RECURSO ESPECIAL Nº 1.786.311 - PR (2018/0330536-4)
RELATOR : MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL.
SUCESSÃO DE EMPRESAS. GRUPO ECONÔMICO DE FATO.
CONFUSÃO PATRIMONIAL. INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.
DESNECESSIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022, DO CPC/2015.
INEXISTÊNCIA.
I - Impõe-se o afastamento de alegada violação do art. 1.022 do
CPC/2015, quando a questão apontada como omitida pelo recorrente foi
examinada no acórdão recorrido, caracterizando o intuito revisional dos
embargos de declaração.
II - Na origem, foi interposto agravo de instrumento contra decisão
que, em via de execução fiscal, deferiu a inclusão da ora recorrente no polo
passivo do feito executivo, em razão da configuração de sucessão empresarial
por aquisição do fundo de comércio da empresa sucedida.
III - Verificado, com base no conteúdo probatório dos autos, a
existência de grupo econômico e confusão patrimonial, apresenta-se inviável o
reexame de tais elementos no âmbito do recurso especial, atraindo o óbice da
Súmula n. 7/STJ.
IV - A previsão constante no art. 134, caput, do CPC/2015, sobre
o cabimento do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, na
execução fundada em título executivo extrajudicial, não implica a incidência do
incidente na execução fiscal regida pela Lei n. 6.830/1980, verificando-se
verdadeira incompatibilidade entre o regime geral do Código de Processo Civil
e a Lei de Execuções, que diversamente da Lei geral, não comporta a
apresentação de defesa sem prévia garantia do juízo, nem a automática
suspensão do processo, conforme a previsão do art. 134, § 3º, do CPC/2015.
Na execução fiscal "a aplicação do CPC é subsidiária, ou seja, fica reservada
para as situações em que as referidas leis são silentes e no que com elas
compatível" (REsp n. 1.431.155/PB, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 27/5/2014).
V - Evidenciadas as situações previstas nos arts. 124, 133 e 135,
todos do CTN, não se apresenta impositiva a instauração do incidente de
desconsideração da personalidade jurídica, podendo o julgador determinar
diretamente o redirecionamento da execução fiscal para responsabilizar a
sociedade na sucessão empresarial. Seria contraditório afastar a instauração do
incidente para atingir os sócios-administradores (art. 135, III, do CTN), mas
exigi-la para mirar pessoas jurídicas que constituem grupos econômicos para
blindar o patrimônio em comum, sendo que nas duas hipóteses há
responsabilidade por atuação irregular, em descumprimento das obrigações
tributárias, não havendo que se falar em desconsideração da personalidade
jurídica, mas sim de imputação de responsabilidade tributária pessoal e direta
pelo ilícito.
VI - Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte,
improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
conhecer em parte do recurso e, nessa parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto do(a)
Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Og Fernandes e Assusete
Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Mauro Campbell Marques.
Dr(a). GABRIEL MATOS BAHIA(Representação decorre de Lei), pela parte
RECORRIDA: FAZENDA NACIONAL
Brasília (DF), 09 de maio de 2019(Data do
Julgamento)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO (Relator):
Trata-se de recurso especial interposto pela CCD Transporte Coletivo S.A,
com fundamento no art. 105, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. SUCESSÃO DE
EMPRESAS. ARTIGO 133 DO CTN. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO.
INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.
DESNECESSIDADE.
1. Caracteriza a sucessão de empresas, e assunção de responsabilidade
tributária, quando a empresa sucessora adquire o fundo de comércio da empresa
sucedida, continua a exploração da mesma atividade econômica e em mesmo local.
2. A sucessão empresarial pode ser configurada sem a necessidade de um
ato formal da transferência, e sim com indícios e provas convincentes de sua
ocorrência.
3. A jurisprudência deste Tribunal está consolidada, conforme a Súmula
112, no sentido de que a responsabilização dos sócios fundada na dissolução
irregular da pessoa jurídica prescinde do incidente de desconsideração da
personalidade jurídica.
4. Agravo de instrumento improvido.
Na origem, foi interposto agravo de instrumento contra decisão que, em via de
execução fiscal do valor que somava R$ 1.332.822,53 (um milhão, trezentos e trinta e dois
mil, oitocentos e vinte e dois reais e cinquenta e três centavos), em abril de 1997 (fl. 8), deferiu
a inclusão da ora recorrente no polo passivo do feito executivo, em razão da configuração de
sucessão empresarial por aquisição do fundo de comércio da empresa sucedida, o que foi
mantido pelo Tribunal de origem, conforme ementa acima transcrita.
Os embargos de declaração interpostos foram improvidos.
No presente recurso especial, a recorrente aponta a violação do art. 1.022 do
CPC/2015, sustentando, em resumo, que, não obstante a interposição dos declaratórios, o
Tribunal de origem não apreciou os fatos que afastam a configuração da sucessão de empresas, diante (i) da existência de contexto fático diverso (novo contrato de concessão com
o Poder Público com regime jurídico diferenciado), (ii) da não comprovação da insolvência da
devedora originária; bem assim (iii) da necessidade de apuração dos fatos em via própria (com
cognição prévia e observância do princípio do devido processo legal).
Indica, ainda, a ofensa ao art. 133 do CTN, alegando, em síntese, que o
Tribunal de origem deveria ter considerado que não ficaram demonstrados os requisitos
formais e materiais para o reconhecimento da sucessão de empresas.
Acusa, por fim, a afronta ao art. 133 do CPC/2015, aduzindo, em suma, que o
Tribunal de origem deveria ter determinado a instauração do incidente de desconsideração da
personalidade jurídica para estabelecer o contraditório sobre a sucessão de empresas.
Apresentadas contrarrazões pela manutenção do acórdão recorrido.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO (Relator):
Em relação à indicada violação do art. 1.022 do CPC/2015 pelo Tribunal a
quo, não se vislumbra a alegada omissão da questão jurídica apresentada pela recorrente, qual
seja, a não configuração da sucessão empresarial, tendo o julgador abordado a questão à fl.
119, consignando que a natureza do contrato de concessão firmado com a municipalidade em
comparação com o vínculo anterior de permissão não altera a moldura fática que demonstra a
ocorrência da sucessão empresarial.
Nesse panorama, a oposição dos embargos declaratórios caracterizou, tão
somente, a irresignação da embargante diante de decisão contrária a seus interesses, o que não
viabiliza o referido recurso. Descaracterizada a alegada omissão, tem-se de rigor o
afastamento da suposta violação do art. 1.022 do CPC/2015.
Sobre a alegada ofensa ao art. 133 do CTN, o recurso não comporta
seguimento.
Verifica-se que a irresignação da recorrente, acerca da não configuração da
sucessão empresarial, vai de encontro às convicções do julgador a quo, que, com lastro no
conjunto probatório constante dos autos, assim decidiu sobre a configuração da sucessão de
empresas:
No caso, mantêm-se hígidos os fundamentos lançados no bojo do
Processo nº 5079008-50.2014.4.04.7000 (acima transcritos), em que reconheceu-se
a sucessão de empresas. Com efeito, a natureza diversa do contrato atualmente
firmado entre a empresa agravante e a municipalidade (concessão) quando
comparada ao vínculo que anteriormente mantinha com o mesmo ente (permissão)
não é capaz de, por si só, alterar a moldura fática delineada pelo juízo de origem, que
permite concluir pela sucessão de empresas, sendo, assim, legítima a inclusão da
agravante no pólo passivo da execução originária. (fl. 96)
No particular, observa-se que foi decisão de primeira instância, que entendeu pela ocorrência da sucessão de empresas com a configuração de grupo econômico de fato
entre executadas com atuação no mesmo ramo de atividade econômica (transporte rodoviário
coletivo de passageiros), tendo havido alterações contratuais evidenciando a identidade de
sócios e a mesma sede social, dentre outros. Apontou-se que, em razão de alteração
contratual, a ora recorrente (sob outra denominação) ingressou no quadro social da outra
pessoa jurídica executada, permitindo, assim, aumento patrimonial de R$ 501.370,00 para R$
9.195.550,00 – tendo, posteriormente, dela se retirado, cedendo a totalidade de suas cotas
aos demais sócios, do que resultou, ao final, a ocorrência de esvaziamento patrimonial.
Confira-se:
Sucessão Tributária Requer a exeqüente seja reconhecida a sucessão
tributária, nos termos do art. 133 do CTN, com a inclusão no pólo passivo da
presente execução, da empresa CCD TRANSPORTE COLETIVO S/A.
O art. 133 do Código Tributário Nacional assim dispõe:
Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que
adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou
estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a
respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob
firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo
ou estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato:
I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do
comércio, indústria ou atividade;
II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na
exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da
alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio,
indústria ou profissão.
Verifica-se, pois, que o artigo 133 do CTN exige tenha havido
aquisição do fundo de comércio ou de estabelecimento comercial,
industrial ou profissional.
No caso dos autos há fortes indícios de que ocorreu a transferência do
fundo de comércio/estabelecimento comercial da Empresa Cristo Rei Ltda à empresa
CCD Transporte Coletivo S/A (anterior Cristo Rei Transporte Coletivo Ltda):
1. Ramo de atividade
Conforme documentos juntados aos autos, ambas as empresas
dedicam-se ao "transporte rodoviário coletivo de passageiros, com
itinerário fixo, municipal" (fl. 102/215).
2. Sede social
Ambas as empresas têm sua sede no mesmo endereço (Rua
Frei Orlando, nº 1400 - Cristo Rei - Ctba) (fls. 102/215).
3. Vínculo entre os sócios
Ambas as empresas são integradas pelos sócios Hilton Chipon,
Eduardo José Chipon, Carlos César Dalledone, Leonice Maria
Chipon, Viviane Vanessa M. Dalledone Chipon, Cristiane Marie
Chipon e Espólio de Vitório Viezzer Neto (fls. 102/215). Conforme 39ª alteração contratual da Empresa Cristo Rei
Limitada (fls. 132/5) , aempresa Cristo Rei Participações e
Administração Limitada (atual CCD Transporte Coletivo S/A),
ingressou na executada com o maior número de cotas sociais,
adquiridas de José Natal Strapasson e Hamilton Gabriel Strapasson.
Consta na 41ª alteração contratual (fls. 141/6), que houve um
aumento de capital social da executada de R$ 501.370,00 para R$
9.195.550,00 resultante basicamente da integralização de imóveis da
empresa Cristo Rei Participações e Administração Limitada (atual
CCD Transporte Coletivo S/A).
Pela 45ª alteração contratual (160/7), em 09/04/07 a empresa
Cristo Rei Participações e Administração Limitada (atual CCD
Transporte Coletivo S/A), retirou-se do quadro social da executada
cedendo a totalidade das suas cotas, proporcionalmente, aos demais
sócios.
4. Aquisição de fundo de comércio
Em contrapartida, em 05/04/07, pela 11ª alteração contratual a
empresa Cristo Rei Transporte Coletivo Ltda (atual CCD Transporte
Coletivo S/A), aumentou seu capital social de R$ 113.128,00 para R$
10.200.000,00 (fls. 198/200). E em 29/05/2009, aumentou o capital
social para R$ 23.200.000,00 (fls. 201/2) e em 03/11/09, aumentou
para R$ 38.200.000,00 (fls. 214/5).
Atualmente constam registrados 44 veículos em circulação em
nome da Empresa Cristo Rei Ltda (fls. 217/225). A frota registrada
no CNPJ 76852949/0001-84 é proporcionalmente mais antiga que a
frota de CCD Transporte Coletivo S/A. Em nome da empresa CCD
Transporte Coletivo S/A, constam registrados 125 veículos em
circulação (fls. 227/247).
Tais informações indicam que a saída da empresa CCD
Transporte Coletivo S/A não se deu apenas em termos de quadro
social, mas com a efetiva transferência do fundo de comércio da
executada Empresa Cristo Rei Limitada e o seu esvaziamento
patrimonial.
Esta conclusão resta evidenciada também pelo fato de que a
Empresa Cristo Rei Ltda contava com 1055 vínculos, conforme
relação anula de informações sociais, de fl. 342, tendo por base
2006, o número de vínculos, conforme mesmo relatório de fl. 346 é
01, com base em 2008. Na fl. 268, constam 926 funcionários em
12/2006 e em 01/2007, passou a ter apenas 36 funcionários (fl. 311),
passando ao tratamento de microempresa a partir de 2008 e declarou
que não exerceu atividade a partir do ano-base mencionado (fl.
346/351).
Em contrapartida, a empresa CCD Transporte Coletivo S/A
declarou que não exerceu atividade no ano de 2006, porém em 2007
registrou na RAIS 1.028 vínculos trabalhistas, em 2008 registrou
1.128 vínculos, em 2009 foram 1.120 vínculos, e em 2.010 foram
1.159 vínculos (fls. (fls. 353/362).
Observo, também, que as consultas de vínculos do PIS de fls.
317 e seguintes exemplificam situações de empregados que
encerraram seu vínculo com a Empresa Cristo Rei Ltda em janeiro
de 2007 e tem admissão no mês seguinte na CCD Transporte
Coletivo SA. Na petição da Medida Cautelar Inominada nº
2009.70.00.015399-5 (2ª Vara de Execuções Fiscais de Curitiba),
consta como autora Empresa Cristo Rei Ltda (CNPJ
76.520.949/0001-84). Na A própria executada quando do
ajuizamento da Medida Cautelar Inominada nº 2009.70.00.015399-5
(2ª Vara de Execuções Fiscais de Curitiba), afirma gerar
aproximadamente mil empregos e, para comprovar tal alegação,
anexa declaração de número de funcionários da autora. O anexo em
questão, antecedido de folha em que está escrito "número de
funcionários (1.000 - (e-STJ Fl.90) Documento recebido
eletronicamente da origemum mil)" é um extrato do Cadastro Geral
de Empregados e Desempregados - CAGED da empresa CCD
Transporte Coletivo S/A (CNPJ 76097062/0001-25), que está nas
fls. 267/8. Na petição inicial afirmou:
E mais: estão comprometendo a operacionalidade de empresa
do mesmo grupo econômico, a qual, na condição de terceira de
boa-fé, vem destinando considerável parcela de sua receita para
honrar compromissos da autora." (fl. 252).
Ou seja, embora se qualifique com um CNPJ na petição inicial,
para comprovar sua afirmação de que gera aproximadamente mil
empregos utiliza documento em que consta o CNPJ da pessoa
jurídica (fl. 115) que a teria sucedido nos termos do art. 133 CTN.
Além disso, aponta para o fato de que está inserida em um grupo
econômico de que faz parte CCD Transporte Coletivo S/ª Às fls.
292/3, consta declaração da URBS, da qual se extrai:
"Tendo em vista solicitação da parte interessada, a empresa
CCD TRANSPORTE COLETIVO LTDA, denominada histórica e
operacionalmente de EMPRESA CRISTO REI, a URBS - Urbanização de Curitiba S.A declara, a quem interessar possa, que
trata-se de permissionária tradicional da Rede Integrada de
Transporte - RIT, que compõe o sistema desde a implementação da
primeira regulamentação do transporte coletivo, em 1955, que
estabelecia áreas seletivas de atuação, que posteriormente, através da
Lei 7.556/90, regulamentada pelo Decreto 210/91, passaram a ser
denominadas áreas preferenciais. (fl. 292).
Decisiva, contudo, é a transferência de fundo de comércio
considerando que este é uma universalidade de bens, composta de
bens materiais e imateriais, sendo de se destacar a transferência do
contrato de exploração de serviço público (transporte de passageiros)
entre ambas as empresas.
Às fls. 296/298, consta o "Termo de Consolidação de
Transferência de Outorga de Permissão para Exploração de Serviço
Público de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros nº 01/2007",
lavrado em 12/03/07, em que a URBS consolida a transferência de
permissão para exploração de serviços de transporte coletivo da
Empresa Cristo Rei Ltda para a empresa Cristo Rei Transporte
Coletivo Ltda (atual CCD Transporte Coletivo S/A), do qual se extrai
(clausula primeira):
A firma CRISTO REI TRANSPORTE COLETIVO LTDA a
partir do firmamento deste e da subscrição do competente termo de
Compromisso vinculado a este instrumento assume a condição de
permissionária dos serviços de transporte coletivo urbano de passageiros que vinham sendo executados pela EMPRESA CRISTO
REI LTDA, em substituição a esta última e segundo os limites
definidos na outorga de origem." Já a cláusula terceira é expressa
quanto à sucessão, inclusive nos débitos e obrigações:
A beneficiária CRISTO REI TRANSPORTE COLETIVO
LTDA., que investida ficou por este escrito na qualidade de
permissionária dos serviços enunciados anteriormente, também
assume a condição de sucessora da transferente EMPRESA CRISTO
REI LTDA, em tudo quanto diga respeito a débitos e obrigações até
então de responsabilidade desta última, tanto em relação à Permitente
URBS, quanto a terceiros quaisquer, desde que originários da
prestação de serviços de transporte coletivo." (fl. 297).
Às fls. 372/381 consta cópia de sentença proferida nos autos
05475-2010-001-09-00- 0 de reclamatória trabalhista em que são
reclamados CCD TRANSPORTE COLETIVO S.A e EMPRESA
CRISTO REI LTDA, de cuja fundamentação destaca-se:
DO GRUPO ECONÔMICO - DA RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA DAS RECLAMADAS - DA ATUAÇÃO NO MESMO
RAMO ECONÔMICO O reclamante alega que as reclamadas
constituem um grupo econômico, requerendo, com isso, a
condenação solidária de ambas por todos os direitos trabalhistas
postulados na inicial (fls. 03).
As reclamadas não contestaram o pedido formulado pelo
reclamante, razão pela qual, nos termos do artigo 302, caput, do
CPC (CLT, art. 769), reconheço a existência de grupo econômico
entre as referidas litigantes..
Registre-se, que o fato de cada uma das reclamadas ter
personalidade jurídica distinta (vide alterações contratuais às fls.
207-216 e 220-227), conforme o disposto no art. 2º, § 2º, da CLT,
não impede o reconhecimento do grupo econômico.
Ao contrário, o dispositivo legal citado acima ressalta a
condição individual distinta de cada uma das empresas componentes
do grupo econômico, sendo importante verificar, no caso, a
existência de algum laço de união entre elas capaz de configurar a
direção, controle ou administração de uma sobre a (s) outra(s).
Nesse sentido, para além dos efeitos da confissão ficta
decorrente da ausência de defesa do pedido, as alterações contratuais
indicam, claramente, que ambas atuavam no mesmo ramo
econômico (transporte coletivo), o que reforça ainda mais o pedido
de reconhecimento da responsabilidade solidária por formação de
grupo econômico. (fl. 373).
Portanto, estão presentes fortes indícios apontando para a
ocorrência da sucessão empresarial, assim se justificando a inclusão
da sucessora no pólo passivo desta execução fiscal. Através de
embargos, que permitem ampla dilação probatória, poderá vir a
empresa apontada como sucessora defender a sua ilegitimidade.
Em casos semelhantes, decidiu o TRF da 4ª Região:
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CDA. SUCESSÃO
EMPRESARIAL. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 133,
DO CTN. PRESENÇA DE FORTES INDÍCIOS DA SUCESSÃO. 1.
Para a caracterização da sucessão empresarial, faz-se necessária a
existência de fortes indícios apontando para a sua ocorrência. 2. Dispõe o art. 133, do CTN, que a pessoa natural ou jurídica de
direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de
comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e
continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social
ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos relativos ao
fundo ou estabelecimento adquirido. 3. Apelação improvida. (AC
200772110006460 AC - APELAÇÃO CIVEL Relator(a) JOEL ILAN
PACIORNIK - Órgão julgador PRIMEIRA TURMA - Fonte D.E.
13/04/2011) AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL.
REDIRECIONAMENTO. SUCESSÃO DE EMPRESAS. ART. 133
DO CTN. Reconhecida a sucessão empresarial e autorizado o
redirecionamento da execução nos termos do art. 133 do CTN, pois
restou demonstrado estarem as empresas situadas praticamente no
mesmo local, possuindo o ramo de atividade bem parecido, sendo
seus representantes legais parentes próximos (marido e mulher).(AG
00091795720104040000 - AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO
Relator(a) LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH - Órgão julgador
SEGUNDA TURMA - Fonte D.E. 09/06/2010) TRIBUTÁRIO.
EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE.
SUCESSÃO COMERCIAL. INDÍCIOS FORTES ACERCA
DA TRANFERÊNCIA DO FUNDO DE COMÉRCIO.
POSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO. PRESCRIÇÃO.
INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS. 1. Para que se configure a
sucessão comercial, nos termos do art. 133 do CTN, mister que
tenha havido aquisição do fundo de comércio ou de estabelecimento
comercial, industrial ou profissional. 2. (e-STJ Fl.92) Documento
recebido eletronicamente da origemNa hipótese, como são fortes os
indícios de ocorrência de sucessão, o mais razoável é admitir-se o
prosseguimento da ação executiva e, quando dos embargos, que
permitem ampla dilação probatória, vir a empresa apontada como
sucessora defender a sua ilegitimidade. ...(TRF4, AG
0028673-05.2010.404.0000, Primeira Turma, Relator Joel Ilan
Paciornik, D.E. 12/01/2011) De outro lado, argumenta a Empresa
Cristo Rei Ltda que permanece em situação regular perante o Fisco e
órgãos de registro, possui patrimônio, atividades e receitas próprias,
portanto sustenta que está ausente a condição basilar para a
pretendida sucessão, qual seja a constatação definitiva de insolvência
da executada, não demonstrada nos autos. Por fim, entendo que a
insolvência da sucedida não é requisito imposto no CTN para o
reconhecimento da sucessão.
Diante disso, entendo que antes de ser efetivada a citação da
empresa sucessora nos termos do art. 133 do CTN, deve ser a
Empresa Cristo Rei Ltda intimada a pagar ou nomear bens idôneos à
penhora, no prazo de 5 dias." Observo, ainda, que nos autos nº
5007510-54.2015.4.04.7000 a própria executada informou a
sucessão de empresa pela pessoa jurídica acima indicada (evento 2,
PET143, fls. 483 e seguintes dos autos físicos).
Ressalto que não há necessidade de a sucessão ser decidida
em ação própria, pois eventual alegação de ilegitimidade pode ser
discutida em sede de embargos, que permitem ampla dilação
probatória.
No mesmo sentido: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. SUCESSÃO
EMPRESARIAL. REDIRECIONAMENTO. 1. A sucessão de
empresas pode ser reconhecida nos próprios autos da execução
fiscal, sem a necessidade de formação do contraditório e da ampla
defesa, que são postergados à ação própria, se assim desejarem os
executados. 2. Em havendo sucessão de empresas, a
responsabilidade da empresa sucessora frente aos débitos tributários
é subsidiária em relação à empresa que a antecede. Portanto, uma vez
comprovados os elementos que autorizam o redirecionamento da
execução fiscal, constantes no artigo 135 do Código Tributário
Nacional, caracterizadores da dissolução irregular, é possível a
presunção de infração à lei que permite a inclusão da empresa
sucessora no polo passivo da execução. 3. No caso concreto, da
analise dos comprovantes de situação cadastral, verifica-se que a
pretensa sucessora atua nesse ramo de atividade anteriormente à
executada. Além disso, conforme telas do SIARCO, inexiste sócio
comum entre as empresas ou grau de parentesco entre eles.
Por fim, cabe o registro de que a União não juntou aos autos
originários cópias dos contratos sociais, para se averiguar
exatamente as datas de constituição das empresas e evolução e seus
endereços. (TRF4 5002415-91.2015.404.0000, Primeira Turma,
Relator p/ Acórdão Jorge Antonio Maurique, juntado aos autos em
27/02/2015) Ainda, não há necessidade da instauração do incidente
previsto no art. 133 e seguintes do Código de Processo Civil uma vez
que, tanto para o reconhecimento da responsabilidade do sócio com
o consequente redirecionamento quanto no caso de sucessão de
empresa, não se faz necessária a desconsideração da personalidade
jurídica. A questão já foi sumulada pelo TRF4, para o
redirecionamento ao sócio, aplicando-se o mesmo raciocínio à
sucessão:
Súmula nº 112 do TRF4:
A responsabilização dos sócios fundada na dissolução irregular
da pessoa jurídica (art. 135 do CTN) prescinde de decretação da
desconsideração de personalidade jurídica da empresa e, por
conseguinte, inaplicável o incidente processual previsto nos arts. 133
a 137 do CPC/15.
Posto isso, reconheço a sucessão de empresas nos termos da
determinando a inclusão no polo passivo e a citação da responsável
CCD Transporte Coletivo S/A (CNPJ Nº 76.097.062/0001-25) , nos
termos do art. 133, II do CTN e na forma do art. 7º da lei nº
6.830/80. Expeça-se o necessário.
Intimem-se. (fls. 89/94)
Dessa forma, para rever tal posição e interpretar o dispositivo legal indicado
como violado, seria necessário o reexame desses mesmos elementos fático-probatórios, o que
é vedado no âmbito estreito do recurso especial. Incide na hipótese a Súmula n. 7/STJ.
Sobre a alegada ofensa ao art. 133 do CPC/2015, o recurso não comporta
provimento.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está se assentando no sentido
de ser desnecessária a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica
(arts. 133 e seguintes do CPC/2015) para se proceder ao redirecionamento da execução da
pessoa jurídica em face dos sócios-administradores.
A desnecessidade de instauração do incidente de desconsideração para o
redirecionamento em face dos sócios deve atrair a mesma conclusão ao redirecionamento em
face de outra pessoa jurídica quando se evidenciam práticas comuns ou conjunta do fato
gerador ou confusão patrimonial.
No caso, como apontado, foi devidamente aferida pelo juízo de primeira
instância, no bojo da execução fiscal, a ocorrência de sucessão de empresas pela formação de
grupo econômico de fato com prática do fato gerador e situação de confusão patrimonial.
Ficou comprovada a atuação da ora recorrente no mesmo ramo de atividade econômica da
outra executada, além das alterações contratuais realizadas e dos vínculos entre os sócios entre
as pessoas jurídicas, da transferência do fundo de comércio, dentre outros indícios de
confusão patrimonial. Assim, de fato, não há fundamento de direito material a afastar, no
presente caso, o redirecionamento da execução.
Portanto, a questão em tela é meramente procedimental, tendo em conta que a
recorrente aduz a necessidade de prévia instauração do incidente de desconsideração da
personalidade jurídica, no presente caso.
Não há, contudo, fundamento jurídico para a obrigatoriedade da instauração
desse incidente.
Primeiramente, tendo em conta que "a aplicação do CPC é subsidiária, ou seja,
fica reservada para as situações em que as referidas leis são silentes e no que com elas
compatível" (REsp n. 1.431.155/PB, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 27/5/2014).
Pelo princípio da especialidade, a previsão na lei geral – Código de Processo
Civil – da hipótese de cabimento do incidente de desconsideração na execução fundada em
título executivo extrajudicial (art. 134, caput, CPC/2015) não implica sua incidência
automática em execução de título extrajudicial regulada por lei especial, como no caso da
execução fiscal, regida pela Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal).
No particular, sob a ótica hermenêutico-sistêmica, quando o CPC/2015
pretendeu que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica fosse aplicado a um
microssistema, o Código foi expresso nesse sentido, a exemplo do art. 1.062 em relação aos
juizados especiais. É dizer, isso não ocorreu em relação ao sistema especial que envolve a o
regime jurídico da execução fiscal.
Aponta-se que o art. 124 do CTN ("são solidariamente obrigadas as pessoas
que: I - tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação
principal; e II - as pessoas expressamente designadas por lei") seria insuficiente para imputar a
todas as pessoas do grupo econômico responsabilidade solidária, sob o fundamento de que,
mesmo havendo grupo econômico, cada empresa dele integrante conservaria a sua
individualidade patrimonial, operacional e financeira.
Nesse sentido, conforme tem sido assentado pelo Superior Tribunal de Justiça,
o fato de haver pessoas jurídicas que pertençam ao mesmo grupo econômico, por si só não
enseja a responsabilidade solidária, na forma do art. 124 do CTN (EREsp n. 859.616/RS,
Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/2/2011, DJe
18/2/2011; EREsp n. 834.044/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção,
julgado em 8/9/2010, DJe 29/9/2010).
Contudo, a distinção entre responsabilidade por substituição (dos
sócios-administradores) e por sucessão (entre empresas) não é relevante no caso. Da mesma
forma com que independe da personalidade da pessoa jurídica a imputação de
responsabilidade aos sócios por atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos por parte dos sócios-administradores; não há individualidade da
empresa (patrimonial, financeira e operacional) diante da continuidade da exploração da
atividade empresarial mediante práticas comuns ou conjunta do fato gerador ou confusão
patrimonial.
Seria contraditório afastar a instauração do incidente para atingir os
sócios-administradores, mas exigi-la para mirar pessoas jurídicas que constituem grupos
econômicos para blindar o patrimônio em comum, em que deve incidir a responsabilidade
solidária por interesse comum na prática do fato gerador ou confusão patrimonial. Nas duas
hipóteses há responsabilidade por atuação irregular, em descumprimento das obrigações
tributárias, não havendo que se falar em desconsideração da personalidade jurídica, mas sim
de imputação de responsabilidade tributária pessoal e direta pelo ilícito.
A propósito, confira-se:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
OFENSA AO ART. 535 DO CPC CONFIGURADA. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 124 E
174 CTN. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. GRUPO ECONÔMICO.
CONFUSÃO PATRIMONIAL. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. SÚMULA 7
DO STJ.
1. Os Embargos de Declaração merecem prosperar, uma vez que presentes
um dos vícios listados no art. 535 do CPC. Na hipótese dos autos, o acórdão
embargado não analisou a tese apresentada pela ora embargante. Dessa forma,
presente o vício da omissão.
2. No caso dos autos, o Tribunal de origem assentou que: não merece
reproche a conclusão do juízo a quo no que tange à responsabilização solidária de
pessoas físicas (por meio da desconsideração da personalidade jurídica) e jurídicas
integrantes do mesmo grupo econômico de empresas devedoras, quando existe
separação societária apenas formal e pessoas jurídicas do grupo são usadas para
blindar o patrimônio dos sócios em comum, como é o caso das excipientes, e de
outras empresas do grupo."
3. O Superior Tribunal de Justiça entende que a responsabilidade solidária
do art. 124 do CTN não decorre exclusivamente da demonstração da formação de
grupo econômico, mas demanda a comprovação de práticas comuns, prática
conjunta do fato gerador ou, ainda, quando há confusão patrimonial.
4. O Tribunal ordinário entendeu pela responsabilidade solidária da empresa
não pela simples circunstância de a sociedade pertencer ao mesmo grupo econômico
do sujeito passivo originário. Antes, reconheceu a existência de confusão
patrimonial, considerando haver entre as sociedades evidente identidade de endereços
de sede e filiais, objeto social, denominação social, quadro societário, contador e
contabilidade.
5. As questões foram decididas com base no suporte fático-probatório dos
autos, de modo que a conclusão em forma diversa é inviável no âmbito do Recurso
Especial, ante o óbice da Súmula 7 do STJ. 6. Embargos de Declaração acolhidos com efeitos integrativos.
(EDcl no AgRg no REsp n. 1.511.682/PE, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Segunda Turma, julgado em 25/10/2016, DJe 8/11/2016.)
De fato, o presente caso é exemplar, neste sentido. Conforme consignado, o
juízo de primeira instância aferiu ocorrência de sucessão de empresas com configuração de
grupo econômico de fato entre executadas com atuação no mesmo ramo de atividade
econômica (transporte rodoviário coletivo de passageiros), tendo havido alterações contratuais
evidenciando a identidade de sócios e a mesma sede social, dentre outros. Apontou-se que,
em razão de alteração contratual, a ora recorrente (sob outra denominação) ingressou no
quadro social da outra pessoa jurídica executada, permitindo, assim, aumento patrimonial – de
R$ 501.370,00 (quinhentos e um mil, trezentos e setenta reais) para R$ 9.195.550,00 (nove
milhões, cento e noventa e cinco mil, quinhentos e cinquenta reais) – tendo, posteriormente,
dela se retirado, cedendo a totalidade de suas cotas aos demais sócios, do que resultou, ao
final, a ocorrência de esvaziamento patrimonial.
Assim, verifica-se que, do ponto de vista prático da cobrança do crédito
tributário, a exigência de instauração do incidente de desconsideração dificultaria a persecução
de bens do devedor e facilitaria a dilapidação patrimonial, além de transferir à Fazenda Pública
o ônus desproporcional de ajuizar medidas cautelares fiscais e tutelas provisórias de urgência
para evitar os prejuízos decorrentes do risco que se colocaria à satisfação do crédito.
Ante o exposto, conheço parcialmente do recurso especial e, nessa parte,
nego-lhe provimento.
É o voto.