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16 de fevereiro de 2022

Se o débito está garantido apenas parcialmente, não há óbice à determinação judicial de inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes, nos termos do art. 782, § 3º, do CPC

 CADASTRO DE INADIMPLENTES

STJ. 3ª Turma. REsp 1953667-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 07/12/2021 (Info 721)

Se o débito está garantido apenas parcialmente, não há óbice à determinação judicial de inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes, nos termos do art. 782, § 3º, do CPC

inclusão do nome do devedor em cadastro de inadimplentes

Art. 782, § 3º, CPC: “A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes”

Sistema SerasaJud

art. 782, § 4º, CPC/2015: “a inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento, se for garantida a execução ou se a execução for extinta por qualquer outro motivo”

na interpretação das normas que regem a execução, deve-se extrair a maior efetividade possível ao procedimento executório

princípio da efetividade da execução: propiciar pronta e integral satisfação crédito exequendo

princípio da menor onerosidade da execução (art. 805, CPC); jurisprudência do STJ é no sentido de que a menor onerosidade da execução não se sobrepõe à sua efetividade

sopesando os direitos fundamentais em conflito - de um lado o direito fundamental do credor à tutela executiva e, de outro, os direitos de personalidade do executado -, deve prevalecer o direito do credor à integral satisfação da obrigação

se o débito for garantido apenas parcialmente, não há óbice à determinação judicial de inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes, mediante prévio requerimento do exequente

9 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Efetividade da jurisdição - Fredie Didier

 1. PRINCÍPIOS DA EXECUÇÃO 1.1. Princípio da efetividade. Direito fundamental à tutela executiva. O devido processo legal, cláusula geral processual constitucional, tem como um de seus corolários o princípio da efetividade: os direitos devem ser efetivados, não apenas reconhecidos. Processo devido é processo efetivo. O princípio da efetividade garante o direito fundamental à tutela executiva, que consiste 'na exigência de um sistema completo de tutela executiva, no qual existam meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva'. O art. 4º do CPC, embora em nível infraconstitucional, reforça esse princípio como norma fundamental do processo civil brasileiro, ao incluir o direito à atividade satisfativa, que é o direito à execução (...). 


DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: execução. 7 ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p.65

8 de maio de 2021

AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO NOME DA DEVEDORA EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. ART. 782, § 3º, DO CPC/2015. TRIBUNAL DE ORIGEM QUE INDEFERE O PLEITO EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DE HIPOSSUFICIÊNCIA DAS PARTES REQUERENTES. IMPOSSIBILIDADE. NORMA QUE DEVE SER INTERPRETADA DE FORMA A GARANTIR AMPLA EFICÁCIA À EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL EXECUTIVA.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.887.712 - DF (2020/0196624-2) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

 DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO NOME DA DEVEDORA EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. ART. 782, § 3º, DO CPC/2015. TRIBUNAL DE ORIGEM QUE INDEFERE O PLEITO EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DE HIPOSSUFICIÊNCIA DAS PARTES REQUERENTES. IMPOSSIBILIDADE. NORMA QUE DEVE SER INTERPRETADA DE FORMA A GARANTIR AMPLA EFICÁCIA À EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL EXECUTIVA. 

1. Ação de execução de título executivo extrajudicial, tendo em vista o inadimplemento de débitos locatícios. 

2. Ação ajuizada em 18/01/2017. Recurso especial concluso ao gabinete em 08/09/2020. Julgamento: CPC/2015. 

3. O propósito recursal é definir se o requerimento da inclusão do nome da executada em cadastros de inadimplentes (art. 782, § 3º, do CPC/2015) pode ser indeferido sob o fundamento de que as exequentes possuem meios técnicos e a expertise necessária para promover, por si mesmas, a inscrição direta junto aos órgãos de proteção ao crédito. 

4. Dispõe o art. 782, § 3º, do CPC/2015 que, a requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes. 

5. O dispositivo legal que autoriza a inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes exige, necessariamente, o requerimento da parte, não podendo o juízo promovê-lo de ofício. Ademais, depreende-se da redação do referido dispositivo legal que, havendo o requerimento, não há a obrigação legal de o Juiz determinar a negativação do nome do devedor, tratando-se de mera discricionariedade. A medida, então, deverá ser analisada casuisticamente, de acordo com as particularidades do caso concreto. 

6. Não cabe, contudo, ao julgador criar restrições que a própria lei não criou, limitando o seu alcance, por exemplo, à comprovação da hipossuficiência da parte. Tal atitude vai de encontro ao próprio espírito da efetividade da tutela jurisdicional, norteador de todo o sistema processual. 

7. Na espécie, o indeferimento do pleito pelo Tribunal de origem deu-se unicamente com base no fundamento de que as recorrentes possuem meios técnicos e expertise necessária para, por si mesmas, promover a inscrição do nome do devedor nos cadastros de dados de devedores inadimplentes, não tendo sido tecida quaisquer considerações acerca da necessidade e da potencialidade do deferimento da medida ser útil ao fim pretendido, isto é, à satisfação da obrigação – o que justificaria a discricionariedade na aplicação do art. 782, § 3º, do CPC/2015. 

8. Assim, impõe-se o retorno dos autos à origem para que seja analisada, na hipótese concreta dos autos, a necessidade de se deferir a inclusão do nome da devedora nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito, independentemente das condições econômicas das exequentes para, por si próprias, promoverem tal inscrição. 

9. É possível ao julgador, contudo, ao determinar a inclusão do nome do devedor nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito, nos termos do art. 782, § 3º, do CPC/2015, que atribua ao mesmo - desde que observada a condição econômica daquele que o requer - a responsabilidade pelo pagamento das custas relativas à referida inscrição. 

10. Recurso especial conhecido e provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 27 de outubro de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI: Cuida-se de recurso especial interposto por PAULO OCTÁVIO INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA e FUNDAÇÃO DOS ECONOMIÁRIOS FEDERAIS FUNCEF, fundamentado exclusivamente na alínea “a” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo TJDFT. 

Recurso especial interposto em: 28/04/2020. Concluso ao Gabinete em: 08/09/2020. 

Ação: de execução de título executivo extrajudicial, ajuizada pelas recorrentes, em desfavor de MONTEIRO & MIRANDELA COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA, tendo em vista o inadimplemento de débitos locatícios (e-STJ fls. 20-23). 

Decisão interlocutória: indeferiu o pedido de inclusão do nome da executada em cadastros de inadimplentes, seja via expedição de ofícios ao SPC/SERASA/SCPC, seja via sistema SERASA JUD (e-STJ fls. 182-184). 

Acórdão: negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelas recorrentes, nos termos da seguinte ementa: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. REGISTRO DE RESTRIÇÃO DE CRÉDITO DO NOME DO DEVEDOR. MEDIDA AO ALCANCE DO CREDOR. NECESSÁRIA. PESSOA JURÍDICA DOTADA DE ESTRUTURA ECONÔMICA E JURÍDICA. DESNECESSÁRIA INTERVENÇÃO JUDICIAL. 1. A inscrição do nome do executado nos órgãos de proteção de crédito, mediante determinação judicial, consoante redação do art. 782, § 3º, do CPC – salvo na hipótese de parte hipossuficiente – é mecanismo que se encontra à disposição do credor sem a necessária intervenção judicial e, por não se tratar de medida impositiva, esta somente se evidencia quando demonstrada a impossibilidade de o próprio credor promovê-la. 2. A possibilidade legal do magistrado determinar a inclusão do nome do devedor no cadastro de inadimplentes deve passar pelo crivo da pertinência e necessidade do pedido, segundo as circunstâncias do caso concreto. 3. Ao juiz incumbe determinar todas as medidas que forem indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, conforme previsão legal. Entretanto deve agir no intuito de manter a igualdade de condições entre as partes, pois as demandas judiciais constituem ferramentas jurídicas indispensáveis à pacificação dos conflitos intersubjetivos e, portanto, essenciais para concretização dos direitos fundamentais proclamados na Constituição. 4. Tratando-se de mera faculdade conferida ao juiz, em virtude do poder discricionário que lhe é dado pela lei, exige-se da parte interessada que demonstre não dispor de meios para obter o mesmo efeito do provimento, agindo pelas suas próprias e legítimas forças. 5. Recurso conhecido e desprovido (e-STJ fl. 204). 

Recurso especial: alegam violação dos arts. 139, IV, e 782, § 3º, do CPC/2015. Insurgem-se contra a decisão proferida pelo TJDFT, que entendeu que a medida de inscrição do nome da parte executada no cadastro de inadimplentes não poderia ser deferida judicialmente, uma vez que as exequentes teriam meios técnicos e expertise necessária para, elas próprias, promoverem a inscrição direta do nome da devedora junto aos cadastros de proteção ao crédito. Sustentam que: 

i) incumbe ao Poder Judiciário promover a razoável duração do processo em consonância com o princípio da cooperação processual, devendo impor medidas necessárias para a solução satisfativa do débito; 

ii) a anotação do nome do devedor em cadastro de inadimplentes constitui medida pleiteada comumente quando frustradas as tentativas de busca por bens passíveis de penhora da parte executada, configurando meio colocado à disposição da parte para o fim de agilizar a satisfação dos créditos exequendos; 

iii) a utilização do sistema SERASA JUD, em que o pedido de inclusão do nome do devedor nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito é feito pelo próprio juízo, visa à rápida prestação jurisdicional, e pode ser utilizada sem qualquer ônus, até mesmo porque a lei autoriza o emprego de medidas coercitivas atípicas para assegurar o cumprimento da ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária; e 

iv) o fato da parte credora não demonstrar a impossibilidade de inscrever o nome do executado nos cadastros de inadimplentes não pode ser justificativa para a negativa judicial do pleito, pois é medida que pode ser operacionalizada mediante emissão de ofício pela secretaria do juízo de origem ao órgão de proteção ao crédito (e-STJ fls. 213-223). 

Prévio juízo de admissibilidade: o TJDFT admitiu o recurso especial interposto por PAULO OCTÁVIO INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA e FUNDAÇÃO DOS ECONOMIÁRIOS FEDERAIS FUNCEF, determinando a remessa dos autos a esta Corte Superior (e-STJ fls. 248-249). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (RELATOR): O propósito recursal é definir se o requerimento da inclusão do nome da executada em cadastros de inadimplentes (art. 782, § 3º, do CPC/2015) pode ser indeferido sob o fundamento de que as exequentes possuem meios técnicos e a expertise necessária para promover, por si mesmas, a inscrição direta junto aos órgãos de proteção ao crédito. 

Aplicação do Código de Processo Civil de 2015 – Enunciado Administrativo n. 3/STJ. 

1. DO INDEFERIMENTO DO REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO NOME DA EXECUTADA EM CADASTROS DE INADIMPLENTES (arts. 139, IV, e 782, § 3º, do CPC/2015) 

1. Consta dos autos que a executada (ora recorrida) foi citada por edital e não efetuou o pagamento da dívida devida no prazo legal, motivo pelo qual as recorrentes requereram diversas diligências no sentido de localizar bens passíveis de penhora. 

2. Entretanto, todas as pesquisas realizadas restaram infrutíferas, de forma que as recorrentes pugnaram pela inclusão do nome da executada nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito, nos termos do art. 782, § 3º, do CPC/2015. 

3. Em 1º grau, o pleito foi indeferido sob o argumento de que “o disposto no art. 782, § 3º, do CPC, além de ser faculdade jurisdicional, é comando genérico que necessita de delimitação quanto à sua abrangência, notadamente porque transfere ao Poder Judiciário incumbência que é da própria parte e fixa obrigação a que a serventia do juízo realize acompanhamento para retirada imediata quando houver pagamento (art. 782, § 4º, do CPC), sendo que os recursos humanos disponíveis no cartório são limitados para tal finalidade” (e-STJ fl. 182). 

4. O TJDFT, por sua vez, manteve o indeferimento do pleito, aos fundamentos de que: i) a inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes, após requerimento da parte, é mera discricionariedade do juízo; ii) a medida visa a conferir aos hipossuficientes o pleno acesso à tutela jurisdicional pretendida; e iii) referida faculdade deve ter lugar quando a parte interessada na medida restritiva não dispuser de meios para, mediante esforço próprio, alcançar pretendido fim, não tendo razão de ser quando o exequente possui meios próprios para, por si mesmo, promover a inscrição do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes. A propósito, transcreve-se trechos do acórdão combatido: 

Conforme o disposto no art. 782, § 3º do CPC, o juiz determinará os atos executivos e o oficial de justiça os cumprirá quando não houver disposição de lei de modo diverso, podendo o juiz, a requerimento da parte, determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes. Por certo que o legislador ao estabelecer que o juiz poderá determinar a inclusão do nome do devedor no cadastro de inadimplentes, deixou claro tratar-se de ato adstrito à sua discricionariedade, observadas as hipóteses do caso concreto. De fato, caberá ao juiz a análise da necessidade da parte em obter essa prestação, uma vez que tais atos visam auxiliar às partes desprovidas de recursos técnicos e materiais mais avantajados, assim prestigiando aos hipossuficientes o pleno acesso à tutela jurisdicional pretendida. Note-se que tal medida não é impositiva e pressupõe, antes de mais nada, a manifesta necessidade de intervenção judicial para sua efetivação. No entanto, tratando-se as partes interessadas de notórias organizações empresarial ou previdenciária revestidas de meios próprios, evidenciados pela estrutura econômica e jurídica de que dispõem, não se apresentam como partes incapazes de obter o efeito do provimento desejado que está ao seu alcance por seu legítimo esforço. Dessa forma, não assiste ao exequente o direito subjetivo processual objeto da postulação recursal, de modo que assim a função jurisdicional mantenha-se restrita à sua vocação institucional de compor conflitos intersubjetivos, atuando fora desses limites somente quando houver razões de ordem principiológica, como quando se faça necessário agir para o cumprimento de diretrizes político-constitucionais voltada a assegurar aos hipossuficientes o pleno acesso ao serviço jurisdicional monopolizado do Estado. Por outras palavras, a faculdade de agir que a lei processual confere ao juiz em hipóteses tais somente se exerce quando a parte interessada na medida restritiva não dispuser de meios para, mediante esforço próprio, alcançar o mesmo fim. E mesmo assim os agravantes não demonstraram que não podem, pelos seus próprios meios, promover a inscrição almejada. Afinal, a atividade jurisdicional não se reduz a tarefas administrativas comuns a agentes despachantes, se não houver razões especiais para desviar-se de sua competência institucional maior. Na hipótese dos autos os exequentes certamente possuem meios técnicos e expertise necessária para, por si mesmos, promover a inscrição do nome do devedor em cadastros de dados de devedores inadimplentes (e-STJ fl. 206). 

5. Com efeito, o CPC/2015 prevê um rol variado de medidas executivas típicas e, em evidente inovação, prevê a possibilidade de serem empregadas, também, medidas executivas atípicas para se obter a satisfação da obrigação, não delineadas previamente no diploma legal. 

6. Tais medidas visam a garantir maior celeridade e efetividade ao processo, uma vez que incumbe ao juiz “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”. 

7. Com isso, o legislador optou por abandonar o princípio até então vigente (ao menos para as hipóteses envolvendo obrigação de pagar quantia), da tipicidade das formas executivas, conferindo maior elasticidade ao desenvolvimento do processo satisfativo, de acordo com as circunstâncias de cada caso e com as exigências necessárias à tutela do direto material. 

8. Dispõe o art. 782, § 3º, do CPC/2015 que, a requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes. 

9. Tal medida – também uma inovação trazida pelo CPC/2015 – é salutar, pois tende a inibir a inadimplência venal que usa do trâmite judicial para procrastinar a satisfação da obrigação (NERY JUNIOR, Nelson. Código de processo civil comentado. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2016, p. 1.749). 

10. De fato, o apontamento do nome do devedor nos cadastros de maus pagadores representa inegável limitação de crédito, de maneira que a medida pode atuar de forma positiva no cumprimento, por parte daquele, da obrigação inadimplida, afinal, a inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento ou se for garantida a execução (art. 782, § 4º, do CPC/2015). 

11. Por este motivo é que se elucida que na execução indireta (medidas atípicas), as medidas executivas não possuem força para satisfazer a obrigação inadimplida, atuando tão somente sobre a vontade do devedor (REsp 1.788.950/MT, 3ª Turma, DJe 26/04/2019). 

12. Salienta-se que o dispositivo legal que autoriza a inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes exige, necessariamente, o requerimento da parte, não podendo o juízo promovê-lo de ofício. 

13. Por oportuno, mister destacar, também, que o art. 782, § 3º, do CPC/2015 não impõe ao Juiz o dever de determinar a negativação do nome do devedor, tratando-se de mera discricionariedade - a induzir tal conclusão está o fato de que a redação do dispositivo legal faz uso da expressão verbal “pode”. 

14. A medida, então, deverá ser analisada casuisticamente, de acordo com as particularidades do caso concreto. 

15. Ocorre que, a despeito de não haver obrigação legal de o Juiz determinar a inclusão do nome do devedor nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito, não cabe ao mesmo criar restrições que a própria lei não criou, limitando o seu alcance, por exemplo, à comprovação da hipossuficiência da parte. Afinal, tal atitude vai de encontro ao próprio espírito da efetividade, norteador de todo o sistema processual. 

16. Não se descura, tampouco, de que, nos termos do art. 6º do CPC/2015, todos os sujeitos do processo – aí incluindo-se o julgador – devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. 

17. Vale lembrar que esta 3ª Turma, recentemente, analisou a questão sob a ótica da necessidade de se haver um prévio requerimento extrajudicial da parte antes do pleito judicial fundado no art. 782, § 3º, do CPC/2015. Em conclusão, entendeu-se que não há qualquer óbice para que o requerimento seja feito diretamente pela via judicial, no bojo da execução, sem a necessidade de ter havido prévio requerimento extrajudicial. 

18. Em seu voto, o Min. Relator bem elucidou que: 

Ocorre que, conquanto o magistrado não esteja obrigado a deferir a medida executiva prevista no referido dispositivo, não se revela legítimo o fundamento adotado pelas instâncias ordinárias no caso ora em julgamento, no sentido de que "o acionamento do aparato judiciário somente se justifica se o credor não conseguir obter administrativamente a averbação da existência da ação nos referidos cadastros" (e-STJ, fl. 42). Ora, além de o Tribunal de origem ter criado um requisito não previsto em lei para a adoção da medida executiva de negativação do nome do devedor, tal entendimento está na contramão de toda a sistemática trazida com o novo Código de Processo Civil, em que se busca a máxima efetividade da tutela jurisdicional prestada, conforme já destacado. Com efeito, em decorrência do princípio da efetividade do processo, a norma do art. 782, § 3º, do CPC/2015, que possibilita a inscrição do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, deve ser interpretada de forma a garantir maior amplitude possível à concretização da tutela executiva, não sendo razoável que o Poder Judiciário imponha restrição ao implemento dessa medida sem qualquer fundamento plausível e em manifesto descompasso com o propósito defendido pelo novo CPC, especialmente em casos como o presente, em que as tentativas de satisfação do crédito foram todas frustradas. Não se olvida que nada impede que o credor requeira extrajudicialmente a inclusão do nome do devedor em cadastros de inadimplentes. Todavia, também não há qualquer óbice para que esse requerimento seja feito diretamente pela via judicial, no bojo da execução, como possibilita expressamente o art. 782, § 3º, do CPC/2015 (REsp 1.835.778/PR, 3ª Turma, DJe 06/02/2020) (grifos acrescentados). 

19. Importante salientar que o indeferimento do pleito pelo TJDFT deu-se unicamente com base no fundamento de que as recorrentes possuem meios técnicos e expertise necessária para, por si mesmas, promover a inscrição do nome do devedor nos cadastros de dados de devedores inadimplentes, não tendo sido tecida quaisquer considerações acerca da necessidade e da potencialidade do deferimento da medida ser útil ao fim pretendido, isto é, à satisfação da obrigação – o que justificaria a discricionariedade na aplicação do art. 782, § 3º, do CPC/2015. 

20. Por estas razões, impõe-se o retorno dos autos à origem para que seja analisada, na hipótese concreta dos autos, a necessidade de se deferir a inclusão do nome da devedora nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito, independentemente das condições econômicas das exequentes para, por si próprias, promoverem tal inscrição. 

21. Frisa-se que é possível ao julgador, ao determinar a inclusão do nome do devedor nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito, nos termos do art. 782, § 3º, do CPC/2015, que atribua ao mesmo - desde que observada a condição econômica daquele que o requer - a responsabilidade pelo pagamento das custas relativas à referida inscrição. 

Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial interposto por PAULO OCTÁVIO INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA e FUNDAÇÃO DOS ECONOMIÁRIOS FEDERAIS FUNCEF e DOU-LHE PROVIMENTO, para reformar o acórdão recorrido, determinando que o TJDFT analise novamente o pedido das exequentes, independentemente de seu porte financeiro ou condições técnicas de promoverem extrajudicialmente a inclusão do nome da devedora nos cadastros de inadimplentes. 

Dado o provimento do recurso especial, não há que se falar na majoração dos honorários recursais estabelecida pelo art. 85, § 11, do CPC/2015. 

4 de maio de 2021

AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA PROFERIDA EM AÇÃO INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE. FALECIMENTO DO PRETENSO GENITOR BIOLÓGICO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. LEGITIMIDADE PASSIVA NA AÇÃO RESCISÓRIA DOS HERDEIROS DO FALECIDO E NÃO DO ESPÓLIO

RECURSO ESPECIAL Nº 1.667.576 - PR (2017/0077797-4) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA PROFERIDA EM AÇÃO INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE. FALECIMENTO DO PRETENSO GENITOR BIOLÓGICO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. LEGITIMIDADE PASSIVA NA AÇÃO RESCISÓRIA DOS HERDEIROS DO FALECIDO E NÃO DO ESPÓLIO. AÇÃO DE ESTADO E DE NATUREZA PESSOAL. EMENDA À PETIÇÃO INICIAL PARA MODIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO, SEM ALTERAÇÃO DO PEDIDO OU DA CAUSA DE PEDIR, APÓS A CONTESTAÇÃO DO RÉU. ADMISSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA EFETIVIDADE DO PROCESSO, ECONOMIA PROCESSUAL E INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. OBRIGATORIEDADE DE A ALTERAÇÃO SE REALIZAR ANTES DO ESCOAMENTO DO BIÊNIO DA AÇÃO RESCISÓRIA, SOB PENA DE DECADÊNCIA. 

1- Ação proposta em 07/02/2014. Recursos especiais interpostos em 01/10/2015 e atribuídos à Relatora em 18/07/2017. 

2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deve ser ajuizada em face do espólio ou em face dos herdeiros; (ii) se é admissível a determinação judicial de emenda à petição inicial para correção do polo passivo após a contestação do réu na ação rescisória e após o escoamento do biênio para ajuizamento da ação rescisória. 

3- Por se tratar de ação de estado e de natureza pessoal, a ação de investigação de paternidade em que o pretenso genitor biológico é pré-morto deve ser ajuizada somente em face dos herdeiros do falecido e não de seu espólio, sendo irrelevante o fato de se tratar de rediscussão da matéria no âmbito de ação rescisória, para a qual igualmente são legitimados passivos os sucessores do pretenso genitor biológico, na medida em que são eles as pessoas aptas a suportar as pretensões rescindente e rescisória deduzidas pelos supostos filhos. 

4- Em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, é admissível a emenda à petição inicial para modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação do réu. Precedentes. 

5- No âmbito da ação rescisória, a admissibilidade de modificações no polo passivo, seja para inclusão de litisconsortes passivos necessários, seja para a substituição de parte ilegítima, deve ser realizada, obrigatoriamente, até o escoamento do prazo bienal para o ajuizamento da ação rescisória, sob pena de se operar a decadência. 

6- Recurso especial de GILMAR M conhecido e desprovido; recurso especial do espólio de JOÃO G conhecido e provido, para reconhecer a decadência do direito de rescindir a coisa julgada e julgar improcedente a ação rescisória. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial de GILMAR M e dar provimento ao recurso especial de JOÃO G, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Dr(a). TIAGO BECKERT ISFER, pela parte RECORRIDA: G M. 

Brasília (DF), 10 de setembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recursos especiais interpostos por GILMAR M, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, e por espólio de JOÃO G, também com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, ambos em face de acórdãos do TJ/PR que, por unanimidade, negaram provimento aos agravos internos por eles interpostos. 

Recursos especiais interpostos e m: 01/10/2015. Atribuídos ao gabinete e m: 26/03/2018. 

Ação: rescisória ajuizada por GILMAR M em face de espólio de JOÃO G, visando rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade por elas ajuizada, que julgou improcedente o pedido e que transitou em julgado em 08/02/2012. 

Decisão unipessoal: determinou a emenda da petição inicial da ação rescisória, a fim de que o espólio fosse substituído pelos herdeiros de JOÃO G. 

Acórdão: por unanimidade, negou-se provimento aos agravos internos interpostos pelos recorrentes, nos termos das seguintes ementas: 

AGRAVOS REGIMENTAIS. EMENDA À INICIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. INVESTIGADO FALECIDO. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS HERDEIROS. A ação rescisória que visa desconstituir sentença proferida em ação de investigação de paternidade, cujo réu é falecido, recai sobre os herdeiros, posto que a providência pretendida nesses autos tem o poder de implicar em alterações na esfera jurídica daqueles. (...) AGRAVOS REGIMENTAIS. EMENDA À INICIAL. POSSIBILIDADE. ECONOMIA PROCESSUAL E INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. ART. 284 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Embora a regra não seja a da emenda à petição inicial após a citação, a regularização processual pode ocorrer em casos específicos, em homenagem aos princípios da economia processual e da instrumentalidade, combinados com o art. 284 do Código de Processo Civil. 

Recurso especial de GILMAR M: alega-se violação aos arts. 12, V, e 472, ambos do CPC/73, ao fundamento de que a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deveria ser ajuizada em face do espólio ou, quando muito, em litisconsórcio passivo necessário entre espólio e herdeiros, razão pela qual deve ser reformada a decisão judicial que determinou fosse emendada a petição inicial (fls. 1.509/1.525, e-STJ). 

Recurso especial do espólio de JOÃO G: alega-se violação aos arts. 264, 267, VI, e 495, todos do CPC/73, ao fundamento de que seria inadmissível a ordem judicial de emenda à inicial, quer seja porque já teria havido contestação do réu e, consequentemente, estabilização subjetiva da lide, quer seja porque a emenda somente ocorreu após o escoamento do biênio da ação rescisória, tendo se operado a decadência (fls. 1.306/1.324, e-STJ). 

Ministério Público Federal: opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso especial de GILMAR M; e pelo conhecimento e provimento do recurso especial do espólio de JOÃO G (fls. 1.723/1.730, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deve ser ajuizada em face do espólio ou em face dos herdeiros; (ii) se é admissível a determinação judicial de emenda à petição inicial para correção do polo passivo após a contestação do réu na ação rescisória e após o escoamento do biênio para ajuizamento da ação rescisória. 

1. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO POR GILMAR M. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 12, V, E 472, AMBOS DO CPC/73. 

O recorrente GILMAR M sustenta inicialmente que seria correto o ajuizamento da ação rescisória em face do espólio de JOÃO G, na medida em que a ação investigatória de paternidade cuja sentença se pretende rescindir teria sido ajuizada exclusivamente em face dele enquanto vivo, de modo que não poderia haver a posterior substituição processual pelos herdeiros. 

Sustenta o recorrente ainda, em caráter subsidiário, que, se se entender pela legitimação passiva dos herdeiros, a hipótese seria de litisconsórcio passivo necessário desses com o espólio. 

Em se tratando especificamente de ação investigatória de paternidade, leciona Flávio Tartuce: 

Em regra, a ação será proposta contra o suposto pai ou suposta mãe, diante do seu caráter pessoal. Falecido este ou esta, a ação será proposta contra os herdeiros da pessoa investigada, não contra o espólio, justamente diante deste caráter pessoal. Lembre-se de que o espólio não tem personalidade jurídica, o que afasta a possibilidade de propositura da demanda contra este. (TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol. 5: direito de família. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 501). 

A questão é explorada mais profundamente por Rolf Madaleno: 

A legitimação passiva na ação de filiação é do ascendente investigado, no caso a suposta mãe, em sendo investigada a maternidade, ou o pai, no caminho oposto. Se o investigado já é falecido, serão réus os respectivos herdeiros, a serem individual e pessoalmente citados, tendo em vista ser uma ação de estado, não podendo ser representados pelo inventariante, acaso ainda tramitando o processo de inventário do investigado sucedido, mesmo se a pretensão judicial inserir pedido cumulativo e relativo ao quinhão hereditário do investigante. Isso porque a ação é de investigação de filiação, e visa ao reconhecimento da perfilhação. É uma ação declaratória de estado da pessoa e não guardar qualquer correlação com o resultado econômico oriundo da procedência da investigatória, e também implicará um resultado econômico se o extinto declarado genitor tiver deixado bens para inventariar e não estiver prescrita a ação de petição de herança. (MADALENO, Rolf. Direito de família. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 624/625). 

A jurisprudência desta Corte, de igual modo, fixou-se no sentido de que a ação de investigação de paternidade deve ser ajuizada em face dos herdeiros e não do espólio do falecido. 

Nesse sentido, confiram-se: REsp 5.280/RJ, 3ª Turma, DJ 11/11/1991; REsp 120.622/RS, 3ª Turma, DJ 25/02/1998; REsp 331.842/AL, 3ª Turma, DJ 10/06/2002. Nesse contexto, o fato de a sentença que se pretende rescindir ter sido proferida em ação investigatória de paternidade em que somente JOÃO G figurou como parte, o que sustentaria a tese recursal de que, após o seu falecimento, a ação rescisória deveria ser ajuizada em face do espólio, e não dos seus herdeiros, não modifica em absolutamente nada o entendimento acima mencionado. 

Com efeito, embora o CPC/73 não trate da legitimidade passiva para a ação rescisória (e, anote-se, que o CPC/15 também não examine esse tema), é correto afirmar que a regra do art. 487, I, do CPC revogado (idêntico ao art. 967, I, do novo CPC), que disciplina a legitimidade ativa e que informe que poderá propor a referida ação “quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular” deve se aplicar, por lógica, coerência e simetria, também à adequada configuração da legitimação passiva da ação rescisória. 

Por essa razão, o falecimento da parte após o trânsito em julgado da sentença a ser rescindida implica em sucessão processual não apenas no polo ativo, mas também no polo passivo. 

Tratando especificamente dessa matéria, leciona José Carlos Barbosa Moreira: 

Merece consideração especial a hipótese de sucessão intercorrente, quanto a alguma pessoa que, por haver sido parte no outro feito, devesse ser citada para a rescisória. Na sucessão causa mortis e na sucessão a título universal entre pessoas jurídicas (por exemplo: fusão ou incorporação de sociedades), não há dúvida de que a legitimação passiva se transfere aos sucessores. (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil – Vol. 5 – Arts. 476 a 565. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 174/175).

Como se sabe, a legitimidade passiva decorre de uma relação lógica e abstrata entre quem pede, o que se pede e contra quem se pede, devendo figurar no polo passivo a pessoa indicada pelo autor que possa ser compelida e reúna condições de satisfazer o pedido inicial. 

Tendo em mira essa premissa, conclui-se que, evidentemente, o espólio não é parte legítima para responder à ação rescisória em que se pleiteie a rescisão de sentença e o rejulgamento de ação investigatória de paternidade post mortem, seja como legitimado exclusivo, seja como litisconsorte passivo necessário, na medida em que, nessa ação, nada será pedido contra o espólio, que tão somente é um ente despersonalizado apto a titularizar a universalidade jurídica denominada herança até que se efetive a partilha dos bens. 

Sublinhe-se que as eventuais repercussões econômicas ou patrimoniais derivadas do reconhecimento, ou não, da filiação que se pretende alcançar por intermédio da ação investigatória de paternidade é que poderão, hipoteticamente, ser objeto de pretensões autônomas que serão deduzidas contra o espólio, como já se consignou em precedentes desta Corte em relação à petição de herança (AgRg no Ag 580.197/SP, 4ª Turma, DJe 04/05/2009) e à execução de dívidas do de cujus (REsp 1.559.791/PB, 3ª Turma, DJe 31/08/2018). 

Por tais razões, não há que se falar em violação aos arts. 12, V, e 472, ambos do CPC/73, motivo pelo qual o recurso especial interposto por GILMAR M deve ser desprovido. 

2. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELO ESPÓLIO DE JOÃO G. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 264, 267, VI, E 495, TODOS DO CPC/73. 

A primeira tese apresentada no recurso especial do espólio de JOÃO G é de que a consequência jurídica do reconhecimento de sua ilegitimidade passiva para responder a ação rescisória seria o indeferimento da petição inicial e, consequentemente, a extinção do processo sem resolução de mérito (art. 267, VI, combinado com art. 295, II, ambos do CPC/73), não havendo que se cogitar a possibilidade de emenda à petição inicial após a citação do recorrente (violação ao art. 264 do CPC/73). 

Não se pode olvidar, evidentemente, que há antigo precedente desta Corte que consignou que a ilegitimidade não pode ser concebida “como simples erro na petição inicial, passível de correção”, motivo pelo qual “iniciado o processo sob uma titularidade, a alteração no polo ativo, por meio de emenda, corresponderia a uma substituição processual, mormente quando é determinada após a citação, hipótese expressamente vedada, salvo exceções não presentes no caso, a teor do artigo 264 do Código de Processo Civil”. (REsp 758.622/RJ, 3ª Turma, DJ 10/10/2005). 

Ocorre que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, evoluiu no sentido de que é admissível a emenda à petição inicial para modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação. Nesse sentido: AgRg no REsp 1.362.921/MG, 2ª Turma, DJe 01/07/2013; AgInt no AREsp 921.282/PR, 4ª Turma, DJe 27/02/2018. 

Existe, inclusive, precedente específico da 3ª Turma desta Corte: 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU INCLUSÃO DE PARTE NO POLO PASSIVO DA AÇÃO APÓS A CITAÇÃO DO RÉU. INTERDITO PROIBITÓRIO. AUSÊNCIA DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 535 DO CPC. EMENDA DA INICIAL APÓS CITAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS E DA ECONOMIA PROCESSUAL. PECULIARIDADES DO CASO QUE JUSTIFICAM A RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO. INEXISTÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR OU PEDIDO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Não há violação do disposto no art 535 do CPC quando o aresto recorrido adota fundamentação suficiente para dirimir a controvérsia, sendo desnecessária a manifestação expressa sobre todos os argumentos apresentados. 2. Observados os princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, é possível a relativização das regras previstas no art. 264 do CPC para se admitir a emenda da inicial após a citação do réu desde que isso não acarrete alteração da causa de pedir ou do pedido. Precedentes. 3. Recurso especial não provido. (REsp 1.473.280/ES, 3ª Turma, DJe 14/12/2015. 

Por tais motivos, conclui-se que o acórdão recorrido não violou os arts. 264 e 267, VI, ambos do CPC/73, razão pela qual o recurso especial do espólio de JOÃO G não merece ser provido sob esse fundamento. 

É preciso examinar, contudo, a segunda tese deduzida no recurso especial do espólio de JOÃO G, segundo a qual teria havido violação ao art. 495 do CPC/73, na medida em que o recorrido GILMAR M teria decaído do direito de rescindir a sentença proferida na ação investigatória de paternidade em virtude de não ter havido a substituição do polo passivo antes do término do prazo bienal. 

A esse respeito, destaque-se desde logo precedente da Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça: 

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO RESCISÓRIA. PROPOSITURA APENAS EM FACE DE PARTE DOS INTEGRANTES DA RELAÇÃO ORIGINÁRIA. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. CORREÇÃO. DECADÊNCIA. 1. Nas ações rescisórias integrais devem participar, em litisconsórcio unitário, todos os que foram partes no processo cuja sentença é objeto de rescisão. 2. A propositura de ação rescisória sem a presença, no polo passivo, de litisconsorte necessário somente comporta correção até o prazo de dois anos disciplinado pelo art. 495 do CPC. Após essa data, a falta de citação do litisconsorte implica a decadência do direito de pleitear a rescisão, conduzindo à extinção do processo sem resolução do mérito. 3. Embargos de divergência conhecidos e providos. (EREsp 676.159/MT, Corte Especial, DJe 30/03/2011). 

Conquanto o precedente acima mencionado verse sobre complementação de polo passivo e a hipótese examinada neste recurso especial envolva substituição do polo passivo, colhe-se da ratio decidendi os fundamentos determinantes que justificam a aplicação da mesma solução jurídica já consolidada nesta Corte. 

Com efeito, o precedente se funda na existência de “falha do próprio autor da ação rescisória”, que “gerou graves inconvenientes”, como a surpresa causada a quem havia sido beneficiado pela coisa julgada e que repentinamente se encontra, muitos anos após, sob ameaça de rescisão e de ruptura da estabilidade e da segurança dela originada, motivo pelo qual a formação da relação jurídico-processual deve sempre observar o prazo decadencial bienal do art. 495 do CPC/73. 

Essas mesmas circunstâncias fáticas também se encontram, concreta ou potencialmente, presentes na hipótese em exame, na medida em que os herdeiros, somente agora, seriam surpreendidos e teriam ciência de nova ação ajuizada pelos pretensos filhos do de cujus, em que se visa rescindir coisa julgada formada em Fevereiro de 2012. 

Anote-se, ademais, que embora a inventariante do espólio de JOÃO G igualmente seja herdeira, há mais quatro herdeiros que eventualmente podem não ter ciência da presente ação rescisória, de modo que o elemento surpresa acima mencionado se fará presente em relação a eles. 

Além disso, registre-se que, ao tempo da propositura da ação rescisória, não existia sequer dúvida objetiva ou razoável acerca da legitimação do polo passivo na ação investigatória de paternidade, pois o primeiro julgado desta Corte que apontou a legitimação dos herdeiros, e não do espólio, está datado de 1991. 

Assim, a despeito de ser possível a modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação, com a substituição do réu pelo correto legitimado, essa alteração deverá ser realizada, obrigatoriamente, até o escoamento do prazo bienal decadencial da ação rescisória. 

Na hipótese, a sentença proferida na ação ajuizada pelo recorrente GILMAR M em face de JOÃO G e que julgou improcedente o pedido de reconhecimento da paternidade transitou em julgado em 08/02/2012 e a ação rescisória contra o espólio de JOÃO G foi ajuizada em 23/01/2014. 

Contudo, somente em 21/11/2014 houve a modificação do polo passivo para a substituição do espólio pelos herdeiros de JOÃO G, conforme se depreende da petição de fls. 1.301/1.303 (e-STJ), razão pela qual se operou a decadência na forma do art. 495 do CPC/73 que, pela fundamentação acima expendida, foi violado pelo acórdão recorrido. 

3. CONCLUSÃO. 

Forte nessas razões, CONHEÇO e NEGO PROVIMENTO ao recurso especial de GILMAR M; e CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso especial do espólio de JOÃO G, a fim de reconhecer a decadência do direito de rescindir a coisa julgada que se formou na ação investigatória de paternidade com base no art. 495 do CPC/73 e, consequentemente, julgar improcedente a ação rescisória com base no art. 269, IV, do CPC/73. 

1 de maio de 2021

Efetividade da jurisdição - Lopes, João Batista . Processo civil brasileiro: um modelo esgotado. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 17-24. São Paulo: Ed. RT, maio 2021.

 A preocupação com nosso modelo processual é antiga, remontando a Lobão, que, há dois séculos, já se insurgia contra a ordinarização do processo e as dilações indevidas.

Sem embargo das tentativas de reforma que se sucederam no tempo, o fato é que nosso modelo processual continua burocrático, cartorial e cerimonial.

Não se compreende que, na era da mídia digital, da inteligência artificial e da robótica, ele continue marcado pelo anacronismo, pela prolixidade e pelo apego a fórmulas sacramentais.

Posto que não tenham faltado a colaboração e o empenho de estudiosos no sentido do aprimoramento da prestação jurisdicional, verifica-se que o problema é mais complexo: não se cuida de alterações pontuais, mas de atender à necessidade de um modelo inteiramente novo, inspirado na simplicidade, informalidade e aderência às necessidades do dia a dia forense.

Para tanto, partindo-se da proposta de um processo justo alvitrada por Comoglio, a que se acrescentam novas garantias introduzidas na Constituição (razoável duração, publicidade das decisões e proibição das provas ilícitas) merecem estudo, entre outras, as seguintes propostas: a) a introdução de protocolos prévios à propositura da ação; b) o rigor na observância da tentativa de conciliação; c) a consagração do dever de transparência e lealdade no que respeita à produção de provas; d) a punição severa aos abusos dos “clientes habituais da Justiça” e ao descumprimento de ordens judiciais; e) concessão de maior poder aos órgãos de proteção ao consumidor para que se reduza a judicialização de questões de telefonia, taxas bancárias, compras pela internet; f) o fortalecimento das escolas da magistratura etc.


Lopes, João Batista . Processo civil brasileiro: um modelo esgotado. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 17-24. São Paulo: Ed. RT, maio 2021.

Efetividade da jurisdição - Lopes, João Batista . Processo civil brasileiro: um modelo esgotado. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 17-24. São Paulo: Ed. RT, maio 2021.

 A verdade é que múltiplas são as causas da morosidade processual e numerosas as tentativas para enfrentá-la. Quando das discussões sobre a reforma do CPC, houve divulgação de centenas de projetos de lei e numerosos estudos que, com o tempo, ficaram em segundo plano. Esse cenário reflete o inconformismo da comunidade jurídica com o modelo vigente, anacrônico, burocrático e cartorial.

Com efeito, não se compreende que, na era digital, as partes tenham o poder de deduzir suas pretensões em número ilimitado de páginas, com longa transcrição de lições doutrinárias e acórdãos de nossos tribunais, muitas vezes impertinentes e em linguagem incorreta. É necessário refletir sobre a conveniência de introdução de protocolos prévios à propositura da ação, a exemplo do que ocorre no direito inglês, para troca de informações pelas partes, o que pode contribuir para a composição extrajudicial do conflito.

Também não se pode aceitar que as partes escondam provas para, posteriormente, surpreender o adversário. Por igual, o acesso à justiça e o direito de demandar não podem ser ilimitados, devendo a lei punir severamente a litigância de má-fé e prever penalidades maiores para o abuso no direito de recorrer. Ampla defesa não significa defesa ilimitada, mas defesa adequada e pertinente, sem abusos. Outro ponto a ser discutido é o fortalecimento dos órgãos de proteção ao consumidor, para que se reduza a judicialização em questões de telefonia, compras pela internet, cobrança abusiva de taxas por bancos etc. Além disso, deve-se discutir sobre a necessidade de punição severa para o descumprimento de decisões judiciais.

Propõe-se que todos esses pontos sejam objeto de nossos currículos acadêmicos e de pautas de instituições representativas da magistratura, Ministério Público e advocacia, para amplo debate, a fim de se verificar a necessidade de introdução de um novo modelo para o processo civil brasileiro.

Lopes, João Batista . Processo civil brasileiro: um modelo esgotado. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 17-24. São Paulo: Ed. RT, maio 2021.

Efetividade da Jurisdição - Lopes, João Batista . Processo civil brasileiro: um modelo esgotado. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 17-24. São Paulo: Ed. RT, maio 2021.

 A concepção de processo como instrumento técnico destinado a fazer atuar a vontade da lei para “resolver os conflitos de interesses” se mostrou insuficiente para atender, integralmente, aos anseios da sociedade, razão por que os processualistas se empenham em pôr em relevo sua predominante função social.

A preocupação com a efetividade do processo tem sido uma constante, mas não há consenso a respeito do conteúdo dessa expressão. Como adverte Marcacini, para se conceituar efetividade é mister saber o que se espera obter do processo, ou seja, quais os fins por ele colimados.4 Para uns, é simplesmente a solução de conflitos; para outros, preservar a segurança das relações jurídicas; também se deve considerar que o processo deve garantir o respeito aos valores consagrados na Constituição; por igual, é significativo o número dos que defendem a tese de que o processo deve realizar o ideal de justiça, a equidade.

De qualquer modo, a preocupação com a efetividade deve estar presente em todas as tentativas de reforma da legislação processual.


Lopes, João Batista . Processo civil brasileiro: um modelo esgotado. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 17-24. São Paulo: Ed. RT, maio 2021.

26 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: Princípio da efetividade na execução - Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha, Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira

 1. PRINCÍPIOS DA EXECUÇÃO 

1.1. Princípio da efetividade. 

Direito fundamental à tutela executiva. O devido processo legal, cláusula geral processual constitucional, tem como um de seus corolários o princípio da efetividade: os direitos devem ser efetivados, não apenas reconhecidos. Processo devido é processo efetivo. O princípio da efetividade garante o direito fundamental à tutela executiva, que consiste 'na exigência de um sistema completo de tutela executiva, no qual existam meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva'. O art. 4º do CPC, embora em nível infraconstitucional, reforça esse princípio como norma fundamental do processo civil brasileiro, ao incluir o direito à atividade satisfativa, que é o direito à execução (...). (DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de Direito Processual Civil: execução. 7 ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p.65)