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6 de fevereiro de 2022

Não é possível a adoção de novo critério do coeficiente no Fundo de Participação dos Municípios, com aplicação imediata, em meio ao exercício financeiro, mesmo verificado o aumento populacional da municipalidade, em confronto com os dados do IBGE

 Fundo de Participação dos Municípios (FPM)

STJ. 1ª Seção. EREsp 1.749.966-PR, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 27/10/2021 (Info 716).

Não é possível a adoção de novo critério do coeficiente no Fundo de Participação dos Municípios, com aplicação imediata, em meio ao exercício financeiro, mesmo verificado o aumento populacional da municipalidade, em confronto com os dados do IBGE.

Fundo de Participação dos Municípios (FPM)

A CF/88 determina no art. 159, I, que a União deverá repassar aos Municípios uma parte dos recursos que ela arrecadar com o IR e o IPI (impostos federais).

Esse dinheiro não é repassado diretamente pela União para os Municípios

A União deposita esse dinheiro no Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e depois desse fundo os recursos vão para cada um dos Municípios.

O FPM é um instrumento contábil utilizado para facilitar o repasse, permitindo uma melhor organização dos valores para que depois eles sejam repartidos entre os Municípios

TCU (art. 161, §ú, CF e 91, CTN) efetua o cálculo das quotas referentes aos fundos de participação

cálculos são elaborados pelo TCU em um ano para serem implementados durante todo o exercício seguinte (princípio da anualidade)

Art. 91, CTN: “Do Fundo de Participação dos Municípios a que se refere o art. 86, serão atribuídos:

I - 10% (dez por cento) aos Municípios das Capitais dos Estados;

II - 90% (noventa por cento) aos demais Municípios do País. (...)

§ 3º Para os efeitos deste artigo, consideram-se os municípios regularmente instalados, fazendo-se a revisão das quotas anualmente, a partir de 1989, com base em dados oficiais de população produzidos pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

princípio da anualidade

não é possível a aplicação imediata, em meio ao exercício financeiro, de novos coeficientes individuais de participação no FPM

8 de janeiro de 2022

STF suspendeu a execução do “orçamento paralelo” (“orçamento secreto”), tendo posteriormente liberado a execução da execução das emendas do relator (identificadas pela sigla RP9) relativas ao orçamento de 2021

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/12/info-1037-stf.pdf


ORÇAMENTO - STF suspendeu a execução do “orçamento paralelo” (“orçamento secreto”), tendo posteriormente liberado a execução da execução das emendas do relator (identificadas pela sigla RP9) relativas ao orçamento de 2021 

O modelo de elaboração e execução das despesas oriundas de emendas do relator-geral do orçamento viola o princípio republicano e os postulados informadores do regime de transparência no uso dos recursos financeiros do Estado. Na decisão monocrática do dia 05/11/2021, referendada pelo Plenário, determinou-se: 

(a) quanto ao orçamento dos exercícios de 2020 e de 2021, que seja dada ampla publicidade, em plataforma centralizada de acesso público, aos documentos encaminhados aos órgãos e entidades federais que embasaram as demandas e/ou resultaram na distribuição de recursos das emendas de relator geral (RP-9); 

(b) quanto à execução das despesas indicadas pelo classificador RP 9 (despesas decorrentes de emendas do relator do projeto de lei orçamentária anual), que sejam adotadas as providências necessárias para que todas as demandas de parlamentares voltadas à distribuição de emendas de relator geral, independentemente da modalidade de aplicação, sejam registradas em plataforma eletrônica centralizada mantida pelo órgão central do Sistema de Planejamento e Orçamento Federal previsto nos arts. 3º e 4º da Lei 10.180/2001, à qual assegurado amplo acesso público, com medidas de fomento à transparência ativa, assim como sejam garantidas a comparabilidade e a rastreabilidade dos dados referentes às solicitações/pedidos de distribuição de emendas e sua respectiva execução, em conformidade com os princípios da publicidade e transparência previstos nos arts. 37, caput, e 163-A da Constituição Federal, com o art. 3º da Lei 12.527/2011 e art. 48 da Lei Complementar 101/2000, também no prazo de 30 (trinta) dias corridos; e 

(c) quanto ao orçamento do exercício de 2021, que seja suspensa integral e imediatamente a execução dos recursos orçamentários oriundos do identificador de resultado primário nº 9 (RP 9), até final julgamento de mérito desta arguição de descumprimento. STF. Plenário. ADPF 854 MC-Ref/DF, ADPF 850 MC-Ref/DF e ADPF 851 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgados em 10/11/2021 (Info 1037). 

No dia 06/12/2021, a Min. Rosa Weber atendeu pedido da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e revogou a suspensão da execução das emendas do relator (identificadas pela sigla RP9) relativas ao orçamento de 2021. A medida havia sido determinada na liminar deferida pela Ministra e referendada pelo Plenário, conforme vimos acima. Em outras palavras, por meio dessa decisão do dia 06/12/2021, a Ministra suspendeu o comando que ela havia dado no item “c” da liminar concedida no dia 05/11/2021. 

Explicando melhor: 

• na decisão do dia 05/11/2021 a Ministra havia dito que os valores alocados por meio das emendas do relator (RP 9) relacionadas com o orçamento de 2021 não deveriam ser executadas (não deveriam ser gastos esses valores); 

• na decisão do dia 06/12/2021, ela voltou atrás quanto a esse ponto e disse que tais emendas podem ser executadas (o dinheiro pode ser gasto). 

Por quê? Segundo a Ministra, há risco de prejuízo à continuidade da prestação de serviços essenciais à população e à execução de políticas públicas. A Ministra considerou, também, que o Congresso Nacional adotou providências para cumprir a decisão anterior e aumentar a transparência. Tais providências se mostraram suficientes no momento, justificando a retomada da execução das despesas. A relatora determinou que a execução das despesas classificadas sob o indicador RP 9 observe, no que couber, as regras do Ato Conjunto 1/2021 da Câmara e do Senado e da Resolução 2/2021 do Congresso Nacional, editados para assegurar maior publicidade e transparência à execução orçamentárias das emendas do relator. Essa segunda decisão monocrática também foi referendada pelo Plenário do STF. 

STF. Plenário. ADPF 854 MC-Ref/DF, ADPF 850 MC-Ref/DF e ADPF 851 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgados em 16/12/2021. 

O caso concreto foi o seguinte: 

Alguns Partidos ajuizaram ADPF contra uma prática que ficou conhecida como “orçamento secreto”. Os autores alegaram existir um “esquema montado pelo Governo Federal” objetivando aumentar sua base política de apoio no Congresso Nacional, que envolveria a atuação combinada entre o relator-geral do orçamento e a Chefia do Poder Executivo da União. Segundo alegado, o relator-geral do orçamento utilizaria seus poderes regimentais para introduzir a previsão de despesas públicas na Lei Orçamentária Anual mediante emendas do relator. Essa programação orçamentária seria utilizada para negociar apoio político de parlamentares, que seriam contemplados com uma “quota orçamentária” (fração das despesas alocadas no orçamento por emendas do relator). A fração da quota parlamentar obtida pelos congressistas poderia ser por eles destinada, individualmente, às suas bases eleitorais, bastando, para tanto, a simples indicação das entidades públicas ou órgãos beneficiários, por meio de ofícios e outras vias informais de comunicação encaminhados pelos Deputados e Senadores ao próprio relator-geral do orçamento que faria a destinação das verbas como emenda do relator. Desse modo, o Executivo (atuando em comunhão de esforços com o relator-geral do orçamento) teria o instrumento político necessário para fazer a cooptação do apoio político dos parlamentares, utilizandose, para esse fim, dessas emendas. Os Partidos autores alegaram, ainda, que as emendas do relator-geral não possuem previsão constitucional e que o regimento comum do Congresso Nacional as disciplina apenas como um instrumento técnico de ajuste final do projeto de lei à legislação de regência. Argumentaram que a prática noticiada como “orçamento secreto” viola, pela forma como adotadas e executadas as emendas do relator, os preceitos fundamentais regentes da Administração, da execução do orçamento público e das finanças públicas, bem como os princípios constitucionais da legalidade, da moralidade, da eficiência e da publicidade. 

Decisão monocrática

 No dia 05/11/2021, a Ministra Relatora Rosa Weber, monocraticamente, determinou a suspensão integral e imediata da execução dos recursos oriundos das chamadas “emendas do relator” relativas ao orçamento de 2021, até que fosse julgado o mérito das ações que questionam a prática no Congresso Nacional. A relatora determinou, ainda, que sejam tornados públicos os documentos que embasaram a distribuição de recursos provenientes dessas emendas (identificadas pela rubrica RP 9) nos orçamentos de 2020 e 2021. A liminar também estabeleceu que devem ser adotadas medidas para que todas as demandas de parlamentares voltadas à distribuição de emendas do relator-geral do orçamento, independentemente da modalidade de aplicação, sejam registradas em plataforma eletrônica centralizada, mantida pelo órgão central do Sistema de Planejamento e Orçamento Federal, em conformidade com os princípios constitucionais da publicidade e da transparência. 

Referendo da decisão monocrática 

No dia 10/11/2021, o Plenário do STF concluiu a apreciação da decisão monocrática e referendou a cautelar concedida pela Ministra Relatora. Vencidos, parcialmente, os ministros Gilmar Mendes e Nunes Marques. O STF afirmou que: 

O modelo de elaboração e execução das despesas oriundas de emendas do relator-geral do orçamento viola o princípio republicano e os postulados informadores do regime de transparência no uso dos recursos financeiros do Estado. STF. Plenário. ADPF 854 MC-Ref/DF, ADPF 850 MC-Ref/DF e ADPF 851 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgados em 10/11/2021 (Info 1037). 

Esse modelo de emendas do relator-geral do orçamento faz com que se crie uma categoria cuja autoria material não corresponde àquela declarada na peça formal. O relator-geral do orçamento figura apenas formalmente como autor da programação orçamentária classificada sob o indicador RP 9. Quem detém, de fato, o poder de decidir quais serão o objeto e o destino dos valores previstos nessa categoria orçamentária são apenas os Deputados e Senadores autorizados, por meio de acordos informais, a realizarem as indicações dos órgãos e entidades a serem contemplados com as dotações previstas naquela categoria de programação (RP 9). Enquanto as emendas individuais e de bancada vinculam o autor da emenda ao beneficiário das despesas, tornando claras e verificáveis a origem e a destinação do dinheiro gasto, as emendas do relator operam com base na lógica da ocultação dos congressistas requerentes da despesa por meio do estratagema da rubrica RP 9. Além disso, diferentemente do sistema existente para as emendas individuais e de bancada, a definição de onde serão aplicados os recursos ocorre internamente, sem possibilidade de controle por meio das plataformas e sistemas de transparência da União na internet. Essa dinâmica desrespeita os postulados da execução equitativa, da igualdade entre os parlamentares, da observância de critérios objetivos e imparciais na elaboração orçamentária e, acima de tudo, o primado do ideal republicano e o postulado da transparência no gasto de recursos públicos. 

Ministra Relatora atendeu a pedido do Congresso e autorizou a execução das emendas do relator 

Depois da liminar concedida, os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal promoveram algumas mudanças nessa sistemática e as chamadas “emendas do relator” passaram a ser disponibilizadas em plataforma de acesso público, com atualizações periódicas, e detalhadas com a identificação de beneficiários, valores pagos, objeto das despesas, documentos contratuais e indicação dos entes federados contemplados e dos partidos políticos de seus governantes em exercício. Diante disso, os Presidentes peticionaram pedindo que o STF liberasse a execução das emendas relativas ao orçamento de 2021 argumentando que se tratam de recursos que atendem necessidades de interesse público. No dia 06/12/2021, a Min. Rosa Weber atendeu a esse pedido e liberou a execução das emendas do relator (identificadas pela sigla RP9) relativas ao orçamento de 2021. Essa suspensão da execução das emendas havia sido determinada na liminar deferida pela Ministra e referendada pelo Plenário, conforme vimos acima. Assim, por meio dessa decisão do dia 06/12/2021, a Ministra suspendeu o comando que ela havia dado no item “c” da liminar concedida no dia 05/11/2021. O que dizia esse item “c”: 

“Ante o exposto, conheço em parte da arguição de descumprimento e, nessa extensão, defiro o pedido de medida cautelar requerido (...) para determinar (...): (c) quanto ao orçamento do exercício de 2021, que seja suspensa integral e imediatamente a execução dos recursos orçamentários oriundos do identificador de resultado primário nº 9 (RP 9), até final julgamento de mérito desta arguição de descumprimento.” 

Explicando melhor: 

• na decisão do dia 05/11/2021 a Ministra havia dito que os valores alocados por meio das emendas do relator (RP 9) relacionadas com o orçamento de 2021 não deveriam ser executadas (não deveriam ser gastos esses valores); 

• na decisão do dia 06/12/2021, ela voltou atrás quanto a esse ponto e disse que tais emendas podem ser executadas (o dinheiro pode ser gasto). 

Por quê? 

Segundo a Ministra, há risco de prejuízo à continuidade da prestação de serviços essenciais à população e à execução de políticas públicas. A Ministra considerou, também, que o Congresso Nacional adotou providências para cumprir a decisão anterior e aumentar a transparência. Tais providências se mostraram suficientes no momento, justificando a retomada da execução das despesas. A relatora determinou que a execução das despesas classificadas sob o indicador RP 9 observe, no que couber, as regras do Ato Conjunto 1/2021 da Câmara e do Senado e da Resolução 2/2021 do Congresso Nacional, editados para assegurar maior publicidade e transparência à execução orçamentárias das emendas do relator. A Ministra Relatora destacou que, de acordo com nota técnica elaborada pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira do Congresso Nacional, metade das verbas autorizadas para despesas classificadas como RP 9 se destinam ao custeio dos serviços de atenção básica e assistência hospitalar. A suspensão da execução dessas parcelas prejudicaria o cumprimento de programações orçamentárias vinculadas à prestação de serviços públicos essenciais à população. O dado técnico demonstra, ainda, que a medida produziria maior impacto no orçamento dos pequenos municípios e das regiões com menor índice de desenvolvimento humano. A Ministra ressaltou, ainda, que, embora o Congresso Nacional tenha afastado a incidência das novas regras em relação aos atos anteriores à sua publicação, as verbas cuja execução estava paralisada em decorrência da decisão cautelar passarão, agora, a ser executadas em conformidade com as regras do novo sistema. O Ato Conjunto 1/2021 criou sistemas mais eficientes de garantia de transparência da execução das despesas classificadas como RP 9. 

STF referendou decisão que autorizou continuidade de emendas de relator 

No dia 16/12/2021, o Plenário do STF referendou a liminar da Ministra Rosa Weber que autorizou a continuidade das emendas de relator ao Orçamento da União. O STF, por maioria, referendou a decisão na qual, acolhendo o pedido formulado pelos Senhores Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, foi concedida a medida cautelar requerida, para afastar a suspensão determinada pelo item “c” da decisão anteriormente proferida, autorizando, dessa forma, a continuidade da execução das despesas classificadas sob o indicador RP 9, devendo ser observadas, para tanto, no que couber, as regras do Ato Conjunto das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal nº 1, de 2021, e a Resolução nº 2/2021-CN, nos termos do voto da Relatora, vencidos os Ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia. 

É inconstitucional orçamento impositivo previsto na Constituição estadual antes das ECs 86/2015 e 100/2019

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/12/info-1034-stf.pdf


ORÇAMENTO É inconstitucional orçamento impositivo previsto na Constituição estadual antes das ECs 86/2015 e 100/2019 

É inconstitucional norma estadual que tenha criado impositividade da lei orçamentária antes do advento das Emendas Constitucionais 86/2015 e 100/2019. STF. Plenário. ADI 5274/SC, Rel. Min. Carmen Lúcia, julgado em 18/10/2021 (Info 1034). 

A situação concreta foi a seguinte: 

Em 2014, a Assembleia Legislativa de Santa Catarina aprovou a emenda constitucional nº 70, que acrescentou os arts. 120-A e 120-B à Constituição do Estado de Santa Catarina. Esses dois artigos disseram que haveria emendas ao orçamento que seriam de execução impositiva, ou seja, que deveriam ser obrigatoriamente gastas. Veja: 

Art. 120-A. Recebidos os projetos do Plano Plurianual e da Lei Orçamentária Anual e constatado não haverem sido integralmente contempladas as prioridades estabelecidas nas audiências públicas regionais, a Assembleia Legislativa as incluirá como emenda da competente comissão técnica permanente, no texto legislativo a ser submetido à deliberação do Plenário. 

Art. 120-B. É de execução impositiva a programação constante da Lei Orçamentária Anual relativa às prioridades estabelecidas nas audiências públicas regionais, nos termos da lei complementar. 

§ 1º A Lei de Diretrizes Orçamentárias fixará, anualmente, o valor destinado às prioridades eleitas nas audiências públicas regionais, com base na receita corrente líquida efetivamente realizada no exercício anterior. 

§ 2º A comissão técnica permanente a que se refere o art. 122 estabelecerá o indicador que será utilizado na distribuição regional dos recursos de que trata o § 1º deste artigo. 

§ 3º As dotações referentes às prioridades eleitas nas audiências públicas regionais poderão ser contingenciadas na forma da lei complementar de que trata o art. 163 da Constituição Federal. 

O Governador do Estado ajuizou ADI contra esses dispositivos afirmando que eles ofenderam a proibição expressa de vinculação de receita tributária, além de provocar o desequilíbrio do planejamento orçamentário. 

O que o STF decidiu? Essa previsão é constitucional? NÃO. 

É inconstitucional norma estadual que tenha criado impositividade da lei orçamentária antes do advento das Emendas Constitucionais 86/2015 e 100/2019. STF. Plenário. ADI 5274/SC, Rel. Min. Carmen Lúcia, julgado em 18/10/2021 (Info 1034). 

Como vimos, as normas impugnadas estabelecem a “execução impositiva” das prioridades estabelecidas nas audiências públicas regionais, incorporadas ao orçamento por emenda parlamentar. Para o STF, esses artigos são inconstitucionais por vícios formal e material. A jurisprudência do STF, antes das Emendas Constitucionais nº 86/2015 e nº 100/2019, manifestava-se pelo caráter meramente formal e autorizativo da lei orçamentária. Em data posterior às normas questionadas no sistema estadual catarinense, foi editada a Emenda Constitucional nº 86/2015 (emenda à Constituição Federal), que passou a prever emendas impositivas na lei orçamentária, incluindo os §§ 9º a 18 no art. 166 da CF/88, parcialmente modificados pela Emenda Constitucional n. 100/2019, que acrescentou os §§ 19 e 20 ao art. 166. Com efeito, as alterações promovidas pelas Emendas Constitucionais nº 86/2015 e nº 100/2019 trouxeram expressamente o cuidado sobre a questão das emendas impositivas, de caráter vinculativo, salvo comprovado impedimento de ordem técnica. Buscou-se, assim, compatibilizar a discricionariedade a ser permitida ao Executivo para a definição de políticas públicas e a importância do Legislativo na elaboração do orçamento, harmonizando e reequilibrando a função de cada qual dos Poderes. Na espécie, a norma questionada, promulgada em 18/12/2014, foi inserida na Constituição de Santa Catarina antes das modificações promovidas no art. 166 da Constituição da República. 

Ocorre que inexiste no sistema jurídico brasileiro a figura da constitucionalidade superveniente, de modo que norma estadual, com previsão de orçamento de execução obrigatória e editada antes do advento das ECs 86/2015 e 100/2019, contraria o princípio da separação dos Poderes e o caráter meramente formal da lei orçamentária. Ademais, embora o art. 24, I, da Constituição Federal estabeleça a competência legislativa concorrente sobre direito financeiro, as normas sobre processo legislativo são de observância obrigatória pelos estados-membros, aplicando-se o princípio da simetria. Assim, reveste-se de inconstitucionalidade material a norma estadual que fixe limites diferentes daqueles previstos na CF para emendas parlamentares impositivas em matéria orçamentária. Ao impor ao Poder Executivo a obrigatoriedade de execução das prioridades do orçamento estabelecidas nas audiências públicas regionais, a Emenda à Constituição de Santa Catarina nº 70/2014 contrariou o princípio da separação dos poderes e o caráter meramente formal da lei orçamentária até então em vigor na CF/88. A despeito de se ter a importância da finalidade democrática e da participação do cidadão na formulação do orçamento, a ausência de parâmetros e percentuais para a impositividade fixada, não se observou a normatividade constitucional então vigente (dezembro de 2014), retirando-se do Poder Executivo os meios para fazer face às obrigações legais. A busca necessária de participação popular, inclusive na formulação do projeto e da lei orçamentária, não poderia, portanto, deixar de definir parâmetros condizentes com o figurino constitucional nacional. Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente o pedido formulado em ação direta, para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 120-A e 120-B da Constituição do Estado de Santa Catarina.

17 de novembro de 2021

Não é possível a adoção de novo critério do coeficiente no Fundo de Participação dos Municípios, com aplicação imediata, em meio ao exercício financeiro, mesmo verificado o aumento populacional da municipalidade, em confronto com os dados do IBGE

Processo

EREsp 1.749.966-PR, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 27.10.2021.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO FINANCEIRO

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Fundo de participação dos municípios. Decisão Normativa do TCU. Aumento populacional. Índice do IBGE. Adoção de critérios para o mesmo exercício financeiro. Ilegalidade. Princípio da anualidade.

 

DESTAQUE

Não é possível a adoção de novo critério do coeficiente no Fundo de Participação dos Municípios, com aplicação imediata, em meio ao exercício financeiro, mesmo verificado o aumento populacional da municipalidade, em confronto com os dados do IBGE.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Na ação originária a municipalidade postulava contra a União, pretendendo discutir os critérios para fixação do Fundo de Participação dos Municípios, voltando-se contra Decisão Normativa de 2006, que teria fixado o respectivo índice para 2007. Sustentava que tal coeficiente não mais poderia ser utilizado para o exercício de 2007, uma vez que a população estimada pelo IBGE não seria condizente com a nova realidade, no que pleiteou eventuais diferenças.

A Primeira Turma do STJ deu provimento ao recurso especial do Município, sob o fundamento de que, diante de erro censitário do IBGE, a reivindicação esposada não esbarraria no princípio da anualidade. Ou seja, em resumo, a municipalidade poderia se valer de novos coeficientes para o próprio ano de 2007, em detrimento da orientação normativa do TCU ao final do ano de 2006 para aplicação em 2007.

O acórdão paradigma da Segunda Turma, a seu turno, cuidou de ação movida por municipalidade pretendendo obter o reconhecimento da ilegalidade da Decisão Normativa n. 38/2001 do TCU que, editada no meio do ano de 2001, alterou os critérios da Decisão Normativa anterior, expedida em 2000 para 2001, trazendo novos critérios a serem observados para a segunda metade daquele mesmo ano de 2001.

A municipalidade sagrou-se vencedora nas duas instâncias, ressalvando-se a prescrição quinquenal, e ao recurso especial interposto pela União foi negado provimento, sob o principal argumento de que o STJ e STF já entenderam pela ilegalidade da referida Decisão Normativa, em razão de não ser possível, por ofensa ao princípio da anualidade, a aplicação imediata, em meio ao exercício financeiro, de novos coeficientes individuais de participação no FPM.

Em resumo temos as seguintes situações: a ação originária deste feito pretendia a adoção de novos parâmetros, dentro do mesmo exercício de 2007, enquanto que a do acórdão paradigma, voltava-se contra a fixação de novos parâmetros, pela União, no meio do ano, para utilização no mesmo exercício.

Nesse panorama, em linhas gerais, quer por um objetivo ou por outro, e independentemente da natureza das ações e consequente forma de pagamento de eventual diferença encontrada, as duas ações discutem, ao final, a utilização de critérios referentes ao FPM para adoção no mesmo exercício, o que evidencia a divergência apontada.

A se aceitar a tese de que os municípios podem buscar o ressarcimento posterior, pretendendo a adoção de novos critérios com base nas informações do mesmo exercício, como no caso do entendimento prestigiado pelo acórdão ora embargado de divergência, há que se aceitar a tese de que a União, possa, num mesmo exercício, proceder com a revisão dos referidos critérios, voltando-se contra municípios que, eventualmente, possam ter recebido valores a maior.

Desse modo, deve prevalecer o entendimento prestigiado pela Segunda Turma, seguindo precedentes desta Corte e do STF em relação à matéria, no sentido da ilegalidade da Decisão Normativa n. 38/2001 do TCU, ao fundamento de que não é possível, por ofensa ao princípio da anualidade, a aplicação imediata, em meio ao exercício financeiro, de novos coeficientes individuais de participação no FPM.



9 de novembro de 2021

DIREITO FINANCEIRO - São inconstitucionais atos de constrição, por decisão judicial, do patrimônio de estatais prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, para fins de quitação de suas dívidas

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-1026-stf.pdf


DIREITO FINANCEIRO - São inconstitucionais atos de constrição, por decisão judicial, do patrimônio de estatais prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, para fins de quitação de suas dívidas 

Os recursos públicos vinculados ao orçamento de estatais prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, não podem ser bloqueados ou sequestrados por decisão judicial para pagamento de suas dívidas, em virtude do disposto no art. 100 da CF/88, e dos princípios da legalidade orçamentária (art. 167, VI, da CF/88), da separação dos poderes (arts. 2º, 60, § 4º, III, da CF/88) e da eficiência da administração pública (art. 37, caput, da CF/88). STF. Plenário. ADPF 789/MA, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 20/8/2021 (Info 1026). 

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: 

A Justiça do Trabalho proferiu diversas decisões judiciais determinando o bloqueio, arresto, penhora e sequestro de valores integrantes do orçamento da Empresa Maranhense de Serviços Hospitalares - EMSERH, para pagamento de indenizações trabalhistas sem observância do regime de precatórios (art. 100 da CF/88). Vale ressaltar que a EMSERH é uma empresa pública prestadora de serviços gratuitos de assistência médico-hospitalar, ambulatorial e farmacêutica. O Governador ajuizou ADPF contra esse conjunto de decisões judiciais alegando que houve violação a diversos preceitos fundamentais, em especial àqueles referentes ao sistema orçamentário. 

Primeira pergunta: cabe ADPF neste caso? SIM. 

Mas essas decisões não poderiam ser impugnadas individualmente? Ex: não seria possível que o Estado interpusesse recursos contra essas decisões da Justiça do Trabalho? SIM. Essas decisões podem ser impugnadas individualmente. 

O fato de as decisões poderem ser impugnadas individualmente prejudica o cabimento da ADPF? Um dos requisitos da ADPF é a subsidiariedade... 

De fato, um dos requisitos da ADPF é a subsidiariedade. A subsidiariedade da ADPF está prevista expressamente no art. 4º, § 1º, da nº 9.882/99: “a arguição não será admitida quando houver qualquer outro meio de sanar a lesividade”. Assim, só cabe ADPF se não houver outro meio eficaz de sanar a lesão. Vale ressaltar, no entanto, que o fato de existirem ações, incidentes processuais ou recursos que poderiam ser manejados nas instâncias ordinária ou extraordinária não exclui, por si só, a admissibilidade de ADPF. Isso porque o requisito de subsidiariedade deve ser compreendido pela inexistência de meio processual apto a sanar a controvérsia de forma geral e imediata. Não havia outro meio eficaz para se declarar, de forma ampla, geral e imediata, a inconstitucionalidade desse conjunto de decisões. Desse modo: 

A ADPF pode ser ajuizada para impugnar um conjunto de decisões judiciais tidas como violadoras de preceitos constitucionais fundamentais. STF. Plenário. ADPF 588/PB, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 26/4/2021 (Info 1014). 

Superada a questão do cabimento, vamos ao mérito. Essa constrição das verbas públicas foi uma medida acertada? As decisões da Justiça do Trabalho foram mantidas? 

NÃO. O STF considerou que são inconstitucionais os atos de constrição do patrimônio de estatal prestadora de serviço público essencial prestado em regime não concorrencial e sem finalidade lucrativa. A EMSERH é uma empresa que desempenha serviço público essencial (direito social à saúde), prestado em regime não concorrencial e sem finalidade lucrativa. Desse modo, o bloqueio e a penhora de seus recursos da EMSERH violam: 

· o sistema constitucional de precatórios; 

· o princípio da legalidade orçamentária; 

· o princípio da separação dos Poderes; e 

· o princípio da eficiência administrativa. 

Precatório 

A jurisprudência do STF afirma que o regime constitucional dos precatórios deve ser aplicado também para as empresas estatais que prestam serviço público em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário. Logo, as decisões judiciais que determinam o bloqueio e o sequestro de verbas dessas empresas são inconstitucionais por violarem o regime de precatórios (art. 100 da CF/88). 

Princípio da legalidade orçamentária 

A Constituição veda a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa: 

Art. 167. São vedados: VI - a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa; 

São balizas constitucionais para alocação e utilização de recursos públicos. Justamente por isso, quando a Justiça do Trabalho determina o uso de verbas alocadas para a execução de determinada finalidade (saúde) em finalidades diversas (pagamento de dívidas trabalhistas), isso viola normas constitucionais relacionadas com a legalidade orçamentária (art. 167, VI). 

Princípio da separação dos Poderes 

Ademais, o princípio da legalidade orçamentária está estreitamente vinculado ao princípio da separação dos Poderes (arts. 2º e 60, § 4º, III, da CF/88). A exigência de lei para a modificação da destinação orçamentária de recursos públicos tem por finalidade resguardar o planejamento chancelado pelos Poderes Executivo e Legislativo no momento de aprovação da lei orçamentária anual. É nessa ocasião que se definem as prioridades de atuação da Administração, isto é, que se apontam as políticas e os serviços públicos que deverão ser implementados ou aprimorados no exercício financeiro respectivo. A ordem constitucional rechaça a interferência do Judiciário na organização orçamentária dos projetos da Administração Pública, salvo, excepcionalmente, como fiscalizador. 

Princípio da eficiência administrativa 

Entende-se, por fim, que, no caso, os atos jurisdicionais impugnados, ao bloquearem verbas orçamentárias para o pagamento de indenizações trabalhistas, atuaram como obstáculos ao exercício eficiente da gestão pública, subvertendo o planejamento e a ordem de prioridades na execução de projetos sociais do Poder Executivo local, o que caracteriza desrespeito ao princípio da eficiência da Administração Pública (art. 37, caput, da CF/88). 

Tese fixada pelo STF: 

Os recursos públicos vinculados ao orçamento de estatais prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, não podem ser bloqueados ou sequestrados por decisão judicial para pagamento de suas dívidas, em virtude do disposto no art. 100 da CF/88, e dos princípios da legalidade orçamentária (art. 167, VI, da CF/88), da separação dos poderes (arts. 2º, 60, § 4º, III, da CF/88) e da eficiência da administração pública (art. 37, caput, da CF/88). STF. Plenário. ADPF 789/MA, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 20/8/2021 (Info 1026). 

ADPF 

Com base nesse entendimento, o Plenário confirmou a cautelar anteriormente deferida e julgou procedente o pedido formulado em arguição de descumprimento de preceito fundamental para: 

a) suspender as decisões judiciais nas quais se promoveram constrições patrimoniais por bloqueio, penhora, arresto, sequestro; 

b) determinar a sujeição da Empresa Maranhense de Serviços Hospitalares – EMSERH ao regime constitucional de precatórios; e 

c) determinar a imediata devolução das verbas subtraídas dos cofres públicos, e ainda em poder do Judiciário, para as respectivas contas de que foram retiradas. 

Caso correlato: 

Os recursos públicos vinculados ao orçamento de estatais prestadoras de serviço público essencial, em regime não concorrencial e sem intuito lucrativo primário, não podem ser bloqueados ou sequestrados por decisão judicial para pagamento de verbas trabalhistas, em virtude do disposto no art. 100 da CF/1988, e dos princípios da legalidade orçamentária (art. 167, VI, da CF), da separação dos poderes (arts. 2º, 60, § 4º, III, da CF) e da eficiência da administração pública (art. 37, ‘caput’, da CF). STF. Plenário. ADPF 588/PB, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 26/4/2021 (Info 1014).

 

28 de junho de 2021

É possível condenar judicialmente Estado ou Município a investir na saúde os valores mínimos que não foram aplicados em anos anteriores

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/06/info-1017-stf.pdf


DIREITO FINANCEIRO - É possível condenar judicialmente Estado ou Município a investir na saúde os valores mínimos que não foram aplicados em anos anteriores 

É compatível com a Constituição Federal controle judicial a tornar obrigatória a observância, tendo em conta recursos orçamentários destinados à saúde, dos percentuais mínimos previstos no artigo 77 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, considerado período anterior à edição da Lei Complementar nº 141/2012. STF. Plenário. RE 858075/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 14/5/2021 (Repercussão Geral – Tema 818) (Info 1017). 

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: 

O Ministério Público federal ajuizou ação civil pública contra o Município de Nova Iguaçu (RJ) e contra a União, alegando que, no ano de 2003, o Município não aplicou o percentual mínimo de recursos que deveriam ser destinados à saúde, conforme exigido pelo art. 198, § 2º, III, da Constituição, observados os parâmetros do art. 77, § 1º, do ADCT: 

Art. 198 (...) § 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: (...) III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º. 

Art. 77. Até o exercício financeiro de 2004, os recursos mínimos aplicados nas ações e serviços públicos de saúde serão equivalentes: (...) III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, quinze por cento do produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º. (Incluído pela EC 29/2000) § 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que apliquem percentuais inferiores aos fixados nos incisos II e III deverão elevá-los gradualmente, até o exercício financeiro de 2004, reduzida a diferença à razão de, pelo menos, um quinto por ano, sendo que, a partir de 2000, a aplicação será de pelo menos sete por cento. (Incluído pela EC 29/2000) 

O MPF alegou, ainda, que, diante do descumprimento do art. 198, § 2º, III, da CF/88, a União deveria ter deixado de repassar recursos financeiros para o Município. 

Sentença 

O magistrado jugou o pedido procedente para determinar ao Município de Nova Iguaçu que incluísse, no orçamento do exercício financeiro seguinte, os recursos que deixaram de ser investidos na saúde no ano de 2003. Em outras palavras, vamos imaginar que, em 2003, deveriam ter sido investidos R$ 4 milhões na saúde, mas só foram destinados R$ 3 milhões. O juiz determinou que esse R$ 1 milhão que faltou ser aplicado deverá agora ser investido no ano seguinte à publicação da sentença. Vale ressaltar que esse R$ 1 milhão será somado ao valor mínimo que já é destinado normalmente à saúde. O juiz condenou, ainda, a União dizendo que ela não deveria ter repassado as transferências voluntárias ao Município, tendo em vista que ele não cumpriu a aplicação mínima de recursos na área de saúde. 

Recurso extraordinário 

Após o esgotamento das instâncias ordinárias, foi interposto extraordinário dirigido ao STF. O Município sustentou a tese de que: 

- em 2003, ainda não havia sido editada nenhuma lei ou ato normativo prevendo a sanção aplicável pelo descumprimento do mínimo constitucional para a saúde; 

- a definição das sanções e do momento de sua aplicação somente surgiu com a Lei Complementar federal nº 141/2012, editada em cumprimento ao art. 198, § 3º, IV, da CF/88; 

- logo, o juiz não poderia ter proferido essa condenação, já que os fatos são anteriores à LC 141/2012. 

A União afirmou também que, naquela época, não havia norma autorizando que ela retivesse as transferências voluntárias devidas ao Município pelo simples fato de o referido ente local não ter aplicado o percentual mínimo de recursos na saúde. 

O argumento da União foi acolhido pelo STF? 

SIM. No ano de 2003, ainda não havia sido editada regra que estabelecesse a sanção aplicável pelo descumprimento do mínimo constitucional e regulasse o seu procedimento de aplicação. O art. 160, parágrafo único, II, da Constituição, incluído pela EC nº 29/2000, previu a possibilidade de União e Estados condicionarem a entrega dos recursos indicados nos arts. 158 e 159 ao cumprimento do art. 198, § 2º, II e III, mas não determinou que essa fosse a consequência direta e imediata do desrespeito aos percentuais mínimos: 

Art. 160. É vedada a retenção ou qualquer restrição à entrega e ao emprego dos recursos atribuídos, nesta seção, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, neles compreendidos adicionais e acréscimos relativos a impostos. Parágrafo único. A vedação prevista neste artigo não impede a União e os Estados de condicionarem a entrega de recursos: (...) II – ao cumprimento do disposto no art. 198, § 2º, incisos II e III. 

Assim, o STF entende que, antes do advento da LC 141/2012, não se pode aplicar a sanção de restrição de transferência voluntária federal a Município ou Estado-membro em razão do descumprimento do percentual mínimo de gastos em saúde: STF. Plenário. ACO 2075 AgR, Rel. Dias Toffoli, julgado em 27/04/2018. 

Por outro lado, a alegação do Município foi aceita pelo STF? 

NÃO. A regra instituidora da sanção imputável ao ente federativo que descumpre o mínimo constitucional só sobreveio com a edição dos arts. 25 e 26 da LC 141/2012, mas a exigência de aplicação de um percentual mínimo em ações e serviços públicos de saúde decorre diretamente da Constituição, desde a edição da EC 29/2000. O art. 77, III e § 1º, do ADCT indica expressamente os percentuais mínimos a serem observados pelos Municípios desde o ano 2000, deixando claro o caráter autoaplicável da previsão, que deveria ser obedecida desde a sua promulgação. Assim, embora não se possa obrigar a União a restringir a entrega de recursos financeiros ao Municípioréu, é plenamente exigível desse último a compensação da diferença que deixou de ser aplicada em ações e serviços de saúde no ano de 2003. A condenação da União é impossível porque, à época dos fatos submetidos a julgamento, não havia lei que condicionasse a realização das transferências constitucionais determinadas nos arts. 158 e 159 ao cumprimento dos percentuais mínimos de gasto em saúde. Da mesma forma, não há previsão que condicione a transferência de receitas tributárias ao cumprimento de decisões judiciais. Por outro lado, desde a promulgação da EC nº 29/2000 há norma autoaplicável que exige dos Municípios a aplicação de um percentual mínimo em ações e serviços de saúde. Desse modo, tal providência é passível de ser exigida do Município-réu pelo Poder Judiciário, com o emprego dos meios coercitivos típicos para cumprimento de decisões judiciais. 

Em suma: É compatível com a Constituição Federal controle judicial a tornar obrigatória a observância, tendo em conta recursos orçamentários destinados à saúde, dos percentuais mínimos previstos no artigo 77 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, considerado período anterior à edição da Lei Complementar nº 141/2012. O controle judicial da exigência de aplicação de um percentual mínimo de recursos orçamentários em ações e serviços públicos de saúde, previsto no art. 77 do ADCT, é compatível com a Constituição Federal desde a edição da EC 29/2000. STF. Plenário. RE 858075/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 14/5/2021 (Repercussão Geral – Tema 818) (Info 1017).

10 de maio de 2021

DIREITO FINANCEIRO - Se o Estado-membro utiliza em outras áreas determinadas verbas que deveriam aplicadas na saúde, ele deverá ser condenado a aplicar agora a integralidade da quantia na saúde

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-692-stj.pdf 


DIREITO FINANCEIRO - Se o Estado-membro utiliza em outras áreas determinadas verbas que deveriam aplicadas na saúde, ele deverá ser condenado a aplicar agora a integralidade da quantia na saúde 

O Estado-membro que desrespeita o mínimo constitucional que deve ser aplicado na saúde, realocando recurso em programa diverso, deve devolvê-lo à sua área de origem em sua totalidade. STJ. 2ª Turma. REsp 1.752.162/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 13/04/2021 (Info 692). 

A situação concreta foi a seguinte: 

O § 2º do art. 198 da CF/88 prevê percentuais mínimos que os entes públicos deverão aplicar na saúde: 

Art. 198 (...) 

§ 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: (...) 

II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; (...) 

O § 3º, por sua vez, determina que seja editada uma lei complementar federal estabelecendo algumas regras sobre o custeio do SUS. Uma das regras que deve ser estabelecida são os percentuais que deverão ser investidos pelos Estados e DF na saúde. Isso foi determinado pelo inciso I do § 3º do art. 198: 

Art. 198 (...) § 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos a cada cinco anos, estabelecerá: I - os percentuais de que tratam os incisos II e III do § 2º; (...) 

No ano de 2005, o Estado do Rio de Janeiro não aplicou e descumpriu o mínimo constitucional que deveria ser aplicado na saúde, utilizando o dinheiro para outros gastos. Diante disso, o Ministério Público federal ajuizou, na Justiça Federal, ação civil pública objetivando a condenação de Estado-membro a reparar integralmente o dano causado pela não alocação do mínimo constitucional de recursos na área de saúde. O Tribunal Regional Federal da 2ª Região reconheceu que, de fato, o governo não aplicou os valores devidos na saúde, mas afirmou que o orçamento do ano 2005 já era um fato pretérito e consumado. Logo, seria inviável o desfazimento ou a retificação daquele orçamento. Também não seria possível a modificação de futuras dotações orçamentárias. Em compensação, o TRF2 condenou o Estado a indenizar o Fundo Nacional de Saúde pelo dano causado com a não alocação dos recursos na área de saúde, fixando a verba indenizatória em R$ 18 milhões, correspondente a 10% (dez por cento) da verba apurada como não aplicada em programas e ações de saúde. O TRF2 considerou que não seria razoável condenar o Estado a investir todo o valor “desviado” da saúde (R$ 183 milhões) porque essa quantia foi aplicada em benefício da população, no entanto, em outras áreas de interesse público. Logo, para ao TRF2 não fazia sentido condenar o Estado a investir agora esse valor na saúde. O Ministério Público federal interpôs recurso especial. 

O STJ concordou com o acórdão do TRF2? 

NÃO. O STJ afirmou que, como o Estado do Rio de Janeiro não aplicou o mínimo constitucional que deve ser utilizado na saúde, utilizando os recursos em programa diverso, ele deverá devolver a quantia à sua área de origem (saúde) na totalidade. Isso significa que, se deixou de aplicar R$ 183 milhões que pertenciam à saúde, deverá ser condenado a investir esse valor agora na saúde. Considerando o efetivo desvio de verba orçamentária destinada exclusivamente à saúde, a sua aplicação em outras áreas de serviço público não pode servir de argumento para a redução do quantum, até porque as condições de serviço público oferecido à população, notadamente no setor de saúde, notoriamente se encontram extremamente precárias. Assim, se determinado valor deveria, por força de norma constitucional, ter sido aplicado na saúde, e o Estado alocou-o em programas diversos, a devolução de tal valor à sua área de origem, em sua totalidade, deve ser efetivada como forma de restaurar a ordem pública. A cominação de uma espécie de multa de 10% sobre o montante desviado revela-se em efetiva dissonância da legislação pátria em vigor, que prevê sempre quantum indenizatório equivalente ao prejuízo apurado em cada hipótese concreta, conforme se infere do art. 944 do Código Civil: 

Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano. 

Em suma: O Estado-membro que desrespeita o mínimo constitucional que deve ser aplicado na saúde, realocando recurso em programa diverso, deve devolvê-lo à sua área de origem em sua totalidade. STJ. 2ª Turma. REsp 1.752.162/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 13/04/2021 (Info 692).