Fonte: Dizer o Direito
Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/12/info-1037-stf.pdf
ORÇAMENTO - STF suspendeu a execução do “orçamento paralelo” (“orçamento secreto”),
tendo posteriormente liberado a execução da execução das emendas do relator
(identificadas pela sigla RP9) relativas ao orçamento de 2021
O modelo de elaboração e execução das despesas oriundas de emendas do relator-geral do
orçamento viola o princípio republicano e os postulados informadores do regime de
transparência no uso dos recursos financeiros do Estado.
Na decisão monocrática do dia 05/11/2021, referendada pelo Plenário, determinou-se:
(a) quanto ao orçamento dos exercícios de 2020 e de 2021, que seja dada ampla
publicidade, em plataforma centralizada de acesso público, aos documentos encaminhados
aos órgãos e entidades federais que embasaram as demandas e/ou resultaram na
distribuição de recursos das emendas de relator geral (RP-9);
(b) quanto à execução das despesas indicadas pelo classificador RP 9 (despesas
decorrentes de emendas do relator do projeto de lei orçamentária anual), que sejam
adotadas as providências necessárias para que todas as demandas de parlamentares
voltadas à distribuição de emendas de relator geral, independentemente da modalidade
de aplicação, sejam registradas em plataforma eletrônica centralizada mantida pelo órgão
central do Sistema de Planejamento e Orçamento Federal previsto nos arts. 3º e 4º da
Lei 10.180/2001, à qual assegurado amplo acesso público, com medidas de fomento à
transparência ativa, assim como sejam garantidas a comparabilidade e a rastreabilidade
dos dados referentes às solicitações/pedidos de distribuição de emendas e sua
respectiva execução, em conformidade com os princípios da publicidade e transparência
previstos nos arts. 37, caput, e 163-A da Constituição Federal, com o art. 3º da Lei
12.527/2011 e art. 48 da Lei Complementar 101/2000, também no prazo de 30 (trinta)
dias corridos; e
(c) quanto ao orçamento do exercício de 2021, que seja suspensa integral e
imediatamente a execução dos recursos orçamentários oriundos do identificador de
resultado primário nº 9 (RP 9), até final julgamento de mérito desta arguição de
descumprimento.
STF. Plenário. ADPF 854 MC-Ref/DF, ADPF 850 MC-Ref/DF e ADPF 851 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa
Weber, julgados em 10/11/2021 (Info 1037).
No dia 06/12/2021, a Min. Rosa Weber atendeu pedido da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal e revogou a suspensão da execução das emendas do relator (identificadas pela sigla
RP9) relativas ao orçamento de 2021. A medida havia sido determinada na liminar deferida
pela Ministra e referendada pelo Plenário, conforme vimos acima. Em outras palavras, por meio dessa decisão do dia 06/12/2021, a Ministra suspendeu o
comando que ela havia dado no item “c” da liminar concedida no dia 05/11/2021.
Explicando melhor:
• na decisão do dia 05/11/2021 a Ministra havia dito que os valores alocados por meio das
emendas do relator (RP 9) relacionadas com o orçamento de 2021 não deveriam ser
executadas (não deveriam ser gastos esses valores);
• na decisão do dia 06/12/2021, ela voltou atrás quanto a esse ponto e disse que tais emendas
podem ser executadas (o dinheiro pode ser gasto).
Por quê? Segundo a Ministra, há risco de prejuízo à continuidade da prestação de serviços
essenciais à população e à execução de políticas públicas.
A Ministra considerou, também, que o Congresso Nacional adotou providências para cumprir
a decisão anterior e aumentar a transparência. Tais providências se mostraram suficientes no
momento, justificando a retomada da execução das despesas.
A relatora determinou que a execução das despesas classificadas sob o indicador RP 9 observe,
no que couber, as regras do Ato Conjunto 1/2021 da Câmara e do Senado e da Resolução
2/2021 do Congresso Nacional, editados para assegurar maior publicidade e transparência à
execução orçamentárias das emendas do relator.
Essa segunda decisão monocrática também foi referendada pelo Plenário do STF.
STF. Plenário. ADPF 854 MC-Ref/DF, ADPF 850 MC-Ref/DF e ADPF 851 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa
Weber, julgados em 16/12/2021.
O caso concreto foi o seguinte:
Alguns Partidos ajuizaram ADPF contra uma prática que ficou conhecida como “orçamento secreto”.
Os autores alegaram existir um “esquema montado pelo Governo Federal” objetivando aumentar sua base
política de apoio no Congresso Nacional, que envolveria a atuação combinada entre o relator-geral do
orçamento e a Chefia do Poder Executivo da União.
Segundo alegado, o relator-geral do orçamento utilizaria seus poderes regimentais para introduzir a
previsão de despesas públicas na Lei Orçamentária Anual mediante emendas do relator. Essa programação
orçamentária seria utilizada para negociar apoio político de parlamentares, que seriam contemplados com
uma “quota orçamentária” (fração das despesas alocadas no orçamento por emendas do relator).
A fração da quota parlamentar obtida pelos congressistas poderia ser por eles destinada, individualmente,
às suas bases eleitorais, bastando, para tanto, a simples indicação das entidades públicas ou órgãos
beneficiários, por meio de ofícios e outras vias informais de comunicação encaminhados pelos Deputados
e Senadores ao próprio relator-geral do orçamento que faria a destinação das verbas como emenda do
relator.
Desse modo, o Executivo (atuando em comunhão de esforços com o relator-geral do orçamento) teria o
instrumento político necessário para fazer a cooptação do apoio político dos parlamentares, utilizandose, para esse fim, dessas emendas.
Os Partidos autores alegaram, ainda, que as emendas do relator-geral não possuem previsão
constitucional e que o regimento comum do Congresso Nacional as disciplina apenas como um
instrumento técnico de ajuste final do projeto de lei à legislação de regência.
Argumentaram que a prática noticiada como “orçamento secreto” viola, pela forma como adotadas e
executadas as emendas do relator, os preceitos fundamentais regentes da Administração, da execução do
orçamento público e das finanças públicas, bem como os princípios constitucionais da legalidade, da
moralidade, da eficiência e da publicidade.
Decisão monocrática
No dia 05/11/2021, a Ministra Relatora Rosa Weber, monocraticamente, determinou a suspensão integral
e imediata da execução dos recursos oriundos das chamadas “emendas do relator” relativas ao orçamento
de 2021, até que fosse julgado o mérito das ações que questionam a prática no Congresso Nacional.
A relatora determinou, ainda, que sejam tornados públicos os documentos que embasaram a distribuição
de recursos provenientes dessas emendas (identificadas pela rubrica RP 9) nos orçamentos de 2020 e
2021.
A liminar também estabeleceu que devem ser adotadas medidas para que todas as demandas de
parlamentares voltadas à distribuição de emendas do relator-geral do orçamento, independentemente da
modalidade de aplicação, sejam registradas em plataforma eletrônica centralizada, mantida pelo órgão
central do Sistema de Planejamento e Orçamento Federal, em conformidade com os princípios
constitucionais da publicidade e da transparência.
Referendo da decisão monocrática
No dia 10/11/2021, o Plenário do STF concluiu a apreciação da decisão monocrática e referendou a
cautelar concedida pela Ministra Relatora. Vencidos, parcialmente, os ministros Gilmar Mendes e Nunes
Marques.
O STF afirmou que:
O modelo de elaboração e execução das despesas oriundas de emendas do relator-geral do orçamento
viola o princípio republicano e os postulados informadores do regime de transparência no uso dos
recursos financeiros do Estado.
STF. Plenário. ADPF 854 MC-Ref/DF, ADPF 850 MC-Ref/DF e ADPF 851 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber,
julgados em 10/11/2021 (Info 1037).
Esse modelo de emendas do relator-geral do orçamento faz com que se crie uma categoria cuja autoria
material não corresponde àquela declarada na peça formal.
O relator-geral do orçamento figura apenas formalmente como autor da programação orçamentária
classificada sob o indicador RP 9. Quem detém, de fato, o poder de decidir quais serão o objeto e o destino
dos valores previstos nessa categoria orçamentária são apenas os Deputados e Senadores autorizados,
por meio de acordos informais, a realizarem as indicações dos órgãos e entidades a serem contemplados
com as dotações previstas naquela categoria de programação (RP 9).
Enquanto as emendas individuais e de bancada vinculam o autor da emenda ao beneficiário das despesas,
tornando claras e verificáveis a origem e a destinação do dinheiro gasto, as emendas do relator operam
com base na lógica da ocultação dos congressistas requerentes da despesa por meio do estratagema da
rubrica RP 9.
Além disso, diferentemente do sistema existente para as emendas individuais e de bancada, a definição
de onde serão aplicados os recursos ocorre internamente, sem possibilidade de controle por meio das
plataformas e sistemas de transparência da União na internet.
Essa dinâmica desrespeita os postulados da execução equitativa, da igualdade entre os parlamentares, da
observância de critérios objetivos e imparciais na elaboração orçamentária e, acima de tudo, o primado
do ideal republicano e o postulado da transparência no gasto de recursos públicos.
Ministra Relatora atendeu a pedido do Congresso e autorizou a execução das emendas do relator
Depois da liminar concedida, os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal promoveram
algumas mudanças nessa sistemática e as chamadas “emendas do relator” passaram a ser disponibilizadas
em plataforma de acesso público, com atualizações periódicas, e detalhadas com a identificação de
beneficiários, valores pagos, objeto das despesas, documentos contratuais e indicação dos entes
federados contemplados e dos partidos políticos de seus governantes em exercício. Diante disso, os Presidentes peticionaram pedindo que o STF liberasse a execução das emendas relativas
ao orçamento de 2021 argumentando que se tratam de recursos que atendem necessidades de interesse
público.
No dia 06/12/2021, a Min. Rosa Weber atendeu a esse pedido e liberou a execução das emendas do relator
(identificadas pela sigla RP9) relativas ao orçamento de 2021.
Essa suspensão da execução das emendas havia sido determinada na liminar deferida pela Ministra e
referendada pelo Plenário, conforme vimos acima.
Assim, por meio dessa decisão do dia 06/12/2021, a Ministra suspendeu o comando que ela havia dado
no item “c” da liminar concedida no dia 05/11/2021.
O que dizia esse item “c”:
“Ante o exposto, conheço em parte da arguição de descumprimento e, nessa extensão, defiro o
pedido de medida cautelar requerido (...) para determinar (...):
(c) quanto ao orçamento do exercício de 2021, que seja suspensa integral e imediatamente a
execução dos recursos orçamentários oriundos do identificador de resultado primário nº 9 (RP 9),
até final julgamento de mérito desta arguição de descumprimento.”
Explicando melhor:
• na decisão do dia 05/11/2021 a Ministra havia dito que os valores alocados por meio das emendas do
relator (RP 9) relacionadas com o orçamento de 2021 não deveriam ser executadas (não deveriam ser
gastos esses valores);
• na decisão do dia 06/12/2021, ela voltou atrás quanto a esse ponto e disse que tais emendas podem ser
executadas (o dinheiro pode ser gasto).
Por quê?
Segundo a Ministra, há risco de prejuízo à continuidade da prestação de serviços essenciais à população e
à execução de políticas públicas.
A Ministra considerou, também, que o Congresso Nacional adotou providências para cumprir a decisão
anterior e aumentar a transparência. Tais providências se mostraram suficientes no momento, justificando
a retomada da execução das despesas.
A relatora determinou que a execução das despesas classificadas sob o indicador RP 9 observe, no que
couber, as regras do Ato Conjunto 1/2021 da Câmara e do Senado e da Resolução 2/2021 do Congresso
Nacional, editados para assegurar maior publicidade e transparência à execução orçamentárias das
emendas do relator.
A Ministra Relatora destacou que, de acordo com nota técnica elaborada pela Consultoria de Orçamento
e Fiscalização Financeira do Congresso Nacional, metade das verbas autorizadas para despesas
classificadas como RP 9 se destinam ao custeio dos serviços de atenção básica e assistência hospitalar. A
suspensão da execução dessas parcelas prejudicaria o cumprimento de programações orçamentárias
vinculadas à prestação de serviços públicos essenciais à população. O dado técnico demonstra, ainda, que
a medida produziria maior impacto no orçamento dos pequenos municípios e das regiões com menor
índice de desenvolvimento humano.
A Ministra ressaltou, ainda, que, embora o Congresso Nacional tenha afastado a incidência das novas
regras em relação aos atos anteriores à sua publicação, as verbas cuja execução estava paralisada em
decorrência da decisão cautelar passarão, agora, a ser executadas em conformidade com as regras do
novo sistema. O Ato Conjunto 1/2021 criou sistemas mais eficientes de garantia de transparência da
execução das despesas classificadas como RP 9.
STF referendou decisão que autorizou continuidade de emendas de relator
No dia 16/12/2021, o Plenário do STF referendou a liminar da Ministra Rosa Weber que autorizou a
continuidade das emendas de relator ao Orçamento da União. O STF, por maioria, referendou a decisão na qual, acolhendo o pedido formulado pelos Senhores
Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, foi concedida a medida cautelar requerida,
para afastar a suspensão determinada pelo item “c” da decisão anteriormente proferida, autorizando,
dessa forma, a continuidade da execução das despesas classificadas sob o indicador RP 9, devendo ser
observadas, para tanto, no que couber, as regras do Ato Conjunto das Mesas da Câmara dos Deputados e
do Senado Federal nº 1, de 2021, e a Resolução nº 2/2021-CN, nos termos do voto da Relatora, vencidos
os Ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia.