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15 de outubro de 2021

A ANVISA, no exercício do “ato de anuência prévia” do art. 229-C da Lei 9.279/96, podia adentrar no exame de quaisquer aspectos dos produtos ou processos farmacêuticos

Fonte: Dizer o Direito

Referência:  https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-703-stj-1.pdf


PATENTE 

A ANVISA, no exercício do “ato de anuência prévia” do art. 229-C da Lei 9.279/96, podia adentrar no exame de quaisquer aspectos dos produtos ou processos farmacêuticos 

Em se tratando de pedido de patente de fármacos, competia à Anvisa analisar - previamente à análise do INPI - quaisquer aspectos dos produtos ou processos farmacêuticos - ainda que extraídos dos requisitos de patenteabilidade (novidade, atividade inventiva e aplicação industrial) - que lhe permitam inferir se a outorga de direito de exclusividade (de produção, uso, comercialização, importação ou licenciamento) poderá ensejar situação atentatória à saúde pública. Art. 229-C. A concessão de patentes para produtos e processos farmacêuticos dependerá da prévia anuência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. (Incluído pela Lei nº 10.196/2001) (Posteriormente revogado pela Lei nº 14.195/2021) STJ. 4ª Turma. REsp 1.543.826-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 05/08/2021 (Info 703). 

INPI 

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da Economia, sendo responsável, no Brasil, pela concessão e garantia dos direitos de propriedade intelectual para a indústria. 

Patente 

Patente é um título de propriedade temporária concedido pelo INPI para a pessoa que inventou um novo produto, um novo processo ou para quem fez aperfeiçoamentos destinados à aplicação industrial. A patente, concedida ao autor de uma invenção ou de um modelo de utilidade, é o direito de, durante determinado tempo, só ele explorar economicamente essa invenção ou modelo de utilidade. Veja o que diz o art. 6º Lei nº 9.279/96: 

Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo de utilidade será assegurado o direito de obter a patente que lhe garanta a propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei. 

Existe, no Brasil, patente de produtos ou processos farmacêuticos? 

Para responder isso, é importante fazermos um breve histórico: 

• a concessão de patentes de produtos e processos farmacêuticos era proibida no Brasil, por força do art. 9º, letra “c”, da Lei nº 5.772/71 (antigo Código da Propriedade Industrial); 

• no final dos anos 1980, em virtude da não patenteabilidade de produtos e processos farmacêuticos — o que contrariava os interesses de muitos laboratórios internacionais —, o País passou a sofrer sanções comerciais unilaterais, na forma de sobretaxa de 100% sobre a importação de produtos brasileiros dos setores farmacêutico, eletroeletrônico e de papel e celulose. O impasse entre Brasil e Estados Unidos gerou a abertura de processo de solução de controvérsia no âmbito do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), sistema econômico multilateral de normas e concessões tarifárias criado em 1947, cujas regras e princípios foram incorporados pela Organização Mundial de Comércio (OMC), fundada em 1995; 

• a superação dessa controvérsia começou a se resolver em 1994, quando o Estado brasileiro assinou o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio (o chamado Acordo TRIPS); 

• o Decreto nº 1.355/94 incorporou no Brasil o Acordo TRIPS (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio); 

• O que foi o Acordo TRIPS? Em inglês: “Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights”. Em português: Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Foi um tratado Internacional, integrante do conjunto de acordos assinados por diversos países, em 1994, que encerrou a “Rodada Uruguai” e criou a Organização Mundial do Comércio (OMC). O Acordo TRIP estabeleceu, em seu artigo 27.1, a proibição de se discriminarem áreas tecnológicas para fins de patente. Isso obrigou os Estados-membros a considerar patenteável qualquer invenção, de produto ou processo, em todos os setores tecnológicos, sem restrições. 

• O Brasil precisou se adaptar ao artigo 27.1 do Acordo TRIPS. Em razão desse compromisso assumido no plano internacional, o Brasil precisou adaptar sua legislação para permitir a patente de produtos ou processos nas áreas agroquímica e farmacêutica. Isso porque, como já mencionado, a Lei brasileira proibia essa patente. 

• em 1996, foi editada a Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), que revogou a Lei nº 5.772/71 e incorporou as disposições protetivas dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio previstas no Acordo TRIPS, passando, a partir de então, a se admitir, no Brasil, a patente de produtos e processos farmacêuticos. 

• em 1999, o Presidente da República editou a Medida Provisória 2.006, de 14 de dezembro de 1999 — convertida, posteriormente, na Lei nº 10.196/2001 —, que introduziu o art. 229-C na Lei de Propriedade Industrial, condicionando a concessão de patentes de fármacos à anuência prévia da ANVISA; 

• em 2021, após o julgado do STJ que está sendo aqui comentado, a Lei nº 14.195/2021 revogou o art. 229-C da Lei nº 9.279/96. 

Como era a concessão de patente de produtos e processos farmacêuticos com base no art. 229-C da Lei nº 9.279/96? 

O art. 229-C da Lei nº 9.279/96 dizia que a concessão de patentes para produtos e processos farmacêuticos dependia da prévia anuência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Assim, a indústria farmacêutica pedia o registro do produto ou processo farmacêutico no INPI. Em seguida, o INPI emitia parecer técnico sobre o pedido de patente. Se este fosse favorável, ainda se tinha que aguardar a manifestação da ANVISA, que era exigida com base no art. 229-C da Lei nº 9.279/96, que dizia o seguinte: 

Art. 229-C. A concessão de patentes para produtos e processos farmacêuticos dependerá da prévia anuência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. (Incluído pela Lei nº 10.196/2001) (Posteriormente revogado pela Lei nº 14.195/2021) 

Existia uma gigantesca discussão jurídica sobre a abrangência desse art. 229-C. Qual era o grau de análise da ANVISA a respeito do pedido? A agência tinha uma atuação restrita avaliando apenas eventuais riscos do produto à saúde humana ou fazia uma análise ampla, que incluía outros aspectos? 

O exame feito pela ANVISA era amplo. Conforme decidiu o STJ: 

Em se tratando de pedido de patente de fármacos, compete à Anvisa analisar - previamente à análise do INPI - quaisquer aspectos dos produtos ou processos farmacêuticos - ainda que extraídos dos requisitos de patenteabilidade (novidade, atividade inventiva e aplicação industrial) - que lhe permitam inferir se a outorga de direito de exclusividade (de produção, uso, comercialização, importação ou licenciamento) poderá ensejar situação atentatória à saúde pública. STJ. 4ª Turma. REsp 1.543.826-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 05/08/2021 (Info 703). 

A ANVISA, mesmo sendo uma agência detentora de conhecimento especializado no setor de saúde, quando fazia a análise para esse “ato de anuência prévia” do art. 229-C da Lei nº 9.279/96, podia adentrar no exame de quaisquer aspectos dos produtos ou processos farmacêuticos, ainda que relacionados com a análise dos requisitos de patenteabilidade (novidade, atividade inventiva e aplicação industrial). Isso porque essa análise era fundamental para a ANVISA examinar se a outorga do direito de exclusividade representaria potencial prejuízo às políticas públicas do SUS voltadas a garantir a assistência farmacêutica à população. A atuação da ANVISA neste caso tinha, portanto, uma função redistributiva, na qual se procurava conciliar o interesse privado (relacionado com o direito de exclusividade da exploração lucrativa da invenção) com as metas e os objetivos de interesses públicos relacionados com as políticas de saúde. O mister institucional da ANVISA no processo de concessão de patentes farmacêuticas não se confunde com o controle sanitário de medicamentos, drogas e insumos farmacêuticos, realizado no âmbito do procedimento de registro. 

Interpretação baseada na conjugação das Leis 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), 9.782/99 (Lei da ANVISA) e 10.742/2003 (Lei do setor farmacêutico) 

O art. 18, I, da Lei nº 9.279/96 afirma que não pode ser patenteado aquilo que for contrário à saúde pública. A expressão “saúde pública” tem significado mais amplo que “saúde individual”. Não se resume a tratamento ou a recuperação de doença, mas sim compreende o conjunto de medidas preventivas e de controle de enfermidades destinadas a garantir o bem-estar físico, mental e social de todos e de cada um dos membros da coletividade, o que inclui ações de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica e a formulação de política de medicamentos. O art. 6º da Lei nº 9.782/99 prevê que a finalidade institucional da ANVISA é a de promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras. O art. 7º também da Lei nº 9.782/99 afirma que compete à ANVISA a correção de falhas de mercado do setor de fármacos, mediante o monitoramento da evolução dos preços de medicamentos, podendo a agência reguladora, para tanto, requisitar informações, proceder ao exame de estoques ou convocar os responsáveis para explicarem conduta indicativa de infração à ordem econômica, tais como a imposição de preços excessivos ou aumentos injustificados (inciso XXV). A Lei nº 10.742/2003, por sua vez, estabelece normas de regulação do setor farmacêutico, com a finalidade de promover a assistência farmacêutica à população, por meio de mecanismos que estimulem a oferta de medicamentos e a competitividade do setor. 

ANVISA fazia a regulação econômico-social do setor de medicamentos 

Nessa perspectiva, a estipulação da “anuência prévia” da autarquia especial, como condição para a concessão da patente farmacêutica, tem por base o seu papel de regulação econômico-social - ou socioeconômica - do setor de medicamentos, que se justifica pelos mandamentos extraídos da Carta Magna, no sentido da necessária harmonização do direito à propriedade industrial com os princípios da função social, da livre concorrência e da defesa do consumidor, assim como o interesse social encartado no dever do Estado de, observada a cláusula de reserva do possível, conferir concretude ao direito social fundamental à saúde (arts. 5º, incisos XXIII, XXIX, 6º, 170, incisos III, IV e V, e 196). 

O parecer negativo da ANVISA era meramente opinativo ou tinha caráter vinculativo? 

Tinha caráter vinculativo. À luz da norma legal analisada (art. 229-C da Lei nº 9.279/96), a exigência de anuência prévia da ANVISA constituía pressuposto de validade da concessão de patente de produto ou processo farmacêutico. Logo, o parecer negativo da ANVISA, em casos nos quais demonstrada a contrariedade às políticas de saúde pública, não deveria ser considerado como um simples “subsídio” à tomada de decisão do INPI. Essa recusa da ANVISA tinha caráter vinculativo. Nas palavras do Min. Luis Felipe Salomão: 

“Desse modo, reconhecendo-se a anuência prévia da Anvisa como pressuposto de validade da concessão de patente de produto ou processo farmacêutico, é certo que o respectivo parecer negativo, em casos nos quais demonstrada a contrariedade às políticas de saúde pública, não pode ser adotado apenas como subsídio à tomada de decisão do INPI. O caráter vinculativo da recusa de anuência é, portanto, indubitável.”


28 de junho de 2021

É inconstitucional o parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/96

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/06/info-1017-stf.pdf


DIREITO EMPRESARIAL - PATENTE 

É inconstitucional o parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/96 


É inconstitucional o parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/96: Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior. Essa norma contraria a segurança jurídica, a temporalidade da patente, a função social da propriedade intelectual, a duração razoável do processo, a eficiência da administração pública, a livre concorrência e a defesa do consumidor e o direito à saúde. STF. Plenário. ADI 5529/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 12/5/2021 (Info 1017). 

INPI 

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério da Economia, sendo responsável, no Brasil, pela concessão e garantia dos direitos de propriedade intelectual para a indústria. 

Patente 

Patente é um título de propriedade temporária concedido pelo INPI para a pessoa que inventou um novo produto, um novo processo ou para quem fez aperfeiçoamentos destinados à aplicação industrial. A patente, concedida ao autor de uma invenção ou de um modelo de utilidade, é o direito de, durante determinado tempo, só ele explorar economicamente essa invenção ou modelo de utilidade. Veja o que diz o art. 6º Lei nº 9.279/96: 

Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo de utilidade será assegurado o direito de obter a patente que lhe garanta a propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei. 

Direitos 

A patente confere os seguintes direitos ao seu titular: 

Art. 42. A patente confere ao seu titular o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos: I - produto objeto de patente; II - processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado. § 1º Ao titular da patente é assegurado ainda o direito de impedir que terceiros contribuam para que outros pratiquem os atos referidos neste artigo. § 2º Ocorrerá violação de direito da patente de processo, a que se refere o inciso II, quando o possuidor ou proprietário não comprovar, mediante determinação judicial específica, que o seu produto foi obtido por processo de fabricação diverso daquele protegido pela patente. 

Depósito do pedido junto ao INPI 

O procedimento para obtenção da patente tem início com o depósito do pedido no INPI, que deverá ser instruído com uma série de documentos e informações. Em regra, a patente deverá ser requerida junto ao INPI pelo próprio autor, em nome próprio. Poderá também ser requerida pelos herdeiros ou sucessores do autor, pelo cessionário ou por aquele a quem a lei ou o contrato de trabalho ou de prestação de serviços determinar que pertença a titularidade (art. 6º, § 2º, da Lei nº 9.279/96). 

Proteção conferida pela patente retroage 

É importante destacar que, expedida a carta-patente, surge para o titular o direito de obter indenização pela exploração indevida do objeto patenteado, inclusive em relação ao período entre a publicação do pedido e a concessão da patente, como preceitua o art. 44 da Lei: 

Art. 44. Ao titular da patente é assegurado o direito de obter indenização pela exploração indevida de seu objeto, inclusive em relação à exploração ocorrida entre a data da publicação do pedido e a da concessão da patente. 

Assim sendo, uma vez concedida a patente, a proteção por ela conferida retroage a momento inicial do processo, o que funciona como uma contenção (um desestímulo) aos concorrentes que cogitem explorar indevidamente o objeto protegido durante a tramitação do pedido. A proteção patentária, portanto, não se inicia apenas com a decisão final de deferimento do pedido, sendo interessante notar que a lei considera o requerente como presumivelmente legitimado a obter a patente, salvo prova em contrário, conforme o art. 6º, § 1º, da LPI. 

Prazo de vigência das patentes 

Em regra, a vigência da patente observará os prazos fixos de 20 anos para invenções e de 15 anos para modelos de utilidade, contados da data de depósito, conforme o caput do art. 40 da Lei: 

Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze) anos contados da data de depósito. 

A Lei de Propriedade Intelectual prevê, contudo, uma regra adicional no parágrafo único do mesmo dispositivo: a contar da data de concessão da patente, o prazo de vigência não será inferior a 10 anos para a patente de invenção e a 7 anos para a patente de modelo de utilidade: 

Art. 40 (...) Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior. 

Assim, por exemplo, se o INPI demorar 10 anos para deferir um requerimento de patente de invenção, essa patente vigerá por mais 10 anos, de modo que, ao final do período de vigência, terão transcorrido 20 anos desde o depósito. Repare que, neste caso, o prazo do caput foi respeitado. Por outro lado, se a autarquia demorar 15 anos para deferir o pedido, estando garantido que a patente vigerá por mais 10 anos desde a concessão (regra do parágrafo único), ao final do período de vigência terão transcorrido 25 anos desde a data do depósito. Repare que, neste segundo caso, o titular terá gozado dos privilégios da patente por mais tempo do que o previsto no caput do art. 40. 

Problema do parágrafo único: gera um prazo variável de proteção 

Vê-se, portanto, que o parágrafo único do art. 40 estabelece um prazo variável de proteção, pois esse depende do tempo de tramitação de cada processo administrativo. Ademais, caso o INPI demore mais de 10 anos, no caso da invenção, ou mais de 8 anos, no caso do modelo de utilidade, para proferir uma decisão final, o período total do privilégio ultrapassará o tempo de vigência previsto no caput do art. 40. 

E depois que terminar o prazo da patente? 

Findo o prazo de vigência da patente, a proteção extingue-se e seu objeto passa a ser considerado de domínio público, conforme o art. 78, I e parágrafo único, da Lei: 

Art. 78. A patente extingue-se: I - pela expiração do prazo de vigência; (...) Parágrafo único. Extinta a patente, o seu objeto cai em domínio público. 

ADI 

O Procurador-Geral da República ajuizou ação direta de inconstitucionalidade contra o parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial). O PGR alegou que o parágrafo único, ao impor esse prazo mínimo de vigência contado depois da concessão, acaba por tornar o prazo de proteção indeterminado, já que não se sabe quanto tempo demorará para o INPI conceder. Em caso de atraso na análise dos pedidos por muitos anos (o que acontece em alguns casos), a patente ultrapassaria os prazos máximos previstos no caput do art. 40. Para o autor, essa indeterminação do prazo viola o art. 5º, XXIX, da CF/88, que afirma que o privilégio de utilização dos inventos deve ser temporário: 

Art. 5º (...) XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País; 

O STF concordou com os argumentos do PGR? 

SIM. O STF, por maioria, julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/96. Vencidos os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux. A norma impugnada contraria a segurança jurídica, a temporalidade da patente, a função social da propriedade intelectual, a duração razoável do processo, a eficiência da administração pública, a livre concorrência e a defesa do consumidor e o direito à saúde. 

Segurança jurídica 

Como o prazo do parágrafo único só começa a ser contado a partir da data de concessão da patente e como não se sabe quando o INPI terminará a análise do pedido, a conclusão que se chega é a de que o parágrafo único do art. 40 traz a previsão de um prazo indeterminado. Ocorre que isso gera insegurança jurídica e ofende o próprio Estado Democrático de Direito. A previsibilidade quanto ao prazo de vigência das patentes é essencial para que os agentes de mercado (depositantes, potenciais concorrentes e investidores) possam fazer escolhas racionais. A ausência de regras claras dá margem ao arbítrio e à utilização oportunista e anti-isonômica das regras do jogo, tais como as estratégias utilizadas pelos depositantes para prolongar o período de exploração exclusiva dos produtos. 

Temporalidade da patente 

Para além de representar ofensa à segurança jurídica, a norma questionada subverte a própria essência do art. 5º, XXIX, da Constituição Federal, que determina que seja assegurada por lei a proteção à propriedade industrial mediante um privilégio temporário, com observância do interesse social e do desenvolvimento tecnológico e econômico do País. Conforme já demonstrado, o parágrafo único do art. 40 da Lei de Propriedade Industrial (LPI) não observa o quesito da temporariedade, pois, ao se vincular a vigência da patente à data de sua concessão, ou seja, indiretamente, ao tempo de tramitação do respectivo processo no INPI, se indetermina o prazo de vigência do benefício, o que concorre para a extrapolação dos prazos previstos no caput do art. 40 e para a falta de objetividade e previsibilidade de todo o processo. 

Função social da propriedade 

A norma questionada também enseja violação da função social da propriedade intelectual: 

Art. 5º (...) XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; 

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) III - função social da propriedade; 

Bens incorpóreos não são exceção à imposição constitucional de observância à função social da propriedade e, como tais, demandam a harmonização de interesses individuais e coletivos. A temporariedade da patente permite a harmonização da proteção à inventividade com o cumprimento da função social da propriedade, pois, apesar de resguardar os direitos dos autores de inventos ou modelos de utilidade por um período determinado, incentivando e remunerando os investimentos em inovação, garante ao restante da indústria e à sociedade a possibilidade de se apropriar dos benefícios proporcionados pelos produtos da criatividade, a partir da extinção dos privilégios de sua exploração. Se por um lado a CF/88 concede o privilégio da proteção à propriedade industrial, por outro, garante que, a partir de determinado prazo, os demais agentes da indústria venham a se igualar ao titular da patente na possibilidade de exploração do objeto protegido, liberando-o à lógica concorrencial do mercado. O prolongamento arbitrário do privilégio vem em prejuízo do mercado como um todo, pois proporciona justamente o que a Constituição buscou reprimir, ou seja, a dominação dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros, aprofundando a desigualdade entre os agentes econômicos e transformando o que era justificável e razoável em inconstitucional. 

Livre concorrência e a defesa do consumidor 

A falta de justa limitação temporal das patentes evidencia contrariedade à livre concorrência e à defesa do consumidor, pois o adiamento da entrada da concorrência no mercado possui sérios impactos sobre os preços dos produtos e, consequentemente, sobre o acesso dos consumidores a tais produtos. A CF/88, ao promover uma ordem econômica em que haja competição entre os agentes do mercado de forma igualitária, busca garantir, também, a liberdade de escolha dos consumidores, cujo exercício depende da multiplicidade de opções. 

Duração razoável do processo e eficiência da administração pública 

Observa-se, ademais, que a prorrogação do prazo de vigência da patente prevista no parágrafo único do art. 40 da LPI, ao tempo em que não contribui para a solução do atraso crônico dos processos submetidos ao INPI, acaba por induzir o descumprimento dos prazos previstos no caput do dispositivo. A norma ameniza as consequências da mora administrativa e prolonga o período de privilégio usufruído pelos depositantes, em prejuízo dos demais atores do mercado, além da Administração Pública, incorrendo, assim, em direta afronta aos princípios da razoável duração do processo e da eficiência administrativa. 

Direito à saúde 

Por fim, é necessário mencionar que o parágrafo único gera um prolongamento excessivo de patentes relacionadas com a indústria farmacêutica, o que faz com que haja uma violação ao direito à saúde. O domínio comercial proporcionado pela patente por períodos muito longos tem impacto no acesso da população a serviços públicos de saúde, uma vez que onera o sistema ao eliminar a concorrência e impor a aquisição de itens farmacêuticos por preço estipulado unilateralmente pelo titular do direito, acrescido do pagamento de royalties sobre os itens patenteados que o Poder Público adquire e distribui. Consequentemente, a extensão do prazo de vigência das patentes afeta diretamente as políticas públicas de saúde do País e obsta o acesso dos cidadãos a medicamentos, ações e serviços de saúde, dando concretude aos prejuízos causados não apenas a concorrentes e consumidores, mas principalmente àqueles que dependem do SUS para garantir sua integridade física e sua sobrevivência. Em suma: 

É inconstitucional o parágrafo único do art. 40 da Lei nº 9.279/96, segundo o qual os prazos de vigência de patentes e de modelos de utilidade podem ser prorrogados na hipótese de o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior. STF. Plenário. ADI 5529/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 12/5/2021 (Info 1017). 

Modulação dos efeitos 

O Plenário, por maioria, modulou os efeitos da decisão de declaração de inconstitucionalidade, nos seguintes termos: Em regra, a decisão proferida nesta ADI 5529 terá eficácia ex nunc. Assim, os efeitos da decisão de declaração de inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da LPI são ex nunc, contados a partir da publicação da ata de julgamento. Logo, ficam mantidas as extensões de prazo concedidas com base no art. 40, parágrafo único, mantendo, assim, a validade das patentes já concedidas e ainda vigentes em decorrência do aludido preceito. 

Exceções. Existem duas situações nas quais a decisão produzirá efeitos ex tunc: 

a) em relação às ações judiciais propostas até o dia 7 de abril de 2021, inclusive (data da concessão parcial da medida cautelar no presente processo); e 

b) as patentes que tenham sido concedidas com extensão de prazo relacionadas a produtos e processos farmacêuticos e a equipamentos e/ou materiais de uso em saúde. 

Em ambas as situações, opera-se o efeito ex tunc, o que resultará na perda das extensões de prazo concedidas com base no parágrafo único do art. 40 da LPI, respeitado o prazo de vigência da patente estabelecido no caput do art. 40 da Lei nº 9.279/96 e resguardados eventuais efeitos concretos já produzidos em decorrência da extensão de prazo das referidas patentes. 

DOD PLUS – APROFUNDANDO 

Para quem se interessa pelo tema, recomendo ler o excelente voto proferido pelo Ministro Relator e também o parecer do Professor Eros Grau que consta no processo. O Professor Eros Grau sintetiza os desdobramentos do parágrafo único do art. 40: 

“(i) prolonga, injustificadamente, o privilégio de exploração exclusiva de produtos e processos industriais, em prejuízo de quantos possam concorrer como titulares da patente e, ainda, dos consumidores, beneficiários da livre concorrência nos mercados; 

(ii) impede que virtuais concorrentes do depositante do pedido de patente tenham conhecimento da data a partir da qual poderão explorar economicamente os produtos ou processos objeto da patente, o que compromete calculabilidade e previsibilidade indispensáveis à atuação dos agentes econômicos no mercado, vale dizer, certeza e segurança jurídica; e 

(iii) permite, viabiliza, incita comportamentos adversos à livre concorrência da parte de depositantes de pedidos de patente, comportamentos voltados, tanto quanto isso se torne possível, ao retardamento do processo de exame do pedido de patente conduzido pelo Poder Executivo; quanto mais lento for esse exame, mais extenso será o privilégio de utilização exclusiva dos produtos e processos patenteados”.