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6 de janeiro de 2022

É intransmissível ao cônjuge sobrevivente a pretensão de ver declarada a existência de relação avoenga com o de cujus

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-713-stj.pdf


PARENTESCO É intransmissível ao cônjuge sobrevivente a pretensão de ver declarada a existência de relação avoenga com o de cujus 

É intransmissível ao cônjuge sobrevivente a pretensão de ver declarada a existência de relação avoenga com o de cujus. A impossibilidade do julgamento do pedido declaratório de relação avoenga não acarreta, necessariamente, a impossibilidade do julgamento do pedido de petição de herança. STJ. 3ª Turma. REsp 1.868.188-GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/09/2021 (Info 713). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Francisca foi criada, desde os 3 anos de idade, por João e Maria, que a tratavam como se fosse filha, apesar de não haver nenhum vínculo biológico entre eles. Muitos anos se passaram, Francisca cresceu e se casou com Pedro. Dessa relação nasceu Júlia. Anos mais tarde, Júlia, já adulta, se casou com Eduardo. Francisca faleceu em virtude de um ataque cardíaco. Alguns meses após a morte de Francisca, Júlia ajuizou ação pedindo que ficasse declarada a relação avoenga com relação a João e Maria. Em outras palavras, a autora pediu que sua falecida mãe (Francisca) fosse reconhecida, post mortem, como filha socioafetiva de João e Maria e que, consequentemente, ela (Júlia) fosse reconhecida como neta (relação avoenga). Antes que a sentença fosse prolatada, Júlia morreu. Eduardo (esposo e único herdeiro de Júlia) peticiona nos autos pedindo para suceder a autor e que a ação declaratória persista e seja julgada. 

O pedido de Eduardo pode ser acolhido? NÃO. 

É intransmissível ao cônjuge sobrevivente a pretensão de ver declarada a existência de relação avoenga com o de cujus. STJ. 3ª Turma. REsp 1.868.188-GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/09/2021 (Info 713). 

Vamos entender com calma. 

As ações podem ser transmitidas? 

SIM. Aliás, a transmissibilidade das ações em sentido amplo (lato sensu) é a regra no sistema jurídico brasileiro. Nesse sentido, veja o que diz o art. 485, IX, do CPC: 

Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (...) IX - em caso de morte da parte, a ação for considerada intransmissível por disposição legal; e 

No caso de ações de estado, contudo, a regra é diferente, sendo mais restritiva e excepcional. 

Isso significa dizer que as ações de estado, em que se veiculam pretensão personalíssima, são sempre intransmissíveis? 

NÃO. Nem sempre. Não é correto afirmar que a ação de estado, em que se veicula pretensão personalíssima, seja, sempre e obrigatoriamente, processualmente intransmissível aos herdeiros do falecido. A doutrina afirma que existe a intransmissibilidade absoluta e a relativa. No caso de intransmissibilidade relativa, os direitos personalíssimos (ou apenas as suas repercussões econômicas ou patrimoniais) podem, mediante autorização legal, ser transmitidas aos herdeiros. 

No caso concreto, Eduardo (o marido e herdeiro) afirmou que poderia continuar a ação com base no art. 1.606, parágrafo único, do Código Civil? O STJ concordou com esse argumento? 

NÃO. Veja o que diz esse dispositivo: 

Art. 1.606. A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz. Parágrafo único. Se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá-la, salvo se julgado extinto o processo. 

Não é admissível a interpretação extensiva do art. 1.606, parágrafo único, do CC/2002, segundo o qual “se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá-la...”, a fim de que também às ações iniciadas pelos netos ou para outros descendentes em linha reta sejam igualmente transmissíveis aos herdeiros. Isso porque, conforme já dito, nas ações de estado, a regra é a intransmissibilidade. Diante desse cenário, o pedido de declaração da existência de relação avoenga efetivamente perdeu seu objeto pela superveniente ilegitimidade ad causam que decorre da intransmissibilidade legal da referida pretensão ao cônjuge sobrevivente da autora, devendo, quanto ao ponto, ser aplicada a regra do art. 485, IX, do CPC/2015. 

Voltando ao nosso exemplo acima: 

Na mesma ação, além do pedido declaratória da relação avoenga, Júlia formulou também petição de herança em face de João e Maria. Ação de petição de herança é aquela proposta por alguém que quer ser reconhecido como herdeiro do falecido e, como via de consequência, ter direito à herança (no todo ou em parte). Petição = pedido. Logo petição de herança significa pedir a herança. Trata-se de ação para que um herdeiro preterido possa reivindicar a totalidade ou parte do acervo hereditário, sendo movida contra o detentor da herança, com o objetivo de que seja realizada nova partilha dos bens. 

Ex1: mulher vivia em união estável com o morto, mas isso não estava oficializado e os filhos do defunto não a reconhecem como sua companheira. Ela poderá ajuizar ação de reconhecimento de união estável post mortem cumulada com petição de herança. 

Ex2: filho não reconhecido pelo morto poderá ajuizar ação de reconhecimento de paternidade post mortem cumulada com petição de herança. A petição de herança está prevista nos arts. 1.824 a 1.828 do CC: 

Art. 1.824. O herdeiro pode, em ação de petição de herança, demandar o reconhecimento de seu direito sucessório, para obter a restituição da herança, ou de parte dela, contra quem, na qualidade de herdeiro, ou mesmo sem título, a possua. 

Considerando as particularidades do caso acima, a impossibilidade de julgamento do pedido de declaração da relação avoenga por intransmissibilidade da ação impede o juiz de examinar o pedido de petição de herança? NÃO. 

A impossibilidade do julgamento do pedido declaratório de relação avoenga não acarreta, necessariamente, a impossibilidade do julgamento do pedido de petição de herança. STJ. 3ª Turma. REsp 1.868.188-GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/09/2021 (Info 713). 

Assim, o pedido de petição de herança, formulado por suposta neta, que vem a falecer no curso do processo declaratório de relação avoenga, não deve ser declarado intransmissível. A petição de herança, na medida em que se trata de ação real, universal e condenatória, pode ser transmitida pelo espólio ou herdeiros na hipótese de falecimento de seu autor. A esse respeito, aliás, basta verificar que se a relação avoenga houvesse sido reconhecida previamente ao ajuizamento da petição de herança, não existiria absolutamente nenhum óbice para que ela prosseguisse, após a morte da neta, mediante ingresso de seu cônjuge sobrevivente, na qualidade de seu sucessor processual. Registra-se que a existência do vínculo de parentesco é logicamente antecedente e efetivamente subordinante da resolução de mérito da petição de herança, de modo que, ausente o vínculo, será naturalmente improcedente a petição de herança, ao passo que existente o vínculo, poderá ser procedente a petição de herança se presentes os seus demais requisitos ensejadores (como, por exemplo, viabilidade temporal do pedido (ausência de prescrição), existência de herança, etc.). Na hipótese, o fato de ter havido a formulação cumulativa de pedido de declaração da relação avoenga e de pedido de petição de herança não retira a qualificação daquela como uma questão prejudicial, razão pela qual a impossibilidade de julgamento do pedido de declaração da relação avoenga por intransmissibilidade da ação (em caráter principal ou principaliter tantum) não pode impedir o exame dessa questão como fundamento da decisão da petição de herança (em caráter incidental ou incidenter tantum).

19 de outubro de 2021

É intransmissível ao cônjuge sobrevivente a pretensão de ver declarada a existência de relação avoenga com o de cujus

Processo

REsp 1.868.188-GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 28/09/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Relação avoenga. Ação declaratória. Falecimento da autora. Cônjuge supérstite. Sucessão processual. Ilegitimidade. Direito personalíssimo.

 

DESTAQUE

É intransmissível ao cônjuge sobrevivente a pretensão de ver declarada a existência de relação avoenga com o de cujus.


INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

De início, não é correto afirmar que a ação de estado, em que se veicula pretensão personalíssima, seja, sempre e obrigatoriamente, processualmente intransmissível aos herdeiros do falecido.

Com efeito, a doutrina bem diferencia as intransmissibilidades absolutas das relativas, sendo que, nessas últimas, os direitos personalíssimos (ou apenas as suas repercussões econômicas ou patrimoniais) são, mediante autorização legal, suscetíveis de transmissão e de defesa pelos herdeiros.

As regras jurídicas contidas no art. 1.606, caput e parágrafo único, do CC/2002, bem demonstram, pois, a possibilidade de uma ação de estado, de natureza personalíssima, ser transmissível aos herdeiros.

A despeito de a transmissibilidade das ações lato sensu ser a regra no sistema jurídico brasileiro (não por acaso, aliás, o art. 485, IX, do CPC/2015, afirma que ela não se dará apenas "por disposição legal"), não se pode olvidar que a transmissibilidade das ações de estado, especificamente, deve ser orientada por regra distinta, mais restritiva e excepcional, quer seja diante da veiculação de pretensões personalíssimas e que somente interessem ao sujeito que as intentou, quer seja para evitar a contínua judicialização das relações familiares, por infindáveis gerações.

Por esse motivo é que, respeitadas as posições em sentido contrário, não é admissível a interpretação extensiva do art. 1.606, parágrafo único, do CC/2002, segundo o qual "se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá-la...", a fim de que também às ações iniciadas pelos netos ou para outros descendentes em linha reta sejam igualmente transmissíveis aos herdeiros.

Diante desse cenário, o pedido de declaração da existência de relação avoenga efetivamente perdeu seu objeto pela superveniente ilegitimidade ad causam que decorre da intransmissibilidade legal da referida pretensão ao cônjuge sobrevivente da autora, devendo, quanto ao ponto, ser aplicada a regra do art. 485, IX, do CPC/2015.