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5 de janeiro de 2022

O histórico infracional é suficiente para afastar a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006?

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-712-stj.pdf


LEI DE DROGAS (TRÁFICO PRIVILEGIADO) O histórico infracional é suficiente para afastar a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006? 

O histórico de ato infracional pode ser considerado para afastar a minorante do art. 33, § 4.º, da Lei nº 11.343/2006, por meio de fundamentação idônea que aponte a existência de circunstâncias excepcionais, nas quais se verifique a gravidade de atos pretéritos, devidamente documentados nos autos, bem como a razoável proximidade temporal com o crime em apuração. STJ. 3ª Turma. EREsp 1.916.596-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Rel. Acd. Min. Laurita Vaz, julgado em 08/09/2021 (Info 712). O STF possui a mesma posição? Para o STF, a existência de atos infracionais pode servir para afastar o benefício do § 4º do art. 33 da LD? 1ª Turma do STF: SIM. RHC 190434 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 23/08/2021. 2ª Turma do STF: NÃO. STF. 2ª Turma. HC 202574 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 17/08/2021. 

Tráfico privilegiado (art. 33, § 4º da Lei nº 11.343/2006) 

A Lei de Drogas prevê, em seu art. 33, § 4º, a figura do “traficante privilegiado”, também chamada de “traficância menor” ou “traficância eventual”: 

Art. 33 (...) § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. 

Qual é a natureza jurídica deste § 4º? Trata-se de uma causa de diminuição de pena. 

Redução: de 1/6 a 2/3 

O magistrado tem plena autonomia para aplicar a redução no quantum que reputar adequado de acordo com as peculiaridades do caso concreto. Vale ressaltar, no entanto, que essa fixação deve ser suficientemente fundamentada e não pode utilizar os mesmos argumentos adotados em outras fases da dosimetria da pena (STF HC 108387, 06.03.12). Dito de outra forma, não se pode utilizar os mesmos fundamentos para fixar a pena-base acima do mínimo legal e para definir o quantum da redução prevista neste dispositivo, sob pena de bis in idem. 

 (Delegado PC/RS 2018 FUNDATEC) Aquele que pratica conduta de tráfico de drogas, descrita no caput do artigo 33 da referida Lei, pode ter sua pena reduzida nos mesmos patamares propostos no Código Penal para a minorante da tentativa, desde que seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. (errado) 

Jurisprudência em Teses do STJ (ed. 131) Tese 25: Diante da ausência de parâmetros legais, é possível que a fração de redução da causa de diminuição de pena estabelecida no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 seja modulada em razão da qualidade e da quantidade de droga apreendida, além das demais circunstâncias do delito. 

Vedação à conversão em penas restritivas de direitos 

O STF já declarou, de forma incidental, a inconstitucionalidade da expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, constante deste § 4º do art. 33, de modo que é possível, segundo avaliação do caso concreto, a concessão da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, desde que cumpridos os requisitos do art. 44 do CP. 

Requisitos: 

Para ter direito à minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, é necessário o preenchimento de quatro requisitos autônomos: 

a) primariedade; 

b) bons antecedentes; 

c) não dedicação a atividades criminosas; e 

d) não integração à organização criminosa. 

 (Promotor MP/MG 2019) São requisitos para o reconhecimento do tráfico privilegiado que o agente seja primário, de bons antecedentes e boa conduta social, que não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. (errado) 

Se o réu não preencher algum desses requisitos, não terá direito à minorante. São requisitos cumulativos: 

Jurisprudência em Teses do STJ Tese 22: A causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas só pode ser aplicada se todos os requisitos, cumulativamente, estiverem presentes. 

Esse benefício se aplica para quais delitos? 

• Art. 33, caput: tráfico de drogas. 

• Art. 33, § 1º, I: importar, exportar, produzir, adquirir, vender, guardar matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas. 

• Art. 33, § 1º, II: semear, cultivar, fazer a colheita de plantas que são matéria-prima para preparação de drogas. 

• Art. 33, § 1º, III: utilizar local ou bem de sua propriedade, posse, administração guarda ou vigilância, ou consentir que alguém utilize para o tráfico ilícito de drogas. 

• Art. 33, § 1º, IV: vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) 

 (Juiz de Direito TJ-MS 2020 FCC) No que concerne à lei de drogas, cabível a redução da pena de um sexto a dois terços para o agente que tem em depósito, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, desde que primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. (CERTO) 

Tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006) não é crime equiparado a hediondo 

Veja o que diz o § 5º do art. 112 da LEP: 

Art. 112 (...) § 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. (Lei nº 13.964/2019 – Pacote Anticrime) 

 (Juiz Federal TRF2 2017) Presente a causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, por ser o agente primário, de bons antecedentes, não dedicado a atividades criminosas e não integrante de organização criminosa, ainda assim é hediondo o crime de tráfico por ele praticado. (errado) 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

Henrique foi denunciado pela prática de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006). A defesa pediu a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas. O juiz condenou o réu e negou o benefício do art. 33, § 4º sob o argumento de que Henrique já praticou atos infracionais equivalentes ao tráfico na época em que era adolescente. Logo, para o magistrado, está comprovado que o acusado se dedica às atividades criminosas. 

O histórico infracional é suficiente para afastar a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006? SIM. 

O histórico de ato infracional pode ser considerado para afastar a minorante do art. 33, § 4.º, da Lei nº 11.343/2006, por meio de fundamentação idônea que aponte a existência de circunstâncias excepcionais, nas quais se verifique a gravidade de atos pretéritos, devidamente documentados nos autos, bem como a razoável proximidade temporal com o crime em apuração. STJ. 3ª Turma. EREsp 1.916.596-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Rel. Acd. Min. Laurita Vaz, julgado em 08/09/2021 (Info 712). 

O STJ entende que a existência de ato(s) infracional(is) pode ser sopesada para fins de comprovar a dedicação do réu a atividades criminosas e, por conseguinte, de impedir a incidência da causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas. Embora atos infracionais praticados na adolescência não constituam crime na acepção normativa do termo, não há como se olvidar que eles são fatos contrários ao Direito e implicam, sim, consequências jurídicas, inclusive a possibilidade de internação do menor. Quando esse indivíduo completa 18 anos de idade - e, portanto, torna-se imputável -, essa mesma conduta deixa de ser considerada ato infracional e passa a ser, em seu sentido técnico-jurídico, classificada como crime. No entanto, do ponto de vista da essência do fato, não há distinção entre ambos, porque o fato, objetivamente analisado, é o mesmo. Diante de tais considerações, não se vê óbice a que a existência de atos infracionais possa, com base peculiaridades do caso concreto, ser considerada elemento apto a evidenciar a dedicação do acusado a atividades criminosas, até porque esses atos não estarão sendo sopesados para um agravamento da pena do réu, mas para lhe negar a possibilidade de ser beneficiado com uma redução em sua reprimenda. Se a natureza do instituto em análise é justamente tratar com menor rigor o indivíduo que se envolve circunstancialmente com o tráfico de drogas - e que, portanto, não possui maior envolvimento com o narcotráfico ou habitualidade na prática delitiva -, não parece razoável punir um jovem de 18 ou 19 anos de idade, sem nenhum passado criminógeno e sem nenhum registro contra si, da mesma forma e com igual intensidade daquele indivíduo que, quando adolescente, cometeu reiteradas vezes atos infracionais graves ou atos infracionais equivalentes a tráfico de drogas. Se assim fosse feito, estaria havendo uma afronta ao princípio da individualização da pena e do próprio princípio da igualdade. 

Existência de atos infracionais significa que o indivíduo se dedica a atividades criminosas 

É importante esclarecer que o registro da existência de atos infracionais pode afastar o benefício do art. 33, § 4º não por ausência de preenchimento dos dois primeiros requisitos elencados pelo legislador (primariedade e existência de bons antecedentes), mas sim pelo descumprimento do terceiro requisito exigido pela lei, que é a ausência de dedicação do acusado a atividades criminosas. Em outros termos, embora seja evidente que não possamos considerar atos infracionais como antecedentes penais e muito menos como reincidência, não se vê razões para desconsiderar todo o passado de atuação de um adolescente contrário ao Direito para concluir pela sua dedicação a atividades delituosas. Não há impedimento, portanto, a que se considere fatos da vida real para esse fim. Ademais, exigir a existência de prévio cometimento de crime e de prévia imposição de pena para fins de justificar o afastamento do redutor em questão acaba, em última análise, esvaziando o próprio conceito de dedicação a atividades criminosas. Isso porque, se houver trânsito em julgado de condenação por crime praticado anteriormente, então essa condenação anterior já se enquadra ou no conceito de maus antecedentes ou no de reincidência. Assim, considerando que não há palavras inúteis na lei, por certo que o legislador quis abarcar situação diversa ao prever a impossibilidade de concessão do benefício àqueles indivíduos que se dedicam a atividades criminosas. 

Não é todo ato infracional que impede o benefício

 Vale ressaltar que não é todo e qualquer ato infracional praticado pelo acusado quando ainda adolescente que poderá, automaticamente, gerar a negativa de incidência do redutor previsto no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, até porque justiça penal não se faz por atacado e sim artesanalmente, examinando-se atentamente cada caso para dele extraírem-se todas as suas especificidades, de modo a torná-lo singular e, portanto, a merecer providência adequada e necessária. Para que se negue o benefício é necessário que, no caso concreto, se identifique: 1º) se o ato infracional foi grave; 2º) se o ato infracional está documentado nos autos, de sorte a não pairar dúvidas sobre o reconhecimento judicial de sua ocorrência; 3º) a distância temporal entre o ato infracional e o crime que deu origem ao processo no qual se está a decidir sobre a possibilidade de incidência ou não do redutor, ou seja, se o ato infracional não está muito distante no tempo. 

O STF possui a mesma posição? Para o STF, a existência de atos infracionais pode servir para afastar o benefício do § 4º do art. 33 da LD? 

O STF está dividido: 

1ª Turma do STF: SIM 

(...) Tráfico de drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/06). Condenação. Dosimetria. Aplicação do redutor de pena do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas. Utilização da prática de atos infracionais para se afastar a causa de diminuição. Possibilidade. Precedentes. Agravo regimental não provido. STF. 1ª Turma. RHC 190434 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 23/08/2021. 

2ª Turma do STF: NÃO 

(...) 2. A causa de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006 é aplicada desde que o agente seja primário, possua bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. 3. Na linha dos precedentes desta Colenda Turma, a menção a atos infracionais praticados pelo agente não consiste fundamentação idônea para afastar a minorante em exame. Esse entendimento está em consonância com sistema de proteção integral assegurado a crianças e adolescentes por nosso ordenamento jurídico. (...) STF. 2ª Turma. HC 202574 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 17/08/2021. 

Cuidado com o seguinte tema correlato: 

Não se pode negar a aplicação da causa de diminuição pelo tráfico privilegiado, prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, com fundamento no fato de o réu responder a inquéritos policiais ou processos criminais em andamento, mesmo que estejam em fase recursal, sob pena de violação ao art. 5º, LIV (princípio da presunção de não culpabilidade). Não cabe afastar a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) com base em condenações não alcançadas pela preclusão maior (coisa julgada). Informativo comentado Informativo 712-STJ (11/10/2021) – Márcio André Lopes Cavalcante | 25 STF. 1ª Turma. HC 166385/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 14/4/2020 (Info 973). STF. 2ª Turma. RE 1.283.996 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 11/11/2020. STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 676.516/SC, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 19/10/2021. STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1936058/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 14/09/2021