RECURSO ESPECIAL Nº 1.835.778 - PR (2018/0264494-0)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE NEGATIVA DE
PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. QUESTÕES DEVIDAMENTE APRECIADAS PELO TRIBUNAL
DE ORIGEM. REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO NOME DO EXECUTADO EM CADASTROS
DE INADIMPLENTES, NOS TERMOS DO ART. 782, § 3º, DO CPC/2015. DESNECESSIDADE
DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NORMA QUE DEVE SER INTERPRETADA
DE FORMA A GARANTIR AMPLA EFICÁCIA À EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL
EXECUTIVA. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO EM
PARTE.
1. A controvérsia posta no presente recurso especial consiste em saber, além da adequação
da tutela jurisdicional prestada, se o requerimento de inclusão do nome do executado em
cadastros de inadimplentes, nos termos do que dispõe o art. 782, § 3º, do Código de
Processo Civil de 2015, depende da comprovação de prévia recusa administrativa das
entidades mantenedoras do respectivo cadastro.
2. Da leitura do acórdão recorrido, verifica-se que a Corte local apreciou expressamente a
questão relacionada à norma do art. 139, inciso IV, do CPC/2015, não havendo que se falar
em negativa de prestação jurisdicional.
3. O ordenamento jurídico brasileiro deve tutelar não apenas o reconhecimento do direito
postulado pela parte perante o Poder Judiciário, mas, também, a efetivação desse direito.
Trata-se do princípio da efetividade, corolário do devido processo legal, o qual foi alçado
pelo Código de Processo Civil de 2015 como norma fundamental, ao estabelecer em seus
arts. 4º e 6º o direito à obtenção da atividade satisfativa.
4. Nessa linha, foram implementados no novo CPC diversas medidas executivas visando
garantir a efetividade da tutela jurisdicional prestada, permitindo-se ao Magistrado, ainda, a
aplicação de medidas atípicas, a fim de coagir indiretamente o executado a satisfazer a
obrigação, em conformidade com o teor do art. 139, inciso IV, do CPC/2015.
5. Em relação às medidas executivas típicas, uma das novidades trazidas pelo novo diploma
processual civil é a possibilidade de inclusão do nome do devedor nos cadastros de
inadimplentes, a qual encontra previsão expressa no art. 782, § 3º, do CPC de 2015.
6. Tal norma deve ser interpretada de forma a garantir maior amplitude possível à
concretização da tutela executiva, em conformidade com o princípio da efetividade do
processo, não se mostrando razoável que o Poder Judiciário imponha restrição ao
implemento dessa medida, condicionando-a à prévia recusa administrativa das entidades
mantenedoras do respectivo cadastro, em manifesto descompasso com o propósito
defendido pelo CPC/2015, especialmente em casos como o presente, em que as tentativas
de satisfação do crédito foram todas frustradas.
7. Considerando que o único fundamento utilizado pelas instâncias ordinárias foi a
necessidade de requerimento administrativo prévio pelo exequente, não havendo, portanto,
qualquer análise acerca das circunstâncias do caso concreto para se verificar a necessidade
e a potencialidade de a negativação coagir o devedor à satisfação da obrigação, impõe-se o
retorno dos autos para que o pedido seja novamente analisado.
8. Recurso especial parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar parcial
provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi, Paulo de Tarso
Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 04 de fevereiro de 2020 (data do julgamento).
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:
Cuida-se, na origem, de agravo de instrumento interposto por Finanza
Fomento Mercantil Ltda. contra a decisão do Juízo de primeiro grau que, na ação de
locupletamento em fase de cumprimento de sentença, indeferiu o pedido de inscrição do
nome da executada no cadastro de inadimplentes, sob o fundamento de que tal medida é
de iniciativa exclusiva do credor.
A Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná negou
provimento ao agravo, em acórdão assim ementado:
CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO
NOME DO EXECUTADO EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. ART.
782. § 3º, DO NCPC. ACIONAMENTO DO APARATO JUDICIÁRIO QUE
SOMENTE SE JUSTIFICA SE COMPROVADA A RECUSA DAS
ENTIDADES MANTENEDORAS DO CADASTRO À AVERBAÇÃO DA
DÍVIDA. DECISÃO CORRETA. AGRAVO DE INSTRUMENTO
DESPROVIDO.
Os embargos de declaração opostos ao referido decisum foram rejeitados.
No recurso especial, a Finanza Fomento Mercantil Ltda. afirma que o
acórdão recorrido violou os arts. 489, § 1º, inciso V, e 1.022, ambos do Código de
Processo Civil de 2015, pois deixou de enfrentar todas as questões suscitadas no agravo
de instrumento interposto, caracterizando, assim, negativa de prestação jurisdicional.
Quanto à questão de fundo, aponta violação dos arts. 139, inciso IV, e 782, §
3º, do CPC/2015, argumentando, em síntese, que, "na sistemática do novo CPC, o juiz
tem o poder/dever de buscar, por todos os meios e medidas disponíveis e possíveis,
assegurar a obtenção do resultado pretendido pelo processo. No presente caso, o
processo já se desenrola a mais de 9 anos, sem ter a parte Recorrente obtido qualquer
êxito em receber seu crédito já reconhecido em sentença judicial. Resta sobremaneira
óbvio e claro, portanto, que sua pretensão, de inserção da parte Recorrida/Executada nos
cadastros de inadimplentes, é legítima e razoável, e busca tão somente dar publicidade a uma situação de fato, qual seja, a inadimplência da parte Recorrida/Executada" (e-STJ, fl.
62).
Reforça, ainda, que "a lei processual não traz qualquer condicionante à
concessão da inscrição ora pretendida", razão pela qual "a alegação do Tribunal de origem
no sentido de que deve a parte buscar a inscrição administrativamente antes de solicitá-la
ao juízo não procede em absoluto" (e-STJ, fl. 63).
Busca, assim, o provimento do recurso especial para que seja reformado o
acórdão recorrido, deferindo-se "o pedido de inscrição da parte Recorrida/Executada junto
aos cadastros de inadimplentes/órgãos de proteção ao crédito, na forma pretendida pela
parte Recorrente", ou, caso se entenda pela ausência de prequestionamento, que seja
reconhecida a negativa de prestação jurisdicional por parte do Tribunal de origem,
determinando-se a devolução dos autos para a reapreciação dos embargos de declaração
opostos, a fim de que haja manifestação expressa sobre os dispositivos apontados pela
Recorrente.
A recorrida não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR):
A controvérsia posta no presente recurso especial consiste em saber, além
da adequação da tutela jurisdicional prestada, se o requerimento de inclusão do nome do
executado em cadastros de inadimplentes, nos termos do que dispõe o art. 782, § 3º, do
Código de Processo Civil de 2015, depende da comprovação de prévia recusa
administrativa das entidades mantenedoras do respectivo cadastro.
1. Delimitação fática.
Consta dos autos que a Finanza Fomento Mercantil Ltda. ajuizou ação de
locupletamento ilícito em desfavor de Ana Paula dos Anjos Samesima Bim, buscando o
recebimento de valores constantes em cheques prescritos.
A ação foi julgada parcialmente procedente.
Na fase de cumprimento de sentença, considerando o transcurso de tempo
significativo sem qualquer êxito em localizar bens ou valores da executada suficientes para
saldar o débito, a exequente Finanza pleiteou ao Juízo, dentre outras providências, a
expedição de ofícios aos órgãos de proteção ao crédito, para o fim de incluir o nome da
executada nos cadastros de inadimplentes.
O Juízo de primeiro grau, contudo, indeferiu o pedido, sob o fundamento de
que a negativação do nome da executada é de iniciativa do próprio credor, não se exigindo
a participação do Poder Judiciário (e-STJ, fl. 26).
Em agravo de instrumento interposto pela exequente, o Tribunal de Justiça
do Paraná manteve a referida decisão, aduzindo, para tanto, o seguinte (e-STJ, fl. 42):
(...), embora o art. 782, § 3º, do NCPC preveja a possibilidade de
o juiz determinar, a requerimento da parte, a inclusão do nome
do executado em cadastros de inadimplentes, entendo que o
acionamento do aparato judiciário somente se justifica se o
credor não conseguir obter administrativamente a averbação
da existência da ação nos referidos cadastros. De fato, estando o credor/exequente de posse de título judicial
(sentença condenatória) e demais documentos comprobatórios da
inadimplência, não se afigura necessária, a princípio, a expedição de
ofício do juízo requerendo a anotação da dívida, bastando que ele
apresente às instituições mantenedoras de tais cadastros os
documentos da dívida para a sua anotação.
Somente na hipótese de recusa comprovada da averbação é que se
justifica a intervenção judicial, conforme precedentes do TJPR
mencionados no recurso, o que, no entanto, não é o caso dos autos.
Feita essa breve síntese do caso, passo à análise das razões recursais.
2. Da violação aos arts. 489, § 1º, inciso V, e 1.022 do CPC/2015 - omissão do acórdão recorrido em relação à análise da incidência do art. 139, inciso
IV, do CPC/2015.
A recorrente sustenta que houve negativa de prestação jurisdicional por parte
do Tribunal de origem no julgamento do agravo de instrumento interposto, pois não se
manifestou expressamente sobre a incidência, na hipótese, do art. 139, inciso IV, do
CPC/2015, "pelo qual cabe ao juiz 'determinar todas as medidas indutivas, coercitivas,
mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem
judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária'" (e-STJ, fl. 59).
O argumento, contudo, não procede.
Isso porque, do que se depreende do acórdão que julgou os embargos de
declaração opostos na origem, verifica-se que a Corte local apreciou expressamente a
questão alegada sobre o referido dispositivo legal - art. 139, IV, do CPC/2015.
Confira-se, a propósito, trecho do referido acórdão:
Não era necessário o enfrentamento do art. 139, IV, do NCPC, pois
este Colegiado entendeu que a averbação da existência do débito
discutido judicialmente nos cadastros de inadimplentes é providência
administrativa que independe da atuação do juiz, salvo se o exequente
comprovar a recusa das instituições mantenedoras de tais cadastros,
o que ainda não aconteceu no caso dos autos.
Ora, certo ou errado, a questão foi apreciada pelo Tribunal de origem, não
havendo, portanto, a apontada negativa de prestação jurisdicional, razão pela qual
afasta-se a violação aos arts. 489, § 1º, V, e 1.022 do Código de Processo Civil de 2015.
3. Da violação aos arts. 139, inciso IV, e 782, § 3º, do CPC/2015 - possibilidade de inserção do nome da executada nos cadastros de inadimplentes, a
requerimento da exequente, independentemente de prévia recusa administrativa.
O ordenamento jurídico brasileiro deve tutelar não apenas o reconhecimento
do direito postulado pela parte perante o Poder Judiciário, mas, também, a efetivação
desse direito.
Trata-se do princípio da efetividade, corolário do devido processo legal, o
qual foi alçado pelo CPC de 2015 como norma fundamental do processo civil, ao
estabelecer em seus arts. 4º e 6º o direito à obtenção da atividade satisfativa.
Confiram-se, a propósito, o teor dos referidos dispositivos legais:
Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução
integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.
Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
Sobre o assunto, lecionam Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha,
Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira:
1. PRINCÍPIOS DA EXECUÇÃO
1.1. Princípio da efetividade. Direito fundamental à tutela executiva.
O devido processo legal, cláusula geral processual constitucional, tem
como um de seus corolários o princípio da efetividade: os direitos
devem ser efetivados, não apenas reconhecidos. Processo devido é
processo efetivo. O princípio da efetividade garante o direito
fundamental à tutela executiva, que consiste 'na exigência de um
sistema completo de tutela executiva, no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a
qualquer direito merecedor de tutela executiva'.
O art. 4º do CPC, embora em nível infraconstitucional, reforça esse
princípio como norma fundamental do processo civil brasileiro, ao
incluir o direito à atividade satisfativa, que é o direito à execução (...).
(Curso de Direito Processual Civil: execução. 7 ed. Salvador: Ed.
JusPodivm, 2017, p.65)
Nessa linha, foram implementados no novo Código de Processo Civil
diversos mecanismos visando garantir a efetividade da tutela jurisdicional, dentre os quais
podemos citar, como exemplos, a possibilidade de protesto da decisão judicial transitada
em julgado depois de transcorrido o prazo para pagamento voluntário, nos termos do art.
517 do CPC/2015, bem como a constituição da hipoteca judiciária (CPC/2015, art. 495),
dentre outros.
Além disso, estabeleceu-se a permissão para a adoção de medidas
executórias atípicas, a fim de coagir indiretamente o executado a satisfazer a obrigação,
dando maior efetividade ao processo civil, possibilitando, por exemplo, a restrição de
alguns direitos, como a retenção de passaporte e/ou da carteira nacional de habilitação - CNH.
A possibilidade de utilização de medidas atípicas é extraída de diversas
disposições do CPC/2015, sendo a principal delas o art. 139, inciso IV, que assim
estabelece:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste
Código, incumbindo-lhe:
(...)
IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais
ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação
pecuniária;
Uma das medidas executivas típicas, objeto do presente recurso especial, é
a possibilidade de inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, a qual
encontra previsão expressa no art. 782, § 3º, do Código de Processo Civil de 2015, que
assim dispõe:
Art. 782. Não dispondo a lei de modo diverso, o juiz determinará os
atos executivos, e o oficial de justiça os cumprirá.
(...)
§ 3º A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão
do nome do executado em cadastros de inadimplentes.
§ 4º A inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento, se for garantida a execução ou se a execução for extinta
por qualquer outro motivo.
§ 5º O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título
judicial.
Do que se extrai da referida norma, verifica-se que a negativação do nome
pela via judicial somente será possível por requerimento da parte, nunca de ofício.
Tal medida se mostra extremamente importante na concretização do
princípio da efetividade do processo, pois acarreta significativa limitação ao crédito do
devedor, em razão da negativação de seu nome, sendo um instrumento eficaz para
assegurar a satisfação da obrigação.
Ao discorrer sobre o tema, Fernando da Fonseca Gajardoni assim leciona:
O autorizativo legal do art. 782, § 3º, do CPC/2015 - muito mal
posicionado no Código, diga-se de passagem (não tem relação
alguma com competência na execução) -, vem na esteira deste ideário
de admitir que obrigações de todas as naturezas sejam cumpridas por
medida de coerção/indução (e não necessariamente de adjudicação).
4.2. Ao autorizar que o juiz possa determinar, a qualquer momento ou
grau de jurisdição, a inclusão do nome do executado em cadastro de
inadimplentes - inclusive no cumprimento de sentença (art. 782, § 5º,
do CPC/2015) -, atua-se indiretamente sobre a vontade do devedor,
aumentando as desvantagens do não cumprimento da obrigação
positivada no título. Afinal, em uma sociedade de consumo globalizada
como a que vivemos, o apontamento no cadastro de maus pagadores
(art. 44 do CDC) representa enorme limitador do crédito,
consequentemente forçando o devedor a buscar a baixa de
negativação a fim de recuperá-lo. 4.3. A negativação pela via judicial
só se faz a requerimento da parte, nunca de ofício.
(Execução e Recursos: comentários ao CPC de 2015. 1 ed. São
Paulo: Método, 2017, p. 62)
Vale ressaltar que a medida prevista no art. 782, § 3º, do CPC/2015 não
impõe ao Juiz o dever de determinar a negativação do nome do devedor, pois se trata de
mera faculdade - em razão do uso da forma verbal "pode" -, e não de uma obrigação legal,
devendo ser analisadas as particularidades do caso concreto.
Assim, nos termos da doutrina acima destacada, "diante do requerimento
apresentado, o juiz faz um juízo de viabilidade da execução ou da fase em que ela se encontra, bem como da necessidade e do potencial que a medida requerida (a
negativação) tem para coagir o devedor ao cumprimento da obrigação. Decisão
fundamentada contra a qual cabe agravo de instrumento, na forma do art. 1.015, parágrafo
único, do CPC/2015" (GAJARDONI, ob cit., p. 63).
Ocorre que, conquanto o magistrado não esteja obrigado a deferir a medida
executiva prevista no referido dispositivo, não se revela legítimo o fundamento adotado
pelas instâncias ordinárias no caso ora em julgamento, no sentido de que "o acionamento
do aparato judiciário somente se justifica se o credor não conseguir obter
administrativamente a averbação da existência da ação nos referidos cadastros" (e-STJ, fl.
42).
Ora, além de o Tribunal de origem ter criado um requisito não previsto em lei
para a adoção da medida executiva de negativação do nome do devedor, tal entendimento
está na contramão de toda a sistemática trazida com o novo Código de Processo Civil, em
que se busca a máxima efetividade da tutela jurisdicional prestada, conforme já destacado.
Com efeito, em decorrência do princípio da efetividade do processo, a norma
do art. 782, § 3º, do CPC/2015, que possibilita a inscrição do nome do devedor nos
cadastros de inadimplentes, deve ser interpretada de forma a garantir maior amplitude
possível à concretização da tutela executiva, não sendo razoável que o Poder Judiciário
imponha restrição ao implemento dessa medida sem qualquer fundamento plausível e em
manifesto descompasso com o propósito defendido pelo novo CPC, especialmente em
casos como o presente, em que as tentativas de satisfação do crédito foram todas
frustradas.
Não se olvida que nada impede que o credor requeira extrajudicialmente a
inclusão do nome do devedor em cadastros de inadimplentes. Todavia, também não há
qualquer óbice para que esse requerimento seja feito diretamente pela via judicial, no bojo
da execução, como possibilita expressamente o art. 782, § 3º, do CPC/2015.
Aliás, o Conselho Nacional de Justiça - CNJ implementou o sistema
"SerasaJud", mediante termo de cooperação técnica firmado com o Serasa, justamente
com o intuito de facilitar a tramitação de ofícios expedidos pelo Poder Judiciário com
ordens de inscrição de nomes no respectivo cadastro de inadimplentes, facilitando, assim,
a operacionalização do disposto no art. 782, §§ 3º a 5º, do CPC/2015.
A propósito, esta Terceira Turma, em caso bastante semelhante ao
presente, em que se discutia a possibilidade do exequente requerer diretamente ao Juízo a
busca de informações sobre eventuais veículos pertencentes ao executado, por meio do
sistema RENAJUD, entendeu que tal medida não dependia do prévio exaurimento das vias
extrajudiciais. O acórdão recebeu a seguinte ementa:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA. SISTEMA RENAJUD. CONSULTA. POSSIBILIDADE.
EXAURIMENTO DE DILIGÊNCIAS PARA BUSCA DE BENS DO
EXECUTADO. DESNECESSIDADE.
1. Cinge-se a controvérsia a definir se é dado ao exequente
solicitar ao Juízo a busca - pelo sistema RENAJUD - de
informação acerca da existência de veículos de propriedade do
executado, independentemente da comprovação do
esgotamento das vias extrajudiciais para tal finalidade.
2. O RENAJUD é um sistema on-line de restrição judicial de veículos
criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que interliga o
Judiciário ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e permite
consultas e envio, em tempo real, à base de dados do Registro
Nacional de Veículos Automotores (Renavam) de ordens judiciais de
restrições de veículos, inclusive registro de penhora.
3. Considerando-se que i) a execução é movida no interesse do
credor, a teor do disposto no artigo 612 do Código de Processo
Civil; ii) o sistema RENAJUD é ferramenta idônea para
simplificar e agilizar a busca de bens aptos a satisfazer os
créditos executados e iii) a utilização do sistema informatizado
permite a maior celeridade do processo (prática de atos com
menor dispêndio de tempo e de recursos) e contribui para a
efetividade da tutela jurisdicional, é lícito ao exequente
requerer ao Juízo que promova a consulta via RENAJUD a
respeito da possível existência de veículos em nome do
executado, independentemente do exaurimento de vias
extrajudiciais.
4. Recurso especial provido.
(REsp n. 1.347.222/RS, Terceira Turma, Relator o Ministro Ricardo
Villas Bôas Cueva, DJe de 2/9/2015 - sem grifo no original)
Em conclusão, embora o magistrado não esteja obrigado a deferir o pedido
de inclusão do nome do executado no cadastro de inadimplentes, visto que a norma do art.
782, § 3º, do CPC/2015 não trata de uma imposição legal, mas mera faculdade atribuída
ao juiz da causa, não se revela idôneo condicionar a referida medida à prévia recusa
administrativa das entidades mantenedoras do respectivo cadastro, tal como entendido
pelas instâncias ordinárias.
Considerando que esse foi o único fundamento utilizado para se indeferir o pedido, não havendo, portanto, qualquer análise acerca das circunstâncias do caso
concreto para se verificar a necessidade e a potencialidade de a negativação coagir o
devedor à satisfação da obrigação, impõe-se o retorno dos autos para que o pedido seja
novamente analisado.
Por essas razões, dou parcial provimento ao recurso especial para,
reformando o acórdão recorrido, determinar que o Juízo a quo analise novamente o pedido
de inclusão do nome da executada em cadastro de inadimplentes, independentemente de
prévio requerimento administrativo pela exequente.
É o voto.