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5 de abril de 2022

É incabível a interposição de recurso ordinário contra apelação em mandado de segurança

Processo

RMS 66.905-SP, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 22/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Recurso ordinário. Apelação em mandado de segurança. Fungibilidade. Recebimento como recurso especial. Descabimento.

 

DESTAQUE

É incabível a interposição de recurso ordinário contra apelação em mandado de segurança.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

No caso, a parte manejou o recurso ordinário a fim de evitar a incidência da Súmula n. 7/STJ ("A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial."), e defende ser admissível, na hipótese, a fungibilidade com a via especial.

Inexiste fungibilidade recursal entre as vias ordinária e especial, ante a ausência de dúvida objetiva patente sobre as hipóteses de cabimento das espécies recursais.

A tática confessadamente deliberada de manejar-se o recurso ordinário com o intuito de afastar a incidência da Súmula n. 7/STJ revela-se particularmente afrontosa ao Poder Judiciário. A competência desta (e de outras) Cortes se afirma pelo ordenamento constitucional e suas derivações, não pela estratégia processual articulada pelas partes.

Há inegável erro grosseiro na interposição do recurso ordinário contra acórdão de apelação em mandado de segurança. O fato de se tratar de erro deliberado, com intuito de burlar a compreensão desta Corte sobre os requisitos constitucionais de manejo do recurso especial não mitiga ou afasta tal equívoco; ao contrário.

Ainda que se admitisse a descabida fungibilidade, por obviedade lógica, a análise do recurso sob a via especial esbarraria, no óbice de que tentou se esquivar, resultando igualmente no não conhecimento da pretensão.

24 de março de 2022

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios não tem competência para processar e julgar mandado de segurança impetrado contra ato do Controlador-Geral do Distrito Federal

Processo

RMS 57.943-DF, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Mandado de Segurança. Autoridade impetrada. Controlador-Geral do Distrito Federal. Status de secretário de estado conferido por decreto distrital. Efeitos limitados à esfera administrativa. TJDFT. Incompetência.

 

DESTAQUE

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios não tem competência para processar e julgar mandado de segurança impetrado contra ato do Controlador-Geral do Distrito Federal.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O art. 8º, I, c, da Lei Federal n. 11.697/2008, Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal - LOJDF, prevê a competência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios para julgar mandado de segurança contra atos de Secretários de Governo do DF. Por sua vez, o art. 26 da mesma Lei Federal (LOJDF) dispõe que compete ao Juiz da Vara da Fazenda Pública processar e julgar: "III - os mandados de segurança contra atos de autoridade do Governo do Distrito Federal e de sua administração descentralizada".

Até a edição do Decreto Distrital n. 36.236/2015, coexistiam os órgãos da Secretaria de Estado de Transparência e Controle - STC e da Controladoria-Geral do Distrito Federal - CGDF, ambos como integrantes do Sistema de Correição do Distrito Federal - SICOR/DF, com a finalidade de prevenir e apurar irregularidades no Poder Executivo - Lei n. 4.938/2012.

Quando da edição do referido ato, a Secretaria de Estado da Transparência foi renomeada para Controladoria-Geral do Distrito Federal (art. 8º, § 1º). Ocorre que este órgão já existia, situação que leva ao entendimento de que teria havido, na verdade, uma absorção de um órgão por outro.

Com isso, verifica-se que a Controladoria-Geral não pode ser considerada uma secretaria para o fim de alteração da competência jurisdicional e deve ser reconhecida a competência absoluta da Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal para processar e julgar o mandamus.



8 de março de 2022

É inviável a subsunção de dirigentes, unidades ou órgãos de entidades de administração do desporto ao conceito de autoridade pública ou exercício de função pública, sobressaindo o caráter privado dessas atividades, declarando-se a ilegitimidade passiva a obstar o exame de mérito do mandado de segurança

QUARTA TURMA
Processo

REsp 1.348.503-SE, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 22/02/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CONSTITUCIONAL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Mandado de segurança. Dirigente de Federação Esportiva. Entidade privada que não desempenha atividade pública delegada. Art. 82 da Lei n. 9.615/1998 (Lei Pelé). Ilegitimidade passiva.

 

DESTAQUE

É inviável a subsunção de dirigentes, unidades ou órgãos de entidades de administração do desporto ao conceito de autoridade pública ou exercício de função pública, sobressaindo o caráter privado dessas atividades, declarando-se a ilegitimidade passiva a obstar o exame de mérito do mandado de segurança.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Inicialmente cumpre salientar que, a par das discussões doutrinárias suscitadas em relação à legitimidade passiva no mandado de segurança, mormente no que se refere à controvérsia acerca de recair sobre a própria pessoa jurídica ou sobre a autoridade coatora, é assente a necessidade de que o ato impugnado seja emanado de autoridade pública ou esteja vinculado a funções/atividades públicas (delegadas ou concedidas) exercidas por particulares.

Na hipótese, a pessoa jurídica interessada - Federação Esportiva - detém natureza de direito privado (art. 44, II, do Código Civil).

Conforme disposto no artigo 16 da Lei n. 9.615/1998 (Lei Pelé), as entidades de prática desportiva e as entidades de administração do desporto, bem como as ligas de que trata o art. 20, são pessoas jurídicas de direito privado, com organização e funcionamento autônomo, e terão as competências definidas em seus estatutos ou contratos sociais.

Especificamente no que se refere à autonomia, à gestão e à natureza das funções desempenhadas, o artigo 82 da referida lei assim preceitua: "os dirigentes, unidades ou órgãos de entidades de administração do desporto, inscritas ou não no registro de comércio, não exercem função delegada pelo Poder Público, nem são consideradas autoridades públicas para os efeitos desta Lei".

Deste modo, é inviável a subsunção ao conceito de autoridade pública ou exercício de função pública, sobressaindo o caráter privado da atividade desempenhada, declarando-se a ilegitimidade passiva, a obstar o exame de mérito do mandado de segurança.



9 de fevereiro de 2022

Contribuinte pode impetrar MS pedindo que se reconheça direito à compensação de tributos indevidamente pagos nos 5 anos anteriores ao ajuizamento, sem que isso implique ofensa à Súmula 271 do STF

 TRIBUTÁRIO - COMPENSAÇÃO

STJ. 1ª Seção. EREsp 1.770.495-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 10/11/2021 (Info 717)

Contribuinte pode impetrar MS pedindo que se reconheça direito à compensação de tributos indevidamente pagos nos 5 anos anteriores ao ajuizamento, sem que isso implique ofensa à Súmula 271 do STF

Súmula 271-STF: “Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”

A pretensão em mandado de segurança que visa exclusivamente à declaração do direito à compensação de eventuais indébitos recolhidos anteriormente à impetração, ainda não atingidos pela prescrição, não importa em produção de efeito patrimonial pretérito, aproveitando apenas o valor referente a indébitos recolhidos nos cinco anos anteriores ao manejo da ação mandamental

Se o Poder Judiciário declara que o contribuinte possui direito de compensar – ainda que os créditos sejam anteriores à impetração – deve-se reconhecer que essa decisão judicial tem efeitos exclusivamente prospectivos, os quais somente serão sentidos posteriormente ao trânsito em julgado (art. 170-A, CTN), quando da realização do efetivo encontro de contas, o qual está sujeito à fiscalização pela Administração Tributária.

Poder Judiciário apenas declara que existe o direito à compensação, mas os efeitos financeiros disso ainda dependerão do encontro de contas a ser feito posteriormente. Logo, a decisão judicial, por si só, não produz efeitos patrimoniais pretéritos

O reconhecimento do direito à compensação de eventuais indébitos recolhidos anteriormente à impetração ainda não atingidos pela prescrição não importa em produção de efeito patrimonial pretérito, vedado pela Súmula 271 do STF, visto que não há quantificação dos créditos a compensar e, por conseguinte, provimento condenatório em desfavor da Fazenda Pública à devolução de determinado valor, o qual deverá ser calculado posteriormente pelo contribuinte e pelo fisco no âmbito administrativo segundo o direito declarado judicialmente ao impetrante

A decisão judicial proferida no mandado de segurança definirá a tese jurídica, mas a quantificação dos créditos a compensar e o quanto o contribuinte terá para receber eventualmente de crédito, isso ainda será calculado posteriormente, não sendo definido na decisão do MS.

“(...) a respectiva decisão judicial (concessiva da Segurança) apenas fixa em abstrato o reconhecimento de que a parte poderá submeter o encontro de contas à análise administrativa – ou seja, não há validação de compensação previamente realizada pelo contribuinte, à revelia da autoridade fiscal, nem tampouco da liquidez dos créditos e débitos compensados (matéria que, em regra, demanda ampla dilação probatória, com fase pericial, etc., incompatível com o célere rito do Mandado de Segurança)”.

decisão proferida no MS tem natureza declaratória e não constitui, mas apenas reconhece um direito pré-existente.

1ª T; AgRg no REsp 1365189/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 08/04/2014: “A possibilidade de a sentença mandamental declarar o direito à compensação (ou creditamento), nos termos da Súmula 213/STJ, de créditos ainda não atingidos pela prescrição não implica concessão de efeitos patrimoniais pretéritos à impetração. O referido provimento mandamental, de natureza declaratória, tem efeitos exclusivamente prospectivos, autorizando a realização do encontro de contas apenas a partir de sua prolação”

Súmula 213-STJ: “O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária”.

18 de novembro de 2021

A pretensão em mandado de segurança que visa exclusivamente a declaração do direito à compensação de eventuais indébitos recolhidos anteriormente à impetração, ainda não atingidos pela prescrição, não importa em produção de efeito patrimonial pretérito, aproveitando apenas o valor referente a indébitos recolhidos nos cinco anos anteriores ao manejo da ação mandamental

Processo

EREsp 1.770.495-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 10/11/2021.

Ramo do Direito

DIREITO TRIBUTÁRIO

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Mandado de segurança. Direito à compensação. Declaração. Súmula 213 do STJ. Valores recolhidos anteriormente à impetração não atingidos pela prescrição. Aproveitamento. Possibilidade.

 

DESTAQUE

A pretensão em mandado de segurança que visa exclusivamente a declaração do direito à compensação de eventuais indébitos recolhidos anteriormente à impetração, ainda não atingidos pela prescrição, não importa em produção de efeito patrimonial pretérito, aproveitando apenas o valor referente a indébitos recolhidos nos cinco anos anteriores ao manejo da ação mandamental.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

No acórdão embargado, a Segunda Turma, ponderando o entendimento sedimentado na Súmula 271 do STF, que veda a concessão de efeitos patrimoniais pretéritos ao mandado de segurança, manteve o acórdão recorrido que indeferira o pedido de declaração do direito de compensação dos indébitos recolhidos nos cinco anos anteriores à data da impetração, limitando a declaração do direito à compensação apenas para o aproveitamento dos pagamentos ocorridos posteriormente à impetração do writ.

Já o aresto paradigma, da Primeira Turma, também analisando mandado de segurança de que trata a Súmula 213 do STJ, expressamente declarou o direito à compensação de indébitos anteriores à impetração, desde que ainda não atingidos pela prescrição.

Quanto ao objeto do dissenso jurisprudencial ora apresentado, deve prevalecer a conclusão estampada no aresto apontado como paradigma.

Isso porque o provimento alcançado em mandado de segurança, que visa exclusivamente a declaração do direito à compensação tributária, nos termos da Súmula 213 do STJ ("O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária"), tem efeitos exclusivamente prospectivos, os quais somente serão sentidos posteriormente ao trânsito em julgado (art. 170-A do CTN), quando da realização do efetivo encontro de contas, o qual está sujeito à fiscalização pela Administração Tributária.

Para essa espécie de pretensão mandamental, o reconhecimento do direito à compensação de eventuais indébitos recolhidos anteriormente à impetração ainda não atingidos pela prescrição não importa em produção de efeito patrimonial pretérito, vedado pela Súmula 271 do STF, visto que não há quantificação dos créditos a compensar e, por conseguinte, provimento condenatório em desfavor da Fazenda Pública à devolução de determinado valor, o qual deverá ser calculado posteriormente pelo contribuinte e pelo fisco no âmbito administrativo segundo o direito declarado judicialmente ao impetrante.

Frise-se que da tese explicitada no julgamento do Recurso Especial Repetitivo REsp 1.365.095/SP é possível depreender que o pedido de declaração do direito à compensação tributária está normalmente atrelado ao "reconhecimento da ilegalidade ou da inconstitucionalidade da anterior exigência da exação", ou seja, aos tributos indevidamente cobrados antes da impetração, não havendo razão jurídica para que, respeitada a prescrição, esses créditos não constem do provimento declaratório.

Aliás, como cediço, a decisão de natureza declaratória não constitui, mas apenas reconhece um direito pré-existente.

Acrescenta-se, por oportuno, que esta Corte Superior orienta que a impetração de mandado de segurança interrompe o prazo prescricional para o ajuizamento da ação de repetição de indébito, entendimento esse que, pela mesma ratio decidendi, permite concluir que tal interrupção também se opera para fins do exercício do direito à compensação declarado a ser exercido na esfera administrativa, de sorte que, quando do encontro de contas, o contribuinte poderá aproveitar o valor referente a indébitos recolhidos nos cinco anos anteriores à data da impetração.

24 de agosto de 2021

Análise da (in) constitucionalidade da Lei do Mandado de Segurança

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/08/info-1021-stf.pdf


MANDADO DE SEGURANÇA - Análise da (in) constitucionalidade da Lei do Mandado de Segurança 

Não cabe mandado de segurança contra atos de gestão comercial praticados por administradores de empresas públicas, sociedades de economia mista e concessionárias de serviço público. É constitucional o art. 1º, § 2º da Lei nº 12.016/2019. 

O juiz tem a faculdade de exigir caução, fiança ou depósito para o deferimento de medida liminar em mandado de segurança, quando verificada a real necessidade da garantia em juízo, de acordo com as circunstâncias do caso concreto. É constitucional o art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2019. 

É inconstitucional ato normativo que vede ou condicione a concessão de medida liminar na via mandamental. É inconstitucional o art. 7º, § 2º da Lei nº 12.016/2009. 

É constitucional o art. 23 da Lei nº 12.016/2009, que fixa o prazo decadencial de 120 dias para a impetração de mandado de segurança. 

É constitucional o art. 25 da Lei nº 12.016/2009, que prevê que não cabe, no processo de mandado de segurança, a condenação em honorários advocatícios. 

STF. Plenário. ADI 4296/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes julgado em 9/6/2021 (Info 1021). 

A situação concreta foi a seguinte: 

Em 07/08/2009, foi promulgada a Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009). Logo em seguida, em 15/09/2009, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil ajuizou ADI contra os seguintes dispositivos da então recém aprovada Lei nº 12.016/2009: 

• art. 1º, § 2º; 

• art. 7º, III e § 2º; 

• art. 22, § 2º; 

• art. 23; 

• art. 25. 

Em 2021, a ação foi julgada. Vejamos com calma cada um dos pontos decididos. 

Art. 1º, § 2º: constitucional 

Confira inicialmente a redação do dispositivo: 

Art. 1º (...) 

§ 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público. 

A OAB alegou que a Lei, ao cercear a possibilidade de apreciação pelo Poder Judiciário dos atos de gestão comercial, interferiu na harmonia e independência entre os Poderes. O STF rejeitou o pedido neste ponto e decidiu que o art. 1º, § 2º da Lei nº 12.016/2009 é constitucional. Desse modo, é válido dizer que: 

Não cabe mandado de segurança contra atos de gestão comercial praticados por administradores de empresas públicas, sociedades de economia mista e concessionárias de serviço público (art. 1º, § 2º da Lei nº 12.016/2019). 

STF. Plenário. ADI 4296/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes julgado em 9/6/2021 (Info 1021). 

Por que essa restrição imposta pela Lei é legítima? 

Segundo o art. 5º, LXIX, da CF/88, o ajuizamento do mandado de segurança somente é cabível contra atos praticados no desempenho de atribuições do poder público: 

Art. 5º (...) LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por “habeas-corpus” ou “habeas-data”, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público; 

Atos de gestão comercial são atos estranhos à ideia da delegação do serviço público em si. Esses atos se destinam à satisfação de interesses privados na exploração de atividade econômica, submetendo-se a regime jurídico próprio das empresas privadas. Em palavras mais simples, se um administrador de empresa pública, sociedade de economia mista ou concessionária de serviço público pratica um ato de gestão comercial, ele não está atuando “no exercício de atribuições do Poder Público”. A gestão comercial dessas empresas é assunto de caráter nitidamente privado. Logo, não cabe realmente mandado de segurança por força da própria previsão constitucional. A despeito de não ter sido mencionada pelo STF, vale a pena recordarmos a Súmula 333 do STJ, cuja redação é a seguinte: 

Súmula 333-STJ: Cabe mandado de segurança contra ato praticado em licitação promovida por sociedade de economia mista ou empresa pública. (Aprovada em 13/12/2006, DJ 14/02/2007) 

Esse enunciado permanece válido mesmo com o art. 1º, § 2º da Lei nº 12.016/2009. Isso porque os atos praticados em licitação possuem natureza jurídica de atos administrativos (e não de atos de gestão comercial). 

Conforme muito bem explica Renério de Castro Júnior (Manual de Direito Administrativo. Salvador: Juspodivm, 2021, p. 200) 

“Os atos praticados por empresas públicas e sociedades de economia mista devem ser caracterizados, em regra, como atos privados. Contudo, os atos praticados por estatais no desempenho de funções administrativas, como em concurso público ou licitação, são considerados atos materialmente administrativos. Por tal motivo, é possível o ajuizamento de mandado de segurança contra atos dos dirigentes das empresas estatais, quando praticados na qualidade de autoridade pública: Súmula nº 333-STJ: Cabe mandado de segurança contra ato praticado em licitação promovida por sociedade de economia mista ou empresa pública. Por outro lado, não caberá o MS quando o ato for de mera gestão econômica. Esse entendimento inicialmente jurisprudencial foi consolidado na Lei 12.016/09 (Lei do Mandado de Segurança), a qual prevê: Art. 1º (...) § 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público.” 

Art. 7º, III: constitucional 

Confira o que diz o dispositivo impugnado: 

Art. 7º Ao despachar a inicial, o juiz ordenará: (...) 

III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica. 

Esse dispositivo trata sobre a possibilidade de se conceder medida liminar em mandado de segurança. A OAB impugnou a parte final do dispositivo. Segundo a entidade, seria inconstitucional exigir o pagamento prévio de caução, depósito ou fiança para a concessão de liminar. O STF não concordou com a autora. No exercício do seu poder geral de cautela, o magistrado pode analisar se determinado caso específico exige caução, fiança ou depósito. A caução, fiança ou depósito previstos no art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2019 configuram mera faculdade, que pode ser exercida se o magistrado entender ser necessária para assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica. Não se trata, portanto, de um obstáculo ao poder geral de cautela, mas uma faculdade que vai ao encontro do art. 300, § 1º, do CPC: 

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 

§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. (...) 

Desse modo, é válido dizer que: 

O juiz tem a faculdade de exigir caução, fiança ou depósito para o deferimento de medida liminar em mandado de segurança, quando verificada a real necessidade da garantia em juízo, de acordo com as circunstâncias do caso concreto (art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2019). 

STF. Plenário. ADI 4296/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes julgado em 9/6/2021 (Info 1021). 

Art. 7º, § 2º: inconstitucional 

Esse dispositivo proíbe a concessão de liminar em mandado de segurança para a compensação de créditos tributários, entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior: 

Art. 7º (...) § 2º Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. 

O STF considerou inconstitucional impedir ou condicionar a concessão de medida liminar, o que caracteriza verdadeiro obstáculo à efetiva prestação jurisdicional e à defesa do direito líquido e certo do impetrante. A Corte concluiu que: 

É inconstitucional ato normativo que vede ou condicione a concessão de medida liminar na via mandamental. STF. Plenário. ADI 4296/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes julgado em 9/6/2021 (Info 1021). 

Atenção! Em virtude dessa decisão do STF, fica superada a Súmula 212 do STJ: Súmula 212-STJ: A compensação de créditos tributários não pode ser deferida em ação cautelar ou por medida liminar cautelar ou antecipatória. (entendimento superado) 

Art. 22, § 2º: inconstitucional 

Confira o que diz o dispositivo: 

Art. 22. (...) § 2º No mandado de segurança coletivo, a liminar só poderá ser concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de 72 (setenta e duas) horas. 

O STF julgou inconstitucional a exigência de oitiva prévia do representante da pessoa jurídica de direito público como condição para a concessão de liminar em mandado de segurança coletivo, por considerar que a disposição restringe o poder geral de cautela do magistrado. Conforme argumentou o Min. Marco Aurélio: 

“O preceito contraria o sistema judicial alusivo à tutela de urgência. Se esta surge cabível no caso concreto, é impertinente, sob pena de risco do perecimento do direito, estabelecer contraditório ouvindo-se, antes de qualquer providência, o patrono da pessoa jurídica. Conflita com o acesso ao Judiciário para afastar lesão ou ameaça de lesão a direito. Tenho como inconstitucional o artigo 22, § 2º, da Lei nº 12.016/2009.” 

Art. 23: constitucional 

O art. 23 da Lei nº 12.016/2009 prevê um prazo decadencial de 120 dias para a impetração do mandado de segurança: 

Art. 23. O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado. 

A OAB questionou esse prazo, sob o argumento de que ele não está previsto na Constituição Federal e, portanto, não poderia ter sido fixado pelo legislador infraconstitucional. O STF, contudo, rejeitou o argumento. A Corte tem entendimento consolidado no sentido de que essa fixação de prazo é compatível com a Constituição Federal, conforme consta na Súmula 632, aprovada em 24/09/2003: 

Súmula 632-STF: É constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança. 

Assim, depois que uma autoridade praticar um ato ilegal ou abusivo, a pessoa prejudicada terá o prazo de até 120 dias para impugná-lo por meio de mandado de segurança. Ultrapassado este período, o interessado continua com o direito de questionar o ato, mas deverá fazer isso mediante ação ordinária. O termo inicial deste prazo é a data em que a pessoa prejudicada teve ciência do ato. Obs: no caso de mandado de segurança preventivo, não há prazo decadencial. 

É constitucional o art. 23 da Lei nº 12.016/2009, que fixa o prazo decadencial de 120 dias para a impetração de mandado de segurança. 

STF. Plenário. ADI 4296/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes julgado em 9/6/2021 (Info 1021). 

Art. 25: constitucional 

O art. 25 da Lei nº 12.016/2009 prevê que não é cabível, no processo de mandado de segurança, a condenação ao pagamento de honorários: 

Art. 25. Não cabem, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. 

A OAB questionou esse trecho acima destacado. O STF, contudo, rejeitou o pedido e afirmou que essa previsão é constitucional. Vale ressaltar, inclusive, que a Corte possui entendimento sumulado, desde 03/12/1969, no sentido de que não cabem honorários de sucumbência na via mandamental: 

Súmula 512-STF: Não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança. 

O STJ também comunga da mesma posição: 

Súmula 105-STJ: Na ação de mandado de segurança não se admite condenação em honorários advocatícios. 

Vale ressaltar que o art. 25 veda exclusivamente honorários sucumbenciais, não tratando sobre honorários advocatícios contratuais. Assim, é lícita a cobrança, por parte do advogado, de honorários ajustados com o seu cliente por meio de contrato. 

É constitucional o art. 25 da Lei nº 12.016/2009, que prevê que não cabe, no processo de mandado de segurança, a condenação em honorários advocatícios. 

STF. Plenário. ADI 4296/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes julgado em 9/6/2021 (Info 1021). 

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ADI e julgou 

• inconstitucionais o art. 7º, § 2º e o art. 22, § 2º, da Lei nº 12.016/2009; 

• constitucionais o art. 1º, § 2º, o art. 7º, III, o art. 23 e o art. 25 da Lei nº 12.016/2009.

Filigrana doutrinária: Atos de gestão comercial e Mandado de Segurança - Renério de Castro Júnior

“Os atos praticados por empresas públicas e sociedades de economia mista devem ser caracterizados, em regra, como atos privados. Contudo, os atos praticados por estatais no desempenho de funções administrativas, como em concurso público ou licitação, são considerados atos materialmente administrativos. Por tal motivo, é possível o ajuizamento de mandado de segurança contra atos dos dirigentes das empresas estatais, quando praticados na qualidade de autoridade pública: Súmula nº 333-STJ: Cabe mandado de segurança contra ato praticado em licitação promovida por sociedade de economia mista ou empresa pública. Por outro lado, não caberá o MS quando o ato for de mera gestão econômica. Esse entendimento inicialmente jurisprudencial foi consolidado na Lei 12.016/09 (Lei do Mandado de Segurança), a qual prevê: Art. 1º (...) § 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público.” 

JÚNIOR, Renério de Castro. Manual de Direito Administrativo. Salvador: Juspodivm, 2021, p. 200. 

15 de agosto de 2021

Filigrana doutrinária: Daniel Mitidiero - Common Law, Civil Law, Mandado de Segurança, Habeas Data e Controle de Constitucionalidade

"Com a passagem do Império para a República, o direito brasileiro acabou ficando entre dois mundos: o direito constitucional aproximou-se da tradição do Common Law americano enquanto o direito infraconstitucional se manteve afeiçoado à tradição romano-canônica. É a partir desse encontro de águas que vários institutos se desenvolveram - por exemplo, o mandado de segurança e o habeas data a partir do habeas corpus (os chamados writs constitucionais) e o controle de constitucionalidade (fruto de uma permanente tensão entre o controle difuso - o judicial review - e o controle abstrato).


MITIDIERO, Daniel. Processo Civil. São Paulo: Thomson Reuters, 2021, p. 19-20

23 de julho de 2021

AgInt no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 56.422 - MS

 AgInt no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 56.422 - MS (2018/0012678-5) RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO AGRAVANTE : AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA ADVOGADOS : FLÁVIO LUIZ YARSHELL - SP088098 GUSTAVO PACÍFICO - SP184101 DANIEL LUIZ YARSHELL - SP373772 AGRAVADO : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL ADVOGADOS : ITANEIDE CABRAL RAMOS - MS005055 SULEIMAR SOUSA SCHRODER ROSA - MS007548 EMENTA CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO JUDICIAL ILEGAL. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA DE APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 334, § 8º, DO CPC/2015, POR INEXISTENTE ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. DECISÃO IRRECORRÍVEL. PARTE DEVIDAMENTE REPRESENTADA NA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO POR ADVOGADO COM PODERES PARA TRANSIGIR. VIOLAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO (CPC, ART. 334, § 10). ORDEM CONCEDIDA. RECURSO PROVIDO. 1. A impetração de mandado de segurança contra ato judicial, a teor da doutrina e da jurisprudência, reveste-se de índole excepcional, admitindo-se apenas em hipóteses determinadas, a saber: a) decisão judicial manifestamente ilegal ou teratológica; b) decisão judicial contra a qual não caiba recurso; c) para imprimir efeito suspensivo a recurso desprovido de tal atributo; e d) quando impetrado por terceiro prejudicado por decisão judicial. 2. Na hipótese, é cabível o mandado de segurança e nítida a violação de direito líquido e certo do impetrante, pois tem-se ato judicial manifestamente ilegal e irrecorrível, consistente em decisão interlocutória que impôs à parte ré multa pelo não comparecimento pessoal à audiência de conciliação, com base no § 8º do art. 334 do CPC, por suposto ato atentatório à dignidade da Justiça, embora estivesse representada naquela audiência por advogado com poderes específicos para transigir, conforme expressamente autoriza o § 10 do mesmo art. 334. 3. Agravo interno provido para dar provimento ao recurso ordinário em mandado de segurança, concedendo-se a segurança. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, dar provimento ao agravo interno para dar provimento ao recurso ordinário em mandado de segurança, concedendo-se a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. A Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti e os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi (Presidente) e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator. Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 1 de 5 Superior Tribunal de Justiça Brasília, 08 de junho de 2021 (Data do Julgamento) MINISTRO RAUL ARAÚJO Relator Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 2 de 5 Superior Tribunal de Justiça AgInt no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 56.422 - MS (2018/0012678-5) RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO AGRAVANTE : AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA ADVOGADOS : FLÁVIO LUIZ YARSHELL - SP088098 GUSTAVO PACÍFICO - SP184101 DANIEL LUIZ YARSHELL - SP373772 AGRAVADO : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL ADVOGADOS : ITANEIDE CABRAL RAMOS - MS005055 SULEIMAR SOUSA SCHRODER ROSA - MS007548 RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO RAUL ARAÚJO: Trata-se de agravo interno interposto por AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA contra decisão que negou provimento ao recurso ordinário em mandado de segurança, em razão da aplicação das Súmulas 267 e 268 do STF (e-STJ, fls. 324/331). A agravante sustenta que, diferentemente do consignado, não incidem no caso os entendimentos sumulados pelo STF nos enunciados 267 e 268. Defende ser irrecorrível a decisão judicial proferida pela autoridade coatora, que aplicou à impetrante a multa pelo não comparecimento pessoal da parte à audiência de conciliação, diante do não cabimento de agravo de instrumento. Complementa que o advento da sentença de improcedência do pedido autoral, não ensejava a interposição de apelação pela ora agravante, pois tal sentença lhe fora favorável no mérito, pois figurava como ré na causa originária. Pondera que a r. decisão proferida pela autoridade coatora produz paradoxo e conduz à flagrante ilegalidade, gerando uma situação excepcional que, caso mantida, torna imutável uma decisão teratológica. Suscita, ao final, a instauração de um incidente de assunção de competência, a fim de que a matéria seja melhor refletida e uniformizada perante todos os Tribunais, considerando que o tema relativo ao cabimento da multa pelo não comparecimento pessoal da parte à audiência de conciliação constitui relevante questão de direito e de inegável repercussão social. O agravado apresentou impugnação (e-STJ, fls. 373/379). O Ministério Público Federal, quando o recurso se encontrava sob apreciação da eg. Primeira Turma, sob a relatoria da eminente Ministra Regina Helena Costa, opinou pela concessão da ordem, com o provimento do presente recurso. A eg. Primeira Turma declinou da competência para uma das Turmas da Segunda Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 3 de 5 Superior Tribunal de Justiça Seção, vindo os autos por regular nova distribuição. É o relatório. Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 4 de 5 Superior Tribunal de Justiça AgInt no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 56.422 - MS (2018/0012678-5) RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO AGRAVANTE : AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA ADVOGADOS : FLÁVIO LUIZ YARSHELL - SP088098 GUSTAVO PACÍFICO - SP184101 DANIEL LUIZ YARSHELL - SP373772 AGRAVADO : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL ADVOGADOS : ITANEIDE CABRAL RAMOS - MS005055 SULEIMAR SOUSA SCHRODER ROSA - MS007548 VOTO O SENHOR MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator): De início, afasto o pedido de instauração de incidente de assunção de competência. No caso dos autos, não estão atendidos os requisitos para o cabimento do incidente de assunção de competência (art. 947 do CPC/2015), pois não se verifica a relevância da questão de direito, com grande repercussão social sobre o tema, sendo prematuro tratar uma situação isolada como a presente, como se fosse, por si só, indicadora de tais requisitos. Na origem, trata-se de mandado de segurança impetrado por AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA contra decisão do d. Juízo de Direito da 1ª Vara Cível de Chapadão do Sul/MS, que, nos autos da Ação Indenizatória nº 0801411- 38.2016.8.12.0046 proposta por Nei Araujo Bianchini Filho, em que se postulava a cobrança de comissão de corretagem referente a venda de imóvel rural, condenou a ré, impetrante e ora agravante, ao pagamento de multa no valor de 2% (dois por cento) do valor da causa, totalizando R$29.400,00 (vinte e nove mil e quatrocentos reais), devido ao não comparecimento pessoal em audiência de conciliação (fl. 17). Narrou a impetrante que, à época, formulou pedido de reconsideração perante a autoridade coatora (fls. 18/22), o qual foi indeferido (fl. 23). Seguiu-se agravo de instrumento (fls. 24/37), não conhecido pelo eg. Tribunal de Justiça - TJMS, sob o fundamento de que a r. decisão não seria "de mérito", não estando prevista no rol taxativo do art. 1.015 do CPC/2015 (fls. 38/40). Justifica, portanto, o cabimento do writ, tendo em vista a inexistência de recurso contra a r. decisão proferida pela autoridade coatora. Alega possuir o direito líquido e certo de se fazer representar em audiência de conciliação por advogado com poderes para negociar e transigir, conforme a letra do art. Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 5 de 5 Superior Tribunal de Justiça 334, § 10, do CPC/2015. Assim, no caso, a aplicação da multa prevista no art. 334, § 8º, do CPC/2015, no valor excessivo de R$29.400,00 (vinte e nove mil e quatrocentos reais), é manifestamente ilegal e viola o citado dispositivo legal, bem como o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) e a regra de proporcionalidade contida do art. 8º do CPC/2015. Argumenta que a ação indenizatória na qual houve a imposição da penalidade foi sentenciada em favor da impetrante, evidenciando o bom direito que a amparava e a impossibilidade de realização de acordo no feito. Além disso, o valor da causa que serviu de parâmetro para a aplicação da multa foi atribuído pelo autor daquela demanda, que, contando com assistência judiciária gratuita, indicou-o na quantia exorbitante de R$1.470.000,00 (um milhão, quatrocentos e setenta mil reais). Postula seja reconhecida a ilegalidade do ato coator, com a cassação da r. decisão da autoridade coatora, ou, subsidiariamente, a redução da multa para R$2.000,00 (dois mil reais). O eminente Relator, Desembargador Vilson Bertelli, indeferiu a petição inicial, por entender incabível o mandado de segurança dirigido contra ato judicial no qual já estava preclusa a faculdade de impugnação, acentuando, inclusive, que a sentença proferida nos autos da Ação Indenizatória nº 0801411-38.2016.8.12.0046 transitara em julgado sem a interposição de recurso pelas partes (e-STJ, fls. 78/82). Seguiu-se agravo interno, o qual deixou de ser conhecido pelo eg. TJMS, diante da falta de impugnação específica dos fundamentos da decisão recorrida (CPC/2015, art. 932, III). O eg. TJMS observou que: "a decisão recorrida indeferiu a inicial do mandado de segurança, porque a impetração ocorreu quando já preclusa a faculdade de impugnação do ato judicial"; "nas razões do agravo interno, o recorrente reitera os fundamentos da impetração do mandado de segurança e de seu alegado direito líquido e certo, não se insurgindo contra o único fundamento da decisão agravada: decurso do prazo para impetração do mandamus". E concluiu: "esse contexto indica a ausência de impugnação específica da decisão agravada", sendo "evidente a violação ao princípio da dialeticidade" (fls. 103/104). Daí o presente Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, no qual se alega: a) a violação do art. 489, § 1º, do CPC/2015, em razão da deficiência de fundamentação do v. aresto recorrido, tendo em vista que a recorrente impugnou todos os fundamentos da r. decisão que não recebeu a inicial do mandado de segurança, inclusive quanto ao prazo para impetração do writ e à inaplicabilidade da Súmula 268/STF; b) a irrecorribilidade da r. decisão proferida pela autoridade Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 6 de 5 Superior Tribunal de Justiça coatora, excluindo, também, a via de eventual ação rescisória; c) o direito líquido e certo de a recorrente se fazer presente em audiência por procurador, com poderes para transigir, conforme a letra clara do art. 334, § 10, do CPC/2015, sendo ilegal a r. decisão objeto do mandado de segurança; d) a inconstitucional falta de razoabilidade e proporcionalidade na aplicação da multa, a qual deve ser cassada ou, ao menos, revista (e-STJ, fls. 112/129). Melhor compulsando os autos, à vista das presentes razões recursais, tem-se assistir razão à agravante quanto ao cabimento do mandado de segurança, não sendo o caso de aplicação das Súmulas 267 e 268 do STF. Conforme relatado, a decisão questionada neste mandado de segurança foi proferida em audiência realizada no dia 04/04/2017. Interposto agravo de instrumento, o recurso não foi conhecido em decisão publicada em 31/05/2017. Por sua vez, a sentença proferida em 23/05/2017 julgou improcedente o pedido formulado na ação, sendo favorável à parte ré, ora impetrante e agravante, por entender o julgador não haver a demonstração de indícios mínimos do direito pleiteado pelo autor relativamente à percepção de comissão de corretagem pela intermediação de compra e venda da Fazenda Santa Tereza. Assim, condenou o autor da ação ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios no valor de 10% sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade em razão da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Seguiu-se, então, a impetração do presente writ, no dia 1º/08/2017, contra a decisão interlocutória de aplicação da multa pelo não comparecimento pessoal à audiência de conciliação.Contando-se o prazo decadencial para o mandamus desde a data de não conhecimento do agravo de instrumento, como parece correto, ou mesmo da data em que aplicada a multa mencionada, como seria a pior hipótese, não houve o decurso do prazo de 120 dias contados da ciência do ato impugnado. Prosseguindo, num exame mais aprofundado do feito, tem-se ser a decisão interlocutória atacada no writ irrecorrível. Nesse sentido: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. HIPÓTESES DE CABIMENTO DO RECURSO (ART. 1.015, INCISO II, DO CPC). AUSÊNCIA INJUSTIFICADA A AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. MULTA POR ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. 1. Controvérsia em torno da recorribilidade, mediante agravo de instrumento, contra a decisão cominatória de multa à parte pela ausência injustificada à audiência de conciliação. Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 7 de 5 Superior Tribunal de Justiça 2. O legislador de 2015, ao reformar o regime processual e recursal, notadamente do agravo de instrumento, pretendeu incrementar a celeridade do processo, que, na vigência do CPC de 1973, era constantemente obstaculizado pela interposição de um número infindável de agravos de instrumento, dilargando o tempo de andamento dos processos e sobrecarregando os Tribunais, Federais e Estaduais. 3. A decisão cominatória da multa do art. 334, §8º, do CPC, à parte que deixa de comparecer à audiência de conciliação, sem apresentar justificativa adequada, não é agravável, não se inserindo na hipótese prevista no art. 1.015, inciso II, do CPC, podendo ser, no futuro, objeto de recurso de apelação, na forma do art. 1.009, §1º, do CPC. 4. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (REsp 1.762.957/MG, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe de 18/03/2020) O agravo de instrumento interposto não foi conhecido, porque incabível, não estando a r. decisão proferida prevista no rol do art. 1.015 do CPC/2015, consignando-se, naquela oportunidade, que "inexiste por ora recurso cabível contra a decisão que aplica a multa por ato atentatório à dignidade da justiça" (e-STJ, fls. 38/39). Já o art. 1.009, § 1º, do CPC/2015 assim estabelece: Art. 1.009. Da sentença cabe apelação. § 1º As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de instrumento, não são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões. A norma processual, de fato, estabelece que as decisões interlocutórias não sujeitas a agravo de instrumento não sofrem preclusão e devem ser objeto de impugnação pela parte em eventual e hipotética apelação ou em contrarrazões, como autoriza o art. 1.009, § 1º, do CPC/2015. Ocorre que, na hipótese, a r. sentença proferida na ação subjacente ao presente mandado de segurança julgou improcedente o pedido de indenização relativo ao pagamento de comissão de corretagem postulado pelo autor em face da ora impetrante e agravante. Nesse contexto, é certo que, diante da improcedência do pedido, não era mesmo o caso de se exigir da ré naquela ação, ora agravante, que apelasse contra a r. sentença de improcedência, pois esta, na essência, lhe era francamente favorável, inclusive no mérito. Afinal, com a simples interposição do apelo, surgiria a possibilidade de recurso adesivo pelo autor da demanda, reabrindo desnecessariamente toda a discussão de mérito no segundo grau. Por isso, tem-se como correta a justificativa apresentada pela impetrante Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 8 de 5 Superior Tribunal de Justiça relativamente à falta de interposição de apelação contra a r. sentença de improcedência que lhe era favorável no mérito, pois figurava como ré na causa originária. Nesse passo, inexistindo recurso contra a r. decisão interlocutória que aplicou a multa por ato atentatório à dignidade da justiça, a via do remédio heroico mostrou-se realmente como único meio cabível contra a decisão, tida por ilegal, proferida pela autoridade coatora. Incabível, inclusive, a ação rescisória, já que esta é direcionada, apenas, contra "decisão de mérito, transitada em julgado" (CPC/2015, art. 966). Passa-se, então, ao exame imediato do mérito da impetração, tendo em vista o rito sumário do mandado de segurança. Examina-se o direito líquido e certo da impetrante de não ser apenada de forma ilegal, com multa processual, como sustenta ter sido. A legalidade da aplicação da referida multa, em virtude do não comparecimento pessoal da ré à audiência de conciliação designada, decorreria de ser tal conduta reprovável a ponto de ser reputada como ato atentatório à dignidade da Justiça. A teor do art. 334, § 8º, do Código de Processo Civil de 2015, "O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado". Ocorre que o § 10 do mesmo dispositivo legal abre a possibilidade de a parte se fazer representar por meio da outorga de procuração com poderes específicos para negociar e transigir: "A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir." Daí por que a doutrina considera suficiente para afastar a penalidade a presença da parte ou do seu representante legal (que pode ou não ser o seu advogado). A propósito, confiram-se as seguintes lições doutrinárias apontadas na impetração: "A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir (art. 334, §10º, CPC). Observe que qualquer parte pode fazer isso: pessoa natural, pessoa jurídica, condomínio, espólio, etc. O uso do termo “representante” em vez de “preposto” (utilizado no art. 331, caput, do CPC/73) teve o nítido propósito de desvincular esta representação voluntária da atividade empresarial: qualquer sujeito de direito, empresário ou não empresário, tem o direito de fazer-se representar nesta audiência. (...). Constituído o representante com poder para negociar e transigir, a parte não precisa Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 9 de 5 Superior Tribunal de Justiça comparecer pessoalmente à audiência preliminar.” (DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao do direito processual civil, Parte geral e processo de conhecimento – 18ª Ed. – Salvador; Ed. JusPodivm, 2016, p. 635). “O § 8º do art. 334 do Novo CPC é um dos mais lamentáveis de todo o Novo Código de Processo Civil. Prevê que a ausência injustificada do autor ou do réu na audiência é ato atentatório à dignidade da justiça, passível de sanção processual representada por multa de até 2% do valor da causa ou da vantagem econômica pretendida, tendo como credor a União ou o Estado. A norma é mais um fruto do fanatismo que se instaurou entre alguns operadores do Direito em favor da conciliação e mediação como forma preferencial de solução de conflitos. Poder-se-á questionar: que sentido tem obrigar a presença das partes para uma audiência em que exclusivamente se tentará a conciliação ou a mediação? Seria uma sanção apenas porque a parte não pretende conciliar ou mediar? Não atenta contra o constitucional direito de ir e vir criar um dever de comparecimento a essa audiência, mesmo que seu objetivo não seja pretendido pela parte, que inclusive expressamente se manifesta nesse sentido? Por outro lado, o legislador não parece ter atentado para o fato de que a realização obrigatória dessa audiência, mesmo com parte que manifestamente não pretende a solução consensual, congestionará a pauta de audiências de maneira considerável, atrasando ainda mais o já lento procedimento. (...) Caso a parte não deseje comparecer pessoalmente à audiência, o § 10º do art. 334, do Novo CPC permite a constituição de um representante, por meio de procuração especifica, com poderes para negociar e transigir. Pode ser seu advogado um ou terceiro, e como na audiência não haverá outra atividade além da tentativa de solução consensual, não há qualquer impedimento para a outorga de poderes da parte para terceiro.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil – volume único – 9ª ed. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 652) “A presença das partes é dispensável, desde que compareça seu representante, munido de procuração específica, com poderes para negociar e transigir (art. 334§10º, CPC).” (Breves comentários ao novo código de processo civil/ coordenadores Teresa Arruda Alvim Wambier – 2ª ed. ver. e atual. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016) “O autor será intimado da designação na pessoa de seu procurador (art. 334, §3º), sendo certo que, na audiência, as partes devem estar acompanhadas de seus procuradores (art. 334, §9º). As partes, por sua vez, poderão constituir representante, por meio de procuração com poderes específicos, para negociar e transigir (art. 334, §10º), hipótese em que a sua própria presença será dispensada.” (BUENO, Cássio Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 10 de 5 Superior Tribunal de Justiça Scarpinella. Manual de direito processual civil: inteiramente estruturado à luz do novo CPC. Saraiva: 2015, p. 274) No caso dos autos, a autoridade coatora aplicou a multa por ato atentatório à dignidade da Justiça pelo não comparecimento pessoal da ré (impetrante) à audiência de conciliação, desconsiderando o fato de que se fazia representar por advogado com poderes específicos para transigir (fl. 16). Desse modo, ficando demonstrado que os procuradores da ré, munidos de procuração com poderes para transigir, estiveram presentes na audiência, tem-se como manifestamente ilegal a aplicação da multa por ato atentatório à dignidade da Justiça. De fato, a ausência de conciliação, por si só, também não autorizaria a aplicação da multa. Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado, afastando a possibilidade de aplicação da multa, quando a parte se faz presente por intermédio de advogados com poderes para transigir: "RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS. PENSÃO ALIMENTÍCIA. EX-CÔNJUGE. BINÔMIO NECESSIDADE E POSSIBILIDADE. ALTERAÇÃO. NÃO DEMONSTRAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. AÇÃO DE ALIMENTOS. PRAZOS PROCESSUAIS. SUSPENSÃO. RECESSO FORENSE. CONTESTAÇÃO. TEMPESTIVIDADE. ART. 215, INCISO II, DO CPC/2015. ART. 220, CAPUT, DO CPC/2015. AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. RÉU. NÃO COMPARECIMENTO. REPRESENTANTE LEGAL. ART. 334, § 8º, DO CPC/2015. MULTA. NÃO INCIDÊNCIA. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Tendo ambas as instâncias de cognição plena concluído, à luz da prova dos autos, pela ausência de evidências do aumento das despesas da autora ou do incremento da capacidade financeira do réu que autorizasse a majoração do valor da obrigação alimentar, inviável a inversão do julgado por força da Súmula nº 7/STJ. 3. A suspensão dos prazos processuais durante o recesso forense (20 de dezembro a 20 de janeiro), conforme previsto no artigo 220, caput, do Código de Processo Civil de 2015, compreende a ação de alimentos e os demais processos mencionados nos incisos I a III do artigo 215 do mesmo diploma legal. 4. O não comparecimento injustificado da parte ou de seu representante legal à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com a multa de que trata o artigo 334, § 8º, do Código de Processo Civil de 2015." (REsp 1.824.214/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/09/2019, DJe de 13/09/2019, g.n.) Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 11 de 5 Superior Tribunal de Justiça Colhe-se do voto do Relator, o eminente Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA: "Em seu apelo nobre, a recorrente reitera o pedido de condenação à multa prevista no artigo 334, § 8°, do Código de Processo Civil de 2015 em virtude do não comparecimento do réu à audiência de conciliação designada, o que representaria, no seu entendimento, conduta classificada como ato atentatório à dignidade da justiça. A teor do art. 334, § 8º, do Código de Processo Civil de 2015, 'O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado'. Ocorre que o § 10 do mesmo dispositivo legal abre a possibilidade de a parte se fazer representar por meio da outorga de procuração com poderes específicos para negociar e transigir: 'A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir'. Daí porque a doutrina considera suficiente para afastar a penalidade a presença da parte ou do seu representante legal (que pode ou não ser o seu advogado). A propósito, as seguintes lições doutrinárias: '(...) A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir (art. 334, §10, CPC). Observe que qualquer parte pode fazer isso: pessoa natural, pessoa jurídica, condomínio, espólio etc. O uso do termo 'representante' em vez de 'preposto' (utilizado no art. 331, caput, do CPC/1973) teve o nítido propósito de desvincular esta representação voluntária da atividade empresarial: qualquer sujeito de direito, empresário ou não empresário, tem o direito de fazer-se representar nesta audiência. É preciso que este representante voluntário tenha poderes para negociar e transigir. A sua atuação restringe-se à negociação e à assinatura do acordo, se for o caso; ele não postula, não alega nem depõe pela parte - até porque nem seria este o momento adequado. O acordo pode conter cláusulas processuais (art. 190, CPC). Qualquer pessoa capaz pode ser constituída como esse representante negocial. (...) (...) Constituído o representante com poder para negociar e transigir, a parte não precisa comparecer pessoalmente à audiência preliminar'. (DIDIER, Fredie. Curso de direito processual civil. 20. ed. Salvador: Jus Podivm, 2018, pág. 724 - grifou-se) Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 12 de 5 Superior Tribunal de Justiça '(...) Assim, conclui-se que, na audiência de conciliação, a parte deverá comparecer pessoalmente ou através de representante ou preposto, além de dever ser acompanhada de advogado ou de defensor público. O advogado poderá, contudo, acumular a função de representante da parte, desde que detenha poderes para transigir; o que não se admite é que apenas a parte ou seu representante compareça, desacompanhados de advogado. O não comparecimento da parte ou de seu representante (advogado ou não) ensejará a aplicação da sanção de que trata o art. 334, § 8º, e não impedirá o início da contagem do prazo contestacional. (...)'. (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, pág. 456 - grifou-se) '(...) Comparecimento das partes. No procedimento comum do CPC/2015, havendo interesse de uma das partes na autocomposição, autor e réu deverão comparecer à audiência, podendo constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir (art. 334, §10). Caso não compareçam nem apresentem justificativas, será caracterizado ato atentatório à dignidade da justiça, sancionado com multa em favor do Estado de até dois por cento sobre a repercussão econômica da demanda ou sobre o valor da causa (334, § 8º). A presença dos advogados representantes das partes é essencial à regularidade da audiência (art. 334, § 9º)'. (CABRAL, Antonio do Passo, CRAMER, Ronaldo (Coord). Rio de Janeiro: Forense, 2015, pág. 536 - grifou-se) No caso dos autos, o Tribunal de origem consignou, de forma categórica, que estiveram presentes na audiência os advogados do réu, munidos de procuração com poderes para transigir: '(...) Entretanto, escorreitas as razões adotadas pelo Juiz a quo na decisão de fls. 440/442, uma vez que conforme consignado na ata da audiência de conciliação (fl. 158) os advogados do réu, munidos com poderes para transigir, conforme procuração de fls. 159, estiveram presentes no ato, o que não trouxe embaraços ao trâmite processual. De fato a ausência à audiência de conciliação, por si só, não autoriza a aplicação da multa, sendo assim, incabível a incidência desta' (e-STJ fl. 631). Nesse contexto, não há reparos a fazer no acórdão recorrido que considerou incabível a aplicação da penalidade no caso concreto." Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 13 de 5 Superior Tribunal de Justiça (grifou-se) Ante o exposto, dou provimento ao agravo interno para dar provimento ao Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, a fim de conceder a segurança para cassar o ato coator, consistente na decisão proferida pela autoridade coatora, que, de forma ilegal, aplicou a multa do art. 334, § 8º, do CPC/2015, reconhecendo-se como inexigível a multa questionada. É como voto. Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 14 de 5 Superior Tribunal de Justiça CERTIDÃO DE JULGAMENTO QUARTA TURMA AgInt no Número Registro: 2018/0012678-5 PROCESSO ELETRÔNICO RMS 56.422 / MS Números Origem: 0801411-38.2016.8.12.0046 14086851120178120000 1408685112017812000050001 8014113820168120046 PAUTA: 01/06/2021 JULGADO: 01/06/2021 Relator Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro MARCO BUZZI Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. MARCELO ANTÔNIO MUSCOGLIATI Secretária Dra. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI AUTUAÇÃO RECORRENTE : AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA ADVOGADOS : FLÁVIO LUIZ YARSHELL - SP088098 GUSTAVO PACÍFICO - SP184101 DANIEL LUIZ YARSHELL - SP373772 RECORRIDO : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL PROCURADORES : ITANEIDE CABRAL RAMOS - MS005055 SULEIMAR SOUSA SCHRODER ROSA - MS007548 LEONARDO CAMPOS SOARES DA FONSECA - MS019859 ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Corretagem AGRAVO INTERNO AGRAVANTE : AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA ADVOGADOS : FLÁVIO LUIZ YARSHELL - SP088098 GUSTAVO PACÍFICO - SP184101 DANIEL LUIZ YARSHELL - SP373772 AGRAVADO : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL ADVOGADOS : ITANEIDE CABRAL RAMOS - MS005055 SULEIMAR SOUSA SCHRODER ROSA - MS007548 CERTIDÃO Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: Adiado o julgamento por indicação do Sr. Ministro Relator. Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 15 de 5 Superior Tribunal de Justiça CERTIDÃO DE JULGAMENTO QUARTA TURMA AgInt no Número Registro: 2018/0012678-5 PROCESSO ELETRÔNICO RMS 56.422 / MS Números Origem: 0801411-38.2016.8.12.0046 14086851120178120000 1408685112017812000050001 8014113820168120046 PAUTA: 01/06/2021 JULGADO: 08/06/2021 Relator Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro MARCO BUZZI Subprocuradora-Geral da República Exma. Sra. Dra. SOLANGE MENDES DE SOUZA Secretária Dra. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI AUTUAÇÃO RECORRENTE : AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA ADVOGADOS : FLÁVIO LUIZ YARSHELL - SP088098 GUSTAVO PACÍFICO - SP184101 DANIEL LUIZ YARSHELL - SP373772 RECORRIDO : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL PROCURADORES : ITANEIDE CABRAL RAMOS - MS005055 SULEIMAR SOUSA SCHRODER ROSA - MS007548 LEONARDO CAMPOS SOARES DA FONSECA - MS019859 ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Corretagem AGRAVO INTERNO AGRAVANTE : AGROFERREIRA PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA ADVOGADOS : FLÁVIO LUIZ YARSHELL - SP088098 GUSTAVO PACÍFICO - SP184101 DANIEL LUIZ YARSHELL - SP373772 AGRAVADO : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL ADVOGADOS : ITANEIDE CABRAL RAMOS - MS005055 SULEIMAR SOUSA SCHRODER ROSA - MS007548 CERTIDÃO Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo interno para dar provimento ao recurso ordinário em mandado de segurança, concedendo-se a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Documento: 2063945 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 16/06/2021 Página 16 de 5 Superior Tribunal de Justiça A Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti e os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi (Presidente) e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator