Mostrando postagens com marcador Litisconsórcio Necessário. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Litisconsórcio Necessário. Mostrar todas as postagens

24 de agosto de 2021

Filigrana doutrinária: Cândido Rangel Dinamarco - Litisconsórcios Necessário e Unitário

 “Litisconsórcio unitário e litisconsórcio necessário são dois fenômenos distintos, quanto ao ponto-de-vista em que se coloca a problemática referente a cada um deles: lá, trata-se de julgamento homogêneo que deve ser dispensado àqueles que estão no processo como litisconsortes; aqui, da exigência de que no processo estejam certas pessoas coligadas na condição de autores ou de réus. Ambos, porém, são expressões de uma só ideia, qual seja a inadmissibilidade de cindir determinada relação jurídica, pretendendo inutilmente ditar uma solução endereçada a certa pessoa, sem ditar a mesma solução com vistas a outra. (...) se a relação posta em juízo for incindível, então não se admitirão julgamentos discrepantes e, por força da regra geral contida no art. 47 [CPC/73], também necessário será o litisconsórcio.” 

DINAMARCO, Cândido Rangel. Litisconsórcio: um estudo sobre o litisconsórcio comum, unitário, necessário, facultativo (doutrina e jurisprudência). São Paulo: RT, 1984. - pp 112 e 116- 117. 

Controvérsia acerca da necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com proprietários do imóvel em ação de demolição de obras realizadas no imóvel

RECURSO ESPECIAL Nº 1.721.472 - DF (2018/0022817-0) 

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO 

EMENTA 

RECURSO ESPECIAL E AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE VIZINHANÇA. 1. RECURSO ESPECIAL DO TERCEIRO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER CUMULADA COM AÇÃO DEMOLITÓRIA E DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONFLITO DE INTERESSES ENTRE PROPRIETÁRIOS DE IMÓVEIS LIMÍTROFES. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA. BARULHO EXCESSIVO. POLUIÇÃO SONORA CONFIGURADA. CONSTRUÇÃO DE TERRAÇO E CHURRASQUEIRA EM DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO CIVIL. 

1.1. Ação de obrigação de não fazer cumulada com ação demolitória oriunda da construção de terraço para realização de festas, sem alvará ou autorização da administração pública, sem obediência à distância mínima de afastamento lateral imposta pelo Código Civil (art. 1.301 do CC), e com visão oblíqua para o interior do imóvel limítrofe, tendo sido a demanda julgada procedente, com determinação de sua demolição (arts. 1.302 e 1312 do Código Civil). 

1.2. Controvérsia acerca da necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com proprietários do imóvel em ação de demolição de obras realizadas no imóvel. 

1.3. Caso em que a diminuição do patrimônio do recorrente é consequência natural da efetivação da decisão judicial que impôs a obrigação de demolir as benfeitorias e acessões erigidas ilicitamente. 

1.4. Na condição de coproprietário, o recorrente sofrerá os efeitos da sentença, o que não é suficiente para caracterizar o litisconsórcio necessário, até porque o direito de propriedade permanecerá intocado. 

1.5. Trata-se de efeito reflexo da sentença, o que, a depender da intensidade, justifica o ingresso de terceiro no processo, como interessado, mas sem imposição de litisconsórcio passivo. 

1.5. RECURSO ESPECIAL DE JULIO CESAR PEREIRA RIBEIRO DESPROVIDO. 

2. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DOS DEMANDADOS. ALEGAÇÃO DE NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. FUNDAMENTAÇÃO RECURSAL DEFICIENTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF. DISPOSITIVO LEGAL QUE NÃO CONTÉM COMANDO SUFICIENTE PARA INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO, BEM COMO AMPARAR A TESE RECURSAL. SÚMULA 284/STF. REVOLVIMENTO DO SUPORTE FÁTICO PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA 07/STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. 

2.2. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DE JOSÉ DE ANCHIETA FIGUEIRESO DA SILVA E FRANCISCA IZINEU RIBEIRO SANTIAGO DESPROVIDO. 

3. RECURSO ESPECIAL E AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DESPROVIDOS. 

ACÓRDÃO 

Prosseguindo no julgamento, após a vista regimental do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial de Júlio César Pereira Ribeiro e negou provimento ao agravo em recurso especial de Francisca Izinei Ribeiro Santiago e José de Anchieta Figueiredo da Silva, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília (DF), 15 de junho de 2021(Data do Julgamento) 

MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO Relator 

RELATÓRIO 

Trata-se de recurso especial interposto por JULIO CESAR PEREIRA RIBEIRO e agravo em recurso especial interposto por JOSÉ DE ANCHIETA FIGUEIREDO DA SILVA e FRANCISCA IZINEI RIBIEIRO SANTIAGO. 

O acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios está assim ementado (fl. 609/611): 

APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER CUMULADA COM AÇÃO DEMOLITÓRIA E DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. DIREITO DE VIZINHANÇA. AÇÃO DEMOLITÓRIA. NATUREZA JURÍDICA. DIREITO PESSOAL. DISPENSA DA FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO. CONFLITO DE INTERESSES ENTRE PROPRIETÁRIOS DE IMÓVEIS LIMÍTROFES. BARULHO EXCESSIVO. POLUIÇÃO SONORA CONFIGURADA. CONSTRUÇÃO DE TERRAÇO E CHURRASQUEIRA EM DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO CIVIL. USO ANORMAL DA PROPRIEDADE. INTERFERÊNCIAS PREJUDICIAIS À SEGURANÇA, SOSSEGO E SAÚDE DOS MORADORES DO IMÓVEL VIZINHO. DIREITO DE ELIMINAÇÃO OU REDUÇÃO DOS DANOS AO PROPRIETÁRIO PREJUDICADO. IMPOSIÇÃO DE LIMITAÇÃO DO BARULHO. DEMOLIÇÃO DA CONSTRUÇÃO IRREGULAR. COMPENSAÇÃO DOS DANOS MORAIS CAUSADOS. QUANTUM FIXADO COM PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ARBITRADOS EM PERCENTUAL MODERADO E ADEQUADO. SENTENÇA MANTIDA. 

1. O direito de vizinhança, tratado em capítulo próprio do Código Civil (arts. 1277 a 1313), representa verdadeira limitação do uso e gozo da propriedade por parte de proprietários e possuidores de "prédios vizinhos", impondo, a todos, sacrifícios no exercício de seus direitos em prol de uma harmônica convivência social e respeito mútuo das propriedades. 

2. A Ação Demolitória é de direito pessoal, pois embora diga respeito a bem imóvel, não discute qualquer controvérsia acerca dos direitos reais ostentados pela parte requerida, cuidando, tão somente, de solucionar os conflitos surgidos do direito de construir com as limitações impostas pelo direito de vizinhança. 

3. Cuidando a Ação Demolitória de direito pessoal, dispensa-se a formação de litisconsórcio passivo por meio da citação de cônjuges, herdeiros e demais proprietários do imóvel. Rejeitado o pedido de declaração de nulidade da ação por falta de formação de litisconsórcio passivo necessário. 

4. Configurado o uso anormal da propriedade por um dos vizinhos, consistente na realização de festas e reuniões sociais frequentes em sua residência, durante o período de descanso noturno, com barulho e música superando os limites toleráveis para área residencial, impõe-se a adoção de medidas judiciais a fim de evitar a insegurança, desassossego e risco à saúde daqueles que habitam no imóvel vizinho, nos exatos termos do art. 1.277 do Código Civil. 

5. A construção de terraço para realização de festas, em total afronta à legislação civil e às disposições normativas acerca da matéria, sem alvará ou autorização da administração pública, sem obediência à distância mínima de afastamento lateral imposta pelo Código Civil (art. 1.301 do CC), e com visão oblíqua para o interior do imóvel limítrofe, impõe-se a determinação de sua imediata demolição, nos exatos termos do que garante os arts. 1.302 e 1312 do Código Civil. 

6. O valor fixado a título de compensação por danos morais, em que pese a falta de critérios objetivos, deve ser pautado pela proporcionalidade e razoabilidade, além de servir como forma de compensação ao dano sofrido e de possuir caráter inibidor da conduta praticada. Demonstrado que o valor da compensação foi bem fixado pelo juiz sentenciante, não há que se falar em provimento da apelação a fim de majorar essa verba pecuniária. 

7. Havendo condenação, os honorários devem ser arbitrados na margem entre 10% e 20% do valor da condenação, sob a luz dos critérios do §3° do artigo 20 do CPC/1973 (vigente à epoca), de sorte que, sendo razoável o percentual arbitrado, não merece qualquer alteração a margem fixada. 

8. Apelação da autora conhecida e não provida. Apelação dos réus conhecida, agravo retido não provido, preliminar rejeitada, e, no mérito, não provida. 

Consta dos autos que ANDRÉA STEFANI PEIXOTO DA SILVA ajuizou ação de obrigação de não fazer em desfavor de JOSÉ DE ANCHIETA FIGUEIREDO DA SILVA e FRANCISCA IZINEI RIBEIRO SANTIAGO. 

O juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente a demanda para condenar os réus (I) a se absterem de realizar qualquer atividade apta a produzir barulho que ultrapasse os limites permitidos pela legislação distrital para área residencial, seja durante o dia ou à noite, especialmente em razão de festas ou reuniões, arbitrando multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) para cada descumprimento, até o limite de R$300.000,00 (trezentos mil reais); (II) a demolir as obras realizadas, eliminando o terraço e também a churrasqueira, no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da sentença, sob pena de multa diária a ser estabelecida pelo juízo; (III) ao pagamento de danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), acrescidos de correção e juros de mora, a partir da data de publicação da sentença, e dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação. 

Irresignadas, as partes interpuseram recurso de apelação. 

O Tribunal negou provimento aos apelos das partes, mantendo a sentença, conforme a ementa acima transcrita. 

Opostos embargos de declaração por JÚLIO CÉSAR PEREIRA RIBEIRO, na qualidade de terceiro prejudicado, foram parcialmente acolhidos, sem alteração do julgado, nos seguintes termos (fls. 767/768): 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER CUMULADA COM AÇÃO DEMOLITÓRIA. DIREITO DE VIZINHANÇA. ACÓRDÃO. OMISSÃO QUANTO À ADMISSÃO DE TERCEIRO COMO ASSISTENTE SIMPLES DOS RÉUS. VÍCIO EXISTENTE. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO ACERCA DE PRETENSA NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO CONFIGURAÇÃO. JULGAMENTO QUE CONTRARIA A TESE DEFENDIDA PELA PARTE. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE. MERO INCONFORMISMO. 1. Os embargos de declaração são cabíveis quando o acórdão estiver eivado de omissão, contradição ou obscuridade e quando houver necessidade de se corrigir erro material, casos em que, em caráter excepcional, admite-se a modificação do julgado (art. 1.022 do Código de Processo Civil). 2. Nos termos do artigo 119 do Código de Processo Civil/2015 (art. 50 do Código de Processo Civil/1973), "pendendo causa entre 2 (duas) ou mais pessoas, o terceiro juridicamente interessado em que a sentença seja favorável a uma delas poderá intervir no processo para assisti-la". Assim, a intervenção de terceiro, na modalidade de assistência simples, exige, para sua admissão, a demonstração de existência de interesse jurídico do requerente. 3. Intervindo terceiro interessado na fase recursal e uma vez preenchido o requisito legal para a assistência, deve a omissão do acórdão acerca dessa matéria ser suprida por meio de embargos de declaração, a fim de declarar de forma expressa a admissão do terceiro interveniente como assistente simples no processo. 4. Apreciados os temas discutidos no processo e lançados os fundamentos que embasaram a decisão acerca da desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário em ação demolitória, não há que se falar em omissão ou contradição no julgado que justifique o acolhimento dos embargos de declaração por divergir das teses apresentadas pela parte. 5. Embargos de declaração conhecidos e parcialmente providos, sem efeitos infringentes. 

Opostos embargos de declaração pelos requeridos JOSE DE ANCHIETA FIGUEIREDO DA SILVA e FRANCISCA IZINEI RIBEIRO SANTIAGO, foram rejeitados (fl. 781): 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER CUMULADA COM AÇÃO DEMOLITÓRIA. DIREITO DE VIZINHANÇA. OMISSÕES E CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO PROFERIDO. NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE VÍCIOS INTEGRATIVOS (CPC, ART. 1.022). JULGAMENTO QUE CONTRARIA A TESE DEFENDIDA PELA PARTE. REDISCUSSÃO. IMPOSSIBILIDADE. MERO INCONFORMISMO. 1.0s embargos de declaração são cabíveis quando o acórdão estiver eivado de omissão, contradição ou obscuridade e quando houver necessidade de se corrigir erro material, casos em que, em caráter excepcional, admite-se a modificação do julgado (art. 1.022 do Código de Processo Civil). 2. Apreciados os temas discutidos no processo e lançados os fundamentos que embasaram a decisão de demolição da construção, erigida em desacordo com do Código Civil e com as normas civis pertinentes, não há que se falar em omissão ou contradição no julgado que justifique o acolhimento dos embargos de declaração por divergir das teses apresentadas pela parte. 3.Embargos de declaração conhecidos e não providos. 

No recurso especial de fls. 731/744, interposto com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, FRANCISCA MINEI RIBEIRO SANTIAGO E JOSÉ DE ANCHIETA FIGUEIREDO DA SILVA alegaram, além do dissídio jurisprudencial, ofensa aos seguintes dispositivos: (I) art. 1.022 do CPC, sustentando a negativa de prestação jurisdicional; (II) art. 3º do CPC/73 (17 do CPC), afirmando a ausência de legitimidade passiva dos requeridos para responderem sobre questão de direito que não lhe pertence, em ação cuja natureza subjetiva é de direito real; (III) art. 1.032 do Código Civil, aduzindo (a) a decadência do direito de vindicar a demolição dos melhoramentos internos realizados no imóvel, que pode ser reconhecida de ofício e em qualquer grau de jurisdição, (b) estar comprovado que a data de conclusão das obras ocorreu em 2006 e 2007, conforme constam das fotografias juntadas aos autos, tendo se ultrapassado o prazo de ano e dia, pois a ação foi ajuizada somente em 2009. 

No recurso especial de fls. 815/837, interposto por JÚLIO CESAR PEREIRA RIBEIRO com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, o recorrente apontou ofensa aos seguintes dispositivos: (I) arts. 489, §1º, inciso VI e 1.022 do CPC, sustentando a negativa de prestação jurisdicional; (II) arts. 114, 115, I, e 276 do CPC, aduzindo (a) ter sido admitido na lide apenas na qualidade de assistente simples, mesmo que, na qualidade de coproprietário do imóvel objeto da ação demolitória, tem interesse direto no resultado da lide; (b) a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário em ação real demolitória; (c) ter ficado demonstrado "tratar-se de ação de natureza de direito real e, como tal, a citação de condômino para integrar a relação processual na qualidade de litisconsorte necessário é condição sine qua non para o desenvolvimento válido do processo" (fl. 825). Apontou, ainda, dissídio jurisprudencial. 

Houve apresentação de contrarrazões pela autora (fls. 864/872 e 873/884), requerendo a condenação dos recorrentes ao pagamento de multa por litigância de má-fé. 

O primeiro recurso especial foi inadmitido pelo TJDFT, que afastou a negativa de prestação jurisdicional, aplicou os óbices da Súmulas 07 e 83/STJ, além de não reconhecer o dissenso pretoriano (fls. 886/893). 

 Irresignados, os recorrentes apresentaram agravo em recurso especial (fls. 898/913) postulando o conhecimento e o provimento do recurso especial. 

Nas petições de fls. 954/958 e 959/962, a autora refere que FRANCISCA MINEI RIBEIRO SANTIAGO E JOSÉ DE ANCHIETA FIGUEIREDO DA SILVA teriam interposto agravo nos próprios autos, configurando erro grosseiro, não podendo ter sido sequer conhecido na origem. Postula da denegação do recurso especial. 

É o relatório. 

VOTO 

Eminentes colegas, passo à análise de cada recurso em separado, iniciando pelo recurso especial do terceiro interessado. 

1) RECURSO ESPECIAL DE JÚLIO CESAR PEREIRA RIBEIRO: 

O recurso especial não comporta provimento. 

Não há nulidade por omissão, tampouco negativa de prestação jurisdicional, no acórdão que decide de modo integral e com fundamentação suficiente a controvérsia. O Tribunal de origem julgou com fundamentação suficiente a matéria devolvida à sua apreciação, conforme se depreende do acórdão recorrido às fls. eSTJ 377/384.

 No caso, a parte recorrente pretendeu rediscutir, em sede de aclaratórios, matérias já apreciadas pelo Tribunal a quo, tendo havido o claro pronunciamento sobre as questões indispensáveis ao deslinde da controvérsia dos autos. 

Ademais, o juiz não está obrigado a responder, um a um, os argumentos levantados pelas partes. 

Nesse sentido: 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. REAJUSTE DE 3,17%. LIMITAÇÃO TEMPORAL. MP 2.150-39/2001. FATO SUPERVENIENTE. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. OMISSÃO. NÃO OCORRÊNCIA. 1. Afasta-se a ofensa aos arts. 489, § 1º e 1.022, II, do CPC/2015, na medida em que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos, não se podendo, ademais, confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. (...) 4. Agravo interno não provido. (AgInt nos EDcl no REsp 1720973/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/02/2019, DJe 21/02/2019) 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 1.022 DO CPC/2015. VIOLAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA NÃO INFIRMADOS. SÚMULA N. 182/STJ. REVISÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DOS ENUNCIADOS 5 E 7 DA SÚMULA DO STJ. NÃO PROVIMENTO. 1. O acórdão recorrido analisou todas as questões necessárias ao deslinde da controvérsia, não se configurando omissão, contradição ou negativa de prestação jurisdicional. 2. Não havendo impugnação específica acerca de todos os fundamentos da decisão que deixou de admitir o recurso especial, deve ser aplicado, por analogia, o teor da Súmula 182 deste Tribunal Superior. 2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar conteúdo contratual (Súmula 5/STJ), bem como matéria fático-probatória (Súmula n. 7/STJ). 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1345223/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 12/02/2019, DJe 19/02/2019) 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. DECISÃO MANTIDA. 1. Inexiste afronta aos arts. 489, § 1º, IV, e 1.022 do CPC/2015 quando o acórdão recorrido pronuncia-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1330111/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 07/02/2019, DJe 14/02/2019) 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ART. 1.022 DO CPC/2015. VIOLAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. RESPONSABILIDADE DA RECORRENTE. OCORRÊNCIA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. (...) 5. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1268364/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/12/2018, DJe 01/02/2019) 

No que tange à alegação de ofensa aos artigos arts. 114, 115, I, e 276 do CPC, conquanto o recorrente seja coproprietário do imóvel, não há obrigatoriedade de formação do litisconsórcio passivo neste caso. 

Não se desconhece a existência de divergência doutrinária acerca da natureza jurídica da ação demolitória, o que levou esta Corte a analisar a questão. 

Na ocasião, o precedente que foi, inclusive, amplamente divulgado, foi julgado pela Segunda Turma, firmando a natureza de ação real, e concluindo pela necessidade, naquele caso, de citação do cônjuge. 

Eis a ementa do referido julgado: 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DEMOLITÓRIA. NATUREZA REAL. CÔNJUGE. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. NULIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia a definir qual a natureza da Ação Demolitória e, em consequência, se a hipótese exige a formação de litisconsórcio necessário passivo entre os cônjuges. 2. O Tribunal a quo entendeu que, por se tratar de ação pessoal, "a citação do cônjuge torna-se dispensável, posto que a ação demolitória não afeta diretamente o direito de propriedade das partes" (fl. 130). 3. A Ação Demolitória visa à demolição de: a) prédio em ruína (art. 1.280 do CC); b) construção prejudicial a imóvel vizinho, às suas servidões ou aos fins a que é destinado (art. 934, I, do CPC); c) obra executada por um dos condôminos que importe prejuízo ou alteração de coisa comum por (art. 934, II, do CPC); d) construção em contravenção da lei, do regulamento ou de postura estabelecidos pelo Município. 4. No sistema do Código Civil, a construção é tratada como uma das formas de aquisição da propriedade imóvel (arts. 1.253 a 1.259). Por outro lado, o direito de exigir a demolição de prédio vizinho encontra-se previsto no capítulo que trata dos direitos de vizinhança e está associado ao uso anormal da propriedade (Seção I do Capítulo V do Título III do Livro dos Direitos das Coisas). 5. A Ação Demolitória tem a mesma natureza da Ação de Nunciação de Obra Nova e se distingue desta em razão do estado em que se encontra a obra (REsp 311.507/AL, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Quarta Turma, DJ 5/11/2001, p. 118). 6. Assentada a premissa de que a Ação Demolitória e a Ação de Nunciação de Obra Nova se equivalem, o art. 95 do CPC corrobora a tese sobre a natureza real de ambas. O dispositivo prescreve que, nas ações fundadas em direito real sobre imóveis, o foro competente é o da situação da coisa, com a ressalva de que as referidas ações podem ser propostas no foro do domicílio ou de eleição, desde que o litígio não recaia sobre propriedade, vizinhança, servidão, posse, divisão e demarcação de terras e nunciação de obra nova. 7. Para o CPC, portanto, a Ação de Nunciação de Obra Nova se insere entre aquelas fundadas em direito real imobiliário. A mesma conclusão deve alcançar a Ação Demolitória. 8. Em precedente de relatoria do saudoso Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, o STJ assentou entendimento pela nulidade de processo em que pleiteada a demolição de bem, por ausência de citação de condômino litisconsorte necessário (REsp 147.769/SP, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, DJ 14/2/2000, p. 34). 9. Recurso Especial provido. (REsp 1374593/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/03/2015, DJe 01/07/2015) 

No presente caso, contudo, entendo que a conclusão quanto à necessidade de formação de litisconsórcio necessário deve ser afastada, ainda que por outros fundamentos. 

De acordo com o disposto no artigo 114 do CPC, “o litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes”. 

Segundo o artigo 116 do mesmo diploma, “o litisconsórcio será unitário quando, pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir o mérito de modo uniforme para todos os litisconsortes”. 

A partir dessas regras, conclui-se que o litisconsórcio será necessário quando a lei determinar ou quando for unitário. 

A estreita relação entre o litisconsórcio necessário e o unitário fez com que o CPC1973, em seu artigo 47, tratasse de ambos conjuntamente: “Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo”. 

Essa estreita relação também foi anotada pela doutrina: 

“Litisconsórcio unitário e litisconsórcio necessário são dois fenômenos distintos, quanto ao ponto-de-vista em que se coloca a problemática referente a cada um deles: lá, trata-se de julgamento homogêneo que deve ser dispensado àqueles que estão no processo como litisconsortes; aqui, da exigência de que no processo estejam certas pessoas coligadas na condição de autores ou de réus. Ambos, porém, são expressões de uma só ideia, qual seja a inadmissibilidade de cindir determinada relação jurídica, pretendendo inutilmente ditar uma solução endereçada a certa pessoa, sem ditar a mesma solução com vistas a outra. (...) se a relação posta em juízo for incindível, então não se admitirão julgamentos discrepantes e, por força da regra geral contina no art. 47, também necessário será o litisconsórcio.” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Litisconsórcio: um estudo sobre o litisconsórcio comum, unitário, necessário, facultativo (doutrina e jurisprudência). São Paulo: RT, 1984. - pp 112 e 116- 117). 

Neste caso, não se discute a propriedade do imóvel, caso em que o recorrente, dada a incindibilidade do direito material, deveria necessariamente integrar a relação processual. 

A diminuição do patrimônio do recorrente é consequência natural da efetivação da decisão judicial que impôs aos réus a obrigação de demolir as benfeitorias e acessões erigidas ilicitamente. 

Portanto, na condição de coproprietário, o recorrente sofrerá os efeitos materiais da sentença, mas isso não é suficiente para caracterizar o litisconsórcio necessário, até porque o direito de propriedade permanecerá intocado. 

Trata-se do que a doutrina denomina de efeito reflexo da sentença, o que, a depender da intensidade, justifica o ingresso de terceiro no processo, mas não a obrigatoriedade do litisconsórcio: 

“O aspecto relevante dessa categoria [de efeitos] reside na constatação de que os efeitos das sentenças – como de qualquer outra decisão jurisdicional – podem afetar, em maior ou menor intensidade, terceiros, isto é, quem não foi e não é parte no processo.” (BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: volume 2: procedimento comum, processos nos Tribunais e recursos. – 8ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019, pp. 349-350) 

Sobre o assunto, inclusive ressaltando a desnecessidade de formação de litisconsórcio, destaco o seguinte julgado desta Corte: 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. ANEEL. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. RESOLUÇÃO. NÃO ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE LEI FEDERAL. INCIDÊNCIA POR ANALOGIA DA SÚMULA N. 518/STJ. OFENSA REFLEXA À LEI FEDERAL. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - O litisconsórcio necessário estabelece-se pela natureza da relação jurídica ou por determinação legal, sendo insuficiente para sua caracterização que a decisão a ser proferida no processo possa produzir efeitos sobre esfera jurídica de terceiro. A eficácia natural das sentenças, como regra, alcança terceiros, sem que esta circunstância obrigue a respectiva inclusão no processo. Não há disposição expressa de lei que exige a participação da ANEEL nas ações que sejam fundamentadas em suas resoluções. III - Consoante pacífica jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, o conceito de tratado ou lei federal, previsto no art. 105, inciso III, a, da Constituição da República, deve ser considerado em seu sentido estrito, não compreendendo súmulas de Tribunais, bem como atos administrativos normativos. Incidência, por analogia, da Súmula n. 518 do Superior Tribunal de Justiça. IV - O Recurso Especial não merece prosperar, porquanto, embora indicada a ofensa aos arts. 2º e 3º da Lei n. 9.427/1996, segundo a Recorrente, a presente controvérsia perpassa, em tese, a análise resoluções normativas, de modo que a violação à lei federal seria meramente reflexa. V - Não apresentação de argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida. VI - Honorários recursais. Não cabimento. VII - Em regra, descabe a imposição da multa, prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, em razão do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso. VIII - Agravo Interno improvido. (AgInt no REsp 1724930/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/08/2018, DJe 22/08/2018) 

Ademais, não fosse a ausência de ofensa às normas apontadas como violadas, cumpre destacar importante fundamento do acórdão recorrido para não admitir a nulidade ab initio do feito, e que não foi sequer refutado pelo recorrente, a demonstrar a necessidade de sua manutenção (fls. 621): 

Noutro turno, cumpre observar que também causa estranheza o fato de somente após transcorridos oito anos da propositura da presente ação de obrigação de não fazer cumulada com ação demolitória, com a prolação de sentença determinando a demolição do terraço e da churrasqueira, é que o terceiro interveniente comparece em Juízo a fim de arguir a nulidade do feito, por falta de citação dos litisconsortes. Não é crível que o terceiro interveniente não tivesse ciência da ação interposta contra sua irmã, em 2009, e que aborda direito de vizinhança de imóvel do qual é um dos herdeiros, ainda mais quando reside nesta capital e na mesma cidade satélite onde se localiza o imóvel, conforme faz prova a procuração que outorgou ao seu causídico (fl. 509). Deste modo, há nos autos claro indicativo de que o terceiro interveniente tinha ciência da ação demolitória desde seu início, não tendo até agora intervindo no processo de forma propositada, aguardando o melhor momento para arguir pretensa nulidade do feito, ocasionando demora à solução do litígio. Contudo, também por este viés não se admite a decretação da nulidade do feito, uma vez que a ordem jurídica repele a má-fé das partes e dos intervenientes, estipulando no art. 276 do Código de Processo Civil/2015 (art. 243 do revogado CPC/1973), que aquele que deu causa à nulidade não poderá requerê-la. Assim, independente da discussão travada acerca da natureza jurídica da ação demolitória, também sob esta ótica do momento da alegação da pretensa nulidade (art. 276 do CPC/2015), recomenda-se o indeferimento do pleito de nulidade da ação postulado pelo terceiro interveniente. 

A ausência de impugnação a tal argumento, suficiente por si só para manter o acórdão recorrido, enseja a aplicação do enunciado da Súmula 283/STF, o que levaria ao não conhecimento do recurso no ponto. 

Portanto, deve ser mantido o acórdão recorrido. 

2) AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DOS DEMANDADOS FRANCISCA MINEI RIBEIRO SANTIAGO E JOSÉ DE ANCHIETA FIGUEIREDO DA SILVA: 

O presente agravo em recurso especial não merece prosperar. 

Em relação à negativa de prestação jurisdicional, o especial apresentara-se deficiente, pois a alegação de ofensa ao art. 1.022 do CPC faz-se de forma genérica, não havendo a demonstração clara dos pontos do acórdão que se apresentam omissos, contraditórios ou obscuros. 

Limitou-se, a parte recorrente, a dizer que não foram apreciadas as teses que envolveram os institutos da ilegitimidade e decadência, concluindo que "a alegação prefacial de invalidade do v. acórdão integrativo que rejeitou esses noticiados embargos de aclaração se presta à constatação .de que, acaso conclua esse colendo STJ pela necessidade formal e explícita de prequestionamento dos dispositivos legais suscitados como violados ao longo da processualidade (LINDB, artigo 4°), finde por reconhecer a nulidade do v. acórdão integrativo e, por efeito da aplicação do princípio do juiz natural em casos desse jaez, determine o retorno dos autos ao egrégio Tribunal a quo para que este possa exaurir a entrega da prestação jurisdicional de segundo grau". 

A alegação de afronta ao art. 1.022 do CPC não é como que um coringa para a eventualidade de esta Corte Superior reconhecer a ausência do devido prequestionamento. Ou bem se demonstra, claramente, que determinadas questões relevantes para o desate da controvérsia não foram enfrentadas, ou não haverá falar em conhecimento do especial. 

Aplica-se, assim, o óbice da Súmula 284/STF. Nesse sentido: AgInt no REsp 1901479/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 29/03/2021, DJe 06/04/2021; AgInt no AREsp 1672845/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/02/2021, DJe 12/02/2021; AgInt no REsp 1809148/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/10/2019, DJe 18/10/2019. 

Com relação à apontada violação ao art. 3º do CPC/73 (17 do CPC), o recurso especial, como se sabe, possui fundamentação vinculada, com forma e conteúdo próprios, e se destina a atribuir a adequada interpretação e uniformização da lei federal, e não ao rejulgamento da causa. 

Assim, exsurge deficiente a fundamentação recursal, pois o dispositivo apontado como violado não contém comando capaz de infirmar os fundamentos do acórdão recorrido, bem como amparar a tese recursal, atraindo, novamente, o óbice da Súmula 284/STF. 

Referida norma dispõe que para "propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade". Os recorrentes sustentam a tese de que são ilegítimos para defenderem-se em ação cuja natureza subjetiva é de direito real, pois repercute, indiscutivelmente, sobre o direito de propriedade de terceiros. 

Entretanto, o acórdão recorrido afastou a alegação de ilegitimidade passiva aplicando entendimento desta Corte no sentido de que também o possuidor, ainda que não ostente o título de proprietário do imóvel, pode figurar no polo passivo da ação demolitória que visa desfazer obra erigida em desacordo com a legislação cabível. 

Asseverou, ainda, o seguinte: 

(...) a prova testemunhal produzida nos autos, atestou que a terceira pessoa, em nome de quem o imóvel ocupado pelos réus encontra-se registrado é, na verdade, genitora da segunda ré, estando já falecida e o imóvel passível de ação de inventário. Logo, também por esta ótica, não há que se falar em ausência de legitimidade passiva dos réus para responderem pelos danos causados pela obra que erigiram no imóvel, pois são possuidores do mesmo e o terraço e a churrasqueira foram por eles erigidas às suas expensas. 

Portanto, a norma em que se funda o recurso não se mostra apta a infirmar os fundamentos apresentados pela Corte de origem, além de não ter havido insurgência quanto ao fundamento do acórdão no sentido de que a segunda ré é herdeira da proprietária do imóvel e, portanto, proprietária, além de terem sidos os recorrentes quem teriam realizados as construções às suas expensas. O que faz incidir, também, o óbice da Súmula 283/STF quanto ao ponto. 

Com relação à apontada decadência, o TJDFT a afastou sob o seguinte fundamento: 

Contudo, apesar da alegação de decadência do direito da autora, os requeridos não fizeram prova de que a obra tenha sido concluída há mais de ano e dia, e que se operou a decadência do direito no caso presente. Por força do disposto no art. 333, II, do revogado CPC/1973, que regulava a matéria à época (atual art. 373, II, do CPC/2015), sempre que a parte requerida formular defesa de mérito indireta, ou seja, alegar fatos novos que impedem, modificam ou extinguem o direito da parte autora, atrairá para si, o ônus de provar aquilo que alegou. Como a decadência se enquadra como alegação de fato extintivo do direito da parte autora, incumbia, in casu, aos requeridos juntar documentos, comprovantes ou mesmo o alvará de construção no segundo pavimento do imóvel, a fim de dar conta de que se tratava de obra antiga, há muito concluída. Diante desse quadro, correta a r. decisão interlocutória de fls. 205/206 que rechaçou, de pronto, a alegação de decadência do direito da autora de ver demolida a obra limítrofe à sua residência, erigida pelos réus em desacordo com a legislação pertinente. 

Os recorrentes apontam como violado o art. 1.032 do CC, afirmando que (I) "muito embora tenha-se travado discussão sobre a natureza do instituto da decadência como sendo fato impeditivo ou extintivo do direito do autor, atraindo o ônus da prova para a parte ré que tenha alegado a sua ocorrência, a verdade é que a questão é daquelas insertas no rol de matéria de ordem pública"; (II) "as provas carreadas aos autos pela recorrida da suposta construção pautou-se unicamente nas fotografias de fls. 41/46, datadas de 2006 e 2007 (data da conclusão)" e, tendo a ação sido ajuizada em 2009, deve ser reconhecida a decadência. 

Verifica-se, portanto, a incidência de três óbices ao conhecimento do recurso, no ponto. 

O primeiro, assim como na questão referente à ilegitimidade, diz respeito à deficiência na fundamentação, pois o dispositivo apontado como violado não contém comando capaz de infirmar os fundamentos do acórdão recorrido, bem como amparar a tese recursal, atraindo, novamente, o óbice da Súmula 284/STF. Com efeito, o prazo decadência de ano e dia, em si, não foi objeto de discussão, já que foi justamente o prazo aplicado ao caso concreto, mas a decadência não foi reconhecida por ausência de prova de que a obra era antiga. 

O segundo, diz respeito à aplicação do óbice da Súmula 07/STJ. Isso porque o acórdão foi categórico ao afirmar a ausência de prova a embasar a tese dos recorrentes e, analisar a tese apresentadas no presente recurso demandaria, necessariamente, o revolvimento do suporte fático probatório dos autos, o que é vedado a esta Corte. 

Por fim, o terceiro óbice diz à ausência de análise, pelo acórdão recorrido, quer no julgamento da apelação, quer nos embargos, das teses referentes (I) à existência de documentos que comprovariam o descumprimento do prazo decadencial e (II) à decadência ser matéria é de ordem pública, e pode ser suscitada a qualquer tempo ou analisada de ofício pelos órgãos julgadores. Incide, portanto, o óbice da Súmula 211/STJ ao ponto. 

Ressalto que "a admissão de prequestionamento ficto (art. 1.025 do CPC/15), em recurso especial, exige que no mesmo recurso seja indicada violação ao art. 1.022 do CPC/15, para que se possibilite ao Órgão julgador verificar a existência do vício inquinado ao acórdão, que uma vez constatado, poderá dar ensejo à supressão de grau facultada pelo dispositivo de lei" (REsp 1.639.314/MG, Rel. Ministra Nancy Andrigui, Terceira Turma, julgado em 04/04/2017, DJe 10/04/2017), o que não ocorreu, pois o recurso especial não foi conhecido quanto à apontada negativa de prestação jurisdicional. 

Logo, não há como se ter como prequestionada a matéria. Nesse sentido: AgInt no AREsp 1.043.549/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 01/08/2017; AgInt no REsp 1.633.039/SC, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/05/2017, DJe 24/05/2017. 

Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial de JÚLIO CESAR PEREIRA RIBEIRO e nego provimento ao agravo em recurso especial de FRANCISCA MINEI RIBEIRO SANTIAGO E JOSÉ DE ANCHIETA FIGUEIREDO DA SILVA. 

É o voto. 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA 

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: Prosseguindo no julgamento, após a vista regimental do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial de Júlio César Pereira Ribeiro e negou provimento ao agravo em recurso especial de Francisca Izinei Ribeiro Santiago e José de Anchieta Figueiredo da Silva, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. 

20 de agosto de 2021

Litisconsórcio não é necessário em ação demolitória que não afeta direito de propriedade do terceiro

 A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) que, em ação para demolição de obra em desacordo com a legislação, considerou desnecessária a formação de litisconsórcio passivo entre todos os proprietários do imóvel.

O caso teve origem em ação ajuizada por vizinhos contra a construção de um terraço com churrasqueira e espaço para festas em imóvel localizado no Distrito Federal.

A obra, sem alvará ou autorização da administração pública, não respeitou a distância mínima de afastamento lateral entre construções, imposta pelo artigo 1.301 do Código Civil. Além disso, o terraço possibilitava a visão do interior do imóvel vizinho.

A sentença, confirmada pelo TJDFT, determinou que a obra irregular fosse demolida, com base nos artigos 1.302 e 1.312 do Código Civil, e fixou indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil.

No recurso ao STJ, um dos coproprietários do imóvel, na condição de terceiro interessado, alegou ter sido admitido na lide apenas como assistente simples, mesmo tendo interesse direto no resultado do processo. Ele sustentou a necessidade de formação de litisconsórcio passivo em ação real demolitória.

O casal que figurou como réu na ação também recorreu, argumentando estar decaído o direito de reivindicar a demolição.

Consequência natural da decisão judicial

Para o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a diminuição do patrimônio do coproprietário do imóvel é apenas uma consequência natural da efetivação da decisão do TJDFT que impôs a obrigação de demolir as benfeitorias erguidas ilicitamente.

"Na condição de coproprietário, o recorrente sofrerá os efeitos da sentença, o que não é suficiente para caracterizar o litisconsórcio necessário, até porque o direito de propriedade permanecerá intocado", afirmou.

"Trata-se do que a doutrina denomina de efeito reflexo da sentença, o que, a depender da intensidade, justifica o ingresso de terceiro no processo, mas não a obrigatoriedade do litisconsórcio", acrescentou o magistrado.

Sanseverino reconheceu a existência de divergência doutrinária sobre a natureza jurídica da ação demolitória e mencionou o julgamento do REsp 1.374.593, em que a Segunda Turma concluiu pela natureza de ação de direito real e, portanto, pela necessidade de citação do cônjuge.

Porém, no caso em julgamento, o relator explicou que, como não se discute a propriedade do imóvel, o terceiro interessado não precisa necessariamente integrar a relação processual. Ele observou que outros julgados do STJ – entre eles, o AgInt no REsp 1.724.930 – corroboram a tese da desnecessidade de formação de litisconsórcio nos casos em que o direito de propriedade do terceiro não será afetado.

Leia o acórdão no REsp 1.721.472.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1721472

24 de junho de 2021

Em ação demolitória, não há obrigatoriedade de litisconsórcio passivo necessário dos coproprietários do imóvel

Processo

REsp 1.721.472-DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Ação demolitória. Coproprietários do imóvel. Litisconsórcio necessário. Desnecessidade. Efeito reflexo da sentença.

 

Destaque

Em ação demolitória, não há obrigatoriedade de litisconsórcio passivo necessário dos coproprietários do imóvel.

Informações do Inteiro Teor

De acordo com o disposto no artigo 114 do CPC, "o litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes". Por sua vez, segundo o artigo 116 do mesmo diploma, "o litisconsórcio será unitário quando, pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir o mérito de modo uniforme para todos os litisconsortes".

A partir dessas regras, conclui-se que o litisconsórcio será necessário quando a lei determinar ou quando for unitário.

A estreita relação entre o litisconsórcio necessário e o unitário fez com que o CPC/1973, em seu artigo 47, tratasse de ambos conjuntamente: "Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo".

Em ação demolitória, como na hipótese, não se discute a propriedade do imóvel, caso em que, dada a incindibilidade do direito material, os demais proprietários deveriam necessariamente integrar a relação processual.

A diminuição do patrimônio é consequência natural da efetivação da decisão judicial que impôs aos réus a obrigação de demolir as benfeitorias e acessões erigidas ilicitamente.

Portanto, na condição de coproprietário, a parte sofrerá os efeitos materiais da sentença, mas isso não é suficiente para caracterizar o litisconsórcio necessário, até porque o direito de propriedade permanecerá intocado.

Trata-se do que a doutrina denomina de efeito reflexo da sentença, o que, a depender da intensidade, justifica o ingresso de terceiro no processo, mas não a obrigatoriedade do litisconsórcio.

https://youtu.be/cKO4hWuDULM?t=1760


11 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Necessariedade ou facultatividade do litisconsórcio eventual nas ações de alimentos avoengos - Cristiano Chaves de Farias

"Reconhecida a possibilidade de estabelecer um litisconsórcio eventual entre pais e avós nas demandas alimentícias, exsurge uma outra questão prática de grande relevância: tratar-se-ia de um litisconsórcio necessário ou facultativo? Pois bem, com o advento do Código Civil de 2002 reinou, primeiramente, a dissonância em relação ao tema. Na literatura jurídica brasileira, a discordância terminou, inclusive, por apontar três diferentes soluções: i) seria uma nova modalidade de intervenção de terceiros [BUENO, Cássio Scarpinella. Partes e terceiros no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 285. Igualmente, WELTER, Belmiro Pedro. Alimentos no Código Civil, cit., p. 223, para quem “se trata de mais uma hipótese de intervenção de terceiros, não constante da legislação processual”]; ii) ostentaria natureza de litisconsórcio necessário [MADALENO, Rolf. Curso de direito de família, cit., p. 929-930. Inicialmente, prevaleceu esta posição no seio da jurisprudência superior, posteriormente superada: “nos termos da mais recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, à luz do Código Civil, há litisconsórcio necessário entre os avós paternos e maternos na ação de alimentos complementares” (STJ, Ac. unân. 4ª T., REsp 958.513/SP, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, j. 22.02.2011, DJe 01.03.2011)]; iii) se enquadra como um caso de litisconsórcio facultativo. [GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. v. 6. p. 554; BERALDO, Leonardo de Faria. Alimentos no Código Civil, cit., p. 76; PEREIRA, Sérgio Gischkow. Ação de alimentos. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 34; DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil, cit., p. 664]. Com efeito, depois de intensos debates, prevaleceu, acertadamente, a tese do litisconsórcio facultativo, por não se emoldurar nas taxativas hipóteses de imposição de sua formação, contempladas no Código de Ritos"


Farias, Cristiano Chaves de. O litisconsórcio entre pais e avós nas ações de alimentos: compreendendo uma megera indomada em três atos. Revista de Processo. vol. 315. ano 46. p. 211-230. São Paulo: Ed. RT, maio 2021. 

9 de maio de 2021

PLANOS E SEGUROS DE SAÚDE. AÇÃO COLETIVA VINDICANDO O DESCUMPRIMENTO DE NORMA INFRALEGAL, EMITIDA POR ENTIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL DIRETA. VELAR PELO CUMPRIMENTO DA LEI N. 9.656/1998 E DE SUA REGULAMENTAÇÃO. ATRIBUIÇÃO LEGAL DA ANS. PLEITO QUE AFETA OS INTERESSES INSTITUCIONAIS DA UNIÃO E DA ANS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. IMPRESCINDIBILIDADE, SOB PENA DE INEFICÁCIA DA SENTENÇA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.188.443 - RJ (2010/0058795-0) 

RELATOR : MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA 

R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

PROCESSUAL CIVIL. PLANOS E SEGUROS DE SAÚDE. AÇÃO COLETIVA VINDICANDO O DESCUMPRIMENTO DE NORMA INFRALEGAL, EMITIDA POR ENTIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL DIRETA. VELAR PELO CUMPRIMENTO DA LEI N. 9.656/1998 E DE SUA REGULAMENTAÇÃO. ATRIBUIÇÃO LEGAL DA ANS. PLEITO QUE AFETA OS INTERESSES INSTITUCIONAIS DA UNIÃO E DA ANS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. IMPRESCINDIBILIDADE, SOB PENA DE INEFICÁCIA DA SENTENÇA. 

1. A ação coletiva tem como causa de pedir a invocação de que a Resolução n. 13/1998 do Conselho de Saúde Suplementar - Consu, reproduzida em cláusulas de contratos de planos e seguros de saúde das rés, alegadamente extrapolou os lindes estabelecidos pela Lei n. 9.656/1998, ao impor o limite, no período de carência contratual, de 12 horas para atendimento aos beneficiários dos planos ambulatoriais e hospitalares. Com efeito, o exame da higidez do ato administrativo é questão prejudicial ao acolhimento do pedido, que implica tacitamente obstar seus efeitos, ao fundamento de violação de direito de terceiros (beneficiários de planos e seguros de saúde). 

2. Por um lado, o art. 4º, incisos I, XXIX e XXX, da Lei n. 9.961/2000 estabelece que compete à Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS: I - propor políticas e diretrizes gerais ao Conselho de Saúde Suplementar - Consu para a regulação do setor de saúde suplementar; XXIX - fiscalizar o cumprimento das disposições da Lei n. 9.656, de 1998, e de sua regulamentação; XXX - aplicar as penalidades pelo descumprimento da Lei n. 9.656, de 1998, e de sua regulamentação. Por outro lado, o contrato (o regulamento contratual) não se confunde com o instrumento contratual, sendo as normas legais e os atos das autoridades constituídas - notadamente em se tratando de relação contratual a envolver a saúde suplementar, que sofre forte intervenção estatal -, juntamente com a vontade das partes (que exprime o poder de autonomia), os agentes típicos das limitações à liberdade contratual dos particulares, isto é, são as fontes do regulamento contratual, para cuja concreta determinação, segundo as circunstâncias e em diferentes medidas, podem concorrer. 

3. Nos termos do art. 47 do CPC/1973, há litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei "ou pela natureza da relação jurídica", o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. E o art. 114 do CPC/2015 também estabelece que o litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes. Já o 115, I, dispõe que a sentença de mérito, quando proferida sem a integração do contraditório, será nula, se a decisão deveria ser uniforme em relação a todos que deveriam ter integrado o processo. 

4. Orienta o abalizado escólio doutrinário que parte legítima para a causa é quem figura na relação como titular dos interesses em lide ou, ainda, como substituto processual. No tocante aos substituídos da ação civil pública e às inúmeras seguradoras e operadoras de planos de saúde rés, o pedido mediato da ação, bem como o decidido pelas instâncias ordinárias, pretensamente esvazia os efeitos do ato regulamentar administrativo (que vincula fornecedores e consumidores), a par de ensejar a possibilidade de coexistência de decisões inconciliáveis, caso o ato administrativo venha a ser questionado na Justiça Federal e considerado hígido. 

5. Consoante a firme jurisprudência da Primeira Seção do STJ, há litisconsórcio passivo necessário quando o pedido formulado na inicial da ação afetar a esfera do poder regulador de entidade da administração pública. Nessa linha de intelecção, não se trata de ação coletiva visando dar cumprimento à regulamentação legal e/ou infralegal - hipótese mais frequente, em que é inquestionável a competência da Justiça estadual e a ausência de interesse institucional da União e da ANS -, mas de tentativa, por via transversa, sem a participação das entidades institucionalmente interessadas, de afastar os efeitos de disposição cogente infralegal, ocasionando embaraço às atividades fiscalizatórias e sancionatórias da ANS, sem propiciar às entidades da administração pública federal o exercício da ampla defesa e do contraditório, até mesmo para eventualmente demonstrarem o interesse público na manutenção dos efeitos da norma. 

6. Recurso especial parcialmente provido para, em reconhecimento da necessidade de litisconsórcio passivo necessário a envolver a União e a ANS, cassar a sentença e o acórdão recorrido, determinando-se o encaminhamento dos autos para a Justiça Federal. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, após o voto-vista do Ministro Luis Felipe Salomão dando parcial provimento ao recurso especial, divergindo do relator, e a reformulação do voto da Ministra Maria Isabel Gallotti para acompanhar o voto do Ministro Luis Felipe Salomão, e o voto do Ministro Marco Buzzi (Presidente) acompanhando o relator, e o voto do Ministro Raul Araújo acompanhando a divergência, por maioria, dar parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto divergente do Ministro Luis Felipe Salomão, que lavrará o acórdão. Vencido o relator e o Ministro Marco Buzzi (Presidente). Votaram com o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão os Srs. Ministros Raul Araújo e Maria Isabel Gallotti. Sustentou oralmente o Dr. LUIZ HENRIQUE FERREIRA LEITE, pela parte RECORRENTE: AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL LTDA. 

Brasília (DF), 27 de outubro de 2020(Data do Julgamento)

PARTILHA. ANULAÇÃO. IMÓVEIS. REGISTRO. HERDEIROS. COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. CITAÇÃO. CÔNJUGES. NECESSIDADE. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.706.999 - SP (2015/0264950-0) 

RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA 

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PARTILHA. ANULAÇÃO. IMÓVEIS. REGISTRO. HERDEIROS. COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. CITAÇÃO. CÔNJUGES. NECESSIDADE. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. 

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

2. Cinge-se a controvérsia a definir se, em ação anulatória de partilha em que o título de transferência dos imóveis anteriormente recebidos pelos herdeiros já foi levado a registro, os cônjuges dos herdeiros casados sob o regime de comunhão universal de bens devem integrar a lide na qualidade de litisconsortes necessários. 

3. No caso de a anulação de partilha acarretar a perda de imóvel já registrado em nome de herdeiro casado sob o regime de comunhão universal de bens, a citação do cônjuge é indispensável, tratando-se de hipótese de litisconsórcio necessário. 

4. Recurso especial provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília (DF), 23 de fevereiro de 2021(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por PAULO ROBERTO CINTRA COELHO e JOSÉ CÉLIO CINTRA COELHO, com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, impugnando acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado: 

"AGRAVO DE INSTRUMENTO – ANULAÇÃO DE PARTILHA – Insurgência em face de decisão que rejeitou preliminar de litisconsórcio necessário – Tentativa de incluir os cônjuges no polo passivo da demanda sob a alegação de serem casados pelo regime de comunhão universal de bens e, uma vez registrados os títulos imobiliários, não há que se falar que a demanda de origem não versa sobre direitos reais imobilários – Anulação de partilha que versa sobre direitos pessoais dos herdeiros, sendo os respectivos cônjuges atingidos apenas por via reflexa em virtude do regime de bens adotado – Condição de meeiras que não as transforma em herdeiras – Decisão mantida – Recurso não provido” (fls. 99, e-STJ). 

Os embargos de declaração foram rejeitados (fls. 116/119, e-STJ). 

No recurso especial, os recorrentes apontam violação dos artigos 47 do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973) e 1.667 do Código Civil. 

Afirmam que a partilha albergou imóveis e, tendo sido levada a registro, os imóveis passaram a ser de propriedade também de suas esposas, já que casados sob o regime de comunhão universal de bens. Entendem, por isso, que eventual anulação da partilha irá afetar os direitos dos cônjuges por se tratar de relação jurídica incindível. 

Ao final, requerem o provimento do recurso especial para que se reconheça ser o caso de litisconsórcio passivo necessário. 

Contrarrazões às fls. 149/154 (e-STJ). 

O recurso especial foi inadmitido, ascendendo a esta Corte por força da decisão de fls. 229/230 (e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): O acórdão impugnado pelo presente recurso especial foi publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

Cinge-se a controvérsia a definir se, em ação anulatória de partilha em que o título de transferência dos imóveis anteriormente recebidos pelos herdeiros já foi levado a registro, os cônjuges dos herdeiros casados sob o regime de comunhão universal de bens devem integrar a lide na qualidade de litisconsortes necessários. 

A insurgência merece acolhida. 

1. Breve histórico 

Trata-se, na origem, de ação anulatória de partilha promovida por Sebastião Machado Branquinho contra os ora recorrentes e Maria Alves da Silva Coelho (interditada). 

Na petição inicial o autor afirma ter mantido união estável com Maria Anésia da Silva Coelho no período entre 1992 e 2009. Porém, na fase em que a companheira adoeceu, não pode cuidar dela, que permaneceu internada sob a responsabilidade de seu irmão e curador, Paulo Roberto Cintra Coelho, vindo a falecer em 2.2.2011. 

Esclarece que a falecida não tinha ascendentes vivos e não deixou descendentes, nem disposição de última vontade. 

Alega que por desconhecer à época que era o único herdeiro da falecida, concordou com um plano de partilha amigável apresentado pelos irmãos da companheira falecida, ora réus, homologado em outubro de 2011. Entretanto, verificou que foi lesado em seus direitos, razão pela qual pretende que a partilha seja anulada. 

Requereu a procedência da ação para declarar a nulidade da partilha e sua qualidade de único herdeiro. 

Na contestação, os réus alegaram que os respectivos cônjuges deveriam compor a lide, pois são casados em regime de comunhão universal de bens e a partilha envolveu imóveis sobre os quais passaram a ter a propriedade. 

O Juízo de primeiro grau entendeu que não era o caso de litisconsórcio necessário, pois a ação não versa sobre direitos reais imobiliários. 

Contra essa decisão os ora recorrentes interpuseram agravo de instrumento, não provido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em vista dos seguintes fundamentos: 

“(...) 9. Consigno, inicialmente, que a demanda de origem não versa sobre direitos reais imobiliários, conforme bem salientado pelo i. magistrado singular e, dessa forma, não há que se falar em litisconsórcio necessário como querem fazer crer os agravantes. 10. Com efeito, trata-se de ação de anulação de partilha, na qual se discute os direitos dos herdeiros e, sendo ambos casados em regime de comunhão universal de bens, a decisão proferida na demanda de origem atingirá os respectivos cônjuges apenas por via reflexa, posto que a qualidade de meeiras não as transforma em herdeiras” (fl. 101, e-STJ). 

Sobreveio, então, o recurso especial. 

2. Do litisconsórcio necessário 

Nos termos do artigo 47 do Código de Processo Civil de 1973, há litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. 

Entretanto, no artigo 999 do Código de Processo Civil de 1973, não há previsão para que os cônjuges dos herdeiros sejam citados para a ação de inventário e partilha, sendo relacionados apenas o cônjuge do falecido, os herdeiros, os legatários, a Fazenda Pública, o Ministério Público (se houver interesse de incapaz ou ausente), e o testamenteiro (se houver testamento). O Código de Processo Civil de 2015 incluiu ainda o companheiro(a) do de cujus (artigo 626). 

Apesar de não haver exigência expressa no supramencionado dispositivo legal, a citação dos cônjuges dos herdeiros é entendida como necessária nas hipóteses em que houver disposição de bens a partir da interpretação de outras normas. Isso porque a herança é tida como bem imóvel enquanto não ocorrer a partilha (art. 80, II, do CC). Assim, a alienação e a renúncia estariam submetidas às vedações do artigo 1.647 do Código Civil, que trata dos atos que necessitam de outorga uxória. 

“Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648 nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - prestar fiança ou aval; IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação. Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.” 

Explica Carlos Roberto Gonçalves: 

“(...) Em regra, é dispensada a citação do cônjuge do herdeiro, assim como é considerada suficiente a outorga unilateral de procuração pelo herdeiro, tendo em vista ser o objeto do inventário o recebimento de bens por sucessão mortis causa, máxime se o regime de bens no casamento exclui a comunicação da herança. A participação do cônjuge é facultativa, por lhe faltar título hereditário. Se houver comunicação dos bens herdados, tratar-se á de relação não hereditária, mas concernente ao regime de bens do casamento. Haverá, no entanto, necessidade de citação do cônjuge, ou de sua representação no processo, em caso de disposição de bens, tais como renúncia, partilha diferenciada e quaisquer atos que dependam de outorga uxória”.(Direito civil brasileiro. Volume 7. 14ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020, e-book - grifou-se). 

Euclides de Oliveira afirma: 

“(...) Dispensável a outorga de procuração pelo cônjuge do herdeiro, ante a situação de benefício aos sucessores que percebem a herança. Em certos casos, todavia, em que haja ato de disposição dos bens, como na renúncia translativa (em favor de terceiro), desistência, cessão de direitos, alienação de bens do espólio e, ainda, na partilha diferenciada (em que não se atende à proporção na atribuição de quinhões da herança), torna-se necessário o comparecimento do cônjuge herdeiro e dos outros interessados, assentindo com instrumento procuratório, para que se valide o ato de alienação. A herança é considerada bem imóvel, enquanto não partilhada (arts. 88 e 1.791 do CC). Daí não se admitir a venda de quinhão hereditário sem anuência do cônjuge, mesmo que se trate de casamento diverso do regime de comunhão dos bens (arts. 1.647, inc. I, do CC). Observe-se, porém, que a regra não incide ao caso de renúncia pura e simples, pois, não havendo recebimento de herança, descabe falar em ato de alienação que exija outorga uxória”. (Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim. Inventário e partilha: teoria e prática. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016, e-book - grifou-se). 

Francisco José Cahali e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka comentam que: 

“(...) Tratando-se a sucessão aberta como imóvel (CC, art. 80, II), a renúncia à herança depende do consentimento do cônjuge, salvo se casado pelo regime de separação absoluta (CC, art. 1.647, I). Considera-se que a ausência do consentimento torna o ato anulável, uma vez passível de ratificação (RT 675/102)” (Direito das Sucessões. 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, e-book). 

Vale citar, ainda, a doutrina de Leonardo Estevam de Assis Zanini e Odete Novais Carneiro Queiroz: 

“(...) Como afirmado anteriormente, o direito à sucessão aberta é classificado pelo Código Civil como bem imóvel por determinação legal (art. 80, II). Diante disso, a renúncia da herança, efetuada por pessoa casada, depende do consentimento do cônjuge (outorga conjugal), haja vista que existe uma equivalência entre a renúncia e a alienação do imóvel. Entretanto, a outorga conjugal não é necessária no regime de separação absoluta (arts. 1.647, caput, parte final, e 1.687), ou, se houver autorização expressa no pacto antenupcial, quando o regime de bens do casamento for o de participação final nos aquestos (art. 1.656). A questão gera polêmica na doutrina. Há na doutrina autores que reconhecem que a pessoa casada pode renunciar à herança independentemente de prévio consentimento do cônjuge. A corrente majoritária, entretanto, considera que o cônjuge necessita do consentimento do outro para renunciar à herança (art. 1.647, I). Recusada a outorga, admite-se sua supressão por autorização judicial (art. 1.648). Ademais, a jurisprudência entende que a ausência de consentimento torna o ato anulável (art. 1.649), uma vez que pode ser ratificado” (Aspectos Relevantes e Breves Anotações sobre a Aceitação e Renúncia da Herança. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil. Ano XVII, nº 98, set/out 2020). 

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho entendem que é desnecessária a participação do cônjuge, mas reconhecem que sua posição é minoritária: 

“(...) A pessoa casada, entendemos, pode aceitar ou renunciar à herança ou legado independentemente de prévio consentimento do cônjuge, apesar de o direito à sucessão aberta ser considerado imóvel para efeitos legais por ser ela a herdeira do de cujus. Não é, todavia, o nosso pensamento que encontra guarida na jurisprudência desde a codificação anterior” (Novo Curso de Direito Civil, volume 7: direito das sucessões. 6ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019) 

De toda forma, o que norteia a conclusão de que o cônjuge do herdeiro deve participar do processo é a correspondência entre a renúncia, a cessão e a desistência com a alienação de bem imóvel. Essa situação fica ainda mais preponderante nos casos em que o herdeiro é casado sob o regime de comunhão universal de bens, pois tudo o que houver sido adquirido por herança passa imediatamente a integrar o patrimônio comum, cabendo ao outro cônjuge por metade. 

Explica Washington de Barros Monteiro: 

“(...) Todos os bens do casal, não importa a natureza, móveis e imóveis, direitos e ações, passam a constituir uma só massa, um só acervo, que permanece indivisível até a dissolução da sociedade conjugal. Cada cônjuge tem direito à metade dessa massa; formam ambos verdadeira sociedade, embora regida por normas especiais. Tudo quanto um deles adquirir transmite imediatamente, por metade, ao outro cônjuge; ainda que nada tenha trazido para a sociedade conjugal, ou nada tenha adquirido durante a sua constância, recebe a metade do que o outro trouxe ou adquiriu na vigência da mesma sociedade” (Curso de Direito Civil. Direito de Família. Volume 2. 43ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016, e-book – grifou-se) 

Registre-se que não se trata de elevar o cônjuge à qualidade de herdeiro mas, sim, de permitir sua participação no processo que envolve a alienação de bem comum. 

No caso de ação de anulação de partilha, parece que o mesmo raciocínio deve orientar a verificação quanto à necessidade de participação do cônjuge do herdeiro no processo. Assim, se houver a possibilidade de ser atingido negativamente o patrimônio do casal, com a alienação (perda) de bem imóvel, o cônjuge do herdeiro deve ser chamado para integrar a lide. Caso contrário, é dispensada sua participação. 

Na hipótese dos autos, o regime de casamento dos herdeiros é a comunhão universal de bens e a partilha anteriormente realizada contemplou bens imóveis, conforme noticia o relatório do acórdão recorrido: 

“(...) 3. Alegam, outrossim, que a demanda de origem versa sobre direitos reais imobiliários, pois a partilha envolveu bens imóveis que foram partilhados entre os agravantes e suas esposas e, uma vez registrado o título imobiliário, não há que se falar que a demanda de origem não se refere a direito real imobiliário.” (fl. 100, e-STJ). 

Nessa situação, em que os imóveis recebidos pelos recorrentes por conta da anterior partilha já foram levados a registro, integrando o patrimônio comum do casal, mostra-se indispensável a citação do cônjuge do herdeiro para a ação de anulação de partilha. Isso porque poderá haver a perda do imóvel que atualmente pertence a ambos, devendo a lide ser decidida de forma uniforme para ambos. 

Vale lembrar, ainda, que de acordo com o artigo 10, §1º, I, do CPC/1973 (art. 73, § 1º, I, do CPC/2015), os cônjuges serão necessariamente citados para a ação que trate de direitos reais imobiliários (art. 1.225 do CC). Nesse contexto, se o imóvel passou a integrar o patrimônio comum, a ação na qual se pretende a anulação da partilha envolve a anulação do próprio registro de transferência da propriedade do bem, mostrando-se indispensável a citação. 

Nessas circunstâncias, merece reforma o acórdão que entendeu pela desnecessidade de citação dos cônjuges dos herdeiros. 

3. Do dispositivo 

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para declarar que a hipótese é de litisconsórcio necessário, de modo que os cônjuges dos recorrentes devem integrar o polo passivo da lide. 

É o voto. 

EXECUÇÃO. AVALISTA. CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE GARANTIA REAL. NECESSIDADE DE CITAÇÃO. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.475.257 - MG (2014/0207179-2) 

RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. AVALISTA. CÔNJUGE. AUSÊNCIA DE GARANTIA REAL. NECESSIDADE DE CITAÇÃO. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. 

1. O cônjuge que apenas autorizou seu consorte a prestar aval, nos termos do art. 1.647 do Código Civil (outorga uxória), não é avalista. Dessa forma, não havendo sido prestada garantia real, não é necessária sua citação como litisconsorte, bastando a mera intimação, como de fato postulado pelo exequente (art. 10, § 1º, incisos I e II, do CPC de 1973). 

2. Recurso especial a que se nega provimento. 

ACÓRDÃO 

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi (Presidente) e Raul Araújo votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão. 

Brasília (DF), 10 de dezembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Trata-se de recurso especial interposto de acórdão que recebeu a seguinte ementa (e-STJ fl. 160): 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE EXECUÇÃO - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - AVAL - INCLUSÃO DO CÔNJUGE NO POLO PASSIVO - IMPOSSIBILIDADE - NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. Nos termos do art. 1647 do Código Civil, é necessária a autorização do outro cônjuge para prestação de aval, como se deu nesta seara. Contudo, por ser o aval garantia de natureza pessoal, não pode ser o cônjuge que presta consentimento, considerado avalista e por conseqüência, não se pode pretender a sua inclusão no pólo passivo da Ação de Execução. 

Alega-se ofensa ao art. 10 do Código de Processo Civil de 1973, bem como dissídio. 

Sustenta-se que "a não inclusão do cônjuge, bem como a não formação do litisconsórcio passivo necessário eivam de nulidade instransponível na Ação executiva proposta pelo Recorrido, devendo o presente Recurso Especial ser acolhido, no sentido de determinar a extinção do feito". 

Contrarrazões às e-STJ fls. 185/189. 

Destaco que a decisão recorrida foi publicada antes da entrada em vigor da Lei n. 13.105 de 2015, estando o recurso sujeito aos requisitos de admissibilidade do Código de Processo Civil de 1973, conforme Enunciado Administrativo 2/2016 desta Corte. 

É o relatório. 

VOTO 

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI (Relatora): A questão jurídica tratada no presente recurso especial diz respeito à necessidade de citação do cônjuge que concede a outorga uxória em aval quando da execução do avalista, na condição de litisconsorte necessário. 

O Tribunal solucionou a questão jurídica tratada nos seguintes termos (e-STJ fls. 161/162): 

Compulsando os autos, vê-se que o agravante propôs exceção de pré-executividade pugnando pela inclusão de sua esposa no pólo passivo da ação de execução proposta pelo Banco Safra S/A, pois, a seu aviso, a não-formação do litisconsórcio passivo gerará nulidade na ação executiva. Tal pedido que foi negado pelo Juizo a quo. Dal o presente agravo de instrumento. Vejo que não assiste razão ao agravante. Em principio, o art. 1647 do Código Civil, disciplina a matéria trazida à apreciação: "Art.1.647: Ressalvado o disposto no artigo 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I - Alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II - Pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - Prestar fiança ou aval; IV - Fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação." Dessa feita, exceto no regime de separação absoluta, o cônjuge precisa da autorização do outro cônjuge para se prestar aval, como é o caso dos autos. Tal consentimento foi devidamente prestado pela esposa do agravante, Patrícia Loureiro Campos, como se vê a f. 31-TJMG. Ocorre que não pode pretender o avalista a inclusão de sua esposa no pólo passivo da demanda executiva, pois o aval é uma garantia de pagamento de titulo de crédito que tem natureza pessoal e, com isso, o pagamento somente pode ser imputado a ele, avalista. (...) Dessa feita, por se tratar de obrigação de natureza pessoal, não pode o cônjuge que presta consentimento ser também considerado avalista. Por conseqüência, não pode figurar no pólo passivo da ação de execução. 

Entendo que o referido posicionamento não merece reformas. O art. 10 do Código de Processo Civil de 1973, invocado como norma violada, assim dispõe: 

Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do outro para propor ações que versem sobre direitos reais imobiliários. § 1o Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para as ações: I - que versem sobre direitos reais imobiliários; II - resultantes de fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou de atos praticados por eles; III - fundadas em dívidas contraídas pelo marido a bem da família, mas cuja execução tenha de recair sobre o produto do trabalho da mulher ou os seus bens reservados; IV - que tenham por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus sobre imóveis de um ou de ambos os cônjuges. § 2o Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos praticados. 

O aval é ato jurídico de prestação de garantia. 

Poderia eventualmente ser praticado por ambos os cônjuges, na condição de avalistas. 

Mas consta do acórdão recorrido que foi praticado apenas pelo executado, assinando a sua esposa unicamente na condição de outorgante da autorização para a prestação da garantia. Trata-se da condição prevista no art. 1.647 do Código Civil: 

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; III - prestar fiança ou aval; IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação. Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada. 

Assim, tal como bem observou a Corte local, não há que se falar em litisconsórcio necessário porque o cônjuge do avalista não é avalista ou tampouco praticou ato visando à garantia. 

Não desconheço o precedente desta Corte nos autos do RESP 212.447/MS, de seguinte ementa: 

EXECUÇÃO. LEGITIMIDADE DE PARTE PASSIVA AD CAUSAM DA MULHER DO AVALISTA, QUE ANUIU À CONSTITUIÇÃO DA GARANTIA HIPOTECÁRIA, COMPROMETENDO INCLUSIVE A SUA MEAÇÃO. - O garante de dívida alheia equipara-se ao devedor. Quem deu a garantia deve figurar no pólo passivo da execução, quando se pretenda tornar aquela efetiva. Precedentes. - Caso em que, ademais, os executados nomearam o bem hipotecado à penhora. Litisconsórcio passivo necessário entre o garante hipotecário e seu cônjuge. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 212.447/MS, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 17/08/2000, DJ 09/10/2000, p. 152) 

Em que pese o referido precedente tratar de legitimidade passiva ad causam em execução de cédula de crédito comercial em que o cônjuge recorrente não figura como emitente nem avalista, tem-se a peculiaridade de que foi anuente de hipoteca, gravame de direito real que atrai a incidência do art. 10, § 1º, I, do Código de Processo Civil de 1973, não tratado no presente caso e tampouco invocado pelo ora recorrente nas razões de seu especial. 

O mesmo ocorre nos seguintes precedentes, em que há garantia real ou penhora de imóvel: 

PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL HIPOTECÁRIA. EXECUÇÃO. NECESSIDADE DE CITAÇÃO DO CÔNJUGE DAQUELE QUE PRESTA AVAL NO TÍTULO. AUSÊNCIA. NULIDADE. 1. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que "não viola a disciplina processual o acórdão que anula o processo de execução de título executivo extrajudicial com garantia pignoratícia e hipotecária, pela ausência da citação do cônjuge do executado (REsp 87.853/MA, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, DJ de 15.12.1997) 2. Precedentes: REsp 468.333/MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 1º/12/2009, DJe de 14/12/2009; REsp 49669/RS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 14/11/2000, DJ de 12/2/2001; REsp 212.447/MG, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, DJ de 9.10.2000. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag 1165048/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 05/08/2011) 

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA DE BEM IMOVEL. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DO CONJUGE. 1. SEGUNDO ORIENTAÇÃO QUE VEIO A PREVALECER NESTA QUARTA TURMA, NO CASO DA PENHORA RECAIR SOBRE BEM IMOVEL TORNA-SE IMPRESCINDIVEL A INTIMAÇÃO DO CONJUGE, SOB PENA DE NULIDADE. 2. ANTE A FORMAÇÃO DE LITISCONSORCIO NECESSARIO, FICA O MARIDO-EXECUTADO LEGITIMADO PARA ARGUIR A EVENTUAL FALTA DA INTIMAÇÃO DE SUA MULHER EM SEDE DE EMBARGOS A EXECUÇÃO. 3. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (REsp 11.699/PR, Rel. Ministro BUENO DE SOUZA, QUARTA TURMA, julgado em 06/06/1994, DJ 01/08/1994, p. 18651) 

Veja-se que no último precedente citado se fala em intimação do cônjuge, e não citação. 

No caso, o exequente postulou a intimação do cônjuge, conforme se depreende do pedido inicial da execução à e-STJ fl. 22 dos autos. 

Assim, não há que se declarar a extinção da execução como pretende a recorrente. 

Não sendo a hipótese dos autos, em que a instituição financeira apresenta sua inicial postulando o pagamento ou a indicação de bens à penhora, suficiente o pedido inicial de intimação. 

Ainda que transpostos os referidos óbices, não seria o caso de extinção do feito, como pretende a recorrente, mas mero retorno dos autos à origem para emenda à inicial, o que não é o caso. No mesmo sentido: 

PROCESSUAL CIVIL. EMENDA À INICIAL. MODIFICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR E DO PEDIDO, APÓS OFERECIDA A CONTESTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DETERMINAÇÃO, EX OFFICIO, DE QUE O AUTOR PROMOVA A CITAÇÃO DO LITISCONSORTE PASSIVO NECESSÁRIO. POSSIBILIDADE. ART. 47 DO CPC/1973. NORMA DE CARÁTER DE ORDEM PÚBLICA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência do STJ não se admite a emenda da inicial após o oferecimento da contestação quando tal diligência ensejar a modificação do pedido ou da causa de pedir. Isso porque a regra prevista no art. 284 do CPC/1973 deve ser compatibilizada com o disposto no art. 264 do CPC/1973, que impede ao autor, após a citação, modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu; e, em nenhuma hipótese, permite a alteração do pedido ou da causa de pedir após o saneamento do processo. 2. In casu, a emenda da inicial para possibilitar a inclusão no polo passivo da demanda de litisconsorte necessário não enseja modificação do pedido ou da causa de pedir. 3. Ademais, é assente o entendimento do STJ de que o litisconsórcio necessário é regido por norma de ordem pública, cabendo ao juiz determinar, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, a integração à lide do litisconsorte passivo. 4. Nos termos do art. 47 do Código de Processo Civil de 1973 há o litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. 5. O litisconsórcio necessário, à exceção das hipóteses de imposição legal, encontra sua razão de ser na natureza da relação jurídica de direito material deduzida em juízo, que implica produção dos efeitos da decisão de mérito de forma direta na esfera jurídica de todos os integrantes dessa relação. 6. Agravo Interno não provido. (AgInt no REsp 1593819/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/10/2016, REPDJe 03/05/2017, DJe 08/11/2016) 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DETERMINAÇÃO DE EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL. DESCUMPRIMENTO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. PROVIMENTO NEGADO. 1. Nos termos do art. 284 do Código de Processo Civil, impõe-se o indeferimento da petição inicial se a parte autora, intimada à emendá-la, não leva a efeito tal incumbência. 2. Preclusa a matéria relacionada à necessidade de aditamento da petição inicial por força do reconhecimento da existência de litisconsórcio passivo necessário, outra alternativa não restava à impetrante, senão promover a emenda da petição inicial do mandado de segurança. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no RMS 27.720/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 12/05/2015, DJe 21/05/2015) 

Improsperável, a meu entender, a pretensão de reforma do acórdão recorrido para extinguir o feito de execução. 

Em face do exposto, nego provimento ao recurso especial. 

É como voto. 

28 de abril de 2021

STJ: Sem citação de companheira, partilha de bens é nula

 A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) restabeleceu decisão de primeiro grau que anulou uma sentença homologatória de partilha e declarou a companheira do falecido como a única herdeira, excluindo os irmãos dele da linha sucessória. Ao anular a homologação da partilha, o juízo levou em conta a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 809 da repercussão geral e, também, a falta de citação da companheira no processo.

Por unanimidade, a Terceira Turma afastou a conclusão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) de que o Tema 809 não seria aplicável ao caso pelo fato de a partilha já estar homologada antes do julgamento em que o STF considerou inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros.

A ação de inventário foi proposta por um irmão do falecido, que indicou os demais irmãos como herdeiros. Diante do consenso das partes até então citadas no processo, o juiz homologou a partilha e atribuiu aos herdeiros os respectivos quinhões. Antes da expedição do formal de partilha, a companheira do falecido requereu a sua habilitação nos autos.

Irmãos excluídos

Em razão desse fato, o juiz declarou insubsistente a sentença homologatória anteriormente proferida. E, após o julgamento do Tema 809 pelo STF, aplicou ao inventário a regra do artigo 1.829 do Código Civil, tornando a convivente herdeira e excluindo os irmãos do falecido da linha sucessória.

O TJSP, porém, reformou a sentença, por considerar que o Tema 809 – como definido pelo próprio STF – só seria aplicável aos inventários cuja sentença de partilha ainda não houvesse transitado em julgado. Considerando que a partilha já se encontrava homologada e que não havia nenhum recurso, o TJSP decretou a nulidade dos atos produzidos após a sentença homologatória e determinou que fosse expedido o formal de partilha.

Inexistência jurídica

A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso no STJ, apontou que o juízo do inventário, ao declarar a insubsistência da sentença homologatória da partilha, nada mais fez do que reconhecer a sua inexistência jurídica em razão da ausência de citação da companheira do autor da herança.

Com base na jurisprudência do STJ, a ministra ressaltou que não é possível falar em coisa julgada de sentença proferida em processo no qual não se formou a relação jurídica necessária ao seu desenvolvimento.

“Ainda que se pudesse cogitar da formação de coisa julgada material a partir de sentença homologatória de acordo de partilha e consequente possibilidade de execução do formal de partilha – que, na hipótese, sequer foi expedido –, não se pode olvidar que a execução seria ineficaz em relação à recorrente, que, relembre-se, apenas ingressou na ação de inventário após a prolação da sentença homologatória de acordo entre os colaterais”, concluiu a magistrada ao restabelecer a decisão que reconheceu a convivente como única herdeira do falecido.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1857852
STJ