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9 de maio de 2021

LIBERDADE NEGOCIAL CONDICIONADA AOS FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS. CPC/2015. NEGÓCIO JURÍDICO PROCESSUAL. FLEXIBILIZAÇÃO DO RITO PROCEDIMENTAL. REQUISITOS E LIMITES. IMPOSSIBILIDADE DE DISPOSIÇÃO SOBRE AS FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELO JUIZ

RECURSO ESPECIAL Nº 1.810.444 - SP (2018/0337644-0) 

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. LIBERDADE NEGOCIAL CONDICIONADA AOS FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS. CPC/2015. NEGÓCIO JURÍDICO PROCESSUAL. FLEXIBILIZAÇÃO DO RITO PROCEDIMENTAL. REQUISITOS E LIMITES. IMPOSSIBILIDADE DE DISPOSIÇÃO SOBRE AS FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELO JUIZ. 

1. A liberdade negocial deriva do princípio constitucional da liberdade individual e da livre iniciativa, fundamento da República, e, como toda garantia constitucional, estará sempre condicionada ao respeito à dignidade humana e sujeita às limitações impostas pelo Estado Democrático de Direito, estruturado para assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais e a Justiça. 

2. O CPC/2015 formalizou a adoção da teoria dos negócios jurídicos processuais, conferindo flexibilização procedimental ao processo, com vistas à promoção efetiva do direito material discutido. Apesar de essencialmente constituído pelo autorregramento das vontades particulares, o negócio jurídico processual atua no exercício do múnus público da jurisdição. 

3. São requisitos do negócio jurídico processual: a) versar a causa sobre direitos que admitam autocomposição; b) serem partes plenamente capazes; c) limitar-se aos ônus, poderes, faculdades e deveres processuais das partes; d) tratar de situação jurídica individualizada e concreta. 

4. O negócio jurídico processual não se sujeita a um juízo de conveniência pelo juiz, que fará apenas a verificação de sua legalidade, pronunciando-se nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou ainda quando alguma parte se encontrar em manifesta situação de vulnerabilidade. 

5. A modificação do procedimento convencionada entre as partes por meio do negócio jurídico sujeita-se a limites, dentre os quais ressai o requisito negativo de não dispor sobre a situação jurídica do magistrado. As funções desempenhadas pelo juiz no processo são inerentes ao exercício da jurisdição e à garantia do devido processo legal, sendo vedado às partes sobre elas dispor. 

6. Recurso especial não provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Marco Buzzi. Sustentou oralmente o Dr. PÉRSIO THOMAZ FERREIRA ROSA, pela parte RECORRENTE: BELARINA ALIMENTOS S/A. 

Brasília (DF), 23 de fevereiro de 2021(Data do Julgamento)

1 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: adaptação procedimental - Oliveira, Pedro Miranda de; Bonemer, Bruno Angeli. A (in)eficácia do negócio processual de irrecorribilidade de sentença. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 55-74. São Paulo: Ed. RT, maio 2021.

 É assim, porque o procedimento, no direito processual eminentemente publicístico como o que se materializava no CPC/1973, atendia, sobretudo, a interesses públicos. Não fora instituído, como regra, para favorecer ou para beneficiar as partes, tampouco para contemplar a comodidade de alguma delas. O interesse envolvido na criação de procedimentos, especialmente de cunho sumário ou especial, parecia atender a um reclamo estatal em extrair da função jurisdicional, do trabalho jurisdicional mesmo, um rendimento maior. Portanto, o procedimento não era objeto possível de convenção das partes, de transigência ou de renúncia delas, mesmo que ambas e também o juiz estejam completamente concordes quanto a isso. Daí o procedimento ser exclusivamente regrado pela lei. Este era o modelo seguido pelo CPC/1973.

Portanto, não havia até então, no Brasil, uma possibilidade mais ampla de autorregulação do procedimento como se verifica em outros sistemas jurídicos. Era possível ao litigante optar por determinados procedimentos quando a ordem jurídica assim o permitisse, mas não se admitia expressamente uma livre disciplina, de natureza convencional, sobre como a causa deve ser processada. Daí por que reputamos bem-vinda e oportuna a introdução, no sistema brasileiro, da permissão legislativa expressa para celebração de acordos de procedimento, autorizando que as partes, em certa medida, regulem a forma de exercício de seus direitos e deveres processuais e até possam dispor, em certas situações, sobre os ônus que contra si recaiam. Os acordos de procedimento vão ao encontro da ideia de favorecer e prestigiar, sempre quando possível, as soluções de controvérsias obtidas diretamente pelos próprios litigantes negociadamente.

Com efeito, o modelo inserido pelo CPC/2015 permite que as partes possam dispor sobre o procedimento, havendo uma subordinação do processo à vontade dos litigantes. Além disso, enaltece o princípio da isonomia, pois coloca as partes em pé de igualdade, cabendo ao juiz o papel de fiscalizador das regras do jogo.


Oliveira, Pedro Miranda de; Bonemer, Bruno Angeli. A (in)eficácia do negócio processual de irrecorribilidade de sentença. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 55-74. São Paulo: Ed. RT, maio 2021.