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26 de fevereiro de 2022

A indução do morador a erro na autorização do ingresso em domicílio macula a validade da manifestação de vontade e, por consequência, contamina toda a busca e apreensão

Processo

HC 674.139-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 15/02/2022.

Ramo do Direito

DIREITO CONSTITUCIONAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Busca e apreensão. Domicílio como expressão do direito à intimidade. Asilo inviolável. Exceções constitucionais. Interpretação restritiva. Ausência de fundadas razões. Ausência de consentimento válido do morador. Indução a erro. Vício da manifestação de vontade. Provas obtidas. Nulidade.

 

DESTAQUE

A indução do morador a erro na autorização do ingresso em domicílio macula a validade da manifestação de vontade e, por consequência, contamina toda a busca e apreensão.


INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O art. 5º, XI, da Constituição Federal consagrou o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, ao dispor que a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.

O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral (Tema 280), que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo - a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno - quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito (RE 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010). No mesmo sentido, neste STJ: REsp 1.574.681/RS.

No caso, apesar da menção a informação anônima repassada pela Central de Operações da Polícia Militar - Copom, não há nenhum registro concreto de prévia investigação para apurar a conformidade da notícia, ou seja, a ocorrência do comércio espúrio na localidade, tampouco a realização de diligências prévias, monitoramento ou campanas no local para averiguar a veracidade e a plausibilidade das informações recebidas anonimamente e constatar o aventado comércio ilícito de entorpecentes. Não houve, da mesma forma, menção a qualquer atitude suspeita, exteriorizada em atos concretos, nem movimentação de pessoas típica de comercialização de drogas.

Por ocasião do julgamento do HC 598.051/SP (Rel. Ministro Rogerio Schietti, DJe 15/3/2021), a Sexta Turma desta Corte Superior de Justiça, à unanimidade, propôs nova e criteriosa abordagem sobre o controle do alegado consentimento do morador para o ingresso em seu domicílio por agentes estatais. Na ocasião, foram apresentadas as seguintes conclusões: a) Na hipótese de suspeita de crime em flagrante, exige- se, em termos de standard probatório para ingresso no domicílio do suspeito sem mandado judicial, a existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de modo objetivo e devidamente justificadas, de maneira a indicar que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito; b) O tráfico ilícito de entorpecentes, em que pese ser classificado como crime de natureza permanente, nem sempre autoriza a entrada sem mandado no domicílio onde supostamente se encontra a droga. Apenas será permitido o ingresso em situações de urgência, quando se concluir que do atraso decorrente da obtenção de mandado judicial se possa objetiva e concretamente inferir que a prova do crime (ou a própria droga) será destruída ou ocultada; c) O consentimento do morador, para validar o ingresso de agentes estatais em sua casa e a busca e apreensão de objetos relacionados ao crime, precisa ser voluntário e livre de qualquer tipo de constrangimento ou coação; d) A prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo e preservada tal prova enquanto durar o processo; e) A violação a essas regras e condições legais e constitucionais para o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas obtidas em decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em relação de causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal do(s) agente(s) público(s) que tenha(m) realizado a diligência.

As regras de experiência e o senso comum, somadas às peculiaridades do caso concreto, não conferem verossimilhança à afirmação dos agentes policiais de que o paciente teria autorizado, livre e voluntariamente, o ingresso em seu próprio domicílio, de sorte a franquear àqueles a apreensão de drogas e, consequentemente, a formação de prova incriminatória em seu desfavor.

Na hipótese em análise, ainda que o acusado haja admitido a abertura do portão do imóvel para os agentes da lei, ressalvou que o fez apenas porque informado sobre a necessidade de perseguirem um suposto criminoso em fuga, e não para que fossem procuradas e apreendidas drogas. Ademais, se, de um lado, deve-se, como regra, presumir a veracidade das declarações de qualquer servidor público, não se há de ignorar, por outro lado, que a notoriedade de frequentes eventos de abusos e desvios na condução de diligências policiais permite inferir como pouco crível a versão oficial apresentada no inquérito policial, máxime quando interfere em direitos fundamentais do indivíduo e quando se nota indisfarçável desejo de se criar narrativa que confira plena legalidade à ação estatal. Essa relevante dúvida não pode, dadas as circunstâncias concretas - avaliadas por qualquer pessoa isenta e com base na experiência quotidiana do que ocorre nos centros urbanos - ser dirimida a favor do Estado, mas a favor do titular do direito atingido (in dubio pro libertas).

Em verdade, caberia aos agentes que atuam em nome do Estado demonstrar, de modo inequívoco, que o consentimento do morador foi livremente prestado, ou que, na espécie, havia em curso na residência uma clara situação de comércio espúrio de droga, a autorizar, pois, o ingresso domiciliar mesmo sem consentimento válido do morador. Entretanto, não se demonstrou preocupação em documentar esse consentimento, quer por escrito, quer por testemunhas, quer, ainda e especialmente, por registro de áudio-vídeo.

Sobre a gravação audiovisual, aliás, é pertinente destacar o recente julgamento pelo Supremo Tribunal Federal dos Embargos de Declaração na Medida Cautelar da ADPF 635 ("ADPF das Favelas", finalizado em 3/2/2022), oportunidade na qual o Pretório Excelso - em sua composição plena e em consonância com o decidido por este Superior Tribunal no já citado HC 598.051/SP - reconheceu a imprescindibilidade de tal forma de monitoração da atividade policial e determinou, entre outros, que "o Estado do Rio de Janeiro, no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, instale equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de segurança, com o posterior armazenamento digital dos respectivos arquivos". Dessa forma, em atenção à basilar lição de hermenêutica constitucional segundo a qual exceções a direitos fundamentais devem ser interpretadas restritivamente, prevalece, quanto ao consentimento, na ausência de prova adequada em sentido diverso, a versão apresentada pelo morador de que apenas abriu o portão para os policiais perseguirem um suposto autor de crime de roubo.

Partindo dessa premissa, isto é, de que a autorização foi obtida mediante indução do acusado a erro pelos policiais militares, não pode ser considerada válida a apreensão das drogas, porquanto viciada a manifestação volitiva do paciente. Se, no Direito Civil, que envolve direitos patrimoniais disponíveis, em uma relação equilibrada entre particulares, a indução da parte adversa a erro acarreta a invalidade da sua manifestação por vício de vontade (art. 145, CC), com muito mais razão deve fazê-lo no Direito Penal (lato sensu), que trata de direitos indisponíveis do indivíduo diante do poderio do Estado, em relação manifestamente desigual.

A descoberta a posteriori de uma situação de flagrante decorreu de ingresso ilícito na moradia do acusado, em violação a norma constitucional que consagra direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, o que torna imprestável, no caso concreto, a prova ilicitamente obtida e, por conseguinte, todos os atos dela decorrentes - relativa ao delito descrito no art. 33 da Lei n. 11.343/2006 -, porque apoiada exclusivamente nessa diligência policial.

Ressalta-se que, conquanto seja legítimo que os órgãos de persecução penal se empenhem em investigar, apurar e punir autores de crimes mais graves, os meios empregados devem, inevitavelmente, vincular-se aos limites e ao regramento das leis e da Constituição Federal. Afinal, é a licitude dos meios empregados pelo Estado que justificam o alcance dos fins perseguidos, em um processo penal sedimentado sobre bases republicanas e democráticas.

9 de outubro de 2021

Na ação de busca e apreensão de que trata o Decreto-Lei n. 911/1969, a análise da contestação somente deve ocorrer após a execução da medida liminar.

Processo

REsp 1.892.589-MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por maioria, julgado em 16/09/2021. (Tema 1040)

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Alienação fiduciária. Ação de busca e apreensão. Decreto-Lei n. 911/1969. Apreciação da contestação antes da execução da medida liminar. Impossibilidade. Tema 1040.

 

DESTAQUE

Na ação de busca e apreensão de que trata o Decreto-Lei n. 911/1969, a análise da contestação somente deve ocorrer após a execução da medida liminar.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Pontua-se, de início, que não se discute a possibilidade de apresentação da contestação antes da execução da medida liminar, não havendo espaço para se falar em extemporaneidade, prematuridade ou necessidade de desentranhamento da peça.

A controvérsia se restringe ao momento em que a contestação deve ser apreciada pelo órgão julgador.

Observa-se que no artigo 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 o legislador elegeu a execução da liminar como termo inicial de contagem do prazo para: 1) a consolidação da propriedade do bem no patrimônio do credor fiduciário; 2) o pagamento da integralidade da dívida pendente e a consequente restituição do bem ao devedor livre de ônus e 3) a apresentação de resposta pelo réu.

Ou seja, a eleição da execução da medida liminar como termo inicial da contagem do prazo para contestação revela uma opção legislativa clara de assegurar ao credor fiduciário com garantia real uma resposta satisfativa rápida em caso de mora ou inadimplemento por parte do devedor fiduciante, incompatível com o procedimento comum.

É essa agilidade inerente ao procedimento especial do Decreto-Lei n. 911/1969 que fomenta o instituto da alienação fiduciária tornando a sua adoção vantajosa tanto para o consumidor, que conta com melhores condições de concessão de crédito (taxas e encargos), quanto para o agente financeiro, por meio da facilitação dos mecanismos de recuperação do bem em caso de inadimplemento.

É cediço que a mora e o inadimplemento, aliados à morosidade no deferimento de tutela satisfativa voltada à entrega do bem alienado ao credor fiduciário, são fatores determinantes para o encarecimento do crédito, de modo que o aparente rigorismo na norma é o que garante a utilidade do instituto, impedindo que ele caia em desuso.

Não foi outro o norte seguido pela Segunda Seção, quando do julgamento do REsp 1.622.555/MG, ao afastar a aplicação da teoria do adimplemento substancial no regime da lei especial (Decreto n. 911/1969), sob pena de desvirtuamento do instituto da propriedade fiduciária, concebido pelo legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial ao desenvolvimento da economia nacional.

Não há dúvidas, portanto, de que a legislação especial foi estruturada com um procedimento especial que prevê, em um primeiro momento, a recuperação do bem e, em uma segunda etapa, a possibilidade de purgação da mora e a análise da defesa.

Vale anotar que o próprio sistema dispõe de mecanismos para remediar eventual abuso ou negligência do credor fiduciário ao prever o pagamento de multa em favor do devedor fiduciante, equivalente a 50% (cinquenta por cento) do valor originalmente financiado, devidamente atualizado, caso o bem já tenha sido alienado, na hipótese de improcedência da ação de busca e apreensão, além da responsabilidade do credor fiduciário por perdas e danos (artigo 3º, §§ 6º e 7º).

Além disso, está absolutamente sedimentada a jurisprudência desta Corte no sentido de que, estando demonstrada a mora/inadimplemento, o deferimento na medida liminar de busca e apreensão é impositivo.

Nesse contexto, condicionar o cumprimento da medida liminar de busca e apreensão à apreciação da contestação, ainda que limitada a eventuais matérias cognoscíveis de ofício e que não demandem dilação probatória (considerada ainda a subjetividade na delimitação dessas matérias), causaria enorme insegurança jurídica e ameaça à efetividade do procedimento.




10 de maio de 2021

O MP pode escolher quais elementos obtidos na busca e apreensão serão utilizados pela acusação; no entanto, o material restante deve permanecer à livre consulta do acusado, para o exercício de suas faculdades defensivas

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-692-stj.pdf 


BUSCA E APREENSÃO - O MP pode escolher quais elementos obtidos na busca e apreensão serão utilizados pela acusação; no entanto, o material restante deve permanecer à livre consulta do acusado, para o exercício de suas faculdades defensivas 

Realizada a busca e apreensão, apesar de o relatório sobre o resultado da diligência ficar adstrito aos elementos relacionados com os fatos sob apuração, deve ser assegurado à defesa acesso à integra dos dados obtidos no cumprimento do mandado judicial. STJ. 6ª Turma. RHC 114.683/RJ, Rel. Rogério Schietti Cruz, julgado em 13/04/2021 (Info 692). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Foi instaurada investigação para apurar crimes que teriam sido praticados por João e outras pessoas. Após representação da autoridade policial, o juiz deferiu medida cautelar de busca e apreensão a ser cumprida em diversos locais, dentre eles, na residência e no escritório de João. A polícia realizou relatório com o resultado da diligência. Este resultado foi compartilhado com a defesa. Ocorre que a defesa argumentou que foram obtidos inúmeros outros dados no cumprimento do mandado judicial aos quais ela não teve acesso, dentre eles, computadores, tablets, cartões de memória, pen-drives, celulares etc. O Ministério Público argumentou que foram juntados aos autos os elementos informativos que interessam aos fatos sob apuração, de forma que o restante que não foi anexado não tinha relação efetiva com a investigação. Ademais, o MP argumentou que muitos elementos colhidos estão relacionados com a intimidade dos demais investigados, razão pela qual não poderiam ser fornecidos. 

A defesa tem direito ao restante do material obtido no cumprimento da busca e apreensão? SIM. 

Realizada a busca e apreensão, apesar de o relatório sobre o resultado da diligência ficar adstrito aos elementos relacionados com os fatos sob apuração, deve ser assegurado à defesa acesso à integra dos dados obtidos no cumprimento do mandado judicial. STJ. 6ª Turma. RHC 114.683/RJ, Rel. Rogério Schietti Cruz, julgado em 13/04/2021 (Info 692). 

Segundo o enunciado da Súmula Vinculante nº 14, do Supremo Tribunal Federal: 

SV 14: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa. 

Durante a fase do inquérito policial, o enunciado da Súmula Vinculante nº 14 do STF expressa o direito de acesso pela defesa aos elementos de convicção já documentados pelo órgão com competência de polícia e que digam respeito ao exercício legítimo do direito de defesa. O STF, em julgado sobre o tema, detalhou em que consistiria o chamado “acesso amplo”, mencionado na súmula vinculante: 

(...) I – O direito ao “acesso amplo”, descrito pelo verbete mencionado, engloba a possibilidade de obtenção de cópias, por quaisquer meios, de todos os elementos de prova já documentados, inclusive mídias que contenham gravação de depoimentos em formato audiovisual. II – A simples autorização de ter vista dos autos, nas dependências do Parquet, e transcrever trechos dos depoimentos de interesse da defesa, não atende ao enunciado da Súmula Vinculante 14. (...) STF. 2ª Turma. Rcl 23.101/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 6/12/2016. 

Princípio da comunhão da prova 

O Ministério Público pode escolher quais elementos obtidos na busca e apreensão serão utilizados pela acusação. No entanto, o material restante, supostamente não utilizado, deve permanecer à livre consulta do acusado, para o exercício de suas faculdades defensivas. Essa é a ratio essendi da Súmula Vinculante nº 14 do STF. O Ministério Público juntou aos autos apenas aquilo que entendeu necessário para a imputação ministerial. Logo, é evidente que o acusado tem o direito de saber se, no restante do material apreendido, existe mais algum elemento que interesse à sua defesa. O órgão responsável pela acusação não pode ter a prerrogativa de escolher o material que irá ser disponibilizado ao réu, como se a ele pertencesse a prova. Na verdade, as fontes e o resultado da prova são de interesse comum de ambas as partes e do juiz (princípio da comunhão da prova). 

Lealdade processual 

A negativa do MP em disponibilizar acesso integral aos elementos colhidos não se ajusta à ideia da lealdade processual e fere de morte a igualdade de oportunidades que há de marcar a atividade estatal de reconstrução da verdade. 

E a intimidade dos demais investigados, não ficaria violada? 

A fim de resguardar a intimidade dos demais investigados em relação aos quais foi cumprida diligência de busca e apreensão, basta que se colha dos advogados o compromisso de não dar publicidade ao material examinado e que não interesse, direta ou indiretamente, à defesa de seu cliente. 

Dispositivo 

Em um caso parecido com o exemplo hipotético acima, o STJ deu provimento ao recurso em habeas corpus, para anular o processo referido na petição inicial desde o ato de recebimento da denúncia, de sorte a permitir à defesa a prévia consulta à totalidade dos documentos e objetos apreendidos em decorrência do cumprimento do mandado de busca e apreensão.

 




4 de maio de 2021

Informativo 694, STJ: Inexiste exigência legal de que o mandado de busca e apreensão detalhe o tipo de documento a ser apreendido, ainda que de natureza sigilosa.

 RHC 141.737/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, Sexta Turma, por maioria, julgado em 27/04/2021.

Busca e apreensão. Prontuários médicos. Documentos sigilosos. Discriminação específica no mandado. Desnecessidade. Nulidade da prova. Inocorrência.


Inexiste exigência legal de que o mandado de busca e apreensão detalhe o tipo de documento a ser apreendido, ainda que de natureza sigilosa.

Informações do Inteiro Teor

No caso, se a investigação foi deflagrada em virtude da adulteração de prontuários, a interpretação evidente é de que os principais objetos visados pela medida de busca e apreensão eram os prontuários dos pacientes que haviam sido submetidos a tratamento e, ao mesmo tempo, vítimas de inúmeros crimes.

Não se vê a ocorrência de nulidade. Embora os prontuários possam conter dados sigilosos, foram obtidos a partir da imprescindível autorização judicial prévia, quer dizer, a prova foi obtida por meio lícito. A ausência de sua discriminação específica no mandado de busca é irrelevante, até porque os prontuários médicos encontram-se inseridos na categoria de documentos em geral, inexistindo qualquer exigência legal de que a autorização cautelar deva detalhar o tipo de documento a ser apreendido quando este possuir natureza sigilosa.

Conforme já se pronunciou o STF, "dada a impossibilidade de indicação, ex ante, de todos os bens passíveis de apreensão no local da busca, é mister conferir-se certa discricionariedade, no momento da diligência, à autoridade policial" (STF, Pet 5173/DF, Min. Dias Tofoli, Primeira Turma, DJe 18/11/2014).

Com efeito, "O artigo 243 da Lei Processual Penal disciplina os requisitos do mandado de busca e apreensão, dentre os quais não se encontra o detalhamento do que pode ou não ser arrecadado" (HC 524.581/RJ, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 13/2/2020). "Suficiente à delimitação da busca e apreensão é a determinação de que deveriam ser apreendidos os materiais que pudessem guardar relação estrita com aqueles fatos [...]" (HC 537.017/RS, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 3/2/2020).

Em outro precedente, esta Corte Superior já preconizou que "O artigo 240 do Código de Processo Penal, ao tratar da busca e apreensão, apresenta um rol exemplificativo dos casos em que a medida pode ser determinada, no qual se encontra a hipótese de arrecadação de objetos necessários à prova da infração ou à defesa do réu, não havendo qualquer ressalva de que não possam dizer respeito à intimidade ou à vida privada do indivíduo" (HC 142.205/RJ, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma DJe 13/12/2010).

Ademais, vale frisar que o sigilo do qual se reveste os prontuários médicos pertencem única e exclusivamente aos pacientes, não ao médico. Assim, como afirmado pelo Tribunal estadual, caso houvesse a violação do direito à intimidade, haveria de ser arguida pelos seus titulares e não pelo investigado.

5 de abril de 2021

Mandado de busca e apreensão. Empresa investigada. Pessoa que se apresenta como representante. Consentimento expresso. Validade. Teoria da aparência.

 RMS 57.740-PE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 23/03/2021

É válida a autorização expressa para busca e apreensão em sede de empresa investigada dada por pessoa que age como sua representante.

Cinge-se a controvérsia a saber sobre a validade da autorização para cumprimento de mandado de busca e apreensão dada por pessoa que, embora tenha deixado de ser sócia formal de empresa, continua assinando documentos, possui a chave do escritório e apresenta-se como responsável para as autoridades policiais.

A teoria da aparência, quando cabível, valida a autorização expressa para a realização de busca e apreensão em sede de empresa investigada.

Vale ressaltar que, embora tal teoria tenha encontrado maior amplitude de aplicação jurisprudencial na seara civil, processual civil e no Código de Defesa do Consumidor, nada há que impeça sua aplicação também na seara penal.

Contudo, para sua aplicação, há de reforçar a necessidade de conjugação da boa-fé com o erro escusável e alguns requisitos essenciais. Segundo a doutrina, são seus requisitos essenciais objetivos: a) uma situação de fato cercada de circunstâncias tais que manifestamente a apresentem como se fora uma situação de direito; b) situação de fato que assim possa ser considerada segundo a ordem geral e normal das coisas; c) e que, nas mesmas condições acima, apresente o titular aparente como se fora titular legítimo, ou o direito como se realmente existisse. São seus requisitos subjetivos essenciais: a) a incidência em erro de quem, de boa-fé, a mencionada situação de fato como situação de direito considera; b) a escusabilidade desse erro apreciada segundo a situação pessoal de quem nele incorreu.

Assim, reputa-se válida a autorização de ingresso da autoridade policial no estabelecimento dada por empregados da empresa, ou quem se apresenta como tal, observados os requisitos supracitados, em face da teoria da aparência.