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23 de agosto de 2021

EXECUÇÃO. DESISTÊNCIA. CITAÇÃO. EMBARGOS DO DEVEDOR. ANUÊNCIA. DESNECESSIDADE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NÃO CABIMENTO

RECURSO ESPECIAL Nº 1.682.215 - MG (2017/0156709-5) 

RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA 

EMENTA 

RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. DESISTÊNCIA. CITAÇÃO. EMBARGOS DO DEVEDOR. ANUÊNCIA. DESNECESSIDADE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NÃO CABIMENTO. 

1.Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

2. Cinge-se a controvérsia a definir (i) se, apresentado o pedido de desistência da execução antes da citação dos executados, os embargos do devedor devem ser apreciados ou julgados extintos e se, nessa circunstância, o credor responde pelo pagamento dos honorários advocatícios; (ii) se há contradição entre a fundamentação e o dispositivo do acórdão e (iii) se a fixação da verba honorária deve observar o regramento previsto no CPC/1973 ou o CPC/2015. 

3. A desistência da execução antes do oferecimento dos embargos independe da anuência do devedor. Precedentes. 

4. A apresentação de desistência da execução quando ainda não efetivada a citação dos devedores provoca a extinção dos embargos posteriormente opostos, ainda que estes versem acerca de questões de direito material. 

5. O credor não responde pelo pagamento de honorários sucumbenciais se manifestar a desistência da execução antes da citação e da apresentação dos embargos e se não houver prévia constituição de advogado nos autos. 

6. Recurso especial provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília (DF), 06 de abril de 2021(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por MARIA ISMÁLIA FAGUNDES DOS SANTOS, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais assim ementado: 

"APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - DESISTÊNCIA DA AÇÃO DE EXECUÇÃO - EMBARGOS QUE TRATAM DE MATÉRIA DE DIREITO - CAUSA MADURA - ART. 515 §3º - CONTRATO SEM FORÇA EXECUTIVA - PEDIDO INICIAL JULGADO PROCEDENTE - EXECUÇÃO EXTINTA - ÔNUS SUCUMBENCIAIS DO EXEQUENTE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS - SENTENÇA REFORMADA. 1. Nas hipóteses de desistência da ação executiva, serão extintos os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, do contrário, a extinção dependerá da concordância dos embargantes, conforme § único e alíneas do art. 569 do CPC. 2. O art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil (CPC) dispõe que 'nos casos de extinção do processo sem julgamento de mérito (art.267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento'. 3. É certo que a sucumbência tem sua raiz hermenêutica no princípio da causalidade. Essa é a exegese do artigo 20, caput, do Código de Processo Civil (CPC). Assim, aquele que deu causa ao iní'cio do processo litigioso deve arcar com as despesas processuais dele decorrentes. 4. Sentença reformada" (fl. 241 e-STJ). 

Os embargos de declaração opostos pelos recorridos foram acolhidos para fixar os honorários advocatícios de acordo com a nova legislação processual civil e os da recorrente foram rejeitados (fls. 311-315 e-STJ). 

Nas presentes razões (fls. 318-339 e-STJ), a recorrente, além de dissídio jurisprudencial, aponta violação dos arts. 20, § 4º, 267, § 4º, 269, I, 515, § 3º, 535 e 569 do Código de Processo Civil de 1973 e arts. 14, 85, 485, § 4º, 487, I, 569, 775, 1.013 e 1.022 do Código de Processo Civil de 2015. 

Defende a extinção, sem resolução do mérito, da ação executiva e dos embargos, eximindo a exequente do pagamento de honorários sucumbenciais, visto que houve o pedido de desistência da execução antes da citação dos executados. 

Acrescenta que "(...) a desistência da ação de execução foi requerida pela Recorrente na data de 29/10/2014 (fl. 58), (ii) a citação dos Recorridos ocorreu na data de 19/11/2014 (f1.61) e 21/11/2014 (fl. 62) e (iii) a oposição dos embargos à execução foi realizada nas datas de 09/12/2014 e 17/12/2014.(...) Isso porque, quando os Recorridos foram citados, peticionaram nos autos indicando bens à penhora e opuseram os cabíveis embargos, o Recorrente há muito já havia manifestado seu intuito de desistência, o que autoriza a imediata extinção do feito, sem resolução do mérito, nem a oitiva dos Recorridos, e tampouco a condenação da Recorrente no pagamento de honorários advocatícios" (fls. 323-324 e-STJ). 

Assevera que, por força do princípio da disponibilidade, é lícito ao credor manifestar a desistência a qualquer tempo, a despeito da anuência do devedor, sem que lhe sejam impostos quaisquer ônus. 

Aduz a existência de contradição entre a fundamentação e a conclusão do julgado, pois o reconhecimento da ausência de título executivo extrajudicial impõe a extinção do feito sem resolução de mérito. 

Sustenta que a definição dos honorários advocatícios deve obedecer ao regramento da legislação processual civil revogada, tendo em vista que o julgamento da apelação ocorreu em 16/3/2016. 

Após as contrarrazões (fls. 359-374 e 383-388 e-STJ), a Terceira Vice-Presidência do Tribunal de origem admitiu o processamento do presente apelo (fls. 390-391 e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): O acórdão impugnado pelo recurso especial foi publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

A irresignação merece prosperar. 

Cinge-se a controvérsia a definir (i) se, apresentado o pedido de desistência da execução antes da citação dos executados, os embargos do devedor devem ser apreciados ou julgados extintos e se, nessa circunstância, o credor responde pelo pagamento dos honorários advocatícios; (ii) se há contradição entre a fundamentação e o dispositivo do acórdão e (iii) se a fixação da verba honorária deve observar o regramento previsto no CPC/1973 ou o CPC/2015. 

1. Histórico da demanda 

Maria Ismália Fagundes dos Santos - ME (ora recorrente) propôs ação de execução contra Consórcio Fidens-Milplan, Fidens Engenharia e Milplan Engenharia Construções e Montagens Ltda. (ora recorridos) visando o recebimento do valor de R$ 479.264.22 (quatrocentos e setenta e nove mil duzentos e sessenta e quatro reais e vinte dois centavos) decorrente da ausência de pagamento de duplicatas vencidas provenientes de contrato de locação de equipamento (fls. 1-6 e-STJ). 

Formulada a desistência da execução (fl. 60 e-STJ) e após a discordância do executado (fl. 151 e-STJ), o magistrado de piso indeferiu o pedido da exequente (fl. 153 e-STJ). Contra tal decisão foi interposto agravo de instrumento (fls. 165-172 e-STJ) e, em juízo de retratação, o Juízo primevo homologou a desistência e julgou extintas a execução e os respectivos embargos (fls. 185-186 e-STJ). 

Irresignadas, as partes interpuseram a apelação (fls. 197-201 e 206-211 e-STJ), sendo que o Tribunal de origem negou provimento ao recurso da ora recorrente e deferiu o dos ora recorridos, consoante a seguinte fundamentação: 

"(...) 13. É cediço que a execução realiza-se por interesse do credor,conforme inteligência do art. 612 do CPC. Dessa forma, o caput art. 519 do referido ordenamento processual, prevê a faculdade de o credor desistir da ação executiva outrora proposta, senão vejamos: (...) 14. É mister dizer que a desistência da execução não importa em renúncia ao direito a executar, tampouco prescinde de vênia do executado,caso tenha sido pedida antes do oferecimento dos embargos. Outro não é o entendimento do STJ, neste aspecto. À guisa de ilustração: (...) 15. Na hipótese, verifico que o pedido de desistência feito pela apelada foi, ab initio, corretamente acolhido pelo magistrado a quo, uma vez que os embargos foram opostos em momento posterior ao pedido de desistência,conforme demonstrado a seguir. 16. Compulsando detidamente os autos verifico que a ação de execução foi distribuída no dia 07/07/2014, sendo que em 29/10/2014 foi protocolizada petição de desistência, como indicado à fls. 58. Por sua vez,as apelantes foram citadas, respectivamente, em 19/11/2014 (fl. 61) e17/12/2014 (fl. 148-v). 17. Cumpra-me, todavia, dizer que, nas hipóteses de desistência da ação executiva, serão extintos os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, do contrário, a extinção dependerá da concordância dos embargantes, conforme § único e alíneas do art. 569 do CPC, in verbis: (...) 18. Desta feita, caso o embargante tenha suscitado questões de direito material, a extinção dos embargos dependerá de sua concordância. (...) 21. É importante dizer que, in casu, nos embargos à execução foram levantadas questões processuais já decididas em saneador, bem como questões de direito material relativas à inexigibilidade do título. Assim, a meu ver, atuou com desacerto o juiz de primeiro grau uma vez que,conforme supramencionado, a desistência na ação de execução não implica na extinção'automática dos embargos que versam também sobre direito material. 22. Pois bem. O art. 515, § 3°, do Código de Processo Civil (CPC) dispõe que 'nos casos de extinção do processo sem julgamento de mérito, o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento'. (...) 24. Com efeito, é o caso dos autos, visto que o processo foi extinto sem julgamento de mérito, devido desistência da exequente nos autos da ação de execução. (...) 25. Assim, por não demandar dilação probatória além daquela já constante nos autos, passo analisar o mérito da lide. 26. Nos termos do art. 585,II do CPC o contrato de Locação é documento hábil a embasar a execução, posto que é um título extrajudicial,senão vejamos: (...) 27. Ocorre que, analisando minuciosamente o contrato acostado aos autos (fls. 09-14), verifico que este foi assinado apenas por uma das embargantes, qual seja, a Consórcio Fidens Milplan, e encontra-se desacompanhada de duplicatas,comprovantes de entregas das mercadorias e/ou qualquer outro documento representativo de eventual título executivo. 28. Ademais, observo que o referido documento também não possui liquidez,uma vez que,conforme estipulado entre as partes, é imprescindível a realização de medições para apuração e consolidação do quantum debeatur. 29. Desta feita, tratando-se de contrato desprovido de liquidez, certeza e exigibilidade é possível concluir que este não possui força executiva, razão pela qual julgo, nos termos do art. 515, § 3º e 269, I, do CPC, procedentes os pedidos constantes nos embargos à execução. 30. Por sua vez, insurge-se a exequente, ora primeira apelante, sustentando que não deve arcar com os ônus sucumbenciais. Em contrapartida, sustentam as segundas apelantes, que os honorários advocatícios devem ser majorados, em razão do serviço prestado pelo procurador. (...) 32. Assim, na hipótese, deverá a embargada, ora primeira apelante,arcar com os ônus sucumbenciais. 36. Nesse sentido, nos embargos à execução, entendo coerente a majoração dos honorários advocatícios para R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), visto que se enquadra nos moldes da legislação com o razoável e condizente com a atuação do patrono no presente feito" (fls. 244-251 e-STJ). 

Os embargos de declaração opostos pelos recorridos foram acolhidos para fixar os honorários com base no Código de Processo Civil de 2015, nos seguintes termos: 

"(...) POSTO ISSO, NEGO PROVIMENTO À PRIMEIRA APELAÇÃO E DOU PROVIMENTO À SEGUNDA APELAÇÃO, para reformar a sentença a quo julgando procedente o pedido inicial, nos termos do art. 1.013, §3° e 487, inciso I do Novo Código de Processo Civil, bem como arbitrar os honorários advocatícios para o importe de 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §2° do Código de Processo Civil de 2015 e, por conseguinte, julgo extinta a execução" (fls. 313-314 e-STJ). 

Feitos esses esclarecimentos, passa-se à análise do presente apelo. 

2. Das consequências advindas do pedido de desistência da execução 

A recorrente defende a extinção sem resolução do mérito da ação executiva e dos embargos, eximindo a credora do pagamento de honorários sucumbenciais, visto que houve o pedido de desistência da execução antes da citação dos devedores. 

Para a ampla compreensão da matéria controvertida, seguem os principais fatos processuais em ordem cronológica: 

- 7/7/2014 - distribuição da execução (fls. 1-6 e-STJ); 

- 11/9/2014 - despacho determinando a citação dos executados (fl. 58 e-STJ); 

- 29/10/2014 - petição de desistência (fl. 60 e-STJ); 

- 19/11/2014 - citação da Milplan - Engenharia Construções e Montagens Ltda (fl. 64 e-STJ); 

- 21/11/2014 - nomeação de bem à penhora (fl. 66 e-STJ); 

- 9/12/2014 e 17/12/2014 - apresentação de embargos à execução; 

- 17/12/2014 - citação da Fidens Engenharia S.A. (fl. 156 e-STJ), e 

- 19/1/2015 - discordância da desistência apresentada pela recorrida Milplan (fl. 151 e-STJ). 

O art. 569 do CPC/1973 estabelece que o credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas. Em consequência, serão extintos os embargos que versarem exclusivamente acerca de questões processuais, pagando o credor as custas e os honorários advocatícios e, nas demais situações, a extinção dependerá da concordância do embargante (executado). Eis, por oportuno, a transcrição do referido dispositivo legal: 

"Art. 569. O credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas. Parágrafo único. Na desistência da execução, observar-se-á o seguinte: a) serão extintos os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, pagando o credor as custas e os honorários advocatícios; b) nos demais casos, a extinção dependerá da concordância do embargante". 

Com efeito, a desistência da execução apresentada antes do oferecimento dos embargos independe da anuência do devedor. Na situação em análise, como o pedido de desistência foi formulado em 29/10/2014 e os embargos somente foram opostos em 9/12/2014 e 17/12/2014, correto o entendimento das instâncias ordinárias em homologar o pedido do exequente e extinguir a execução sem resolução de mérito, mesmo com a objeção do executado (fl. 151 e-STJ). 

Nesse sentido: 

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO. EMBARGOS OPOSTOS APÓS A DESISTÊNCIA. 1. Se a desistência ocorrer antes do oferecimento dos embargos, desnecessária é a anuência do devedor. 2. Precedentes do STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no Ag 538.284/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/4/2004, DJ 7/6/2004) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO. EMBARGOS OPOSTOS APÓS A DESISTÊNCIA. 1. Se a desistência ocorrer antes do oferecimento dos embargos, desnecessária é a anuência do devedor. 2. Precedentes do STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no Ag 538.284/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/4/2004, DJ 7/6/2004) 

Nesse contexto, cumpre ressaltar que o magistrado de piso não fixou honorários advocatícios na execução, visto que "não se instaurou a relação processual com os executados quando do pedido de desistência" (fl. 185 e-STJ). Ademais, julgou extintos os embargos e condenou o executado ao pagamento da verba honorária no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) para cada embargante (fls. 186 e-STJ). 

No julgamento das apelações, o Tribunal local reformou parcialmente a sentença para julgar procedentes os embargos do devedor e majorar a quantia antes estabelecida para R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) (fl. 251 e-STJ). Por ocasião dos declaratórios, os honorários foram atribuídos em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa dado aos embargos, com base no art. 85, § 2º, do CPC/2015 (fls. 313 e-STJ). 

Dessa forma, resta analisar se os embargos à execução deveriam ter sido apreciados ou julgados imediatamente extintos diante do anterior pedido de desistência da execução, assim como o cabimento dos honorários advocatícios. 

O Superior Tribunal de Justiça tem julgado no sentido de que os embargos do devedor são ação de natureza autônoma e meio de defesa no processo de execução, que visa impedir, minorar ou extinguir a pretensão do credor contida em título extrajudicial (REsp nº 1.033.505/MG, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 5/12/2019, DJe 12/12/2019). 

Daniel Amorim Assumpção Neves também perfilha idêntico entendimento:

 "(...) A natureza jurídica dos embargos pode ser inteiramente creditada à tradição da autonomia das ações, considerando-se que no processo de execução busca-se a satisfação do direito do exequente, não havendo espaço para a discussão a respeito da existência ou da dimensão do direito exequendo, o que deverá ser feito em processo cognitivo, chamado de embargos à execução." (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil: volume único. Salvador: Juspodivm, 2018, págs. 1.339-1.340) 

Todavia, apesar da autonomia dos embargos do devedor, a sua propositura depende (i) da prévia existência da relação processual entre exequente e executado, com a efetiva ocorrência de citação ou de comparecimento espontâneo devedor aos autos, (ii) e da ausência de fato pretérito à angularização do processo que impeça a continuidade da demanda executiva (a exemplo da desistência). 

Na hipótese, antes da citação dos devedores, o credor postulou a desistência da demanda executiva. Assim, os embargos opostos carecem de pressuposto da existência ou de constituição válida, visto que, repita-se, a desistência apresentada antes da citação, faz com que o processo principal (execução) seja extinto precocemente e a demanda incidental (embargos) fique prejudicada. 

Com efeito, a autonomia dos embargos do devedor não é absoluta, tanto que a sua existência ou o seu cabimento estão intrinsecamente ligados ao processo de execução com a relação processual angularizada. E é por isso que a outra característica dos embargos é o seu vínculo de incidentalidadede com a execução (processo principal). 

Nessa linha de intelecção, a Quarta Turma desta Corte assentou que, "embora os embargos do devedor constituam ação autônoma, não se pode considerá-los completamente independentes, já que são o meio de defesa do executado" (AgInt no AREsp nº 365.126/PR, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 27/6/2017, DJe 1º/8/2017 - grifou-se). 

Assim, é importante ressaltar que a aplicação do art. 569, parágrafo único, do CPC/1973, dispositivo anteriormente transcrito, pressupõe que a desistência da execução tenha sido apresentada após os embargos. Por outro lado, se a desistência ocorrer antes da oposição dos embargos, estes devem ser imediatamente prejudicados independentemente de versarem a respeito de questões processuais ou materiais. 

Diante disso, se a petição de desistência foi apresentada em 11/9/2014 e a citação dos executados se aperfeiçoou em 19/11/2014 e 17/12/2014, os embargos devem ser julgados extintos sem resolução de mérito, devendo, no ponto, ser restabelecida a sentença de primeiro grau. 

Passa-se, portanto, à apreciação do cabimento de honorários sucumbenciais. 

No processo civil, para se analisar qual das partes responderá pelo pagamento de honorários, deve-se atentar não somente à sucumbência, mas também ao princípio da causalidade, segundo o qual a parte que deu causa à instauração do processo deverá suportar os ônus sucumbenciais (REsp nº 1.223.332/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 22/5/2014, DJe 15/8/2014). 

Por sua vez, a Quarta Turma deste Tribunal Superior tem entendimento no sentido de que o credor responde pelo pagamento de honorários advocatícios quando a desistência da execução ocorrer após a constituição de advogado e da indicação de bens à penhora, independentemente da oposição de embargos. Eis, a propósito, o seguinte julgado: 

"AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE EXECUÇÃO DE QUANTIA CERTA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO - INSURGÊNCIA RECURSAL DO EXEQUENTE. 1. A sucumbência, para fins de arbitramento dos honorários advocatícios, tem por norte a aplicação do princípio da causalidade, de modo que a parte que suscitou instauração do processo deverá suportar os ônus sucumbenciais. Consoante o princípio da causalidade, os honorários advocatícios são devidos quando o credor desiste da ação de execução após o executado constituir advogado e indicar bens à penhora, independentemente da oposição ou não de embargos do devedor à execução. Precedentes. 2. Na hipótese, o Tribunal de origem, com base nos elementos fático-probatórios constantes dos autos, concluiu que quem deu causa à propositura da demanda foi a recorrente. Alterar tal conclusão demandaria o reexame de fatos e provas, inviável em recurso especial, a teor do disposto na Súmula 7 do STJ. 3. Agravo interno desprovido". (AgInt no REsp 1.849.703/CE, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 30/3/2020, DJe 2/4/2020 - grifou-se) 

Entretanto, na hipótese vertente, antes da desistência da demanda executiva, os devedores não constituíram advogado nos autos e não praticaram nenhum ato processual, o que somente ocorreu após a citação. Dessa forma, não há como atrair para o exequente a aplicação do princípio da causalidade. 

Ademais, o credor não pode ser punido pela ausência de apreciação do pedido de desistência antes da efetiva citação dos executados. Desse modo, se o magistrado de piso tivesse examinado a tempo a petição apresentada nos autos, igualmente não teria havido a sucessão de manifestações na execução, tampouco a própria oposição de embargos do devedor. 

Essa situação fática retrata fielmente o disposto na Súmula nº 153/STJ: "A desistência da execução fiscal, após o oferecimento dos embargos não exime o exequente dos encargos da sucumbência". Em contrapartida, se a desistência ocorreu antes da citação e do oferecimento dos embargos do devedor, e não houve nomeação de procurador nos autos, não pode o exequente responder pela verba honorária. 

Dessa forma, deve ser afastado o pagamento da verba honorária pelo exequente, ficando prejudicada as demais questões trazidas no presente apelo. 

4. Do dispositivo 

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para julgar extintos os embargos à execução sem resolução de mérito e para afastar o pagamento de honorários advocatícios pelo exequente. 

É o voto. 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator. 

19 de agosto de 2021

Tentativa de conciliação na execução não altera início do prazo para oposição de embargos do devedor

 A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou intempestivos os embargos à execução opostos após a realização de audiência de conciliação pedida pela parte executada. Para o colegiado, o prazo legal para a oposição dos embargos começa a ser contado, em regra, da juntada do mandado de citação aos autos, e não após a tentativa de conciliação.

O recurso foi interposto no STJ depois que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) considerou fora do prazo legal os embargos apresentados pelo devedor em ação de execução referente a contrato de prestação de serviços advocatícios.

O executado, representado pela Defensoria Pública, alegou que o termo inicial do prazo para impugnar a execução seria a data da audiência de conciliação, uma vez que a apresentação dos embargos em momento prévio prejudicaria a composição entre as partes, pois o credor já teria conhecimento de toda a matéria de defesa.

Audiência de conciliação no processo executivo

A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que, no processo executivo, sejam quais forem o meio executório e o seu procedimento, o prazo para o executado oferecer embargos à execução é único, sempre de 15 dias, variando apenas seu termo inicial (artigo 915 do Código de Processo Civil – CPC).

Segundo a ministra, decorrido o prazo legal de 15 dias, extingue-se o direito de praticar ou de emendar o ato, ocorrendo a preclusão. Em regra, lembrou, o prazo é contado na forma do artigo 231 do CPC – geralmente, a partir da juntada aos autos do mandado de citação. Na hipótese de representação pela Defensoria Pública, o prazo terá início após a sua habilitação nos autos.

A ministra ressaltou que, embora não exista previsão expressa da realização de audiência de conciliação no processo executivo, a sua ocorrência não é vedada. Para a magistrada, ainda que se admita discricionariamente a realização da audiência, tal ato – se requerido pelo executado – "somente acontecerá após a oposição dos embargos à execução a serem eventualmente opostos por ele, de forma que o que fluirá a partir da data da audiência de mediação ou conciliação será o prazo de resposta do embargado".

Aplicação subsidiária do procedimento comum

Na avaliação da relatora, a possibilidade de realizar a audiência de conciliação na execução decorre da aplicação subsidiária do procedimento comum, mas isso não conduz à conclusão de que a apresentação dos embargos do devedor somente ocorrerá posteriormente à sua realização.

Nancy Andrighi destacou entendimento do TJDFT segundo o qual "caberia à parte ré apresentar embargos à execução no prazo legal de 15 dias e, também, efetuar o pedido de marcação da audiência de conciliação no mesmo ato processual, tudo com foco no princípio da eventualidade, sob pena de preclusão consumativa".

Leia o acórdão no REsp 1.919.295.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1919295

24 de junho de 2021

O ajuizamento de um segundo processo de embargos à execução é fato gerador de novas custas judiciais, independentemente da desistência nos primeiros antes de realizada a citação

Processo

REsp 1.893.966-SP, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgada em 08/06/2021, DJe de 16/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO TRIBUTÁRIO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Embargos à execução. Duplo ajuizamento. Custas processuais devidas nos dois processos. Citação da parte contrária. Irrelevância


Destaque

O ajuizamento de um segundo processo de embargos à execução é fato gerador de novas custas judiciais, independentemente da desistência nos primeiros antes de realizada a citação.

Informações do Inteiro Teor

O art. 90 do CPC estabelece a responsabilidade pelas despesas processuais e honorários advocatícios em caso de desistência e renúncia, nos seguintes termos: Proferida sentença com fundamento em desistência, em renúncia ou em reconhecimento do pedido, as despesas e os honorários serão pagos pela parte que desistiu, renunciou ou reconheceu.

Por seu turno, o art. 84 do CPC assim estabelece o que pode ser incluído na categoria "despesa processual": As despesas abrangem as custas dos atos do processo, a indenização de viagem, a remuneração do assistente técnico e a diária de testemunha.

Dessa forma, no gênero despesas, podem ser incluídas diversas verbas: indenização de viagem, remuneração do assistente técnico, diária de testemunha e as custas judiciais, que têm natureza jurídica de taxa.

Portanto, as custas representam um tributo. A aparente confusão ocorre por algumas legislações estaduais utilizarem o termo genérico "custas", outro, porém, empregarem duas rubricas: custas e taxa judiciária.

Como se sabe, o tributo taxa pode ser cobrado em razão do exercício do poder de polícia ou em razão do serviço público efetivamente prestado ou colocado à disposição do contribuinte.

Ora, ao se ajuizar determinada demanda, dá-se início ao processo. O encerramento desse processo exige a prestação do serviço público judicial, ainda que não se analise o mérito da causa.

Assim, o fato de em um primeiro processo de embargos à execução fiscal ter gerado desistência sem a citação da parte contrária não afasta a necessidade de recolhimento das "custas" com o ajuizamento de novos embargos porque o serviço público foi prestado e estava à disposição do contribuinte.

Além disso, com o ajuizamento da demanda, já existe relação jurídica processual, ainda que linear. A citação da parte apontada para figurar no polo passivo apenas tem o condão de ampliar a relação jurídica. Logo, já há processo e já existe prestação do serviço público. Por conseguinte, o ajuizamento de um segundo processo de embargos gera um novo fato gerador do tributo.



 

13 de maio de 2021

10 de maio de 2021

EXECUÇÃO - O que acontece caso o exequente desista da execução antes da citação do executado?

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-692-stj.pdf 


 

EXECUÇÃO - O que acontece caso o exequente desista da execução antes da citação do executado? 

A desistência da execução antes do oferecimento dos embargos independe da anuência do devedor. A apresentação de desistência da execução quando ainda não efetivada a citação do devedor provoca a extinção dos embargos posteriormente opostos, ainda que estes versem acerca de questões de direito material. O credor não responde pelo pagamento de honorários sucumbenciais se manifestar a desistência da execução antes da citação e da apresentação dos embargos e se não houver prévia constituição de advogado nos autos. STJ. 2ª Turma. REsp 1.682.215/MG, Rel. Min. Ricardo Vilas Bôas Cueva, julgado em 06/04/2021 (Info 692). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João ajuizou execução de título extrajudicial contra Pedro. Em 07/07/2014 a execução foi distribuída. Em 11/09/2014, o juiz prolatou despacho determinando a citação do executado. Em 29/10/2014, antes do executado ser citado, o exequente apresentou pedido de desistência da execução. Em 19/11/2014, mesmo já tendo havido pedido de desistência, Pedro foi citado. Em 05/12/2014, Pedro apresentou embargos à execução alegando que: 

• não concorda com o pedido de desistência porque deseja que o mérito da demanda seja enfrentado; 

• os embargos devem ser julgados procedentes para que o juízo reconheça que não existe dívida; e 

• o exequente deverá ser condenado a pagar honorários advocatícios. 

O executado invocou o art. 569 do CPC/1973 (art. 775 do CPC/2015) como argumento para o seu pedido: 

CPC/1973 

Art. 569. O credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas. Parágrafo único. Na desistência da execução, observar-se-á o seguinte: a) serão extintos os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, pagando o credor as custas e os honorários advocatícios; b) nos demais casos, a extinção dependerá da concordância do embargante.


CPC/2015  

Art. 775. O exequente tem o direito de desistir de toda a execução ou de apenas alguma medida executiva. Parágrafo único. Na desistência da execução, observar-se-á o seguinte: I - serão extintos a impugnação e os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, pagando o exequente as custas processuais e os honorários advocatícios; II - nos demais casos, a extinção dependerá da concordância do impugnante ou do embargante. 

O juiz extinguiu a execução e os embargos à execução sem resolução do mérito. Além disso, na sentença, o magistrado deixou de condenar o exequente ao pagamento de honorários advocatícios. 

Agiu corretamente o juiz? SIM. 

Não era necessária a concordância porque o pedido de desistência foi feito antes dos embargos 

A desistência da execução antes do oferecimento dos embargos independe da anuência do devedor. STJ. 2ª Turma. REsp 1.682.215/MG, Rel. Min. Ricardo Vilas Bôas Cueva, julgado em 06/04/2021 (Info 692). 

Os embargos devem ser extintos sem julgamento do mérito porque a desistência foi anterior à citação 

A apresentação de desistência da execução quando ainda não efetivada a citação do devedor provoca a extinção dos embargos posteriormente opostos, ainda que estes versem acerca de questões de direito material. STJ. 2ª Turma. REsp 1.682.215/MG, Rel. Min. Ricardo Vilas Bôas Cueva, julgado em 06/04/2021 (Info 692). 

Vale ressaltar que os embargos do devedor possuem natureza jurídica de ação autônoma e meio de defesa no processo de execução. O objetivo dos embargos é o de impedir, minorar ou extinguir a pretensão do credor contida em título extrajudicial. 

Apesar da autonomia dos embargos do devedor, a sua propositura depende: 

a) da prévia existência da relação processual entre exequente e executado, com a efetiva ocorrência de citação ou de comparecimento espontâneo devedor aos autos; e 

b) da ausência de fato pretérito à angularização do processo que impeça a continuidade da demanda executiva (a exemplo da desistência). 

No caso concreto, antes da citação do devedor, o credor postulou a desistência da execução. Assim, os embargos opostos carecem de pressuposto da existência ou de constituição válida, visto que a desistência apresentada antes da citação faz com que o processo principal (execução) seja extinto precocemente e a demanda incidental (embargos) fique prejudicada. 

A aplicação do art. 569, parágrafo único, do CPC/1973 (art. 775, parágrafo único, do CPC/2015), pressupõe que a desistência da execução tenha sido apresentada após os embargos. Por outro lado, se a desistência ocorrer antes da oposição dos embargos, como foi o caso, esses embargos devem ser imediatamente julgados prejudicados independentemente de versarem a respeito de questões processuais ou materiais. 

Como a desistência foi feita antes da citação, não há pagamento de honorários advocatícios 

O credor não responde pelo pagamento de honorários sucumbenciais se manifestar a desistência da execução antes da citação e da apresentação dos embargos e se não houver prévia constituição de advogado nos autos. STJ. 2ª Turma. REsp 1.682.215/MG, Rel. Min. Ricardo Vilas Bôas Cueva, julgado em 06/04/2021 (Info 692). 

Para analisar o pagamento de honorários advocatícios, deve-se considerar não somente a sucumbência, mas também o princípio da causalidade, segundo o qual a parte que deu causa à instauração do processo deverá suportar os ônus sucumbenciais. O credor responde pelo pagamento de honorários advocatícios quando a desistência da execução ocorrer após a constituição de advogado e a indicação de bens à penhora, independentemente da oposição de embargos (STJ. 4ª Turma. AgInt no REsp 1.849.703/CE, Rel. Ministro Marco Buzzi, julgado em 30/3/2020). No caso concreto, a desistência ocorreu antes da citação. Isso significa que a desistência se deu antes que o devedor tivesse ciência da execução e, portanto, antes que ele tivesse constituído advogado. Dessa forma, não há como atrair para o exequente a aplicação do princípio da causalidade. Logo, deve ser afastado o pagamento da verba honorária.



8 de maio de 2021

EMBARGOS À EXECUÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. NECESSIDADE DE GARANTIA DO JUÍZO. CAUÇÃO OFERECIDA EM AÇÃO CONEXA. APROVEITAMENTO. POSSIBILIDADE.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.743.951 - MG (2018/0127695-0) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. EFEITO SUSPENSIVO. NECESSIDADE DE GARANTIA DO JUÍZO. CAUÇÃO OFERECIDA EM AÇÃO CONEXA. APROVEITAMENTO. POSSIBILIDADE. 

1. Embargos à execução, opostos em virtude de anterior ação de execução ajuizada em desfavor dos embargantes. 

2. Ação ajuizada em 29/06/2016. Recurso especial concluso ao gabinete em 07/02/2019. Julgamento: CPC/2015. 

3. O propósito recursal é definir acerca da possibilidade de se aceitar como garantia do juízo - requisito previsto no art. 919, § 1º, do CPC/2015 para a concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução - caução prestada em ação conexa (cautelar de sustação de protesto). 

4. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados impede o conhecimento do recurso especial. 

5. O art. 919, § 1º, do CPC/2015 prevê que o magistrado poderá atribuir efeito suspensivo aos embargos à execução quando presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos: (a) requerimento do embargante; (b) relevância da argumentação; (c) risco de dano grave de difícil ou incerta reparação; e (d) garantia do juízo. 

6. No caso concreto, as parcelas contratuais que figuram como objeto da ação de execução são as mesmas que dão sufrágio ao pleito declaratório de inexigibilidade do débito, sendo tais parcelas, também, as mesmas que foram objeto de protesto pela recorrente e, via de consequência, objeto da ação de sustação de protesto, na qual foi concedida a providência liminar ante, dentre a presença dos outros requisitos, a existência de caucionamento do suposto débito. Inclusive, não se descura que, posteriormente, houve o reconhecimento de conexão entre as referidas demandas. 

7. Tendo sido reconhecido, no bojo da ação cautelar, que houve o caucionamento do débito – que, frisa-se, é o mesmo discutido na ação de execução e, consequentemente, cujo título os recorridos visam a desconstituir por meio da oposição de embargos à execução – não há por que determinar que seja realizada nova constrição no patrimônio dos agravados, a fim de que seja concedido o efeito suspensivo aos seus embargos. 

8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, negar-lhe provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze. 

Brasília (DF), 06 de outubro de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI: Cuida-se de recurso especial interposto por TS COMERCIO E SERVICOS TELEMATICOS LTDA, fundamentado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo TJ/MG. Recurso especial interposto em: 01/02/2018. Concluso ao gabinete em: 07/02/2019. 

Ação: de embargos à execução, opostos por PAVOTEC PAVIMENTAÇÃO E TERRAPLENAGEM LTDA, DORALICE MARINHO DINIZ e DJALMA FLORENCIO DINIZ, em desfavor da recorrente, em virtude de anterior ação de execução ajuizada por esta em desfavor daqueles (e-STJ fls. 31-50). 

Decisão interlocutória: indeferiu o pleito de concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução, 

mormente por não ter a parte embargante logrado comprovar que o regular prosseguimento da execução poderá provocar a ela dano irreparável e/ou de difícil reparação, sendo certo que o juízo não se encontra garantido” (e-STJ fls. 1.356-1.357) (grifos acrescentados). 

Acórdão: deu provimento ao agravo de instrumento interposto pelos recorridos, para atribuir efeito suspensivo aos embargos à execução, nos termos da seguinte ementa: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO – EMBARGOS À EXECUÇÃO – EFEITO SUSPENSIVO – GARANTIA PRESTADA EM AÇÃO ORDINÁRIA CONEXA À EXECUÇÃO – APROVEITAMENTO – POSSIBILIDADE – PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE. Para a concessão do efeito suspensivo aos embargos à execução, faz-se necessária a presença dos seguintes requisitos, a teor do disposto no § 1º do art. 919 do CPC: I) requerimento da parte embargante; II) relevância dos fundamentos; III) risco de grave dano de incerta ou difícil reparação em caso de prosseguimento da execução; IV) garantia da execução por penhora, depósito ou caução suficiente. Não há óbice em aproveitar a garantia prestada em autos conexos à execução, considerando o princípio da menor onerosidade e o poder geral de cautela do Juiz. Assegurado o juízo e presentes os requisitos da probabilidade do direito invocado e o perigo de dano ou resultado útil do processo, é possível a atribuição de efeito suspensivo aos embargos à execução (e-STJ fl. 1.429). 

Recurso especial: aponta a violação dos arts. 835, I, e 919, § 1º, do CPC/2015, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta que: 

a) a ausência de prévia garantia do juízo afasta a possibilidade de concessão do efeito suspensivo aos embargos do devedor, ante a falta de requisito formal e objetivo para tal mister; 

b) a caução prestada na medida cautelar de sustação de protesto não pode ser entendida como penhora na ação de execução, especialmente na espécie, em que o juízo exequendo não se manifestou sobre a oferta como penhora do mesmo bem dado em garantia na ação conexa; 

c) a caução ofertada na ação cautelar visa apenas a garantir os prejuízos que já vêm sendo suportados pela recorrente naqueles autos, isto é, tem por finalidade assegurar a solvabilidade do devedor no ressarcimento de eventuais prejuízos advindos da sustação do protesto; 

d) a penhora e a caução têm finalidades diversas, motivo pelo qual a caução prestada em sede de medida cautelar de sustação de protesto não pode ser entendida e nem recebida como garantia da execução; 

e) ademais, o bem dado como caução na medida cautelar de sustação de protesto não é suficiente para a garantia da execução; e 

f) a penhora deve recair, preferencialmente, sobre o dinheiro; assim, aceitar como penhora na ação de execução caução dada na forma de bem móvel (maquinário) em medida cautelar de sustação de protesto viola a ordem de preferência de penhora legalmente estabelecida (e-STJ fls. 1.442-1.473). 

Prévio juízo de admissibilidade: o TJ/MG admitiu o recurso especial interposto por TS COMERCIO E SERVICOS TELEMATICOS LTDA, determinando a remessa dos autos a esta Corte Superior (e-STJ fls. 1.508-1.509). 

Decisão monocrática da Presidência: não conheceu do recurso especial interposto pela recorrente, ante o reconhecimento de sua intempestividade (e-STJ fls. 1.550-1.551). 

Agravo interno: foi interposto pela recorrente, pugnando pela reforma da decisão monocrática (e-STJ fls. 1.555-1.569). 

Decisão monocrática: ensejou a reconsideração da decisão proferida às fls. 1.550-1.551 (e-STJ), tendo sido determinada a reautuação do agravo em recurso especial (e-STJ fl. 1.590). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (RELATOR): O propósito recursal é definir acerca da possibilidade de se aceitar como garantia do juízo - requisito previsto no art. 919, § 1º, do CPC/2015 para a concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução - caução prestada em ação conexa (cautelar de sustação de protesto). 

Aplicação do Código de Processo Civil de 2015, pelo Enunciado administrativo n. 3/STJ. 

1. DA AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO 

1. O acórdão recorrido não decidiu acerca dos argumentos trazidos pela recorrente relativos i) à ausência de manifestação do juízo exequendo acerca do bem oferecido à penhora e à consequente ausência de constrição do bem no bojo da ação executiva; ii) à insuficiência do bem dado como caução na medida cautelar de sustação de protesto para garantir o valor da execução; e iii) à violação da ordem legal de preferência de penhora estabelecida pelo art. 835 do CPC/2015. 

2. Aplica-se, neste caso, a Súmula 282/STF. 

2. DA ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AOS EMBARGOS À EXECUÇÃO (art. 919, § 1º, do CPC/2015; e dissídio jurisprudencial) 

3. É cediço que, como regra, os embargos à execução opostos pelo devedor não terão efeito suspensivo. 

4. O juiz poderá, contudo, havendo requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes (art. 919, § 1º, do CPC/2015). 

5. Vale lembrar que o preceituado no referido dispositivo legal, contido no novo Código de Processo Civil, é mera reprodução do que já previa o anterior código em seu art. 739-A, § 1º (após a alteração promovida pela Lei 11.382/2006). Isso significa dizer que a garantia da execução para a concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução já era exigência prevista no CPC/73. 

6. Três são, então, os requisitos para que o julgador atribua efeito suspensivo aos embargos à execução: i) o requerimento do embargante; ii) o preenchimento dos requisitos necessários à concessão da tutela provisória, ou seja, elementos que evidenciem a probabilidade do direito alegado, bem como o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo; e iii) a garantia da execução mediante penhora, depósito ou caução suficientes. 

7. Frisa-se que mencionados requisitos devem estar presentes cumulativamente para a atribuição do pretendido efeito suspensivo aos embargos e, ainda, que, acaso presentes tais requisitos, não há discricionariedade para o julgador deferir o pleito. 

8. Como leciona Araken de Assis: 

Para outorgar efeito suspensivo, requer-se a conjugação desses requisitos. Porém, verificados os pressupostos, nenhuma discrição é dada ao juiz, devendo suspender a execução. Inversamente, não se caracterizando os pressupostos, ou existindo tão só um deles, deverá o juiz negar efeito suspensivo aos embargos. A esse respeito, não há qualquer discrição. A atividade do órgão judiciário não se afigura discricionária, no sentido exato e preciso do termo; ao contrário, é vinculada à única resolução correta que lhe cabe tomar em razão do seu ofício: ou bem se verificam os elementos de incidência, hipótese em que suspenderá a execução; ou não se verificam tais elementos, caso em que a lei proíbe suspender a marcha da execução (Manual da execução. 18 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2016, pp. 704-705) (grifos acrescentados). 

9. Não é outro o entendimento desta Corte, senão veja-se: 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. ART. 919, § 1º, DO CPC/2015. PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. REVOLVIMENTO DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O art. 919, § 1º, do CPC/2015 prevê que o magistrado poderá atribuir efeito suspensivo aos embargos à execução quando presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos: (a) requerimento do embargante; (b) relevância da argumentação; (c) risco de dano grave de difícil ou incerta reparação; e (d) garantia do juízo. 2. No caso, diante das premissas fáticas constantes no acórdão, está demonstrado o dano de difícil ou incerta reparação necessário à suspensão da execução, mormente a alienação da propriedade rural da família, uma vez que aquela unidade familiar pode ter prejuízo nas atividades que pratica no imóvel rural. 3. Agravo interno não provido (AgInt no AREsp 1.462.571/MG, 4ª Turma, DJe 27/08/2019) (grifos acrescentados). 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. ART. 919, § 1º, DO CPC/2015. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. REVOLVIMENTO DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O art. 919, § 1º, do CPC/2015 prevê que o magistrado poderá atribuir efeito suspensivo aos embargos à execução quando presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos: (a) requerimento do embargante; (b) relevância da argumentação; (c) risco de dano grave de difícil ou incerta reparação; e (d) garantia do juízo. 2. No caso, diante das premissas fáticas constantes no acórdão, não está demonstrado o dano de difícil ou incerta reparação necessário à suspensão da execução, mormente considerando que as questões levantadas pela ora agravante revelam a ausência de probabilidade do direito alegado. 3. Agravo interno não provido (AgInt no AREsp 1.124.768/SP, 4ª Turma, DJe 25/10/2017) (grifos acrescentados). 

10. Mais especificamente no tocante ao requisito da garantia da execução, este impõe-se porque não seria razoável permitir a suspensão dos atos sem que o exequente tivesse sua pretensão à satisfação garantida, livrando-o da possibilidade de uma execução frustrada. Só com tal garantia, portanto, se justificaria a paralisação do iter para a discussão do que foi aduzido pelo executado (BUENO, Cassio Scarpinella. Comentários ao código de processo civil – volume 3 (arts. 539 a 925). São Paulo: Saraiva, 2017, p. 808). 

11. Ademais, explica Humberto Theodoro Júnior: 

(...) deve, ainda, estar seguro o juízo antes de ser a eficácia suspensiva deferida; os embargos podem ser manejados sem o pré-requisito da penhora ou outra forma de caução; não se conseguirá, porém, paralisar a marcha da execução se o juízo não restar seguro adequadamente. Mesmo que os embargos sejam relevantes e que, no final, o ato executivo seja perigoso para o executado, não haverá efeito suspensivo para sustar o andamento da execução, se o devedor não oferecer a garantia do juízo. Aliás, é razoável que assim seja, visto que, se ainda não houver penhora ou outra forma de agressão concreta ao patrimônio do executado, não sofre ele dano atual, nem risco de dano grave e iminente. Logo, não há perigo a ser acautelado, por enquanto. Será depois da penhora e do risco, de alienação judicial do bem penhorado que se poderá divisar o perigo de dano necessário para justificar a suspensão da execução (Curso de Direito Processual Civil, volume 3. 52 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 699). 

12. Na espécie, o TJ/MG entendeu não haver óbice em aproveitar a garantia prestada em autos conexos à execução, considerando o princípio da menor onerosidade ao devedor e o poder geral de cautela do juiz, senão veja-se: 

No que tange ao oferecimento de garantia, cabe pontuar que esta não tem por finalidade assegurar o pagamento da obrigação principal, mas eventuais prejuízos decorrentes da tutela concedida, cabendo ao órgão jurisdicional a observância dos princípios que norteiam as ações conexas (ordinária e executiva), como a menor onerosidade, a efetividade da execução e, também, o poder geral de cautela, não havendo óbice ao aproveitamento da garantia oferecida na ação conexa à ação de execução (e-STJ fl. 1.434). 

13. Como mesmo consignado pelo acórdão recorrido, extrai-se dos autos que a recorrente ajuizou ação de execução em face dos recorridos alegando ser credora da quantia de R$ 299.290,20 (duzentos e noventa e nove mil, duzentos e noventa reais e vinte centavos), decorrente do inadimplemento de contrato de locação de equipamentos firmado entre as partes. 

14. Os recorridos, anteriormente ao ajuizamento da presente ação de execução, ajuizaram ação de rescisão contratual cumulada com declaração de inexigibilidade de débito e de multa contratual cumulada com perdas e danos, questionando a higidez do contrato, bem como ação cautelar de sustação de protesto onde foi oferecido um bem móvel em garantia em valor superior ao da execução (e-STJ fl. 1.434). 

15. De fato, as parcelas contratuais que figuram como objeto da ação de execução são as mesmas que dão sufrágio ao pleito declaratório de inexigibilidade do débito, sendo tais parcelas, também, as mesmas que foram objeto de protesto pela recorrente e, via de consequência, objeto da ação de sustação de protesto, na qual foi concedida a providência liminar ante, dentre a presença dos outros requisitos, a existência de caucionamento do suposto débito. Inclusive, não se descura que, posteriormente, houve o reconhecimento de conexão entre as referidas demandas. 

16. Isso significa dizer que a ação cautelar de sustação de protesto versa exatamente sobre o mesmo débito, oriundo do mesmo contrato a que se refere a ação executiva, sendo a ela conexa. 

17. Nessa ordem de ideias, tendo sido reconhecido, no bojo da ação cautelar, que houve o caucionamento do débito – que, frisa-se, é o mesmo discutido na ação de execução e, consequentemente, cujo título os recorridos visam a desconstituir por meio da oposição de embargos à execução – não há por que determinar que seja realizada nova constrição no patrimônio dos agravados, a fim de que seja concedido o efeito suspensivo aos seus embargos. 

18. Tal conclusão está nitidamente em convergência com o princípio da menor onerosidade ao devedor, que deve ser sempre observado pelo julgador. 

19. O acórdão recorrido, portanto, deve ser mantido. 

Forte nessas razões, CONHEÇO PARCIALMENTE do recurso especial interposto por TS COMERCIO E SERVICOS TELEMATICOS LTDA e, nessa extensão, NEGO-LHE PROVIMENTO, para manter o acórdão recorrido quanto à possibilidade de se aproveitar a garantia prestada nos autos conexos à execução. 

Deixo de majorar os honorários de sucumbência recursal, visto que não foram arbitrados na instância de origem.

4 de maio de 2021

AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. PROTOCOLIZAÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO NOS AUTOS DA PRÓPRIA AÇÃO EXECUTIVA. INOBSERVÂNCIA DO ART. 914, § 1º, DO CPC/2015. ERRO SANÁVEL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS E DA ECONOMIA PROCESSUAL

RECURSO ESPECIAL Nº 1.807.228 - RO (2019/0093982-1) 

RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA 

R.P/ACÓRDÃO : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. PROTOCOLIZAÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO NOS AUTOS DA PRÓPRIA AÇÃO EXECUTIVA. INOBSERVÂNCIA DO ART. 914, § 1º, DO CPC/2015. ERRO SANÁVEL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS E DA ECONOMIA PROCESSUAL. 

1. Ação de execução de título executivo extrajudicial, tendo em vista a inadimplência no pagamento de cotas condominiais. 

2. O propósito recursal é definir se configura erro grosseiro, insuscetível de correção, a protocolização de embargos à execução nos autos da própria ação executiva, em inobservância ao que dispõe o art. 914, § 1º, do CPC/2015. 

3. Com efeito, é inegável que a lei prevê expressamente que os embargos à execução tratam-se de ação incidente, que deverá ser distribuída por dependência aos autos da ação principal (demanda executiva). 

4. Contudo, primando por uma maior aproximação ao verdadeiro espírito do novo Código de Processo Civil, não se afigura razoável deixar de apreciar os argumentos apresentados em embargos à execução tempestivamente opostos – ainda que, de forma errônea, nos autos da própria ação de execução – sem antes conceder à parte prazo para sanar o vício, adequando o procedimento à forma prescrita no art. 914, § 1º, do CPC/2015. 

5. Ademais, convém salientar que o art. 277 do CPC/2015 preceitua que, quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade. 

6. Recurso especial conhecido e não provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista da Sra. Ministra Nancy Andrighi, divergindo do voto do Sr. Ministro Relator, por maioria, negar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi, que lavrará o acórdão. Vencidos os Srs. Ministros Ricardo Villa Bôas Cueva e Moura Ribeiro. Votaram com a Sra. Ministra Nancy Andrighi os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze e Paulo de Tarso Sanseverino. 

Brasília (DF), 03 de setembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA: Trata-se de recurso especial interposto por CONDOMÍNIO BRISAS DO MADEIRA RESIDENCIAL CLUBE, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia assim ementado: 

"Agravo de instrumento. Embargos à execução. Impugnação nos próprios autos. Possibilidade. Instrumentalidade das formas. Recurso desprovido. Por se tratar de mero erro procedimental, passível de ser sanado, não há que se falar em eventual não conhecimento dos embargos interpostos nos próprios autos da execução, devendo ser observado o princípio da instrumentalidade das formas" (e-STJ fl. 38). 

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (e-STJ fls. 69/72). 

Em suas razões (e-STJ fls. 82/96), o recorrente aponta, além de divergência jurisprudencial, violação do art. 914, § 1º, Código de Processo Civil de 2015, sustentando, em síntese, a impossibilidade de processamento dos embargos à execução nos autos da própria demanda executiva, ainda que ao fundamento da aplicação do princípio da instrumentalidade das formas, como o fez o Tribunal de origem. 

Alega que os embargos à execução têm natureza de ação autônoma e incidental à execução e, nos termos da legislação processual de regência, devem ser distribuídos por dependência, autuados em autos apartados e instruídos com cópias das peças processuais relevantes. 

Afirma que "(...) não há que se falar nos princípios da instrumentalidade das formas e da celeridade a ser aplicada no procedimento de execução de título extrajudicial, vez que passa a beneficiar o devedor causando morosidade processual divergindo do entendimento do legislador e dos juristas que inseriram a disposição para a proteção ao credor com a intenção de satisfação do crédito exequente" (e-STJ fl. 84). 

Pugna, assim, pelo reconhecimento de inadequação do procedimento adotado pela executada/recorrida e da consequente intempestividade dos embargos manejados nos autos do feito executivo. 

Sem contrarrazões (e-STJ fl. 199), o recurso especial foi admitido na origem (e-STJ fl. 200). 

Em decisão de fls. 216/218 (e-STJ), o pedido de tutela provisória para conferir efeito suspensivo ao recurso especial foi deferido. 

É o relatório. 

VOTO-VENCIDO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA: A irresignação merece prosperar. 

O julgamento do recurso especial é realizado com base nas normas do Código de Processo Civil de 2015 por ser a lei processual vigente na data de publicação da decisão ora impugnada (cf. Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

A controvérsia a ser dirimida reside em verificar se é possível o conhecimento e processamento de embargos à execução apresentados nos autos do próprio processo executivo e não em autos apartados, de forma autônoma e incidental, conforme preconiza o parágrafo 1º do art. 914 do Código de Processo Civil de 2015. 

1. Histórico 

Extrai-se dos autos que está em curso perante o Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho/RO a execução de título extrajudicial ajuizada por Condomínio Brisas do Madeira Residencial Clube, ora recorrente, contra Arileide Pereira do Nascimento, ora recorrida, referente a débitos condominiais. 

A executada apresentou embargos à execução nos autos da própria demanda executiva, os quais foram recebidos pelo magistrado de piso em decisão assim fundamentada: 

"(...) Inicialmente esclareço que, embora a embargante não tenha apresentado embargos à execução em autos apartados e distribuídos por dependência, nos termos do art. 914, § 1º, CPC, fazendo-o no bojo desta execução, à luz dos princípios da celeridade e instrumentalidade das formas, recebo-os. Considerando que a execução está garantida por penhora e que estão presentes os requisitos para a concessão da tutela de urgência (probabilidade do direito e o risco ao resultado útil do processo) reputo prudente a concessão do efeito suspensivo (art. 300; art. 919, § 1º; art. 921, II, todos do CPC). 1- Intime-se o Exequente para impugnar os Embargos em 15 dias úteis (NCPC, art. 920). 2- Após o esgotamento do prazo acima assinalado, digam as partes no prazo de 15 dias se pretendem a produção de outras provas nestes autos" (e-STJ fls. 13/14 - grifou-se). 

O exequente interpôs agravo de instrumento por suposta violação do art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015, segundo o qual "os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e instruídos com cópias das peças processuais relevantes, que poderão ser declaradas autênticas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal". 

O Tribunal de origem negou provimento ao recurso, nos seguintes termos: 

"(...) É inegável que a lei processual determina a distribuição, por dependência à execução, dos embargos do devedor (art. 914, § 1º, do CPC), e as partes devem sempre buscar a observância dos procedimentos previstos. Ocorre que, em casos como o dos autos, a jurisprudência tem admitido o processamento dos embargos, mesmo no bojo da própria execução, em atendimento aos princípios da instrumentalidade das formas e da efetividade do processo, conforme dispõe o art. 277 do CPC. (...) Deve-se considerar que os embargos à execução constituem a defesa do executado, de modo que deixar de conhecê-los em razão da simples distribuição equivocada, além de configurar formalismo exacerbado, ofende o contraditório e a ampla defesa, sobretudo quando tempestivo. (...) Tendo sido a petição dos embargos à execução protocolizada, tempestivamente, mas nos mesmos autos da ação executiva, encontra-se demonstrada a intenção da agravada de impugnar a execução, constituindo flagrante prejuízo ao direito de defesa do executado seu desentranhamento, não havendo óbice para o recebimento da petição como embargos à execução. Destaco que o ato configura mero erro procedimental, passível de ser sanado" (e-STJ fls. 36/37 - grifou-se).

 O exequente interpôs, então, o presente recurso especial, invocando a aplicação literal do disposto no art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015, requerendo, ao fim, o não conhecimento dos embargos à execução em virtude da inadequação do procedimento adotado pela executada. 

2. Do mérito 

A partir da premissa fática incontroversa delineada pelas instâncias ordinárias no sentido de que a embargada apresentou tempestivamente petição de embargos à execução nos autos da própria demanda executiva, a questão a ser examinada no recurso especial, como já mencionado, reside em verificar se é possível, com fundamento nos princípios da instrumentalidade das formas, da efetividade e celeridade processuais, o conhecimento de embargos do devedor apresentados no próprio processo executivo e não em autos apartados, de forma autônoma e incidental, como determina a legislação processual civil. 

O art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015 assim dispõe: 

"Art. 914. O executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá se opor à execução por meio de embargos. § 1º Os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e instruídos com cópias das peças processuais relevantes, que poderão ser declaradas autênticas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal." (grifou-se) 

Ao definir a natureza jurídica dos embargos do devedor, Araken de Assis afirma: 

"(...) Na função jurisdicional executiva, há aspectos insuscetíveis de dúvidas consistentes. Por exemplo, os atos executivos são diferentes dos processuais praticados na função de conhecimento (retro, 4); ao direito de instaurar a relação processual executiva correspondente à ação (retro, 15), tornando nítido o princípio da autonomia (retro, 9), segundo o qual é possível o desenvolvimento simultâneo de ações paralelas à pretensão de executar; e assim por diante. Avulta indiscutível, outrossim, que a função executiva, a despeito de alguma dose de cognição no curso do respectivo procedimento - no mínimo o juiz conhecerá, ex officio, da existência, a validade e a eficácia da relação processual -, visa à atuação do direito contemplado no título executivo, não se ocupando da declaração de direitos litigiosos. Essa última característica conduz a defesa do executado, controvertendo a subsistência e o conteúdo da pretensão a executar, desconstituindo ou não o título, no todo ou em parte, bem como ao controle da sua regularidade (vícios de atividade), realizar-se-á por meio de ação autônoma, posto que acessória à execução. Existe inequívoca incompatibilidade funcional na convivência de atos executivos com atos de índole diversa, simultaneamente, na mesma estrutura (processo). Esta é a ideia fundamental posta à base dos embargos do executado ou, consoante a designação do Título III o Livro II da Parte Especial do NCPC, 'embargos à execução'. Esse veto não é absoluto. Excepciona-o a possibilidade de o executado controverter a existência do título (ou sua inexiquibilidade, a teor do art. 917, I) e os pressupostos processuais por via da exceção de pré-executividade, desde que baseada em prova pré-constituída (retro, 537). Por outro lado, a certeza relativa quanto à existência do crédito outorgada pelo título (retro, 26.1), não torna inútil a defesa. A tese de que os embargos constituem ação incidente à execução é universal. A autonomia dos embargos transparece no seu objeto: tratando-se de oposição em que o executado veicula exceções e objeções substanciais, o desaparecimento da execução por iniciativa do exequente, utilizando-se do disposto no art. 775, caput, em nada prejudica o seu prosseguimento e desenlace. Trata-se de remédio processual específico de oposição à execução, consoante reza o art. 914, caput, parte final, e revela-se insubstituível por qualquer outro, como o mandado de segurança". (ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 18ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, págs. 1.538/1.539 - grifou-se) 

Acerca do procedimento a ser adotado no processamento dos embargos do devedor, Humberto Theodoro Júnior leciona que, 

"(...) Em se tratando de uma nova ação, sujeita-se à distribuição, registro e autuação próprios (NCPC, arts. 206 e 284), devendo, também receber valor de causa, na respectiva petição inicial, como determina o art. 291. Diante da inegável conexão que se nota entre a execução e os embargos, a distribuição destes é feita por dependência (art. 286). Submete-se, outrossim, a ação de embargos, como qualquer outra, à exigência de preparo prévio, de sorte que o não pagamento das custas iniciais em quinze dias importa cancelamento da distribuição e extinção do processo em seu nascedouro (art. 290). Os embargos, como ação cognitiva, devem ser propostos por meio de petição inicial, que satisfaça as exigências dos arts. 319 e 320. Submeter-se-ão à distribuição por dependência, ao juízo da causa principal (a ação executiva). Formarão autos próprios, apartados da ação de execução. Se não ocorrer o deferimento do efeito suspensivo, os embargos deverão tramitar sem prejuízo da marcha processual da execução. Por isso, caberá ao embargante instruir sua petição inicial com cópias das peças do processo principal cujo exame seja relevante para o julgamento da pretensão deduzida na ação incidental (art. 914, § 1º), já que pode acontecer de cada uma das ações tomar rumo diferente, exigindo a prática de atos incompatíveis entre si, e subindo, em momentos diversos, a tribunais distintos. Não deve, à vista disso, faltar na autuação dos embargos peças da execução cujo exame seja indispensável ao julgamento da oposição do executado. Procurações, título executivo, citação, auto de penhora (se já houver) são exemplos de peças cujo traslado comumente haverá de efetuar-se. Com esse novo critério de instrução da petição de embargos, eliminou-se o velho problema, antes existente, da subida dos autos da execução, para processamento da apelação interposta contra a sentença de improcedência dos embargos. Não há mais empecilho algum a que os autos dos embargos sejam desapensados para a subida do recurso ao Tribunal." (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo de Execução e Cumprimento da Sentença. 29ª ed. São Paulo: Ed. Universitária de Direito, 2017, págs. 624/625 - grifou-se) 

Da leitura da doutrina abalizada, não resta dúvida de que os embargos à execução têm natureza de ação de conhecimento autônoma e incidente ao processo de execução, devendo ser manejados por meio de petição inicial, com o preenchimento das condições da ação e dos pressupostos processuais exigíveis para qualquer demanda. 

A questão a ser analisada na hipótese em tela reside em verificar se a apresentação dos embargos nos autos da própria execução constitui vício sanável ou não, de modo a se concluir pela configuração ou não de nulidade procedimental. 

A observância das normas processuais é sempre salutar e recomendável para a correta condução dos feitos judiciais, sendo certo que inaplicável à hipótese dos autos o disposto no art. 277 do Código de Processo Civil de 2015, que consagra o princípio das instrumentalidade das formas e dos atos processuais. 

O não conhecimento dos embargos do devedor no caso em exame é medida que se impõe, pois o seu processamento nos autos do próprio processo executivo, em flagrante afronta aos expressos ditames legais, causaria inegável prejuízo à parte exequente, apto a ensejar a nulidade do procedimento. 

É inegável que a marcha processual da execução restará prejudicada se as teses de defesa apresentadas nos embargos do devedor tiverem que ser apreciadas no mesmo processo da execução, visto que os respectivos procedimentos possuem ritos flagrantemente distintos e muitas vezes incompatíveis entre si. 

O equívoco no proceder do executado/embargante, ao juntar sua petição nos autos da execução, viola o disposto no art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015 e constitui erro grosseiro, insuscetível de correção, ainda que sob a perspectiva do princípio da instrumentalidade das formas. 

A redação original do art. 736 do Código de Processo Civil de 1973, que regulava o processamento dos embargos dos devedor, já determinava sua autuação "em apenso" aos autos do processo principal. A Lei nº 12.322/2006, que introduziu o parágrafo único ao referido dispositivo, manteve essa sistemática, ao preconizar que "os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado (...)". 

Tal circunstância revela que o procedimento de manejo dos embargos em autos distintos da execução é antigo na legislação processual, motivo pelo qual sua apresentação de forma diversa daquela expressamente prevista na lei configura erro inescusável da parte embargante. 

Como já mencionado, os embargos à execução têm natureza jurídica de ação autônoma de conhecimento, devendo ser distribuídos por dependência, autuados em autos apartados, instruídos com cópias das peças processuais relevantes, com observância dos requisitos previstos nos arts. 319 e 320 do Código de Processo Civil de 2015. 

Assim, diante da evidente inobservância do expresso comando legal do art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015, é de rigor o não conhecimento dos embargos à execução. 

3. Do dispositivo 

Ante o exposto, conheço do recurso especial para dar-lhe provimento. 

Solução nesse sentido implica a condenação da parte recorrida ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor do recorrente, que ora são fixados em 10% (dez por cento) do valor da execução, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015. 

Prejudicado o pedido de tutela provisória formulado às fls. 211/214 (e-STJ). 

É o voto. 

VOTO-VISTA 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI: Cuida-se de recurso especial interposto por CONDOMINIO BRISAS DO MADEIRA RESIDENCIAL CLUBE, fundamentado nas alíneas "a" e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo TJ/RO. 

Ação: de execução de título executivo extrajudicial, ajuizada pelo recorrente, em desfavor de ARILEIDE PEREIRA DO NASCIMENTO, tendo em vista a inadimplência no pagamento de cotas condominiais. A executada (ora recorrida), por sua vez, opôs embargos à execução nos autos da própria ação executiva. 

Decisão interlocutória: à luz dos princípios da celeridade e da instrumentalidade das formas, recebeu os embargos à execução opostos pela recorrida, a despeito de não terem sido apresentados em autos apartados e distribuídos por dependência (e-STJ fls. 13-14). 

Acórdão: negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelo recorrente, nos termos da seguinte ementa: 

Agravo de instrumento. Embargos à execução. Impugnação nos próprios autos. Possibilidade. Instrumentalidade das formas. Recurso desprovido. Por se tratar de mero erro procedimental, passível de ser sanado, não há que se falar em eventual não conhecimento dos embargos interpostos nos próprios autos da execução, devendo ser observado o princípio da instrumentalidade das formas (e-STJ fl. 38). 

Embargos de declaração: opostos pelo recorrente, foram parcialmente acolhidos, apenas para fins de prequestionamento (e-STJ fls. 69-72). 

Recurso especial: alega violação do art. 914, § 1º, do CPC/2015, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta que: 

a) os embargos à execução devem ser opostos em autos apartados e distribuídos por dependência, pois são considerados ação autônoma e incidental, como mesmo prescrito em lei; 

b) a real finalidade da norma é garantir o prosseguimento da ação executiva, a fim de evitar o prejuízo ao credor e, consequentemente, a razoável duração do processo; 

c) o oferecimento de embargos à execução no bojo da própria ação executiva implica tumulto na direção e sequência dos atos executivos; e 

d) quando a lei prevê forma específica para a prática de ato, tal forma deverá ser observada e respeitada, não havendo que se falar em aplicação do princípio da instrumentalidade das formas (e-STJ fls. 82-96). 

Voto do Relator: na sessão de 20/08/2019, o Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, relator dos autos, votou no sentido de conhecer e dar provimento ao recurso especial interposto por CONDOMINIO BRISAS DO MADEIRA RESIDENCIAL CLUBE, para reconhecer que é imperioso o não conhecimento dos embargos à execução opostos pela recorrida, uma vez que “O equívoco no proceder do executado/embargante, ao juntar sua petição nos autos da execução, viola o disposto no art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015 e constitui erro grosseiro, insuscetível de correção, ainda que sob a perspectiva do princípio da instrumentalidade das formas”. 

Subsequentemente, pedi vista dos autos para melhor análise. 

O propósito recursal é definir se configura erro grosseiro, insuscetível de correção, a protocolização de embargos à execução nos autos da própria ação executiva, em inobservância ao que dispõe o art. 914, § 1º, do CPC/2015. 

Prevê o art. 914, § 1º, do CPC/2015 que os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e instruído com cópias de peças processuais relevantes. 

Frisa-se que a possibilidade de defesa do executado por meio de ação autônoma – os tradicionalmente conhecidos embargos à execução – não é inovação trazida pelo novo Código de Processo Civil, sendo o dispositivo legal mencionado mera reprodução do art. 736 do CPC/73. 

A propósito, cita-se lição de abalizada doutrina: 

Em se tratando de uma nova ação, sujeita-se à distribuição, registro e autuação próprios (...), devendo, também, receber valor de causa, na respectiva petição inicial (...). Diante da inegável conexão que se nota entre a execução e os embargos, a distribuição destes é feita por dependência (...). Submete-se, em regra, a ação de embargos, como qualquer outra, à exigência de preparo prévio, de sorte que o não pagamento das custas iniciais em trinta dias importa cancelamento da distribuição e extinção do processo em seu nascedouro (...). Os embargos, como ação cognitiva, devem ser propostos por meio de petição inicial, que satisfaça as exigências dos arts. 282 e 283. Submeter-se-ão à distribuição por dependência, ao juízo da causa principal (ação executiva). Formarão autos próprios, apartados da ação de execução. Se não ocorrer o deferimento do efeito suspensivo, os embargos deverão tramitar sem prejuízo da marcha normal da execução. Por isso, caberá ao embargante instruir sua petição inicial com cópias das peças do processo principal cujo exame seja relevante para o julgamento da pretensão deduzida na ação incidental (art. 736, parágrafo único), já que pode acontecer de cada uma das ações tomar rumo diferente, exigindo a prática de atos incompatíveis entre si, e subindo, em momentos diversos, a tribunais distintos. (...) (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, Processo Cautelar e Tutela de Urgência – vol. II. Rio de Janeiro: Forense, 2014, pp. 438-439) (grifos acrescentados). 

Com efeito, é inegável que a lei prevê expressamente que os embargos à execução tratam-se de ação incidente, que deverá ser distribuída por dependência aos autos da ação principal (demanda executiva). 

A controvérsia posta a deslinde nos presentes autos surge quando há a necessidade de se averiguar se a protocolização dos embargos à execução nos autos do próprio processo executivo constitui erro sanável ou, ao revés, deve ser tido por erro grosseiro e, portanto, não passível de correção, impondo ao embargante, que procedeu em evidente equívoco, a consequência de tê-los por não conhecidos. 

O Min. relator dos autos, reformando o acórdão proferido pelo TJ/RO, concluiu que a apresentação dos embargos à execução de forma diversa daquela expressamente prevista em lei configura erro inescusável da parte embargante. Nessa linha, fundamentou o seu voto nos argumentos de que: 

i) a lei expressamente prevê que os embargos à execução têm natureza de ação de conhecimento autônoma e incidente ao processo de execução; 

ii) o procedimento de manejo dos embargos em autos distintos da execução já é antigo na legislação processual, não sendo inovação trazida pelo novo Código de Processo Civil, redundando em erro grosseiro a sua não observância; 

iii) a observância das normas processuais é sempre salutar e recomendável para a correta condução dos feitos judiciais; 

iv) é inaplicável, na hipótese, o princípio da instrumentalidade das formas e dos atos processuais; e 

v) a marcha processual da execução restará prejudicada se as teses de defesa apresentadas nos embargos do devedor tiverem que ser apreciadas no mesmo processo de execução, uma vez que os respectivos procedimentos possuem ritos flagrantemente distintos e muitas vezes incompatíveis entre si. 

Contudo, penso que a controvérsia posta a deslinde nos presentes autos carece de análise sob outro viés. 

É que, primando por uma maior aproximação ao verdadeiro espírito do novo Código de Processo Civil, não se afigura razoável deixar de apreciar os argumentos apresentados em embargos à execução tempestivamente opostos – ainda que, de forma errônea, nos autos da própria ação de execução – sem antes conceder à parte prazo para sanar o vício, adequando o procedimento à forma prescrita no art. 914, § 1º, do CPC/2015. 

Convém salientar que o art. 277 do CPC/2015 preceitua que, quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade. 

Destarte, na espécie, o erro quanto à forma constitui vício sanável, notadamente quando se analisa o processo sob a ótica da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal, da celeridade, da razoável duração do processo, da cooperação e da busca pela solução do mérito. 

Assim, o protocolo equivocado dos embargos à execução nos autos da ação executiva deve dar azo à aplicação dos princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, de modo que a sua rejeição liminar configuraria excesso de formalismo. 

A corroborar com tais argumentos, destaca-se, ainda, que, em tempos de implantação do processo eletrônico, prioriza-se conferir agilidade aos julgamentos, devendo ser tolerados esses tipos de equívoco, nas hipóteses em que não configurada a má-fé. 

Anota, quanto ao ponto, Olavo de Oliveira Neto: 

Por se tratar de uma ação incidente, os embargos deverão ser distribuídos por dependência ao processo de execução e, segundo determina o § 1º, serão autuados em apartado e instruídos com as cópias das peças processuais relevantes. Essas duas providências, com o tempo e com a completa implantação do processo eletrônico, desaparecerão, uma vez que a autuação somente tem razão de ser quando se pensa num processo base-papel e a juntada das peças principais é absolutamente desnecessária quando se pensa que todos os personagens do processo terão acesso ao conteúdo digital da execução. De qualquer forma, quando e se ainda for possível o oferecimento de embargos base-papel, as cópias serão autenticadas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal (BUENO, Cassio Scarpinella. Comentários ao código de processo civil – voume 3. Cassio Scarpinella Bueno (coord.). São Paulo: Saraiva, 2017, p. 789) (grifos acrescentados). 

Em conclusão, tendo a recorrida apresentado o instrumento processual correto para impugnar a execução, dentro do prazo estabelecido na lei processual civil em vigor – o que foi, inclusive, expressamente reconhecido nos termos do voto do Min. Relator –, deve-se conceder prazo para que a parte promova o desentranhamento, distribuição por dependência e autuação em apartado dos embargos à execução opostos, em conformidade com as exigências legais quanto à forma de processamento (a exemplo da comprovação do preparo). 

Forte nessas razões, pedindo as mais respeitosas vênias ao e. Min. Relator, divirjo para CONHECER do recurso especial interposto por CONDOMINIO BRISAS DO MADEIRA RESIDENCIAL CLUBE e NEGAR-LHE PROVIMENTO, a fim de manter o acórdão recorrido, que reconheceu a possibilidade da recorrida sanar o vício de inadequação da via eleita. 

Filigrana doutrinária: Embargos à Execução - Cássio Scarpinella Bueno

"Por se tratar de uma ação incidente, os embargos deverão ser distribuídos por dependência ao processo de execução e, segundo determina o § 1º, serão autuados em apartado e instruídos com as cópias das peças processuais relevantes. Essas duas providências, com o tempo e com a completa implantação do processo eletrônico, desaparecerão, uma vez que a autuação somente tem razão de ser quando se pensa num processo base-papel e a juntada das peças principais é absolutamente desnecessária quando se pensa que todos os personagens do processo terão acesso ao conteúdo digital da execução. De qualquer forma, quando e se ainda for possível o oferecimento de embargos base-papel, as cópias serão autenticadas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal"

BUENO, Cassio Scarpinella. Comentários ao código de processo civil – voume 3. Cassio Scarpinella Bueno (coord.). São Paulo: Saraiva, 2017, p. 789

Filigrana doutrinária: Embargos à Execução - Humberto Theodoro Júnior

 "(...) Em se tratando de uma nova ação, sujeita-se à distribuição, registro e autuação próprios (NCPC, arts. 206 e 284), devendo, também receber valor de causa, na respectiva petição inicial, como determina o art. 291. Diante da inegável conexão que se nota entre a execução e os embargos, a distribuição destes é feita por dependência (art. 286). Submete-se, outrossim, a ação de embargos, como qualquer outra, à exigência de preparo prévio, de sorte que o não pagamento das custas iniciais em quinze dias importa cancelamento da distribuição e extinção do processo em seu nascedouro (art. 290). Os embargos, como ação cognitiva, devem ser propostos por meio de petição inicial, que satisfaça as exigências dos arts. 319 e 320. Submeter-se-ão à distribuição por dependência, ao juízo da causa principal (a ação executiva). Formarão autos próprios, apartados da ação de execução. Se não ocorrer o deferimento do efeito suspensivo, os embargos deverão tramitar sem prejuízo da marcha processual da execução. Por isso, caberá ao embargante instruir sua petição inicial com cópias das peças do processo principal cujo exame seja relevante para o julgamento da pretensão deduzida na ação incidental (art. 914, § 1º), já que pode acontecer de cada uma das ações tomar rumo diferente, exigindo a prática de atos incompatíveis entre si, e subindo, em momentos diversos, a tribunais distintos. Não deve, à vista disso, faltar na autuação dos embargos peças da execução cujo exame seja indispensável ao julgamento da oposição do executado. Procurações, título executivo, citação, auto de penhora (se já houver) são exemplos de peças cujo traslado comumente haverá de efetuar-se. Com esse novo critério de instrução da petição de embargos, eliminou-se o velho problema, antes existente, da subida dos autos da execução, para processamento da apelação interposta contra a sentença de improcedência dos embargos. Não há mais empecilho algum a que os autos dos embargos sejam desapensados para a subida do recurso ao Tribunal." 

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo de Execução e Cumprimento da Sentença. 29ª ed. São Paulo: Ed. Universitária de Direito, 2017, págs. 624/625

Filigrana doutrinária: Embargos à Execução - Araken de Assis

 "(...) Na função jurisdicional executiva, há aspectos insuscetíveis de dúvidas consistentes. Por exemplo, os atos executivos são diferentes dos processuais praticados na função de conhecimento (retro, 4); ao direito de instaurar a relação processual executiva correspondente à ação (retro, 15), tornando nítido o princípio da autonomia (retro, 9), segundo o qual é possível o desenvolvimento simultâneo de ações paralelas à pretensão de executar; e assim por diante. Avulta indiscutível, outrossim, que a função executiva, a despeito de alguma dose de cognição no curso do respectivo procedimento - no mínimo o juiz conhecerá, ex officio, da existência, a validade e a eficácia da relação processual -, visa à atuação do direito contemplado no título executivo, não se ocupando da declaração de direitos litigiosos. Essa última característica conduz a defesa do executado, controvertendo a subsistência e o conteúdo da pretensão a executar, desconstituindo ou não o título, no todo ou em parte, bem como ao controle da sua regularidade (vícios de atividade), realizar-se-á por meio de ação autônoma, posto que acessória à execução. Existe inequívoca incompatibilidade funcional na convivência de atos executivos com atos de índole diversa, simultaneamente, na mesma estrutura (processo). Esta é a ideia fundamental posta à base dos embargos do executado ou, consoante a designação do Título III o Livro II da Parte Especial do NCPC, 'embargos à execução'. Esse veto não é absoluto. Excepciona-o a possibilidade de o executado controverter a existência do título (ou sua inexiquibilidade, a teor do art. 917, I) e os pressupostos processuais por via da exceção de pré-executividade, desde que baseada em prova pré-constituída (retro, 537). Por outro lado, a certeza relativa quanto à existência do crédito outorgada pelo título (retro, 26.1), não torna inútil a defesa. A tese de que os embargos constituem ação incidente à execução é universal. A autonomia dos embargos transparece no seu objeto: tratando-se de oposição em que o executado veicula exceções e objeções substanciais, o desaparecimento da execução por iniciativa do exequente, utilizando-se do disposto no art. 775, caput, em nada prejudica o seu prosseguimento e desenlace. Trata-se de remédio processual específico de oposição à execução, consoante reza o art. 914, caput, parte final, e revela-se insubstituível por qualquer outro, como o mandado de segurança". 

ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 18ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, págs. 1.538/1.539.

30 de abril de 2021

REsp Nº 1.682.218 - MG: embargos à execução

Todavia, apesar da autonomia dos embargos do devedor, a sua propositura depende (i) da prévia existência da relação processual entre exequente e executado, com a efetiva ocorrência de citação ou de comparecimento espontâneo devedor aos autos, (ii) e da ausência de fato pretérito à angularização do processo que impeça a continuidade da demanda executiva (a exemplo da desistência).

Com efeito, a autonomia dos embargos do devedor não é absoluta, tanto que a sua existência ou o seu cabimento estão intrinsecamente ligados ao processo de execução com a relação processual angularizada. E é por isso que a outra característica dos embargos é o seu vínculo de incidentalidadede com a execução (processo principal). 

Nessa linha de intelecção, a Quarta Turma desta Corte assentou que, "embora os embargos do devedor constituam ação autônoma, não se pode considerá-los completamente independentes, já que são o meio de defesa do executado" (AgInt no AREsp nº 365.126/PR, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 27/6/2017, DJe 1º/8/2017 - grifou-se)