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21 de agosto de 2021

A morte de usufrutuário que arrenda imóvel, durante a vigência do contrato de arrendamento, sem a reivindicação possessória pelo proprietário, torna precária e injusta a posse exercida pelos seus sucessores, mas não constitui óbice ao exercício dos direitos provenientes do contrato de arrendamento pelo espólio perante o terceiro arrendatário

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/08/info-700-stj.pdf

 

USUFRUTO - Usufrutuário havia arrendado o imóvel objeto do usufruto; usufrutuário morreu; com isso, extingue-se o usufruto; porém, enquanto o proprietário não reivindicar a posse, os sucessores do usufrutuário poderão pleitear os direitos contratuais em face do arrendatário 

A morte de usufrutuário que arrenda imóvel, durante a vigência do contrato de arrendamento, sem a reivindicação possessória pelo proprietário, torna precária e injusta a posse exercida pelos seus sucessores, mas não constitui óbice ao exercício dos direitos provenientes do contrato de arrendamento pelo espólio perante o terceiro arrendatário. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.758.946-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 08/06/2021 (Info 700). 

Usufruto 

Usufruto é... 

- o direito real e temporário 

- de usar e fruir (retirar frutos e utilidades) 

- coisa alheia (bem móvel ou imóvel), 

- de forma gratuita, 

- sem alterar-lhe a substância ou destinação econômica. 

Exemplo: a mãe tinha uma casa e resolve doar para seu filho. Ao fazer a doação, contudo, a mãe estabelece seu direito real de usufruto sobre o imóvel enquanto viver (usufruto vitalício). Assim, a mãe terá o direito real de usar e fruir da casa (no caso, morar) até que venha a falecer. Veja abaixo os personagens envolvidos no usufruto: 

USUFRUTUÁRIO 

É o titular do direito real de usufruto.

É o detentor do domínio útil do bem, uma vez que a ele pertencem o uso e o gozo sobre a coisa. 

Tem a posse direta do bem. 

Em nosso exemplo, é a mãe. 


NU-PROPRIETÁRIO

É o titular do domínio. 

Tem apenas a nua propriedade, despida dos direitos de usar e fruir. O nu-proprietário mantém apenas os direitos de dispor e reivindicar o bem. 

Tem a posse indireta do bem. 

Em nosso exemplo, é o filho. 


O usufruto está disciplinado nos arts. 1.390 a 1.411 do Código Civil. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

João é proprietário de um imóvel rural (uma fazenda). João concedeu a Lucas usufruto vitalício desse imóvel. Ocorre que Lucas (usufrutuário) não sabe administrar uma fazenda e, por essa razão, ele decidiu arrendar o imóvel para Pedro. Assim, Lucas, figurando como arrendador, celebrou com Pedro (arrendatário), um contrato particular de arrendamento agrícola pelo período de 03/03/2003 até 03/03/2009. Chegou o dia 03/03/2009, termo final do contrato de arrendamento. Apesar disso, Pedro (arrendatário) não devolveu a posse do imóvel para Lucas (arrendador). Diante disso, o contrato de arrendamento, que era um ajuste por prazo determinado, passou a ser um pacto por prazo indeterminado, conforme prevê o art. 95, IV, do Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64). Lucas faleceu em 2008. O espólio de Lucas ajuizou ação de despejo cumulada com cobrança e rescisão contratual em desfavor de Pedro, almejando a resolução do contrato de arrendamento rural, a reintegração de posse do imóvel arrendado e o pagamento dos valores vencidos e não pagos concernentes ao período de 2008 a 31/12/2011. Pedro argumentou que o espólio do usufrutuário/arrendador não teria legitimidade ativa para propor essa ação, tendo em vista que o óbito do usufrutuário extinguiu o usufruto, nos termos do art. 1.410, I, do Código Civil: 

Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis: 

I - pela renúncia ou morte do usufrutuário; (...) 

O que o STJ decidiu sobre o tema? O espólio do usufrutuário possui legitimidade ativa neste caso? 

SIM. É verdade que, havendo a morte do usufrutuário, ocorre a extinção do usufruto (art. 1.410, I, do CC). O usufruto, por ter caráter personalíssimo, não se transmite aos herdeiros, sendo descabida no ordenamento jurídico brasileiro a sucessividade desse direito real. “A regra básica dirigida ao usufruto da pessoa natural é que não pode durar além de sua existência. A morte do usufrutuário extingue-o, não sendo transferido a seus herdeiros.” (VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: reais. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 564). Contudo, diante do efeito constitutivo do registro no cartório imobiliário, o falecimento do usufrutuário não opera efeitos automaticamente, de forma que, mesmo sendo descabida a sucessão do usufruto, as implicações deste subsistirão enquanto não cancelado o registro e retomado o pleno domínio do bem pelo proprietário. Explicando melhor esse ponto: 

O usufruto, por se tratar de direito real, somente se adquire com o registro no Cartório de Registro de Imóveis, nos termos do art. 1.227 do CC: 

Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código. 

Em raciocínio inverso, para a desconstituição do direito real sobre imóvel, é imprescindível o cancelamento do registro no cartório imobiliário para que o direito anteriormente constituído deixe de irradiar efeitos, sobretudo em face de terceiros, visto que o registro é requisito para a eficácia erga omnes do direito real. Assim, se o usufruto recair sobre bem imóvel, a sua constituição ou desconstituição pressupõem o registro e a averbação do cancelamento na respectiva matrícula no Cartório de Registro de Imóveis, medidas estas dotadas de efeito constitutivo, sobretudo em relação a terceiros (arts. 1.227 e 1.410, caput, do CC; arts. 167, II, e 252 da Lei nº 6.015/1973 – Lei de Registros Públicos). No caso, o usufrutuário/arrendador faleceu em 2008, mas somente em 2012 houve a averbação do cancelamento do usufruto, isto é, depois do período cobrado e após o ajuizamento da ação. Ademais, efetivado o usufruto, ocorre o desdobramento da posse, passando o proprietário à condição apenas de possuidor indireto, e o usufrutuário de possuidor direto. Havendo a cessão do exercício do usufruto, pelo usufrutuário, a terceiro (no exemplo, Pedro), mediante contrato de arrendamento (art. 1.399 do CC), acarretará o desdobramento sucessivo da posse, sendo possuidores indiretos o proprietário e o usufrutuário/arrendador, e direto o arrendatário. Sobrevindo a morte do usufrutuário (que é causa de extinção desse direito real), a posse, enquanto não devolvida ou reivindicada pelo proprietário (no exemplo, João), transmite-se aos sucessores do usufrutuário (sucessores de Lucas), mas com o caráter de injusta, dada a sua precariedade. Com isso, o possuidor não perde tal condição em decorrência da mácula que eventualmente recaia sobre sua posse. Contudo, tal vício objetivo da posse repercute apenas na esfera jurídica da vítima do ato agressivo da posse e do agressor, em razão da sua relatividade, o que significa dizer que a justiça ou injustiça da posse somente vale para o proprietário e os sucessores do usufrutuário, não possuindo alcance erga omnes, revelando-se sempre justa em relação a terceiros. Assim, por mais que se possa dizer que a posse dos sucessores de Lucas seja injusta em relação a João (proprietário), ela é uma posse justa em relação a Pedro (arrendatário). O espólio, por se tratar de universalidade de direito, constitui-se pelo complexo de relações jurídicas titularizadas pelo autor da herança, nos moldes do art. 91 do CC, aí se incluindo, na espécie, a relação originária do arrendamento rural. 

Em suma: A morte de usufrutuário que arrenda imóvel, durante a vigência do contrato de arrendamento, sem a reivindicação possessória pelo proprietário, torna precária e injusta a posse exercida pelos seus sucessores, mas não constitui óbice ao exercício dos direitos provenientes do contrato de arrendamento pelo espólio perante o terceiro arrendatário. STJ. 3ª Turma. REsp 1.758.946-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 08/06/2021 (Info 700)

Filigrana doutrinária: Silvio de Salvo Venosa - Usufruto

 “A regra básica dirigida ao usufruto da pessoa natural é que não pode durar além de sua existência. A morte do usufrutuário extingue-o, não sendo transferido a seus herdeiros.” 

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: reais. 20ª ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 564.