parte I. Sobre os instrumentos de contrato de "compra e venda de feijão soja"

(i) Contratos padrão, com cláusulas formuladas unilateralmente pela Exequente. Caracterização de contrato de adesão

Característica comum a todos os instrumentos de contrato de "compra e venda de feijão soja" firmados entre as partes envolvidas no caso ora examinado é a de se tratarem de contratos de adesão.19 Ainda que, no caso, não se esteja diante da modalidade de contrato de adesão "take it or leave it",20 outros fatores denotam que a parte aderente não poderia modificar substancialmente as cláusulas estabelecidas e padronizadas.
As cláusulas contratuais são estandardizadas, inseridas em papel formulário confeccionado pela Exequente - vede, por exemplo, o cabeçalho dos referidos documentos e a padronização da numeração de série dos contratos -, e, salvo em situações excepcionais (estipuladas em proveito da Exequente), não contêm variação. Fica evidente, assim, que não houve discussão entre as partes a respeito do teor das cláusulas contratuais.21 As cláusulas penais ou que estabelecem direito de se resolver o contrato, por sua vez, reconhecem, textualmente, direitos apenas à Exequente, e não à parte aderente - no caso, a Consulente, além daqueles outros que subscreveram tais instrumentos contratuais.22 Tais contratos, assim, são manifestação de "modelli caratterizzati dall'asimmetria nella forza contrattuale delle parti", como acentua Pasquale Pava.23
O exame de duas cláusulas servirá para demonstrar o acerto do que ora se afirma.
Veja-se, por exemplo, o que dispõe a cláusula 7 dos instrumentos contratuais, antes referida, dedicada ao "inadimplemento, rescisão e suas consequências".24 Na mencionada cláusula trata-se unicamente de direitos da compradora (ora Exequente), em face do possível inadimplemento do vendedor (que vem a ser a Consulente, no presente caso), nada prevendo na hipótese inversa - isto é, se inadimplente a compradora. A assimetria entre as posições contratuais das partes, assim, é evidente.
Algo parecido ocorre em relação à cláusula dedicada ao prazo final para a fixação do preço.25 Reconhece-se à vendedora o direito de fazê-lo até dia 25.10.2008. No entanto, caso isso não ocorresse, caberia "exclusivamente à compradora, fazê-lo até o dia 26.10.2008, não podendo, nesta hipótese, a vendedora insurgir-se contra o valor assim fixado".
A circunstância de se estar diante de contrato de adesão nem sempre invalida ou retira o efeito das cláusulas e condições estipuladas. Mas isso pode ocorrer, conforme o caso. É o que se infere do disposto nos arts. 423 e 424 do CC/2002. Aplicando-se as referidas regras ao caso ora examinado, extrai-se que:
a) O reconhecimento de que, no caso, tal contrato tem essa característica impõe que as cláusulas contratuais sejam interpretadas de modo a que, havendo dúvida, ou sendo possível delas extrair mais de um sentido, opte-se por aquele que favoreça à parte aderente (cf. art. 423 do CC/2002). Trata-se da incidência da parêmia in dubio contra stipulatorem (ou interpretatio contra proferendem);
b) Cláusulas que impliquem em renúncia antecipada a direito, ou que sujeite a estipulação de um dos elementos essenciais ao arbítrio da parte que estabeleceu a cláusula, devem ser consideradas nulas (art. 424 do CC/2002).
Para responder às questões formuladas pela Consulente, não reputo necessário recorrer a tais critérios interpretativos: a meu ver, as cláusulas contratuais são bastante claras, e as consequências jurídicas que delas se extraem também o são. Mas, no mínimo, compreender-se que tais contratos são de adesão impõe que, em caso de dubiedade de alguma cláusula contratual, afaste-se interpretação mais favorável à compradora - que, afinal, foi quem concebeu, substancial e formalmente, as cláusulas contratuais. Ainda que não seja preciso recorrer à máxima in dubio pro adherente, a hipótese inversa - vale dizer, na dúvida, interpretar-se em favor daquele que estipulou as cláusulas contratuais - é, a fortiori, inadmissível.

(ii) Interpretação autêntica da cláusula relativa ao termo final para a fixação do preço

Resta bastante claro, diante do que acima se disse, que é inconcebível qualquer interpretação das cláusulas contratuais que admita a flexibilização de qualquer condição ou termo fixados no contrato, em proveito daquele que estabeleceu as cláusulas contratuais.
Assim, por exemplo, o não cumprimento de uma obrigação em seu termo final caracteriza a mora (ex re); como consequência, sobrevindo o termo final, extingue-se, para todos os efeitos, os direitos a que o termo se opõe (cf. arts. 128 e 135 do CC/2002). Essa regra - mais que isso, verdadeiro princípio - deve valer para ambos os contratantes, sendo inadmissível sua aplicação severa em relação à vendedora, e parcimoniosa em relação à compradora.
Tome-se, diante disso, o que dispõe a cláusula dedicada ao termo e ao modo de fixação do preço.26 É bastante clara, a meu ver, a regra que da cláusula se extrai: não dispondo a vendedora a respeito, diz que a fixação do preço caberia "exclusivamente à compradora, fazê-lo até o dia 26.10.2008, não podendo, nesta hipótese, a vendedora insurgir-se contra o valor assim fixado" (destacou-se). O não cumprimento do disposto nessa cláusula pela vendedora, que tem termo final claramente estabelecido, caracteriza mora ex re (art. 397 do CC/2002): a compradora deveria fixar o preço "até" dia 26.10.2008, e a vendedora não poderia se insurgir contra o preço "assim fixado". Lida a fórmula negocial de outro modo, tem-se que a compradora não tem direito de fixar o preço após o dia 26.10.2008, podendo a vendedora discordar de preço assim (isso é, após tal prazo) fixado.
A tal conclusão se chega - repita-se - valendo-se de interpretação autêntica dos dizeres expressos na mencionada cláusula. Uma interpretação elástica que permitisse inferir que a compradora pudesse, após o dia 26.10.2008, fixar o preço, contrariaria não apenas a literalidade dos termos empregados pelas partes, mas, também, os princípios interpretativos referidos no subitem precedente.
Admita-se, porém, que tal cláusula contenha alguma dubiedade. Suponha-se, para esse fim, que onde se lê, entre aspas, "exclusivamente à compradora, fazê-lo até o dia 26.10.2008, não podendo, nesta hipótese, a vendedora insurgir-se contra o valor assim fixado", se pudesse colocar em dúvida o significado das expressões sublinhadas. Poder-se-ia indagar, assim, por exemplo, "pode a compradora, após o dia 26.10.2008, fixar o preço?" Ou, então, "se a compradora, após o dia 26.10.2008, fixar o preço, a vendedora deve aceitar o valor assim fixado?" O simples enunciado dessas questões conduz a uma única resposta, pois, como se disse, o sentido da cláusula é claro. Mas, caso se pudesse responder "talvez sim", ou "talvez não", o fato de a cláusula ter sido pronunciada pela vendedora (Exequente) impõe-se a adoção da interpretação contra proferendem, como impõe o art. 423 do CC/2002: estipulada a condição pela compradora, em caso de dubiedade, deve a cláusula ser interpretada contra ela (a compradora).
De todo modo, reitero aqui o que antes disse, sobre a desnecessidade de se lançar mão desse critério interpretativo para se chegar ao sentido do que consta na sobredita cláusula. Recorri a esse artifício, porém, apenas para demonstrar o sentido como a cláusula relativa ao termo final para a fixação do preço pode ser interpretada.

(iii) Sobre a não fixação do preço pelas partes no prazo previsto no contrato

Celebraram as partes vários contratos de compra e venda com preço a fixar. A cláusula 3.2.1 dos instrumentos contratuais,27 a respeito, assim dispôs:
"A vendedora tem a prerrogativa de escolher a data, para a fixação do preço até o dia 25.10.2008, com base nas cotações da Bolsa de Mercadoria de Chicago (CBOT). Caso ela não se valha da prerrogativa ora estabelecida, a fixação do preço, sempre com base em cotações da CBOT, caberá exclusivamente à compradora, fazê-lo até o dia 26.10.2008, não podendo, nesta hipótese, a vendedora insurgir-se contra o valor assim fixado."
Vê-se, pois, que a cláusula contratual fixa dois termos finais, para a fixação do preço: o primeiro, até dia 25.10.2008, e o segundo, até o dia 26.10.2008. São duas as questões que, neste passo, devem ser respondidas:
1.ª) Pode a compradora, após o dia 26.10.2008, fixar o preço?
2.ª) Caso o preço não seja fixado nos termos previstos na referida cláusula contratual, qual o destino do contrato?
Minha resposta à primeira questão é negativa. Como disse no item precedente, a cláusula é expressa no sentido de que a compradora deve, até o dia 26.10.2008, fixar o preço. Como que reiterando esse comando, a mencionada cláusula, ao final, deixa claro que somente se assim fixado o preço não poderá a vendedora contra ele se insurgir.
Mas, além do que antes se disse, há, ainda, outro fundamento, que, penso, deve ser considerado para que não se admita a fixação ulterior do preço pela compradora: O Código Civil, em seu art. 490, dispõe que "nulo é o contrato de compra e venda, quando se deixa ao arbítrio exclusivo de uma das partes a fixação do preço". Ora, admitir que a compradora possa, em qualquer dia posterior a 27.10.2008, fixar o preço - ainda que tome por parâmetro cotação tirada em data anterior a 27.10.2008 -, significaria atribuir à referida cláusula o sentido de puramente potestativa, já que a vendedora ficaria sujeita ao arbítrio da compradora, que poderia decidir, a qualquer tempo (semanas, meses, anos depois…), se fixaria ou não o preço, e quando o faria. Uma tal interpretação contrariaria não apenas o art. 490, mas também o art. 122, in fine, do CC/2002.
Tem-se, assim, que a fixação do preço pela compradora, para ajustar-se ao que prevê a cláusula contratual ora analisada, deveria ter sido realizada até o dia 26.10.2008. Assim agindo, incidiria a parte final da referida cláusula: "(…) não podendo, nesta hipótese, a vendedora insurgir-se contra o valor assim fixado".
Isso significa que, eventualmente, o preço poderia ser fixado em data posterior à prevista na referida cláusula, mas, em tal caso, poderia a vendedora insurgir-se contra o valor assim fixado, ou, com outras palavras, a manifestação de vontade exarada pela compradora após o prazo estabelecido na cláusula contratual não obriga a vendedora.

(iv) Sobre a manifestação de vontade da compradora, exarada através de notificação, no sentido de que teria fixado o preço em observância ao termo estabelecido no contrato

Em sua petição inicial, informa a compradora (Exequente) que, "Não tendo sido exercida a prerrogativa dos Executados de fixarem o dia da cotação do preço, a Exequente cumpriu a sua obrigação contratual - itens 3.2.1 dos contratos - e fixou o preço do produto segundo a cotação do dia 27.10.2008 (segunda-feira) conforme prerrogativas contratuais, (…)."
Na verdade, porém, a fixação do preço não se realizou de acordo com o que prevê a mencionada cláusula contratual.28 Esse aspecto, inclusive, é mencionado no v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, ao julgar a apelação interposta pela Exequente:
"Observa-se que a Apelada não fixou o preço da soja com base na Cotação de Chicago na data aprazada (25.10.2008), tendo a Apelante fixado o valor em 29.11.2008, utilizando como parâmetro a cotação de 27.10.2008 (segunda-feira)."29
Note-se, a propósito, que, como atesta declaração juntada aos autos pela própria Exequente, tal fixação não ocorreu na data antes indicada nos instrumentos contratuais, já que as partes fizeram "várias reuniões (…) entre os meses de outubro/2008 e novembro/2008", em que se ajustara a prorrogação dos mencionados contratos para julho de 2009.30 Assim, se, ao longo do mês de novembro, as partes ainda estavam negociando a prorrogação do contrato, é evidente que, na data limite para que a Exequente fixasse o preço (26.10.2008), tal ato não havia sido por ela praticado.
De acordo com a cláusula 3.2.1 dos instrumentos contratuais que instruem a petição inicial, a fixação do preço deveria ser realizada pela Exequente "até o dia 26.10.2008".31 Merece leitura com atenção, para que não reste dúvidas acerca do termo final para que se desse fixação do preço, a 2.ª parte da referida cláusula:
"A vendedora tem a prerrogativa de escolher a data, para a fixação do preço até o dia 25.10.2008, com base nas cotações da Bolsa de Mercadoria de Chicago (CBOT). Caso ela não se valha da prerrogativa ora estabelecida, a fixação do preço, sempre com base em cotações da CBOT, caberá exclusivamente à compradora, fazê-lo até o dia 26.10.2008, não podendo, nesta hipótese, a vendedora insurgir-se contra o valor assim fixado."
Consta, bastante claro, na referida cláusula, que a compradora, ora Exequente, deveria fixar o preço até o dia 26.10.2008; mas não está escrito, na mencionada cláusula, que a compradora poderia fixar o preço em data posterior, ainda que com base em "cotações do CBOT" anteriores a 26.10.2008.
Nada há, também, na referida cláusula, sobre os critérios a serem observados para fixação do preço, caso nenhuma das partes (a vendedora, até 25.10.2008; a compradora, até 26.10.2008) fixassem o preço. Poderiam as partes, por exemplo, ter deixado claro que a ausência de manifestação expressa de qualquer delas até referida data faria com que se considerasse fixado o preço de acordo com a cotação da Bolsa de Mercadorias de Chicago (CBOT) do mês de novembro. No entanto, as partes assim não fizeram.
No presente tópico, interessa-me ressaltar o que acima disse: que há, na cláusula 3.2.1 dos referidos instrumentos contratuais, termo certo e final dentro do qual a Exequente poderia manifestar-se, fixando o preço.
A mesma cláusula, aliás, é expressa no sentido de que a vendedora não poderia "insurgir-se contra o valor assim fixado" pela Exequente. Desse modo, além de não admitir a fixação do preço após 26.10.2008, a mesma cláusula contratual é categórica no sentido de que a vendedora não poderia discordar da fixação do preço realizada pela exequente, desde que o ato de fixação se realizasse até a referida data. Ao estabelecer que a vendedora não poderia "insurgir-se contra o valor" desde que "assim fixado" pela Exequente, a mencionada cláusula é explícita no sentido de que pode a vendedora insurgir-se contra a fixação do preço realizada pela exequente após 26.10.2008.
Bem compreendidos tais aspectos, é de se indagar sobre quais seriam os efeitos da notificação extrajudicial de f., ato através do qual, consoante informa o v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, teria a Exequente fixado o preço.
A manifestação de vontade da Exequente, exarada através da notificação extrajudicial de f., não serve para que se considere fixado o preço, em atenção ao que dispõe a cláusula 3.2.1 dos instrumentos contratuais ora examinados. Assim manifestada, a intenção da Exequente mostra-se temporal e formalmente inadequada, para que se considere fixado o preço.
Tal manifestação é temporalmente inadequada, pois, consoante dispõe a cláusula 3.2.1 dos instrumentos contratuais ora examinados, o ato de fixação do preço deveria ocorrer até 26.10.2008; ora, a referida notificação data de 29.11.2008, e a cláusula 3.2.1 dos instrumentos contratuais não prevê que as partes poderiam exarar manifestações sobre a fixação do preço no futuro, com eficácia retroativa (ex tunc).
Além disso, a mesma notificação é formalmente inadequada, já que, consoante estabeleceu a cláusula 10.1 dos instrumentos contratuais submetidos a nosso exame, modificação ou emenda contratual deveria ser realizada por ato "por escrito e devidamente assinado pelas partes".
As partes realizaram a fixação do preço de acordo com a forma prevista na referida cláusula contratual em relação a dois dos instrumentos submetidos a nosso exame:
(a) CTR 1331P80362S, fixação do preço realizada pelas partes em 07.07.2008;32
(b) CTR 1331P80384S, fixação do preço realizada pelas partes em 28.07.2008.33 Em relação aos demais contratos, pelo que consta dos autos, não há manifestação "por escrito e devidamente assinado pelas partes" em relação à fixação do preço. De todo modo, a fixação do preço pelas partes em atenção à forma prevista no contrato em relação a dois dos instrumentos juntados pela Exequente revela que essa prática, além de encontrar-se em conformidade com o negócio celebrado entre as partes, é também a habitualmente empregada, para a fixação do preço.34
Chega-se, fatalmente, à conclusão de que, tendo a Exequente "fixado o valor em 29.11.2008, utilizando como parâmetro a cotação de 27.10.2008 (segunda-feira)",35 deixou de observar, a um só tempo, duas cláusulas contratuais: (1.ª) a que determina que o ato de fixação do preço deveria dar-se até 26.10.2008; e (2.ª) a que determina que qualquer novo ajuste realizado pelas partes em relação aos contratos ora examinados deveria ser realizado por escrito assinado pelas partes.
Não havendo confirmação do preço nos termos previstos nos referidos instrumentos contratuais, carece de sentido a discussão relativa à cotação da Bolsa de Mercadorias e Futuros no mês de novembro de 2008. Ora, o preço praticado em novembro somente poderia ser considerado se as partes o tivessem fixado, por escrito, até 26.10.2008. Como isso não ocorreu, vê-se que, ao fim e ao cabo, não houve fixação do preço pelas partes.
Resta perquirir, diante dessa conclusão, qual a situação jurídica em que se encontram tais contratos.

(v) Efeitos dos contratos de compra e venda, em relação aos quais não houve fixação do preço no termo e na forma estabelecidas pelas partes

Discute-se, na doutrina, sobre a situação jurídica do contrato de compra e venda quando, acordando as partes que o preço será fixado futuramente, o preço, posteriormente, deixa de ser fixado.
Tenha-se presente que não se coloca em dúvida a existência e a validade do contrato, em casos como o presente. É certo que, de acordo com o art. 482 do CC/2002, a compra e venda só se considera "obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço". No que se refere ao preço, no entanto, a lei não exige a prévia determinação, contentando-se com sua determinabilidade (cf. arts. 485 a 488 do CC/2002).
Os problemas começam a surgir quando, embora futuramente determinável o preço, este acabe não sendo determinado. Para alguns, o contrato com preço determinável se sujeitaria a condição suspensiva (assim, a fixação do preço teria eficácia ex tunc, retroagindo à data da celebração do negócio); outros, ainda, afirmam que o contrato somente se aperfeiçoaria (ou seja, somente existiria juridicamente, no sentido do art. 482 do CC/2002) após a fixação do preço.36
Parece-nos acertada, a respeito, a opinião de Pontes de Miranda. Segundo o autor, no caso, "falta a integração da eficácia, pela determinação do preço, que juridicamente já é determinável. (…). No plano da existência, o contrato de compra-e-venda já está constituído, concluso. O sistema jurídico tem como elemento suficiente a determinabilidade do preço".37 O contrato de compra e venda com preço determinável, como antes disse, é existente e válido, tratando-se de figura disciplinada na legislação pátria. Pode o contrato de compra e venda assim celebrado, inclusive, produzir outros efeitos.38 Mas, restando sem determinação o preço, o contrato, quanto ao ponto, é ineficaz.
Tal é o que ocorre, segundo pensamos, no caso submetido a nosso exame: há contrato de compra e venda - tendo, inclusive, a vendedora realizado a entrega da coisa objeto do negócio - pendendo de determinação o preço. Devem as partes acordar sobre o preço da coisa; ausente acordo, incide o disposto no art. 488 do CC/2002, devendo o juiz, ao definir o valor, considerar o termo médio, tendo em vista o preço corrente praticado.39

(vi) Ausência de título executivo, no caso. Ineficácia do contrato, em relação ao preço; logo, a obrigação não é certa. Consequente ausência de exigibilidade e de liquidez

O que se expôs, pouco a pouco, nos itens precedentes, conduziu a conclusão que, segundo penso, é a única correta, em relação ao caso submetido a nosso exame: inexiste, no caso título executivo.
É tranquila a doutrina no sentido de que, para que se esteja diante de um título executivo, devem ser observadas as prescrições previstas na lei: não podem as partes conferir a qualidade de título executivo a algo que assim não é considerado pela norma jurídica; igualmente, se a lei não considera determinado fato um título executivo, não pode o juiz considerá-lo como tal.40
Não se questiona, por outro lado, que o título deve trazer em seu bojo uma obrigação cujo objeto será alvo de execução. Trata-se, como se afirma na doutrina, do conteúdo do título executivo.41 Tal obrigação, de acordo com o Código de Processo Civil brasileiro, deve ser certa, líquida e exigível (arts. 580, 586, 618, I, do CPC). Diz-se, sob esse prisma, que não basta a presença de um "documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas" (art. 585, II, do CPC); é necessário que tal documento tenha um conteúdo certo, líquido e exigível. Caso a obrigação não seja certa, líquida ou exigível, tal documento não será considerado título executivo, já que ausente conteúdo suscetível de ser executado.42
Resta verificar se, no caso ora examinado, aquilo que a Exequente apresenta como título deve ser considerado, como tal. Antecipamos nossa opinião no sentido de que, no caso, não há título executivo, seja porque ausente um "documento" concebido de acordo com o art. 585, II, do CPC, seja porque a obrigação contida nos documentos ostentados pela Exequente não é certa, líquida ou exigível.

(vi.1) Ausência de "documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas" (CPC, art. 585, II): a execução tem por base um conjunto de documentos que a lei não reconhece como títulos executivos

Característica essencial do título executivo é a tipicidade, no sentido de que nem toda representação documental, mas somente aquela escolhida pela norma jurídica é idônea a operar no seio da execução forçada como título executivo.43
Pode a lei reportar-se a um fato simples, ou a um complexo de fatos (ou à soma de atos distintos), a fim de que se configure o título executivo. Assim, por exemplo, a duplicata sem aceite, se acompanhada de protesto e do comprovante de entrega de mercadorias (cf. art. 15, II, da Lei 5.474/1968), será considerada título executivo (art. 585, I, do CPC). Na hipótese prevista no art. 585, II, do CPC, diversamente, o fato considerado título executivo é simples (ou seja, composto por apenas um ato).
No caso submetido a nosso exame, a execução não se baseia apenas em "documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas" (art. 585, II, do CPC). Funda-se a pretensão da Exequente também em uma série de outros documentos, "extratos do contrato", e-mail, notificação extrajudicial à Consulente, até mesmo em declaração de corretora (para demonstrar inocorrência de condição estabelecida no ajuste de prorrogação da data de fixação do preço) etc. Com base nesse conjunto de documentos, afirma a Exequente ser credora da quantia de mais de 70 mil toneladas de soja, em relação à Consulente e outros executados.
Resta verificar se esse rol de documentos, em que se baseia a execução, insere-se, ou não, no comando previsto no art. 585, II, do CPC.44
O ato jurídico, para ser considerado título executivo, deverá cumprir as formalidades designadas no art. 585, II, do CPC. Não sendo observadas tais formalidades, não haverá título executivo. Caso os elementos da obrigação devam ser expostos em dois ou mais documentos, todos eles devem observar o que dispõe o art. 585, II, do CPC.
Assim, por exemplo, caso em um instrumento contratual subscrito pelos contratantes e por duas testemunhas existam alguns dos elementos da obrigação (por exemplo, a coisa vendida), se as partes deixarem a definição do elemento obrigacional restante (por exemplo, o preço) para outro momento, tal "complementação" deverá ser realizada também em observância ao disposto no art. 585, II, do Código. Como, no caso, se está diante de um título executivo complexo, todos os seus elementos integrativos deverão se orientar pela norma que os define, qual seja, o art. 585, II, do CPC.
Trata-se de orientação pacífica: todos os documentos que veiculam a obrigação que é objeto de execução devem ter a mesma índole e se revestir da mesma forma exigida pela lei para a configuração do título executivo.45
Sob esse prisma, vê-se que, no caso vertente, apenas os instrumentos contratuais assinados pelas partes teriam, caso indicassem o valor devido, a qualidade de título executivo. Documentos como "extratos do contrato", e-mail, declaração unilateral da Exequente em que se informa a definição do preço, declaração de corretora, etc., não se ajustam ao que dispõe o art. 585, II, do CPC.
O preço - elemento da obrigação não firmado nos instrumentos contratuais - foi fixado pelas partes em observância ao art. 585, II, do CPC apenas em relação a dois dos contratos (cf. f. e f.). Quanto aos demais, inexiste "documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas", como exige o art. 585, II, do CPC.

(vi.2) Obrigação que não é certa, líquida ou exigível

Considero que a obrigação veiculada nos documentos apresentados pela Exequente não é certa, líquida ou exigível.
Afirma-se que a obrigação é certa quando há a "necessária clareza" quanto aos seus elementos.46 Como afirma Cândido Rangel Dinamarco, por direito certo deve-se entender aquele "cujos elementos sejam perfeitamente conhecidos".47
Como antes se observou, no caso ora examinado as partes não fixaram o preço do produto vendido no tempo e na forma prevista no contrato que celebraram. Assim, embora existente e válido o contrato de compra e venda, é o mesmo, ainda, ineficaz, no que diz respeito ao preço.
Tem-se, assim, que a obrigação não é certa, já que um dos elementos da obrigação - o preço - ainda não se encontra definido. Pelo mesmo motivo, falta exigibilidade a tal obrigação.
Ainda que tal obrigação fosse certa, resta também muito claro que falta-lhe liquidez. Da leitura dos documentos apresentados pela Exequente não é possível inferir a extensão da dívida cobrada. Às f., por exemplo, há dezenas de índices informados pela "Agência Estado", mas fica-se sem saber qual (ou quais) dos índices indicados foi empregado na planilha apresentada às f. Em tal planilha, por sua vez, não se indica o significado das siglas utilizadas, bem como a fonte dos valores usados nos cálculos (por exemplo, não é identificável a origem do valor indicado na coluna "Bid", e nem o significado de "Bid"…).
A propósito da ausência de tais requisitos, no item 3.3 das razões de apelação (f. e ss. dos autos), a Exequente explica, com detalhes, o modus operandi observado para se definir valores, realizar rool-over em tais contratos etc. Tal explicação, ao invés de demonstrar a presença de título executivo e dos elementos da obrigação nele veiculada, acaba tendo efeito contrário: para se chegar ao montante (supostamente) devido, parece imprescindível recorrer a elementos externos aos contratos celebrados entre as partes. Ora, consoante vetusta jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é necessário, "para instaurar-se o processo de execução, que o exequente apresente título do qual, por si só, deflua a obrigação de pagar".48 Não sendo assim, e "dependendo a apuração do valor da execução que sejam verificados fatos posteriores à emissão do contrato", inexiste título executivo, devendo aquele que se afirma credor mover ação de conhecimento condenatória, ou ação monitória.49

Parte II. Sobre a prorrogação da data de fixação do preço, avençada (segundo afirma a Exequente) sob condição suspensiva que não teria sido implementada

(i) Advertência inicial: os limites da cognição no processo de execução de título executivo extrajudicial, as afirmações feitas e os documentos juntados pela Exequente

Cumpre-nos, antes de tecer considerações a respeito do problema relativo à ocorrência de prorrogação de vencimento dos contratos - o que torna, ipso facto, inexigível a prestação objeto de execução - advertir que, nos itens que seguem, daremos ênfase às afirmações da Exequente. Temos posição, expressada em trabalhos doutrinários, no sentido de que a cognição, na execução fundada em título executivo extrajudicial, é limitada (ou parcial); logo, não se permite que, em tal modalidade de processo, realize-se cognição plena (ou completa), tal como sucederia em um processo de conhecimento. Cognição há, porém, ainda que limitada à verificação dos requisitos da execução, dentre os quais sobressai o título executivo que veicule obrigação certa, líquida e exigível.
Diante disso, ficarão em segundo plano as afirmações feitas pela Consulente e outros executados, nos autos. Interessam-nos, neste passo, aquilo que a Exequente juntou com a petição inicial, bem como o que mais tiver juntado ao longo do processo, com o intuito de dar supedâneo à sua pretensão. A execução deve ser autorizada se o juiz, diante da petição inicial da execução e dos documentos juntados pelo exequente (art. 614 do CPC), convencer-se da presença de título executivo de obrigação certa, líquida e exigível.
Examinemos, pois, o que consta dos autos, dentre o que juntou a Exequente, para conferir se tais condições encontram-se presentes.

(ii) Fato afirmado pela Exequente: realização de acordo para a prorrogação da data de fixação do preço, sujeito a condição suspensiva

Desde logo, há, nos autos, um fato que chama a atenção: num primeiro momento, instada a manifestar-se sobre a alegação realizada, em exceção de pré-executividade, a Exequente não contestou a alegação de que teria havido prorrogação do vencimento da data de fixação do preço.50 Na ocasião, limitou-se a Exequente a afirmar que, nos autos, haveria apenas prova da existência da dívida.51
Posteriormente, porém, a Exequente juntou declaração, prestada pela S. C., no sentido de que as partes, antes e depois da data originariamente indicada para a fixação do preço, negociaram a prorrogação dos vencimentos antes estipulados.
O teor da declaração prestada pela referida corretora é o seguinte:52
"Após várias reuniões havidas entre A.B. (…), V.T. (…) e S. C. (…) ocorridas entre os meses de outubro/2008 e novembro/2008, foi ajustado que os referidos contratos seriam prorrogados para julho/2009 somente mediante a assinatura de um aditivo contratual com a A.B. que deveria contemplar todas as seguintes exigências: (…)."
Segundo afirmou a Exequente, tal ajuste teria sido realizado pelas partes mediante condição, e tal condição não teria sido implementada. Sustenta a Exequente:53
"E a prorrogação para CBOT julho/2009 foi condicionada a fixação de Stop de US$ 8,00 por Bushel, que foi alcançado em 05 de dezembro de 2008, conforme declarado pela S. C. (…). Outrossim, a exigência do gatilho de preço era condição suspensiva à prorrogação, que nos termos dos arts. 121 e 125 do Código Civil não permitiriam a utilização do direito à prorrogação para a posição CBOT julho/2009 sem a assinatura do aditivo contratual com sua previsão, ou, ao menos, sua adoção perante a corretora."
É incontroverso, assim, que houve renegociação a respeito do vencimento das obrigações veiculadas originariamente nos instrumentos contratuais, e que tal renegociação se realizou ao longo de dois meses, antes (outubro de 2008) e depois (novembro de 2008) da data final, estabelecida originariamente no contrato, para a fixação do preço.
O que não está claro, nos autos, é se a condição suspensiva a que se refere a Exequente, de fato, não se operou. A declaração juntada pela Exequente também não deixa claro se havia prazo para a implementação das condições - sob esse prisma, a condição ainda não se teria verificado, mas poderia se verificar.
A seguir, examinarei a consequência jurídica desse estado de incerteza que pende sobre a prova de que ocorreu tal condição.

(iii) Sobre a prova da não ocorrência da condição suspensiva cuja observância era necessária para a prorrogação da data em que se deveria fixar o preço do produto

A lei processual brasileira condiciona a execução à demonstração da "prova de que se verificou a condição" (art. 614, III, do CPC).
No caso ora examinado, segundo declaração juntada pela Exequente, após reuniões "ocorridas entre os meses de outubro/2008 e novembro/2008, foi ajustado que os referidos contratos seriam prorrogados para julho/2009".54 Também segundo informa a Exequente, ajustaram as partes "condição suspensiva à prorrogação, que nos termos dos arts. 121 e 125 do Código Civil".55
Como se pode notar por exame perfunctório dos autos, e fica claro ao longo do presente parecer, não se está, no caso, diante de relação obrigacional simples (ou una), em que uma das partes assume a obrigação de praticar apenas um ato, correspondente ao praticado pela outra. Há, no caso ora examinado, relação obrigacional complexa, composta por diversos atos, praticados em momentos diferentes, pelas próprias partes e por terceiros (no caso, a S. C.). Não há, aqui, uma singela e estática relação crédito-débito, que se esgote instantaneamente.
A circunstância - incontroversa - de que as partes, antes e depois da data originariamente indicada para a fixação do preço do produto, continuavam a negociar sobre o momento adequado para a fixação do preço, é reveladora de que, no caso, está-se diante de relação obrigacional dinâmica - já que, a depender do preço fixado, qualquer das partes pode tornar-se credora da outra - e de formação progressiva.56 Mesmo na fase que se poderia considerar pós-contratual, as negociações entre as partes prosseguiam, com ajustes em contratos em vigor e realização de novas avenças.
É nesse contexto que surge o ajuste referido pela Exequente, realizado com o intuito de modificar a data de fixação do preço do produto para o mês de julho de 2009. Sucede que, também consoante afirma a Exequente, tal ajuste foi realizado mediante condição suspensiva, e tal condição não teria se concretizado.57
Segundo pensamos, a existência de ajuste alterando a data da fixação do preço impede que se considere certa a obrigação veiculada nos contratos celebrados entre as partes.
Sustentando a Exequente que tal alteração contratual não produz efeitos porque não verificada condição suspensiva, incumbir-lhe-ia demonstrar, nos termos do art. 614, III, do CPC, tal circunstância. Segundo nosso entendimento, não basta apenas afirmar que, convencionada a alteração da data de fixação do preço, tal negócio não produz efeitos, pois sujeito a condição suspensiva que não se concretizou. Incumbe à Exequente demonstrar, de acordo com o art. 614, III, do CPC, que o negócio jurídico em que se ajustou a nova data de fixação do preço é ineficaz.
Em situações como a presente, o direito positivo pode conceber duas soluções distintas: ou se abre um espaço para a produção de provas, ouvindo-se o executado e decidindo-se a respeito (realizando-se verdadeiro incidente de instrução), ou se condiciona o início da execução à demonstração cabal, realizada através de provas pré-constituídas, de que a condição operou-se.
O direito brasileiro não admite a primeira opção.58 Entre nós, a "prova de que ocorreu a condição" é requisito da petição inicial da execução (art. 614, III, do CPC). Como decidiu o Superior Tribunal de Justiça, "tal prova deve acompanhar a exordial, porquanto inerente à própria exigibilidade da obrigação";59 logo, cumpre ao exequente tê-la à disposição com antecedência - por isso, prova pré-constituída, e não constituenda, produzida após o ajuizamento, no curso da ação.60 À falta de documento que atenda ao comando previsto no art. 614, III, do CPC, poderá o exequente valer-se do procedimento previsto nos arts. 846 ss. do CPC.61
A complexidade e extensão dos eventos narrados na petição inicial e nas razões de apelação pela Exequente indicam que, no caso submetido a nosso exame, inexista algo que possa fazer as vezes do documento que atenda ao disposto no art. 614, III, do CPC. Que houve alteração da data em que o preço deveria ser fixado é algo sobre que as partes não controvertem - tendo a Exequente, inclusive, juntado declaração nesse sentido, e, depois, reafirmado a ocorrência do ajuste, em suas razões de apelação. A inocorrência da condição suspensiva que, segundo a Exequente, acompanhou tal ajuste, porém, é algo sobre que há dúvida.

(iv) Pode e-mail ser usado como prova de alteração contratual?

Sobre a ocorrência, ou não, da prorrogação do prazo contratual para a fixação do preço da soja, resta, ainda, uma questão, a ser por nós examinada: Podem os Executados demonstrar, com a juntada de cópia de e-mail, que houve a alteração de tal prazo? Ou tal circunstância dependeria da apresentação de um aditivo assinado por ambas as partes?
A resposta a essa questão deve ser construída à luz não apenas do que a Consulente - e outros Executados - apresentam como documento, mas, também, do que a Exequente utiliza para demonstrar a existência de seu direito. Afinal, de duas, uma: ou a juntada de cópia de e-mail é inadmissível (e o será para ambas as partes), ou não (e, neste caso, o uso de tal prova deve ser repelido, para ambas as partes).
Às f. dos autos, encontra-se cópia de e-mail, enviado pela S. C., informando a "rolagem" para julho de 2009. Também a Exequente juntou aos autos cópia de e-mail, para demonstrar a ocorrência de "rolagem" (cf. f.). A propósito, afirma a Exequente, em suas razões de apelação, que:
"a rolagem (prorrogação) da dívida dependia de manifestação da corretora, pois os contratos eram fixados à cotação CBOT que somente a S. C. tinha capacidade de operar com o CME Group."62
Caso, por outro lado, se entenda que a celebração de aditivo contratual assinado por ambas as partes seja imprescindível - contrariando, pois, o que afirma a Exequente no texto supra - tal orientação deve ser aplicada não apenas em relação à prova de ocorrência do roll-over referido às f. dos autos, mas, também, a todos os ajustes, alterações e emendas realizados nos instrumentos contratuais que são indicados como título executivo. Com efeito, como antes se mencionou, apenas em relação a dois dos contratos de compra e venda referidos nos autos houve fixação do preço do produto por ajuste assinado por ambas as partes;63 em relação aos demais, a fixação do preço ocorreu de modo temporal e formalmente inadequado.64
Causa espécie, assim, o fato de o v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso não ter dispensado tratamento paritário, às partes.

Parte III. Sobre os meios processuais de que se pode valer a Consulente, para demonstrar, doravante, os vícios existentes no processo

(i) Sobre a profundidade do efeito devolutivo da apelação interposta pela Exequente e omissão do v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso a respeito de fundamentos que poderiam levar à manutenção da r. sentença que extinguiu a execução

A r. sentença proferida pelo Juízo de primeiro grau, para extinguir a execução, não tratou apenas da questão atinente à prorrogação da data referente à fixação do preço do produto vendido. Além disso, considerou a r. sentença que, no caso, a dívida cobrada é inexigível, pois ambas as partes deixaram de cumprir a cláusula referente à fixação do preço. Manifestou-se o juízo a quo, também, sobre a ausência de cálculo que demonstrasse a extensão da dívida cobrada.65
Se, por um lado, é certo que a necessidade de motivação das decisões judiciais é inerente ao Estado Democrático de Direito, nem por isso se exige que o órgão jurisdicional manifeste-se sobre todos os fundamentos da demanda ou da defesa. Não se admite, porém, que se omita quanto a fundamentos considerados essenciais para o desfecho da lide, pois a fundamentação deve ser suficiente para sustentar a tomada de posição neste ou naquele sentido, pelo órgão jurisdicional.
Assim, não se considera viciada a sentença que julgou procedente o pedido, mas rejeitou todos os argumentos expostos pelo réu, que poderiam levar à improcedência do pedido. Mutatis mutandis, não há omissão se o pedido é julgado improcedente, mas o juiz examina e rejeita todos os fundamentos aduzidos pelo autor, que poderiam conduzir à procedência do pedido.
Esse princípio manifesta-se não apenas em relação às sentenças proferidas em primeiro grau de jurisdição, mas também ao julgamento de apelações interpostas contra sentenças.66
Contra a r. sentença que extinguiu a execução, a Exequente interpôs apelação, que foi acolhida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso. Afirmou-se, no v. acórdão, que não haveria, nos autos, provas robustas de que teria realmente ocorrido "a prorrogação do prazo contratual para promover a fixação do preço da soja comercializada".67 Não há, no v. acórdão, contudo, análise do fundamento - levado em consideração pela sentença apelada, e enfatizado, também, nas contrarrazões apresentadas pela Consulente - de que a Exequente também se encontra em mora, por não ter fixado o preço nos termos estabelecidos nos contratos.
Note-se que o v. acórdão chegou a descrever a hipótese jurídica sobre a qual deveria ter decidido, ex vi dos §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC (a saber, o inadimplemento também da Exequente em relação à fixação do preço do produto), mas sobre ela não decidiu.68
Como é cediço, o efeito devolutivo não se restringe àquilo que tiver sido suscitado pelo apelante (extensão do efeito devolutivo).69 O efeito devolutivo se manifesta, também, em sua profundidade: uma vez delimitada, pelo apelante, a extensão da cognição a ser realizada pelo órgão recursal, põe-se a questão de se saber quais as matérias que poderão ser conhecidas no julgamento do recurso.
Tal é o problema que ocorreu no caso ora examinado: dos vários fundamentos que poderiam ensejar a extinção da execução, o Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso considerou apenas um deles - relativo à prorrogação da data em que se deveria fixar o preço - silenciando a respeito dos demais.
Em tais casos, pode o legislador impor à parte vencedora - no caso, em relação à sentença, a ora Consulente - o ônus de manifestar expressamente ao tribunal as questões que deverão ser conhecidas por ocasião do julgamento da apelação interposta; ou pode, diversamente, impor ao tribunal o dever de conhecer, ex officio, a respeito daqueles fundamentos que a sentença apelada não examinou. O Código de Processo Civil brasileiro optou pela segunda alternativa. Quanto a esse aspecto, dispõe o art. 515, § 1.º, do CPC brasileiro que ficam devolvidas ao Tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro. Além disso, tendo o pedido ou a defesa mais de um fundamento, e acolhendo o juiz apenas um deles, os outros fundamentos deverão ser apreciados pelo Tribunal (cf. art. 515, § 2.º, do CPC).
Neste particular, trilhou o direito brasileiro caminho diverso daquele seguido pela legislação de outros países. O art. 636.º, 1, do novo CPC português (Lei 41/2013), por exemplo, condiciona o conhecimento de tal matéria a requerimento do recorrido.70 De modo parecido, de acordo com o art. 346, I, do CPC italiano, se tal fundamento não é expressamente suscitado pela parte, este "si intendono rinunciate".71 De igual modo sucede com as legislações processuais civis argentina (cf. art. 277 do Código Procesal Civil y Comercial de la Nación)72 e espanhola (cf. art. 465, 5, da Ley de Enjuiciamiento Civil).73
O contraste com o direito comparado é oportuno para se por em realce que, no direito processual civil brasileiro, deve o órgão recursal, ao julgar a apelação, examinar todos os fundamentos da defesa, ainda que a sentença apelada não as tenha examinado, ou tenha acolhido apenas parte delas e refutado as demais. Correta, nesse sentido, a constatação de que o efeito devolutivo da apelação, no direito brasileiro, é amplíssimo.74
A ampla profundidade do efeito devolutivo é tradição no direito processual civil brasileiro. O CPC de 1939 já dispunha, em seu art. 824, que "a apelação devolverá à superior instância o conhecimento integral das questões suscitadas e discutidas na ação".75 Os §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC, assim, seguem nesse mesmo sentido. A profundidade do efeito devolutivo é tratada, por parte da doutrina, no contexto do denominado efeito translativo,76 mas a conclusão a que se chega é a mesma: ao julgar a apelação, deverá o tribunal considerar, de ofício, os fundamentos repelidos ou desconsiderados pela sentença apelada, ainda que a parte não o requeira expressamente.
É importante notar, contudo, que, embora tal requerimento da parte seja desnecessário, a Consulente, textualmente, apontou, em suas contrarrazões de apelação, os vícios que devem conduzir à extinção da execução, a respeito dos quais o Tribunal de Justiça deveria se manifestar. Assim, não apenas em observância ao que dispõem os §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC, mas também em função da alegação expressa dos mesmos pela Consulente/apelada em suas contrarrazões, deveria o tribunal manifestar-se a respeito de tais fundamentos.
No sentido ora sustentado, há, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, acórdão paradigmático. No caso, decidiu-se que "o efeito devolutivo da apelação transfere em profundidade o conhecimento da matéria impugnada, ainda que não resolvida pela sentença, nos termos dos parágrafos 1.º e 2.º do art. 515 do CPC e, na atividade cognitiva devolvida, é aplicável a regra iura novit curia", tal como ora afirmamos. No entanto, destacou-se que, na hipótese então objeto de julgamento, "a matéria não foi tão somente devolvida ao Tribunal a quo, como também impugnada pela parte contrária, razão por que, o colegiado local poderia manifestar-se acerca da minoração do valor fixado à título de danos morais, máxime em face da impugnação da parte contrária e do princípio da devolutividade conferido ao recurso".77 Vê-se, pois, que a cautela que norteou o proceder da Consulente nada teve de excessiva. Afinal, caso se entenda que os fundamentos da exceção de pré-executividade não teriam sido devolvidos por força dos §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC, sobre tais fundamentos deveria o Tribunal manifestar-se, por ocasião do julgamento da apelação, porque os mesmos foram suscitados pela Consulente em suas contrarrazões recursais.

(ii) Cabimento dos embargos de declaração opostos pela Consulente e, se não sanado o vício, de recurso especial

A omissão suprimível através de embargos de declaração diz respeito não apenas àqueles temas que, por força de lei, deveriam ser, mas não foram analisados pelo órgão julgador, mas, também, em relação a questões suscitadas pelas partes, nas razões ou contrarrazões de apelação.78
No caso submetido a nosso exame, o tribunal, ao julgar a apelação interposta pela Exequente, deu a esta provimento para "rejeitar as exceções de pré-executividade e determinar o prosseguimento da ação executiva na origem".79 À luz do que impõem os §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC, deveria o tribunal examinar, além da questão atinente à alteração da data em que deveria ser fixado o preço do produto vendido, também o fundamento, exposto na exceção de pré-executividade apresentada pela Consulente e referido também na sentença apelada, no sentido de que a Exequente não fixou o preço do produto no tempo e de acordo com a forma prevista nos instrumentos contratuais firmados entre as partes. No entanto, o referido tribunal assim não o fez.
Vê-se, assim, que o v. acórdão que julgou a apelação foi omisso, já que deixou de se manifestar a respeito de fundamentos que, por força dos §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC, deveriam ter sido objeto de exame e decisão expressa. Omissa a v. decisão, mostram-se admissíveis os embargos de declaração opostos pelo Consulente.
Considero que, não sanada a omissão apontada, restará violado o art. 535, II, do CPC. Com efeito, dispõe o inc. II do art. 535 do CPC que há omissão quando o órgão julgador deixa de se manifestar sobre ponto a respeito do qual "devia pronunciar-se". Deve pronunciar-se o tribunal a respeito de questões suscitadas pela parte e também sobre pontos cuja cognição é imposta pela Lei, tal como ocorre com o que dispõem os §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sempre foi pacífica neste sentido,80 e esta é, a nosso ver, a solução adequada ao caso ora examinado.
Segundo nosso entendimento, caso não sanadas as omissões ora referidas, restarão violados não apenas as regras previstas nos §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC e no inc. II do art. 535 do mesmo Código, mas, também, o direito constitucional à prestação jurisdicional e o princípio constitucional da ampla defesa.81 Afinal, têm as partes direito não apenas de apresentarem as suas razões, mas, também, de ouvirem uma manifestação jurisdicional a respeito dos argumentos expendidos.
Ora, ao deixar de se manifestar sobre todos os fundamentos que poderiam conduzir à extinção da execução, o Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso profere decisão incompleta, cerceando o direito de defesa da Consulente (art. 5.º, LV, da CF/1988). Acaba-se, assim, por violar o direito constitucional à prestação jurisdicional (art. 5.º, XXXV, da CF/1988). Nesse sentido, a jurisprudência dos tribunais superiores vem, com acerto, se manifestando reiteradamente. Decidiu o Supremo Tribunal Federal que "a garantia constitucional alusiva ao acesso ao judiciário engloba a entrega da prestação jurisdicional de forma completa, emitindo o Estado-juiz entendimento explícito sobre as matérias de defesa veiculadas pelas partes. Nisto está a essência da norma inserta no inciso XXXV do art. 5.º da Carta da República".82 Semelhantemente, decidiu o Superior Tribunal de Justiça que "o Tribunal não está obrigado a responder questionário das partes. Entretanto, deve examinar questões, oportunamente suscitadas, e que, se acolhidas, poderia levar o julgamento a um resultado diverso do ocorrido".83
O cabimento de recurso aos Tribunais superiores, com fundamento na violação às disposições acima referidas, não afasta que se alegue, em recurso especial, a violação a outros dispositivos antes referidos, ao longo do presente Parecer, e igualmente mencionados pelas partes (v.g., arts. 580, 586 e 618, I, do CPC; arts. 120 ss. do CC/2002 etc.).

(iii) Do cabimento de embargos do devedor

(iii.1) Do prazo para a apresentação dos embargos, pelos executados

Segundo pensamos, no caso submetido a nosso exame, ainda não teve início o prazo para a apresentação dos embargos, pelos executados. É que, na hipótese, o Juízo a quo determinou a citação dos executados para entregar a coisa objeto da execução, "ou, depositando-a, oferecer embargos" (f. dos autos).84
Em trabalhos doutrinários, temos sustentado que, após a reforma da Lei 11.382/2006, o prazo para a oposição dos embargos, em execução para a entrega de coisa, deve observar o que dispõe o art. 738 do CPC.85 Esse, a nosso ver, deveria ter sido o procedimento a ser observado pelo Juízo a quo. No caso, porém, pensamos que não se aplica essa ordem de ideias. É que, embora revogado o art. 737 do CPC (pela Lei 11.382/2006), o Juízo a quo, textualmente, condicionou a apresentação de embargos ao depósito.
Em situações como a ora examinada, pensamos que seria contraditória a atitude do Juízo que, após orientar a observância de um dado rito procedimental (oposição de embargos após o depósito, em consonância com o art. 621 do CPC), impusesse aos executados outro (oposição de embargos após a citação, de acordo com o art. 738 do CPC, na redação da Lei 11.382/2006).
A conduta dos órgãos judiciários influencia significativamente o comportamento das partes: estas correspondem às determinações judiciais na medida em que os órgãos do Poder Judiciário despertam, objetivamente, a confiança dos litigantes.86 Assim, a atividade jurisdicional deve orientar-se de acordo com o princípio da proteção da confiança do cidadão.87
Tal ordem de ideias é amplamente aceita, na jurisprudência. Tem-se decidido, com acerto, que não pode o órgão jurisdicional adotar postura contraditória, em relação às partes. Assim agindo, violaria o juiz a máxima nemo potest venire contra factum proprium.88
Parece-nos, diante disso, que, diante das circunstâncias presentes nos autos, no caso, enquanto não realizado o depósito, não corre o prazo para a apresentação dos embargos pelos executados.

(iii.2) Do âmbito da cognição a ser realizada, nos embargos

O processo de execução fundado em título executivo extrajudicial, como antes se disse, comporta cognição parcial, limitada no plano horizontal. Não se permite às partes discutir, ou ao órgão jurisdicional decidir, sobre a existência do débito. De tal tema devem os sujeitos do processo ocupar-se nos embargos à execução - ou em outra ação de conhecimento.
Segundo nosso entendimento, o fato de determinados temas terem sido suscitados em exceção de pré-executividade, por si só, não impede que os mesmos sejam posteriormente levantados, em embargos à execução. É que a discussão travada no curso do processo de execução se sujeita aos limites estruturais desse procedimento. Assim, por exemplo, embora tenha a Consulente afirmado que houve alteração da data em que deveria ser fixado o preço do produto vendido, não se produziu - e nem seria lícito produzir - no processo de execução, provas testemunhal e pericial a respeito da questão.
A rejeição da exceção de pré-executividade, assim, não impede que, seja nos embargos à execução, seja em ação de conhecimento ajuizada pela Consulente contra a Exequente, novamente sejam discutidos os temas antes suscitados, mas não decididos de maneira definitiva, com base em cognição judicial plena e exauriente.
Há temas, porém, que, tendo sido ventilados e decididos, com base em cognição exauriente (isso é, profunda, no plano vertical), no curso da execução, não poderão ser reavivados no curso do próprio processo (em razão da preclusão) ou em outro (sob pena de violação à coisa julgada).89 Mas, como se disse, para que isso ocorra é necessário que a questão tenha sido decidida de modo definitivo - vale dizer, sem que tenha havido qualquer tipo de limitação à cognição judicial realizada.
Esse estado de coisas, como antes dissemos, não sucede, por exemplo, no que respeita à questão atinente ao adiamento da data de fixação do preço.
Algo diverso ocorre com a questão relativa à legitimidade passiva ad causam de P.G.V.N., que foi objeto de decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso. No caso, afirmou-se estar diante de matéria de ordem pública, que poderia ser resolvida independentemente de dilação probatória.90
O fato de se estar diante de extinção do processo por ausência de condição da ação (legitimidade processual) não autoriza o entendimento de que, no caso, seria possível reinserir o executado excluído no polo passivo. Há que se extrair de tal julgado o devido rendimento, a fim de se impedir o ajuizamento de ação idêntica, que contenha o mesmo vício. Enrico Tullio Liebman, a propósito, escreveu que "il diffeto delle condizioni dell'azione non riguarda quel determinato processo, ma l'azione in sè, non potrà proporsi nuovamente un altro processo finchè non mutano le circostanze di fatto rilevanti (se, per. es. non sopravviene l'interesse ad agire, che prima era mancante)".91 Sob este prisma, a sentença que acusa a ausência de uma condição da ação é, a rigor, algo até mais grave, perante o ordenamento jurídico, que a sentença que julga improcedente o pedido. Dá-se, assim, efeito idêntico ao da coisa julgada material, também nesse caso.
Há que se considerar a hipótese de, prosseguindo a execução, tornar-se necessário liquidar o valor da coisa, nos termos do art. 627, § 2.º, do CPC. O critério a ser observado para a definição do valor da coisa deverá ser o da cotação oficial do dia em que se operar a liquidação, prosseguindo a execução por tal valor, contando-se daí a correção monetária e outros consectários legais.
Nesse caso, embora a execução seja, em tese, fundada em título extrajudicial, o quantum será definido por decisão judicial, e sobre esse montante prosseguirá a execução - doravante, pelo rito previsto para execução por quantia certa. Mas o título que embasará a execução será, ainda, de natureza extrajudicial. Quaisquer temas de defesa atinentes ao an debeatur, por exemplo, poderão ser alegados pelos executados, em atenção ao que dispõe o art. 745 do CPC.

Analisados todos os dados que me foram fornecidos pela Consulente, e alicerçado nos elementos jurídicos examinados ao longo do Parecer, aos quais me reporto, assim manifesto minha opinião em relação às questões formuladas:
"1) Quais os limites do efeito devolutivo da apelação interposta pela Exequente? Deve o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso examinar outros fundamentos expostos na sentença que extinguiu a execução?"
Deveria o Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso ter examinado, por ocasião do julgamento da apelação interposta pela Exequente, não apenas as questões por ela suscitadas, mas todas as demais, referidas na sentença, bem como aquelas que consubstanciam fundamentos suscitados pelas partes (cf. art. 515, §§ 1.º e 2.º do CPC). É o que sucede, por exemplo, com o tema atinente à ausência de título executivo, face a não fixação do preço pela Exequente, até o termo final estabelecido nos instrumentos contratuais.
Caso não sejam acolhidos os embargos de declaração opostos pela Consulente com o intuito de sanar tal omissão, caberá recurso especial, por violação aos arts. 515, §§ 1.º e 2.º e 535, II, do CPC, dentre outros.
"2) A execução é lastreada em títulos executivos? No caso, a obrigação inserida nos instrumentos contratuais é certa, líquida e exigível?"
Os documentos apresentados pela Exequente não podem ser considerados títulos executivos. Os elementos da obrigação não se encontram, todos, em "documento particular subscrito pelo devedor e por duas testemunhas", como exige o art. 585, II, do CPC. Apenas em dois dos contratos pode-se verificar que a fixação do preço observou tal ditame legal - sendo que, em um deles, houve roll-over. A fixação do preço, em relação aos demais contratos, não foi realizada dentro do prazo estabelecido no contrato (há, portanto, mora accipiendi da Exequente, quanto ao ponto), não tendo sido observado, também, os requisitos de forma previstos nos instrumentos contratuais para tanto.
Por tal razão, a obrigação não é certa, sendo que, se obrigação há, a mesma não pode ser cobrada através de processo executivo, tendo em vista a ausência de título executivo.
Não bastasse, a própria Exequente juntou aos autos declaração segundo a qual houve prorrogação da data de fixação do preço, embora alegue que tal ajuste tenha sido firmado sob condição suspensiva - sendo que tal condição não teria sido implementada. Considero que, no caso, incide o art. 614, III, do CPC, sendo necessária a demonstração da ocorrência do evento afirmado pela Exequente, sob pena de inexigibilidade da obrigação - caso, no caso, tal obrigação fosse certa, o que, segundo pensamos, não é.
Note-se, por derradeiro, que não consideramos líquida a obrigação. Os critérios apontados pela Exequente para se chegar ao montante devido não são claros, pois, aparentemente, não se baseia em parâmetros objetivos.
"3) Podem a Consulente e outros executados opor embargos à execução?"
No caso, considerando que o pronunciamento que ordenou a citação observou, literalmente, o disposto no art. 621 do CPC, poderão Consulente e demais executados opor embargos após intimados da segurança do juízo. Não podem as partes ser prejudicadas pelo fato de o órgão jurisdicional ter adotado procedimento não mais previsto na lei. Incide, no caso, a máxima nemo potest venire contra factum proprium.
"4) Caso admissível a oposição de embargos pela Consulente, pode ser discutida a ocorrência de prorrogação da data de fixação do preço? Ou isso deveria ser feito em outra ação?"
Podem ser discutidos, em embargos à execução, todos os temas que não tenham sido objeto de decisão definitiva, fundada em cognição plena e exauriente, ao longo da execução.
Assim, por exemplo, a decisão que rejeita a rejeição da alegação de que houve prorrogação da data em que deveria ser fixado o preço do produto, terá sido tomada sem que se produzissem provas testemunhal e/ou pericial - o que, de resto, a rigor não é mesmo possível, no processo de execução. Logo, tal tema pode ser objeto de discussão, em ação de conhecimento, em que se permita a realização de provas, dando ensejo à prolação de decisão fundada em cognição plena e exauriente.
Caso se faça necessária a liquidação a que se refere o art. 627, § 2.º, do CPC, observar-se-á, doravante, o rito previsto para a execução por quantia certa - por valor obtido a partir da cotação oficial do produto, na data em que se fizer a liquidação. Os embargos deverão observar o disposto no art. 745 do CPC, podendo os executados alegar todas as matérias que poderiam deduzir, como defesa, em processo de conhecimento.
"5) O Sr. P.G.V.N., tendo sido excluído da execução, pode voltar a ser incluído no polo passivo, se convertida a ação em execução por quantia certa?"
Aplica-se, aqui, o mesmo princípio referido no quesito anterior: tendo havido decisão definitiva, fundada em cognição aprofundada, não se permite a rediscussão a respeito do tema. Entendemos, sob esse prisma, que não pode o executado excluído do processo por decisão judicial tornar a ocupar o polo passivo.
É o meu parecer, s.m.j.
Maringá, 1 de agosto de 2013.
   
1 ApCiv …, … Câm. Civ., j. …, rel. Des. Clarice Claudino da Silva.

2 Autos n. …, Comarca de … - MT.

3 A execução não tem por base apenas os instrumentos contratuais elencados na petição inicial às f. e juntados às f. dos autos, mas assenta-se também em outros variados documentos, que são utilizados pela Exequente para dar sustentação àquilo que deveria ser considerado título executivo (isto é, os instrumentos contratuais indicados pela Exequente às f., em sua petição inicial, e que deveriam ter as características indicadas no art. 585, II, do CPC).

4 Observe-se que, de acordo com o que consta de cláusula existente em todos os instrumentos contratuais analisados, não se admitiria estipulação de nova cláusula, salvo se "por escrito e devidamente assinado pelas partes" (cf., em relação à "confirmação de fixação de basis" de f., cláusula 10.1 do instrumento contratual correspondente, às f. - CTR 1331P80384S). Também às fls. 134 dos autos há "confirmação de fixação de preço (basis)" feita em observância ao que impunha o contrato respectivo (cf. fls. 92, cláusula 9.1 - CTR 1331P80362S), mas, no caso, houve, depois, roll-over "para novembro/08 sem quaisquer ônus para ambas as partes" (sic; cf. e-mail juntado pela Exequente às f., cf. nota precedente e texto correspondente). A leitura desses instrumentos contratuais (bem como dos documentos juntados pela Exequente que àqueles instrumentos fazem alusão) permite constatar o seguinte: (1) em relação ao contrato CTR 1331P80362S, houve, como afirma a Exequente, roll-over para novembro de 2008, sem dia para fixação do preço precisamente definido (cf. e-mail juntado pela Exequente às f.), ou seja, tal contrato não "teve prorrogado o prazo de fixação para os mesmos parâmetros dos demais", ao contrário do que afirma a Exequente às f. 10 dos autos, mas para novembro de 2008 (mês definido, mas dia indeterminado); (2) em relação ao contrato CTR 1331P80384S, houve fixação do preço em 28.07.2008 (cf. f. dos autos). Logo, aos contratos referidos (1331P80362S e 1331P80384S) não há que se falar em fixação do preço nos dias 25 ou 26.10.2008, como ocorre em relação aos demais contratos. A petição inicial padece de incorreção quanto ao ponto, pois; se a execução for admissível (e, segundo penso, tal execução não o é), para que prossiga será necessário emendar-se a petição inicial.

5 Cf. nota de rodapé a seguir.

6 Note-se, porém, que, no caso, não houve fixação do preço em observância ao que impõem os contratos firmados entre as partes (isto é, "por escrito e devidamente assinado pelas partes", cf. cláusula presente em todos os instrumentos contratuais, e dentro do prazo estabelecido nos respectivos instrumentos contratuais). Apenas em relação a dois dos contratos que servem de base à execução houve fixação do preço em atenção à referida cláusula contratual (cf. f. e f.; a respeito, cf. o que se diz na nota precedente). Quanto aos demais, não identificamos, nos autos, fixação do preço - ou, no mínimo, a "fixação" realizada através da notificação de f. e ss. não atendeu ao que se estabelecem os contratos celebrados pelas partes.

7 Note-se, nesse passo, dado relevante: a "garantia hipotecária" de f. e ss. foi firmada em 29.10.2008, depois das datas em que as partes deveriam ter fixado o preço.

8 A quantidade de documentos juntados pela Exequente - seja para instruir a petição inicial, seja para demonstrar, ao longo da tramitação do processo, a existência da dívida - releva, desde logo, que: (1.º) está-se, no caso, diante de relação obrigacional complexa, de formação sucessiva, composta por vários atos distintos das partes e de terceiros (por exemplo, manifestações de vontade a serem emitidas posteriormente pelas partes, declarações de corretores etc.) e dependente de muitos elementos variáveis (por exemplo, oscilações do preço do produto em bolsas de mercadorias etc.); (2.º) para se admitir a realização do direito afirmado pela Exequente, seria necessário realizar cognição sobre a existência da dívida (e não apenas sobre a existência do título executivo). Na verdade, tal atividade cognitiva - inadmissível, em se tratando de execução fundada em título extrajudicial - foi realizada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, que, para dar provimento à apelação interposta pela Exequente para determinar o prosseguimento da execução, teve que examinar, com vagar, a questão atinente à realização, ou não, da prorrogação do contrato, para concluir que a condição (suspensiva, consoante afirma a Exequente às f. e f. dos autos) não teria sido implementada. A necessidade de realização de tal atividade cognitiva para se autorizar a execução evidencia, segundo nosso entendimento, a ausência de título executivo. Afinal, caso se estivesse de título concebido em atenção ao art. 585, II, do CPC, que revelasse obrigação certa, liquida e exigível, a realização de tal grau de cognição seria dispensável.

9 AgIn n. … .

10 REsp …, distribuído ao Min. Raul Araújo.

11 Cf. f. e ss.

12 Cf. sentença de f. e ss.

13 Merece destaque, a nosso ver, tal fundamento: não apenas a Consulente deixou de fixar o preço do produto na data convencionada, mas também a Exequente deixou de fazê-lo. Esse aspecto foi tratado pela Consulente em sua exceção de pré-executividade, e voltou a tratar do tema - bem como de outros pontos - em suas contrarrazões de apelação (cf. f. ss.), especialmente item 2.4 (f.). Tal fundamento, como se observou, foi um dos que a r. sentença proferida pelo MM. Juízo a quo considerou, para extinguir a execução. O v. acórdão que deu provimento à apelação interposta pela Exequente, contudo, não tratou do tema.

14 Cf. acórdão de f. ss. dos autos.

15 Cf. f.

16 A hipótese, porém, foi tangenciada pelos votos que compõem o v. acórdão, mas o fundamento, a rigor, não foi conhecido (ou seja, não foi acolhido ou rejeitado) pelo Tribunal, no julgamento da apelação. Do corpo do v. acórdão, extraem-se as seguintes afirmações: "Observa-se que a Apelada não fixou o preço da soja com base na Cotação de Chicago na data aprazada (25.10.2008), tendo a Apelante fixado o valor em 29.11.2008, utilizando como parâmetro a cotação de 27.10.2008 (segunda-feira)" (f. - g.n.); "(…) a prerrogativa para o ajuste do preço haveria de ser feito primeiramente pela Apelada com a data para fixação até o dia 25.10.2008, e, caso permanecesse inerte, a estipulação deveria se dar pela Apelante até o dia 26.10.2008 (domingo)" (f. - g.n.). Vê-se, pois, que o v. acórdão descreveu a hipótese jurídica sobre a qual deveria ter decidido, ex vi dos §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC (a saber, o inadimplemento também da Exequente em relação à fixação do preço do produto), mas sobre ela não decidiu.

17 Sobre a omissão do v. acórdão a respeito da mora accipiendi, cf. item 3.1 dos embargos de declaração.

18 Autos n. … .

19 Uso aqui a expressão adotada pelo Código Civil (arts. 423 e 424), embora não desconheça que, para alguns, mais adequado seria o uso do termo "contrato por adesão". Não se quer, com isso, dizer que, no caso, se está diante de contrato de consumo. Evidentemente, pode haver contrato de adesão não regido pela Lei 8.078/1990, como dão conta os arts. 423 e 424 do CC/2002. Nesse sentido são os Enunciados n. 171 e 172, aprovados nas Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, que dispõem, respectivamente, que "o contrato de adesão, mencionado nos arts. 423 e 424 do novo Código Civil, não se confunde com o contrato de consumo", e que "as cláusulas abusivas não ocorrem exclusivamente nas relações jurídicas de consumo. Dessa forma, é possível a identificação de cláusulas abusivas em contratos civis comuns, como, por exemplo, aquela estampada no art. 424 do Código Civil de 2002".

20 Expressão comumente empregada no common law (cf., dentre outros, Gregory Klass, Contract law in USA, Kluwer Law International, 2010, p. 119).

21 Ou, como se afirma na doutrina, tais contratos são realizados "without any realistic opportunity for bargaining between the buyer and seller over the terms of contract" (William P. Statsky, Essentials of torts, 3. ed., Cengage Learning, 2011, p. 245).

22 Como se afirma na doutrina francesa - berço da concepção da doutrina do contrat d'adhésion, por Saleilles -, "le contrat d'ordinaire, de pair avec la rédaction unilatérale de conditions générales standardisées, dont la majorité des clauses sont conçues à l'avantage de leur auteur" (Patrick Wéry, Droit des obligations, vol. 1 - Théorie générale des contrats, Larcier, 2010, p. 97).

23 Pasquale Fava, Il contratto, Guiffrè, 2012, p. 37.

24 F. (…), (…), (…), (…), (…), (…) e (…), dos autos.

25 F. (…), (…), (…), (…), (…) e (…) dos autos. A única exceção é prevista às f., em que estipulou-se que o preço seria fixado com base "no preço médio praticado pela compradora no local da entrega do produto, na data da fixação".

26 Cf. fls. dos autos indicadas na nota precedente.

27 Com exceção do instrumento contratual em que estipulou-se que o preço seria fixado com base "no preço médio praticado pela compradora no local da entrega do produto, na data da fixação" (cf. f.).

28 Como antes se disse, a cláusula que indica a data limite para que as partes fixassem o preço encontra-se presente em quase todos os contratos em que se baseia a execução. Há contratos, porém, em que a questão ora examinada não tem relevância, seja porque (a) o preço foi efetivamente fixado em outra data, por ambas as partes, expressamente e por escrito - em atenção, aliás, ao que estabelece outra cláusula, segundo a qual qualquer alteração ou emenda contratual deve ser feita "por escrito e devidamente assinado pelas partes" (cláusula 10.1, na maioria dos instrumentos contratuais); seja porque (b) segundo afirma a Exequente, em um dos negócios realizados, houve roll-over para novembro/2008 (novembro, após 26.10.2008, pois), e, pelo que consta dos autos, nenhuma das partes estipulou critério para fixação do termo, em relação a tal contrato (cf. o que se disse na nota de rodapé 5, acima, e se expõe com mais vagar no item a seguir).

29 F. … - g.n.

30 Cf. declaração de f. … dos Autos.

31 Aspecto também ressaltado no v. acórdão proferido pelo TJMT: "(…) a prerrogativa para o ajuste do preço haveria de ser feito primeiramente pela Apelada com a data para fixação até o dia 25.10.2008, e, caso permanecesse inerte, a estipulação deveria se dar pela Apelante até o dia 26/10/2008 (domingo)" (f. - g.n.).

32 Cf. f. dos Autos. Neste caso, de acordo com o que afirma a Exequente em sua petição inicial, houve, depois, roll-over "para novembro/08 sem quaisquer ônus para ambas as partes". De todo modo, de acordo com a cláusula 6 do referido instrumento, passou tal "confirmação de fixação de preço a fazer parte integrante do contrato principal" (cf. f.).

33 Cf. f. dos Autos. Dispôs a cláusula 3 do referido instrumento que passou tal "confirmação de fixação a produzir todos os fins e efeitos de direito, tornando parte integrante do contrato principal" (f.).

34 O instrumento de f. é citado pela Exequente, em suas razões de apelação, como "exemplo claro e suficiente dessa sistemática" adotada entre as partes (cf. f. dos Autos). No entanto, a mesma "sistemática" não foi observada pelas partes em relação aos demais contratos.

35 Cf. descrição realizada no v. acórdão do TJMT às f. - g.n.

36 Sobre essa discussão, cf. Pontes de Miranda, Tratado de direito privado, Borsoi, 1962, vol. XXXIX, § 4.268, p. 37; mais recentemente, Jones Figueiredo Alves, in Regina Beatriz Tavares da Silva (coord.), Código Civil comentado, 6. ed., Saraiva, 2008, p. 448.

37 Ob. loc. cits.

38 Afirma Pontes de Miranda "ser possível registrar-se tal contrato, sem que ainda se haja determinado o preço" (ob. loc. cits.). Jones Figueiredo Alves lembra de hipótese semelhante a que ora se analisa. Afirma o autor que "o contrato de compra e venda se aperfeiçoa desde sua celebração e poderá, inclusive, já ter produzido alguns efeitos mesmo antes da fixação do preço. Explica-se. Se o vendedor já entregou a coisa, o contrato já produziu efeitos e ocorreu, inclusive, a transferência de propriedade da coisa" (ob. loc. cits).

39 Tal operação, naturalmente, não pode ser realizada em processo de execução; aqui, para que o processo tenha início, pressupõe-se a existência de título com obrigação certa, líquida e exigível. Cf., sobre o ponto, o que se diz a seguir.

40 Sobre esse aspecto, cf. Giovanni Verde, Attualità del principio "nulla executio sine titulo", Rivista di Diritto Processuale, vol. LIV, 1999, p. 974-976.

41 Cf., a respeito, Sérgio Shimura, Título executivo, Saraiva, 1997, n. 2.6., p. 131 ss. Cândido Rangel Dinamarco, Execução civil, 6. ed., Malheiros, 1998, n. 321, p. 485.

42 O que não significa dizer que inexista a obrigação. A ausência de título executivo impede apenas que o direito possa ser exigido através de processo de execução de título executivo regido pelo Livro II do Código de Processo Civil. Nada impede que aquele que se afirma credor lance mão se ação de conhecimento condenatória, ou, sendo o caso, de ação monitória (art. 1.102-A do CPC). A execução fundada em título executivo extrajudicial, contudo, será inadmissível, se ausente obrigação certa, líquida ou exigível (é nula, diz o art. 618, I, do CPC).

43 Na doutrina brasileira, cf. Sérgio Shimura, ob. cit., n. 3.6.2., p. 255-258. Na doutrina italiana, Italo Andolina, "Cognizione" ed "esecuzione forzata" nel sistema della tutela giurisdizionale, Giuffrè, 1983, n. 18, p. 58-59.

44 Ou em outro dispositivo legal, que reconheça que os documentos apresentados pela Exequente têm a característica de título executivo.

45 Em circunstâncias como a examinada no presente parecer, afirma-se que os elementos da obrigação "possono provarsi com altro documento a parte (…) ma in tal caso sembra che non sai sufficiente um qualsiasi documento, bensì occorra um atto o provv. della stessa indole e rivestito delle stesse forme del titolo esecutivo" (Federico Carpi, Vittorio Colesanti e Michele Taruffo, Commentario breve al codice di procedura civile, 2. ed., Cedam, 1988, p. 676). No mesmo sentido, Enrico Redenti e Mario Vellani, Diritto processuale civile, Giuffrè, 1999, vol. 3, n. 206, p. 207.

46 Cf. Elio Fazzalari, Lezioni di diritto processuale civile, vol. II, Cedam, 1986, n. 5, p. 10. Tratando do assunto sob a ótica do direito alemão, afirma Leo Rosenberg que o título executivo deve determinar "o conteúdo e a extensão da execução" (Tratado de derecho procesal civil, Ejea, 1955, t. III, § 172, p. 18).

47 Cf. Cândido Rangel Dinamarco, ob. cit., n. 328, p. 490.

48 STJ, REsp 26.171/PR, 3.ª T., j. 14.12.1992, rel. p/ acórdão Min. Eduardo Ribeiro.

49 STJ, REsp 252.013/RS, 4.ª T., j. 29.06.2000, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira.

50 Cf. petição de f. e ss.

51 Cf., especialmente, f.

52 Cf. f. dos autos; grifou-se, em negrito.

53 Cf. f. e dos autos.

54 Cf. declaração da S. C., juntada pela Exequente às f. e dos autos.

55 Cf. f. dos autos.

56 Sobre a correta compreensão, à luz do Código Civil, de contratos com tais características, cf. Judith Martins-Costa, Comentários ao novo Código Civil, Rio de Janeiro, Forense, 2003, vol. 5, t. II, p. 33 ss.; da mesma autora, cf., ainda, A reconstrução do direito privado, São Paulo, Ed. RT, 2002, p. 651-655. Sobre o mesmo tema, no direito português, cf. António Menezes Cordeiro, Tratado do direito civil português, 2. ed., Coimbra, Almedina, 2000, t. I, p. 233 e ss.; Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das obrigações cit., p. 92 e ss.; Antônio Manuel da Rocha e Menezes Cordeiro, Da boa fé no direito civil, Coimbra, Almedina, 2001, p. 861 e ss.

57 Tal afirmação é contrariada pela Consulente, que afirma que todas as condições avençadas entre as partes foram observadas. No presente item, porém, nos limitamos a examinar os documentos apresentados e declarações feitas pela Exequente.

58 No direito comparado, tal solução é prevista no artigo 715.º do novo CPC português (Lei 41, de 26.06.2013).

59 STJ, REsp 986.972/MS, 4.ª T., j. 04.10.2012, rel. Min. Luis Felipe Salomão.

60 Sobre essa distinção, cf. Jorge Augusto Pais de Amaral, Direito processual civil, 6. ed., Coimbra, Almedina, 2006, p. 260; Giovanni Arieta, Francisco de Santis e Luigi Montesano, Corso base di diritto processuale civile, 3. ed., n. 138, p. 297-298.

61 Nesse sentido, assim leciona Araken de Assis: "Tal prova há de se constituir previamente à demanda executória e acompanhá-la, obrigatoriamente (art. 283 do CPC). Existem duas soluções concebíveis para o problema: ou o credor possui prova documental, tout court, desincumbindo-se do ônus; ou semelhante tipo de prova a ele é inalcançável. Nesta última hipótese, o credor deverá assegurar a prova da ocorrência da condição, pelos meios lícitos (art. 322), através da ação de produção antecipada (arts. 846 a 851)" (Manual da execução, 9. ed., São Paulo, Ed. RT, 2004, n. 31.2, p. 180-181).

62 Cf. f. dos autos.

63 Cf. f. e dos autos.

64 Cf. item (iv) da Primeira Parte, acima.

65 Esses aspectos foram suscitados pela Consulente em sua exceção de pré-executividade e também em suas contrarrazões de apelação (cf. f. e ss.), especialmente nos itens 2.4 e 3.1. Embora tais fundamentos tenham orientado o Juízo a quo a extinguir a execução, o v. acórdão que deu provimento à apelação interposta pela Exequente não tratou de tais temas.

66 Cf. o que se diz a seguir.

67 Cf. f.

68 A hipótese foi apenas mencionada pelos votos que compõem o v. acórdão, mas o fundamento, a rigor, não foi conhecido (ou seja, não foi acolhido ou rejeitado) pelo Tribunal, no julgamento da apelação.

69 Cf. Nelson Nery Jr., Princípios fundamentais - Teoria geral dos recursos, 3. ed., p. 361; José Carlos Barbosa Moreira, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 5, n. 194-195, p. 315 a 318.

70 "Artigo 636.º (Ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido). 1 - No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação."

71 "Art. 346. Decadenza dalle domande e dalle eccezioni non riproposte. I. Le domande e le eccezioni non accolte nella sentenza di primo grado, che non sono espressamente riproposte in appello, si intendono rinunciate."

72 "Artículo 277. Poderes del tribunal. El tribunal no podrá fallar sobre capítulos no propuestos a la decisión del juez de primera instancia. No obstante, deberá resolver sobre los intereses y daños y perjuicios, u otras cuestiones derivadas de hechos posteriores sentencia de primera instancia."

73 "Artículo 465. Resolución de la apelación. (…). 5. El auto o sentencia que se dicte en apelación deberá pronunciarse exclusivamente sobre los puntos y cuestiones planteados en el recurso y, en su caso, en los escritos de oposición o impugnación a que se refiere el artículo 461. La resolución no podrá perjudicar al apelante, salvo que el perjuicio provenga de estimar la impugnación de la resolución de que se trate, formulada por el inicialmente apelado."

74 Cf. José Carlos Barbosa Moreira, Comentários… cit., n. 244, p. 446. Corretamente decidiu o Superior Tribunal de Justiça que, "por vezes, o tribunal exerce cognição mais vertical do que o juiz a quo, porquanto lhe é lícito conhecer de questões que sequer foram apreciadas em primeiro grau, haja vista que a apelação é recurso servil ao afastamento dos 'vícios da ilegalidade' e da 'injustiça', encartados em sentenças definitivas ou terminativas" (STJ, REsp 631.877/RS, 1.ª T., j. 04.04.2006, rel. Min. Luiz Fux).

75 Muito tempo antes, nas Ordenações Filipinas, assim eram orientados os julgadores, quanto ao julgamento da apelação: "não mandem tornar o feito ao Juiz, de que foi appellado, mas vão por elle em diante, e o determinem finalmente, como acharem por Direito, salvo, se o appellante e o appellado ambos requererem, que se torne o feito à terra perante o Juiz, de que foi appellado" (Livro 3, tít. 68).

76 Cf. Nelson Nery Jr., Teoria geral dos recursos, 6. ed., p. 482 ss.

77 STJ, REsp 996.056/SC, 1.ª T., j. 28.04.2009, rel. Min. Luiz Fux; grifou-se.

78 Nesse sentido, assim decidiu, corretamente, o Superior Tribunal de Justiça: "1. Havendo omissão no acórdão em apelação, deve essa ser sanada em sede de embargos de declaração, sob pena de nulidade do decisório. 2. O Tribunal de origem, ao dar provimento à apelação cível interposta pela empresa ora recorrida, deixou de analisar as preliminares suscitadas nas contra-razões de apelação, relativas à decadência e ao não-cabimento de mandado de segurança, por incidência da Súmula 271/STF, bem como os próprios fundamentos da r. sentença que acolhia a preliminar de carência da ação, em virtude do implemento do prazo decadencial e da ausência de prova pré-constituída a embasar a impetração. Ademais, instada a se manifestar sobre o tema em sede de embargos de declaração, a Corte estadual não sanou as omissões supramencionadas. 3. Recurso especial parcialmente provido, para declarar a nulidade do acórdão proferido em embargos de declaração, determinando-se o retorno dos autos à Corte de origem, a fim de que seja sanada a omissão" (STJ, REsp 700.190/RS, rel. Min. Denise Arruda, 1.ª T., j. 02.08.2007; grifou-se).

79 Cf. f. dos autos.

80 Cf. STJ, REsp 1.030.817/DF, 1.ª Seção, j. 25.11.2009, rel. Min. Luiz Fux. No mesmo sentido: "É da Jurisprudência desta Corte o entendimento de que 'conforme resulta dos §§ 1.º e 2.º do art. 515 do CPC, é integral, em profundidade, o efeito devolutivo da apelação: não se cinge às questões efetivamente resolvidas na instância inferior; abrange também as que poderiam tê-lo sido'" (STJ, REsp 168.930/MS, 4.ª T., j. 21.10.2008, rel. Min. Luiz Felipe Salomão); "O Tribunal, ao julgar a apelação, deve observar os ditames do art. 515 do CPC, devendo examinar as teses suscitadas e discutidas no processo, caso em que, incorrendo em omissão, deve corrigi-la através dos embargos declaratórios opostos, sob pena de violação ao art. 535 do CPC. 4. Omissão também quanto à análise de violação a dispositivos legais surgida no julgamento da apelação" (STJ, REsp 313.521/MG, 2.ª T., j. 27.05.2003, rel. Min. Eliana Calmon).

81 Michelle Taruffo, La motivazione della sentenza civile, Ed. Cedam, 1975, cap. VI, p. 402.

82 STF, RE 172.084/MG, 2.ª T., DJU 03.03.1995, p. 4.111; grifou-se. No mesmo sentido, cf. também, dentre outros, STF, Ag 238.664/DF, 2.ª T., j. 10.04.1999, rel. Min. Marco Aurélio; STF, 2.ª T., RE 158.655/PA, rel. Min. Marco Aurélio, DJU 02.05.1997.

83 STJ, REsp 785.913/MG, 2.ª T., j. 20.05.2008, rel. Min. Eliana Calmon; grifou-se. No mesmo sentido: "Deve ser declarado nulo o acórdão recorrido para que outro julgamento seja proferido, em obediência ao devido processo legal, quando o tribunal de origem deixa de apreciar fundamentadamente questões indispensáveis ao irrepreensível deslinde da controvérsia, mesmo que instado a fazê-lo por meio de embargos de declaração" (STJ, REsp 885.618/SP, 3.ª T., j. 23.10.2007, rel. Min. Nancy Andrighi).

84 O Juízo a quo deferiu a execução nos termos pleiteados pela Exequente, que fundamentou seu pedido (cf. f.) no art. 621 do CPC - segundo o qual o executado é citado para "satisfazer a obrigação ou, seguro o juízo (art. 737, II) apresentar embargos" - transcrevendo, inclusive, tal dispositivo legal.

85 Cf. o que escrevemos em Código de Processo Civil comentado, 2. ed., São Paulo, Ed. RT, 2012, p. 787-788.

86 "Os postulados da segurança jurídica, da boa-fé objetiva e da proteção da confiança, enquanto expressões do Estado Democrático de Direito, mostram-se impregnados de elevado conteúdo ético, social e jurídico", e incidem estes princípios "sobre comportamentos de qualquer dos Poderes ou órgãos do Estado" (STF, MS 25.805/DF, j. 22.03.2010, rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática). O princípio da proteção da legítima confiança é considerado desdobramento do princípio da segurança jurídica (ou, ainda, dimensão subjetiva deste princípio; cf. STJ, REsp 799.965/RN, 3.ª T., j. 07.10.2008, rel. Min. Sidnei Beneti, em que se decidiu que "o direito processual deve trazer segurança às partes"). A proteção à confiança, como um dos elementos constitutivos do Estado de direito, "se reconduz à exigência de certeza e calculabilidade, por parte dos cidadãos" (José Joaquim Gomes Canotilho, Manual de direito constitucional, 6. ed., p. 264). Ausentes a segurança, a estabilidade e a previsibilidade, o Direito "se constituiria, de certa forma mesmo, até em fator de insegurança" (Arruda Alvim. Tratado de direito processual civil, vol. 1, p. 19).

87 Corretamente, nesse sentido, assim se decidiu: "Na hipótese em que, por equívoco do escrivão, fica consignado de maneira expressa na correspondência do art. 229 do CPC, que o prazo para a contestação será contado a partir da juntada do respectivo AR, a parte foi induzida a erro por ato emanado do próprio Poder Judiciário. Essa peculiaridade justifica que se excepcione a regra geral, admitindo a contestação e afastando a revelia" (STJ, REsp 746.524/SC, 3.ª T., j. 03.03.2009, v.u., rel. Min. Nancy Andrighi, RT 884/170).

88 Nesse sentido, cf., dentre outros, os seguintes julgados: "A jurisprudência desta Corte Superior proclama que, na hipótese de oposição de embargos do devedor, sem a comprovação do recolhimento de preparo, o juiz deve determinar o cancelamento da distribuição do processo e o arquivamento dos respectivos autos, independentemente de intimação pessoal. Todavia, na espécie, a conduta do juízo a quo revela-se contraditória e viola o princípio insculpido na máxima nemo potest venire contra factum proprium, na medida em que anteriormente determinou - quando não precisava fazê-lo - a intimação para recolhimento do preparo e, ato contínuo, mesmo após o cumprimento de sua ordem, entendeu por bem julgar extinta a demanda, sem julgamento de mérito. Tal atitude viola o princípio da boa-fé objetiva porque criou, na parte autora, a legítima expectativa de que, após o recolhimento do preparo, dentro do prazo estabelecido pelo magistrado, suas razões iniciais seriam examinadas, observando-se o devido processo legal" (STJ, REsp 1.116.574/ES, 3.ª T., j. 14.04.2011, rel. Min. Massami Uyeda). "É imperiosa a proteção da boa-fé objetiva das partes da relação jurídico-processual, em atenção aos princípios da segurança jurídica, do devido processo legal e seus corolários - princípios da confiança e da não surpresa - valores muito caros ao nosso ordenamento jurídico. Ao homologar a convenção pela suspensão do processo, o Poder Judiciário criou nos jurisdicionados a legítima expectativa de que o processo só voltaria a tramitar após o termo final do prazo convencionado. Por óbvio, não se pode admitir que, logo em seguida, seja praticado ato processual de ofício - publicação de decisão - e, ademais, considerá-lo como termo inicial do prazo recursal. Está caracterizada a prática de atos contraditórios justamente pelo sujeito da relação processual responsável por conduzir o procedimento com vistas à concretização do princípio do devido processo legal. Assim agindo, o Poder Judiciário feriu a máxima nemo potest venire contra factum proprium, reconhecidamente aplicável no âmbito processual" (STJ, REsp 1.306.463/RS, 2.ª T., j. 04.09.2012, rel. Min. Herman Benjamin).

89 Nesse sentido, assim decidiu o STJ: "As questões decididas definitivamente em sede de exceção de pré-executividade não podem ser renovadas por ocasião da oposição de embargos à execução, em razão da força preclusiva da coisa julgada. O art. 469 do CPC, ao estabelecer quais as partes da sentença não abrangidas pela coisa julgada, retirou a imutabilidade das questões que compõem os fundamentos jurídicos aduzidos pelo autor, enfrentados pelo réu e decididos pelo juiz. Com efeito, no caso em julgamento tem-se que a coisa julgada deve abarcar a matéria relativa à prescrição - já decidida em sede de exceção de pré-executividade anterior, entre as mesmas partes e com o mesmo objeto litigioso -, o que torna o ponto infenso à apreciação pelo Tribunal a quo" (STJ, REsp 927.136/RS, 4.ª T., j. 17.05.2012, rel. Min. Luis Felipe Salomão,).

90 Consta, do referido acórdão: "A questão da legitimidade é matéria de ordem pública, devendo ser conhecida de ofício e em qualquer grau de jurisdição, pelo que, com maior razão, deve ser admitida quando reclamada através do incidente de pré-executividade. (…) Ante o exposto, dou provimento ao recurso para julgar procedente a exceção de pré-executividade e reconhecer a ilegitimidade passiva do excipiente, ora agravante, e, com relação a ele, julgar extinta a execução, condenando, ainda o exequente nas custas processuais e honorários advocatícios que fixo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do artigo 20, § 4.º do Código de Processo Civil".


91 Manuale di diritto processuale civile, vol. 1, n. 80, p. 156.