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7 de maio de 2021

PROLAÇÃO DE DECISÃO DE ACOLHIMENTO DA IMPUGNAÇÃO DA CAUSA POSTERIOR À DECISÃO DE MÉRITO DO PRINCIPAL. IRREGULARIDADE. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO COMPROVADO

AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1667308 - SP (2017/0096353-6) 

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO 

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À ARREMATAÇÃO. PREÇO VIL RECONHECIDO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. PROLAÇÃO DE DECISÃO DE ACOLHIMENTO DA IMPUGNAÇÃO DA CAUSA POSTERIOR À DECISÃO DE MÉRITO DO PRINCIPAL. IRREGULARIDADE. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO COMPROVADO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Moura Ribeiro. 

Brasília, 30 de março de 2020 (Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator): Trata-se de agravo interno interposto por ONÉLIO ARGENTINO contra decisão que negou provimento ao seu recurso especial, ementado nos seguintes termos: 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À ARREMATAÇÃO. PREÇO VIL RECONHECIDO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. PROLAÇÃO DE DECISÃO DE ACOLHIMENTO DA IMPUGNAÇÃO DA CAUSA POSTERIOR À DECISÃO DE MÉRITO DO PRINCIPAL. IRREGULARIDADE. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO COMPROVADO. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 

Em suas razões, a parte agravante reiterou as mesmas alegações apresentadas em seu recurso especial, destacando a violação dos artigos 19, 739 e 746 do CPC/73. Postulou conhecimento e reconsideração ou encaminhamento de suas insurgências para apreciação pelo Colegiado. 

Ausente contrarrazões. 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator): Eminentes colegas, não merece provimento o presente agravo interno. 

A parte recorrente insiste nas mesmas razões apresentadas em seu recurso especial, defendendo a inaplicabilidade da Súmula 83/STJ. 

Sem razão. 

O Tribunal de origem, negando provimento ao recurso de apelação, manteve a sentença que, a despeito de reconhecer a intempestividade dos embargos à arrematação, reconheceu de ofício a nulidade da arrematação diante do preço vil do imóvel penhorado. 

Contrariada, a parte se insurgiu, preliminarmente, com a decisão de mérito ter sido prolatada anteriormente à decisão que acolheu a sua impugnação ao valor dado aos embargos à arrematação. No mérito, reiterou intempestivos os embargos à arrematação. 

Primeiramente, a prolação da decisão de acolhimento da impugnação ao valor da causa em momento posterior à decisão que julgara o mérito da causa principal constitui mera irregularidade, não gerando prejuízo suficiente para decretação da nulidade do processo. 

Ademais, ante o princípio da instrumentalidade, atinge seu fim o recolhimento posterior das custas, sem que para tanto seja necessária decretação da nulidade do ato. 

Por fim, não se vislumbrou prejuízo suficiente à parte atingida pela irregularidade, pois o recolhimento das custas pode se dar de forma posterior, tendo por norte que o princípio da instrumentalidade anda sempre de mãos dadas com o princípio da primazia da resolução de mérito. 

Quanto ao mérito recursal, a parte indica violação aos artigos 739 e 746 do CPC/73, diante da intempestividade dos embargos à arrematação em tela. 

Todavia, o fundamento do acórdão recorrido foi no sentido de que, a despeito da intempestividade dos embargos à arrematação, manteve-se a decretação da nulidade da arrematação diante do preço vil reconhecido de ofício pelo juízo de primeiro grau. 

Antiga a jurisprudência desta Corte Superior vai ao encontro do entendimento firmado pelo Tribunal de origem no sentido de que a nulidade da arrematação pode ser declarada de ofício pelo Juízo ou a requerimento do interessado, por simples petição, nos próprios autos da execução, dispensada a oposição dos embargos à arrematação . 

Nesse sentido: 

PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO. EMBARGOS À ARREMATAÇÃO. ALIENAÇÃO A PREÇO VIL. PREÇO INFERIOR A TRINTA POR CENTO DO VALOR DA AVALIAÇÃO. PRIMEIRA PRAÇA. POSSIBILIDADE DE SER DECLARADA A NULIDADE NOS EMBARGOS DE SEGUNDA FASE, DE OFÍCIO OU A REQUERIMENTO DO INTERESSADO. REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DA PESSOA JURÍDICA. INEXISTÊNCIA DE FUNDADA DÚVIDA. INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS ARTS. 12-VI E 267-I CPC. CERCEAMENTO DE DEFESA. ART. 398 - CPC. INOCORRÊNCIA. PREJUÍZO PROCESSUAL INDEMONSTRADO. INÉPCIA E EMENDA DA INICIAL. DISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. TEMAS NÃO ABORDADOS PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. RECURSO DESACOLHIDO. I - Dada a inexistência de critérios legais objetivos para a conceituação do "preço vil", repudiado pelo sistema processual em vigor, por enriquecimento indevido em detrimento do executado, fica a sua aferição na dependência de circunstâncias peculiares do caso concreto. II - Caracteriza-se na espécie o preço vil em face do irrisório valor alcançado, acrescendo-se a circunstância de ter sido efetuada a arrematação logo na primeira praça. III - A nulidade da arrematação pode ser declarada de ofício pelo Juízo ou a requerimento do interessado, por simples petição, nos próprios autos da execução, dispensada a oposição dos embargos à arrematação. IV - Conquanto não seja caso de ajuizamento dos embargos de segunda fase, não deixará o Juízo de conhecer da nulidade decorrente da arrematação por preço vil e declará-la porque suscitada por esse meio. V - Se inocorre fundada dúvida sobre a regularidade da representação da pessoa jurídica, alegada pela parte contrária mas não demonstrada, não está o juiz obrigado a exigir em Juízo a apresentação dos respectivos atos constitutivos da sociedade. VI - Não se anula o julgamento, com base em alegado cerceamento de defesa, pela juntada de procuração pela embargante sem ser aberta vista ao embargado, tendo este tido oportunidade de ver examinada sua impugnação ao documento no acórdão da apelação, sem, contudo comprovar qualquer irregularidade na representação da parte contrária. VII - A alegação de violação a dispositivos legais, cujos temas não foram examinados pelo acórdão recorrido, não pode ser analisada em sede de recurso especial, à míngua de prequestionamento, pressuposto específico dos recursos de natureza extraordinária. (REsp 100.706/RO, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 29/10/1998, DJ 01/03/1999, p. 319) 

Portanto, a pretensão recursal, realmente, esbarra no óbice da Súmula 83/STJ, pois o acórdão recorrido está em consonância com a orientação desta Corte Superior. 

Por fim, quanto a notícia vinda aos autos do falecimento da parte recorrida, como a presente decisão vai em favor de seus interesses - apresentados em contrarrazão, a regularização da sua representação processual pode se dar nas instâncias ordinárias. 

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO. 

É o voto. 

4 de maio de 2021

AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. PROTOCOLIZAÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO NOS AUTOS DA PRÓPRIA AÇÃO EXECUTIVA. INOBSERVÂNCIA DO ART. 914, § 1º, DO CPC/2015. ERRO SANÁVEL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS E DA ECONOMIA PROCESSUAL

RECURSO ESPECIAL Nº 1.807.228 - RO (2019/0093982-1) 

RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA 

R.P/ACÓRDÃO : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. PROTOCOLIZAÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO NOS AUTOS DA PRÓPRIA AÇÃO EXECUTIVA. INOBSERVÂNCIA DO ART. 914, § 1º, DO CPC/2015. ERRO SANÁVEL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS E DA ECONOMIA PROCESSUAL. 

1. Ação de execução de título executivo extrajudicial, tendo em vista a inadimplência no pagamento de cotas condominiais. 

2. O propósito recursal é definir se configura erro grosseiro, insuscetível de correção, a protocolização de embargos à execução nos autos da própria ação executiva, em inobservância ao que dispõe o art. 914, § 1º, do CPC/2015. 

3. Com efeito, é inegável que a lei prevê expressamente que os embargos à execução tratam-se de ação incidente, que deverá ser distribuída por dependência aos autos da ação principal (demanda executiva). 

4. Contudo, primando por uma maior aproximação ao verdadeiro espírito do novo Código de Processo Civil, não se afigura razoável deixar de apreciar os argumentos apresentados em embargos à execução tempestivamente opostos – ainda que, de forma errônea, nos autos da própria ação de execução – sem antes conceder à parte prazo para sanar o vício, adequando o procedimento à forma prescrita no art. 914, § 1º, do CPC/2015. 

5. Ademais, convém salientar que o art. 277 do CPC/2015 preceitua que, quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade. 

6. Recurso especial conhecido e não provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista da Sra. Ministra Nancy Andrighi, divergindo do voto do Sr. Ministro Relator, por maioria, negar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi, que lavrará o acórdão. Vencidos os Srs. Ministros Ricardo Villa Bôas Cueva e Moura Ribeiro. Votaram com a Sra. Ministra Nancy Andrighi os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze e Paulo de Tarso Sanseverino. 

Brasília (DF), 03 de setembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA: Trata-se de recurso especial interposto por CONDOMÍNIO BRISAS DO MADEIRA RESIDENCIAL CLUBE, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia assim ementado: 

"Agravo de instrumento. Embargos à execução. Impugnação nos próprios autos. Possibilidade. Instrumentalidade das formas. Recurso desprovido. Por se tratar de mero erro procedimental, passível de ser sanado, não há que se falar em eventual não conhecimento dos embargos interpostos nos próprios autos da execução, devendo ser observado o princípio da instrumentalidade das formas" (e-STJ fl. 38). 

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (e-STJ fls. 69/72). 

Em suas razões (e-STJ fls. 82/96), o recorrente aponta, além de divergência jurisprudencial, violação do art. 914, § 1º, Código de Processo Civil de 2015, sustentando, em síntese, a impossibilidade de processamento dos embargos à execução nos autos da própria demanda executiva, ainda que ao fundamento da aplicação do princípio da instrumentalidade das formas, como o fez o Tribunal de origem. 

Alega que os embargos à execução têm natureza de ação autônoma e incidental à execução e, nos termos da legislação processual de regência, devem ser distribuídos por dependência, autuados em autos apartados e instruídos com cópias das peças processuais relevantes. 

Afirma que "(...) não há que se falar nos princípios da instrumentalidade das formas e da celeridade a ser aplicada no procedimento de execução de título extrajudicial, vez que passa a beneficiar o devedor causando morosidade processual divergindo do entendimento do legislador e dos juristas que inseriram a disposição para a proteção ao credor com a intenção de satisfação do crédito exequente" (e-STJ fl. 84). 

Pugna, assim, pelo reconhecimento de inadequação do procedimento adotado pela executada/recorrida e da consequente intempestividade dos embargos manejados nos autos do feito executivo. 

Sem contrarrazões (e-STJ fl. 199), o recurso especial foi admitido na origem (e-STJ fl. 200). 

Em decisão de fls. 216/218 (e-STJ), o pedido de tutela provisória para conferir efeito suspensivo ao recurso especial foi deferido. 

É o relatório. 

VOTO-VENCIDO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA: A irresignação merece prosperar. 

O julgamento do recurso especial é realizado com base nas normas do Código de Processo Civil de 2015 por ser a lei processual vigente na data de publicação da decisão ora impugnada (cf. Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

A controvérsia a ser dirimida reside em verificar se é possível o conhecimento e processamento de embargos à execução apresentados nos autos do próprio processo executivo e não em autos apartados, de forma autônoma e incidental, conforme preconiza o parágrafo 1º do art. 914 do Código de Processo Civil de 2015. 

1. Histórico 

Extrai-se dos autos que está em curso perante o Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho/RO a execução de título extrajudicial ajuizada por Condomínio Brisas do Madeira Residencial Clube, ora recorrente, contra Arileide Pereira do Nascimento, ora recorrida, referente a débitos condominiais. 

A executada apresentou embargos à execução nos autos da própria demanda executiva, os quais foram recebidos pelo magistrado de piso em decisão assim fundamentada: 

"(...) Inicialmente esclareço que, embora a embargante não tenha apresentado embargos à execução em autos apartados e distribuídos por dependência, nos termos do art. 914, § 1º, CPC, fazendo-o no bojo desta execução, à luz dos princípios da celeridade e instrumentalidade das formas, recebo-os. Considerando que a execução está garantida por penhora e que estão presentes os requisitos para a concessão da tutela de urgência (probabilidade do direito e o risco ao resultado útil do processo) reputo prudente a concessão do efeito suspensivo (art. 300; art. 919, § 1º; art. 921, II, todos do CPC). 1- Intime-se o Exequente para impugnar os Embargos em 15 dias úteis (NCPC, art. 920). 2- Após o esgotamento do prazo acima assinalado, digam as partes no prazo de 15 dias se pretendem a produção de outras provas nestes autos" (e-STJ fls. 13/14 - grifou-se). 

O exequente interpôs agravo de instrumento por suposta violação do art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015, segundo o qual "os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e instruídos com cópias das peças processuais relevantes, que poderão ser declaradas autênticas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal". 

O Tribunal de origem negou provimento ao recurso, nos seguintes termos: 

"(...) É inegável que a lei processual determina a distribuição, por dependência à execução, dos embargos do devedor (art. 914, § 1º, do CPC), e as partes devem sempre buscar a observância dos procedimentos previstos. Ocorre que, em casos como o dos autos, a jurisprudência tem admitido o processamento dos embargos, mesmo no bojo da própria execução, em atendimento aos princípios da instrumentalidade das formas e da efetividade do processo, conforme dispõe o art. 277 do CPC. (...) Deve-se considerar que os embargos à execução constituem a defesa do executado, de modo que deixar de conhecê-los em razão da simples distribuição equivocada, além de configurar formalismo exacerbado, ofende o contraditório e a ampla defesa, sobretudo quando tempestivo. (...) Tendo sido a petição dos embargos à execução protocolizada, tempestivamente, mas nos mesmos autos da ação executiva, encontra-se demonstrada a intenção da agravada de impugnar a execução, constituindo flagrante prejuízo ao direito de defesa do executado seu desentranhamento, não havendo óbice para o recebimento da petição como embargos à execução. Destaco que o ato configura mero erro procedimental, passível de ser sanado" (e-STJ fls. 36/37 - grifou-se).

 O exequente interpôs, então, o presente recurso especial, invocando a aplicação literal do disposto no art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015, requerendo, ao fim, o não conhecimento dos embargos à execução em virtude da inadequação do procedimento adotado pela executada. 

2. Do mérito 

A partir da premissa fática incontroversa delineada pelas instâncias ordinárias no sentido de que a embargada apresentou tempestivamente petição de embargos à execução nos autos da própria demanda executiva, a questão a ser examinada no recurso especial, como já mencionado, reside em verificar se é possível, com fundamento nos princípios da instrumentalidade das formas, da efetividade e celeridade processuais, o conhecimento de embargos do devedor apresentados no próprio processo executivo e não em autos apartados, de forma autônoma e incidental, como determina a legislação processual civil. 

O art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015 assim dispõe: 

"Art. 914. O executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá se opor à execução por meio de embargos. § 1º Os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e instruídos com cópias das peças processuais relevantes, que poderão ser declaradas autênticas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal." (grifou-se) 

Ao definir a natureza jurídica dos embargos do devedor, Araken de Assis afirma: 

"(...) Na função jurisdicional executiva, há aspectos insuscetíveis de dúvidas consistentes. Por exemplo, os atos executivos são diferentes dos processuais praticados na função de conhecimento (retro, 4); ao direito de instaurar a relação processual executiva correspondente à ação (retro, 15), tornando nítido o princípio da autonomia (retro, 9), segundo o qual é possível o desenvolvimento simultâneo de ações paralelas à pretensão de executar; e assim por diante. Avulta indiscutível, outrossim, que a função executiva, a despeito de alguma dose de cognição no curso do respectivo procedimento - no mínimo o juiz conhecerá, ex officio, da existência, a validade e a eficácia da relação processual -, visa à atuação do direito contemplado no título executivo, não se ocupando da declaração de direitos litigiosos. Essa última característica conduz a defesa do executado, controvertendo a subsistência e o conteúdo da pretensão a executar, desconstituindo ou não o título, no todo ou em parte, bem como ao controle da sua regularidade (vícios de atividade), realizar-se-á por meio de ação autônoma, posto que acessória à execução. Existe inequívoca incompatibilidade funcional na convivência de atos executivos com atos de índole diversa, simultaneamente, na mesma estrutura (processo). Esta é a ideia fundamental posta à base dos embargos do executado ou, consoante a designação do Título III o Livro II da Parte Especial do NCPC, 'embargos à execução'. Esse veto não é absoluto. Excepciona-o a possibilidade de o executado controverter a existência do título (ou sua inexiquibilidade, a teor do art. 917, I) e os pressupostos processuais por via da exceção de pré-executividade, desde que baseada em prova pré-constituída (retro, 537). Por outro lado, a certeza relativa quanto à existência do crédito outorgada pelo título (retro, 26.1), não torna inútil a defesa. A tese de que os embargos constituem ação incidente à execução é universal. A autonomia dos embargos transparece no seu objeto: tratando-se de oposição em que o executado veicula exceções e objeções substanciais, o desaparecimento da execução por iniciativa do exequente, utilizando-se do disposto no art. 775, caput, em nada prejudica o seu prosseguimento e desenlace. Trata-se de remédio processual específico de oposição à execução, consoante reza o art. 914, caput, parte final, e revela-se insubstituível por qualquer outro, como o mandado de segurança". (ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 18ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, págs. 1.538/1.539 - grifou-se) 

Acerca do procedimento a ser adotado no processamento dos embargos do devedor, Humberto Theodoro Júnior leciona que, 

"(...) Em se tratando de uma nova ação, sujeita-se à distribuição, registro e autuação próprios (NCPC, arts. 206 e 284), devendo, também receber valor de causa, na respectiva petição inicial, como determina o art. 291. Diante da inegável conexão que se nota entre a execução e os embargos, a distribuição destes é feita por dependência (art. 286). Submete-se, outrossim, a ação de embargos, como qualquer outra, à exigência de preparo prévio, de sorte que o não pagamento das custas iniciais em quinze dias importa cancelamento da distribuição e extinção do processo em seu nascedouro (art. 290). Os embargos, como ação cognitiva, devem ser propostos por meio de petição inicial, que satisfaça as exigências dos arts. 319 e 320. Submeter-se-ão à distribuição por dependência, ao juízo da causa principal (a ação executiva). Formarão autos próprios, apartados da ação de execução. Se não ocorrer o deferimento do efeito suspensivo, os embargos deverão tramitar sem prejuízo da marcha processual da execução. Por isso, caberá ao embargante instruir sua petição inicial com cópias das peças do processo principal cujo exame seja relevante para o julgamento da pretensão deduzida na ação incidental (art. 914, § 1º), já que pode acontecer de cada uma das ações tomar rumo diferente, exigindo a prática de atos incompatíveis entre si, e subindo, em momentos diversos, a tribunais distintos. Não deve, à vista disso, faltar na autuação dos embargos peças da execução cujo exame seja indispensável ao julgamento da oposição do executado. Procurações, título executivo, citação, auto de penhora (se já houver) são exemplos de peças cujo traslado comumente haverá de efetuar-se. Com esse novo critério de instrução da petição de embargos, eliminou-se o velho problema, antes existente, da subida dos autos da execução, para processamento da apelação interposta contra a sentença de improcedência dos embargos. Não há mais empecilho algum a que os autos dos embargos sejam desapensados para a subida do recurso ao Tribunal." (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo de Execução e Cumprimento da Sentença. 29ª ed. São Paulo: Ed. Universitária de Direito, 2017, págs. 624/625 - grifou-se) 

Da leitura da doutrina abalizada, não resta dúvida de que os embargos à execução têm natureza de ação de conhecimento autônoma e incidente ao processo de execução, devendo ser manejados por meio de petição inicial, com o preenchimento das condições da ação e dos pressupostos processuais exigíveis para qualquer demanda. 

A questão a ser analisada na hipótese em tela reside em verificar se a apresentação dos embargos nos autos da própria execução constitui vício sanável ou não, de modo a se concluir pela configuração ou não de nulidade procedimental. 

A observância das normas processuais é sempre salutar e recomendável para a correta condução dos feitos judiciais, sendo certo que inaplicável à hipótese dos autos o disposto no art. 277 do Código de Processo Civil de 2015, que consagra o princípio das instrumentalidade das formas e dos atos processuais. 

O não conhecimento dos embargos do devedor no caso em exame é medida que se impõe, pois o seu processamento nos autos do próprio processo executivo, em flagrante afronta aos expressos ditames legais, causaria inegável prejuízo à parte exequente, apto a ensejar a nulidade do procedimento. 

É inegável que a marcha processual da execução restará prejudicada se as teses de defesa apresentadas nos embargos do devedor tiverem que ser apreciadas no mesmo processo da execução, visto que os respectivos procedimentos possuem ritos flagrantemente distintos e muitas vezes incompatíveis entre si. 

O equívoco no proceder do executado/embargante, ao juntar sua petição nos autos da execução, viola o disposto no art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015 e constitui erro grosseiro, insuscetível de correção, ainda que sob a perspectiva do princípio da instrumentalidade das formas. 

A redação original do art. 736 do Código de Processo Civil de 1973, que regulava o processamento dos embargos dos devedor, já determinava sua autuação "em apenso" aos autos do processo principal. A Lei nº 12.322/2006, que introduziu o parágrafo único ao referido dispositivo, manteve essa sistemática, ao preconizar que "os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado (...)". 

Tal circunstância revela que o procedimento de manejo dos embargos em autos distintos da execução é antigo na legislação processual, motivo pelo qual sua apresentação de forma diversa daquela expressamente prevista na lei configura erro inescusável da parte embargante. 

Como já mencionado, os embargos à execução têm natureza jurídica de ação autônoma de conhecimento, devendo ser distribuídos por dependência, autuados em autos apartados, instruídos com cópias das peças processuais relevantes, com observância dos requisitos previstos nos arts. 319 e 320 do Código de Processo Civil de 2015. 

Assim, diante da evidente inobservância do expresso comando legal do art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015, é de rigor o não conhecimento dos embargos à execução. 

3. Do dispositivo 

Ante o exposto, conheço do recurso especial para dar-lhe provimento. 

Solução nesse sentido implica a condenação da parte recorrida ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais em favor do recorrente, que ora são fixados em 10% (dez por cento) do valor da execução, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015. 

Prejudicado o pedido de tutela provisória formulado às fls. 211/214 (e-STJ). 

É o voto. 

VOTO-VISTA 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI: Cuida-se de recurso especial interposto por CONDOMINIO BRISAS DO MADEIRA RESIDENCIAL CLUBE, fundamentado nas alíneas "a" e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo TJ/RO. 

Ação: de execução de título executivo extrajudicial, ajuizada pelo recorrente, em desfavor de ARILEIDE PEREIRA DO NASCIMENTO, tendo em vista a inadimplência no pagamento de cotas condominiais. A executada (ora recorrida), por sua vez, opôs embargos à execução nos autos da própria ação executiva. 

Decisão interlocutória: à luz dos princípios da celeridade e da instrumentalidade das formas, recebeu os embargos à execução opostos pela recorrida, a despeito de não terem sido apresentados em autos apartados e distribuídos por dependência (e-STJ fls. 13-14). 

Acórdão: negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelo recorrente, nos termos da seguinte ementa: 

Agravo de instrumento. Embargos à execução. Impugnação nos próprios autos. Possibilidade. Instrumentalidade das formas. Recurso desprovido. Por se tratar de mero erro procedimental, passível de ser sanado, não há que se falar em eventual não conhecimento dos embargos interpostos nos próprios autos da execução, devendo ser observado o princípio da instrumentalidade das formas (e-STJ fl. 38). 

Embargos de declaração: opostos pelo recorrente, foram parcialmente acolhidos, apenas para fins de prequestionamento (e-STJ fls. 69-72). 

Recurso especial: alega violação do art. 914, § 1º, do CPC/2015, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta que: 

a) os embargos à execução devem ser opostos em autos apartados e distribuídos por dependência, pois são considerados ação autônoma e incidental, como mesmo prescrito em lei; 

b) a real finalidade da norma é garantir o prosseguimento da ação executiva, a fim de evitar o prejuízo ao credor e, consequentemente, a razoável duração do processo; 

c) o oferecimento de embargos à execução no bojo da própria ação executiva implica tumulto na direção e sequência dos atos executivos; e 

d) quando a lei prevê forma específica para a prática de ato, tal forma deverá ser observada e respeitada, não havendo que se falar em aplicação do princípio da instrumentalidade das formas (e-STJ fls. 82-96). 

Voto do Relator: na sessão de 20/08/2019, o Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, relator dos autos, votou no sentido de conhecer e dar provimento ao recurso especial interposto por CONDOMINIO BRISAS DO MADEIRA RESIDENCIAL CLUBE, para reconhecer que é imperioso o não conhecimento dos embargos à execução opostos pela recorrida, uma vez que “O equívoco no proceder do executado/embargante, ao juntar sua petição nos autos da execução, viola o disposto no art. 914, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015 e constitui erro grosseiro, insuscetível de correção, ainda que sob a perspectiva do princípio da instrumentalidade das formas”. 

Subsequentemente, pedi vista dos autos para melhor análise. 

O propósito recursal é definir se configura erro grosseiro, insuscetível de correção, a protocolização de embargos à execução nos autos da própria ação executiva, em inobservância ao que dispõe o art. 914, § 1º, do CPC/2015. 

Prevê o art. 914, § 1º, do CPC/2015 que os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e instruído com cópias de peças processuais relevantes. 

Frisa-se que a possibilidade de defesa do executado por meio de ação autônoma – os tradicionalmente conhecidos embargos à execução – não é inovação trazida pelo novo Código de Processo Civil, sendo o dispositivo legal mencionado mera reprodução do art. 736 do CPC/73. 

A propósito, cita-se lição de abalizada doutrina: 

Em se tratando de uma nova ação, sujeita-se à distribuição, registro e autuação próprios (...), devendo, também, receber valor de causa, na respectiva petição inicial (...). Diante da inegável conexão que se nota entre a execução e os embargos, a distribuição destes é feita por dependência (...). Submete-se, em regra, a ação de embargos, como qualquer outra, à exigência de preparo prévio, de sorte que o não pagamento das custas iniciais em trinta dias importa cancelamento da distribuição e extinção do processo em seu nascedouro (...). Os embargos, como ação cognitiva, devem ser propostos por meio de petição inicial, que satisfaça as exigências dos arts. 282 e 283. Submeter-se-ão à distribuição por dependência, ao juízo da causa principal (ação executiva). Formarão autos próprios, apartados da ação de execução. Se não ocorrer o deferimento do efeito suspensivo, os embargos deverão tramitar sem prejuízo da marcha normal da execução. Por isso, caberá ao embargante instruir sua petição inicial com cópias das peças do processo principal cujo exame seja relevante para o julgamento da pretensão deduzida na ação incidental (art. 736, parágrafo único), já que pode acontecer de cada uma das ações tomar rumo diferente, exigindo a prática de atos incompatíveis entre si, e subindo, em momentos diversos, a tribunais distintos. (...) (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, Processo Cautelar e Tutela de Urgência – vol. II. Rio de Janeiro: Forense, 2014, pp. 438-439) (grifos acrescentados). 

Com efeito, é inegável que a lei prevê expressamente que os embargos à execução tratam-se de ação incidente, que deverá ser distribuída por dependência aos autos da ação principal (demanda executiva). 

A controvérsia posta a deslinde nos presentes autos surge quando há a necessidade de se averiguar se a protocolização dos embargos à execução nos autos do próprio processo executivo constitui erro sanável ou, ao revés, deve ser tido por erro grosseiro e, portanto, não passível de correção, impondo ao embargante, que procedeu em evidente equívoco, a consequência de tê-los por não conhecidos. 

O Min. relator dos autos, reformando o acórdão proferido pelo TJ/RO, concluiu que a apresentação dos embargos à execução de forma diversa daquela expressamente prevista em lei configura erro inescusável da parte embargante. Nessa linha, fundamentou o seu voto nos argumentos de que: 

i) a lei expressamente prevê que os embargos à execução têm natureza de ação de conhecimento autônoma e incidente ao processo de execução; 

ii) o procedimento de manejo dos embargos em autos distintos da execução já é antigo na legislação processual, não sendo inovação trazida pelo novo Código de Processo Civil, redundando em erro grosseiro a sua não observância; 

iii) a observância das normas processuais é sempre salutar e recomendável para a correta condução dos feitos judiciais; 

iv) é inaplicável, na hipótese, o princípio da instrumentalidade das formas e dos atos processuais; e 

v) a marcha processual da execução restará prejudicada se as teses de defesa apresentadas nos embargos do devedor tiverem que ser apreciadas no mesmo processo de execução, uma vez que os respectivos procedimentos possuem ritos flagrantemente distintos e muitas vezes incompatíveis entre si. 

Contudo, penso que a controvérsia posta a deslinde nos presentes autos carece de análise sob outro viés. 

É que, primando por uma maior aproximação ao verdadeiro espírito do novo Código de Processo Civil, não se afigura razoável deixar de apreciar os argumentos apresentados em embargos à execução tempestivamente opostos – ainda que, de forma errônea, nos autos da própria ação de execução – sem antes conceder à parte prazo para sanar o vício, adequando o procedimento à forma prescrita no art. 914, § 1º, do CPC/2015. 

Convém salientar que o art. 277 do CPC/2015 preceitua que, quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade. 

Destarte, na espécie, o erro quanto à forma constitui vício sanável, notadamente quando se analisa o processo sob a ótica da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal, da celeridade, da razoável duração do processo, da cooperação e da busca pela solução do mérito. 

Assim, o protocolo equivocado dos embargos à execução nos autos da ação executiva deve dar azo à aplicação dos princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, de modo que a sua rejeição liminar configuraria excesso de formalismo. 

A corroborar com tais argumentos, destaca-se, ainda, que, em tempos de implantação do processo eletrônico, prioriza-se conferir agilidade aos julgamentos, devendo ser tolerados esses tipos de equívoco, nas hipóteses em que não configurada a má-fé. 

Anota, quanto ao ponto, Olavo de Oliveira Neto: 

Por se tratar de uma ação incidente, os embargos deverão ser distribuídos por dependência ao processo de execução e, segundo determina o § 1º, serão autuados em apartado e instruídos com as cópias das peças processuais relevantes. Essas duas providências, com o tempo e com a completa implantação do processo eletrônico, desaparecerão, uma vez que a autuação somente tem razão de ser quando se pensa num processo base-papel e a juntada das peças principais é absolutamente desnecessária quando se pensa que todos os personagens do processo terão acesso ao conteúdo digital da execução. De qualquer forma, quando e se ainda for possível o oferecimento de embargos base-papel, as cópias serão autenticadas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal (BUENO, Cassio Scarpinella. Comentários ao código de processo civil – voume 3. Cassio Scarpinella Bueno (coord.). São Paulo: Saraiva, 2017, p. 789) (grifos acrescentados). 

Em conclusão, tendo a recorrida apresentado o instrumento processual correto para impugnar a execução, dentro do prazo estabelecido na lei processual civil em vigor – o que foi, inclusive, expressamente reconhecido nos termos do voto do Min. Relator –, deve-se conceder prazo para que a parte promova o desentranhamento, distribuição por dependência e autuação em apartado dos embargos à execução opostos, em conformidade com as exigências legais quanto à forma de processamento (a exemplo da comprovação do preparo). 

Forte nessas razões, pedindo as mais respeitosas vênias ao e. Min. Relator, divirjo para CONHECER do recurso especial interposto por CONDOMINIO BRISAS DO MADEIRA RESIDENCIAL CLUBE e NEGAR-LHE PROVIMENTO, a fim de manter o acórdão recorrido, que reconheceu a possibilidade da recorrida sanar o vício de inadequação da via eleita. 

AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA PROFERIDA EM AÇÃO INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE. FALECIMENTO DO PRETENSO GENITOR BIOLÓGICO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. LEGITIMIDADE PASSIVA NA AÇÃO RESCISÓRIA DOS HERDEIROS DO FALECIDO E NÃO DO ESPÓLIO

RECURSO ESPECIAL Nº 1.667.576 - PR (2017/0077797-4) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA PROFERIDA EM AÇÃO INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE. FALECIMENTO DO PRETENSO GENITOR BIOLÓGICO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. LEGITIMIDADE PASSIVA NA AÇÃO RESCISÓRIA DOS HERDEIROS DO FALECIDO E NÃO DO ESPÓLIO. AÇÃO DE ESTADO E DE NATUREZA PESSOAL. EMENDA À PETIÇÃO INICIAL PARA MODIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO, SEM ALTERAÇÃO DO PEDIDO OU DA CAUSA DE PEDIR, APÓS A CONTESTAÇÃO DO RÉU. ADMISSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA EFETIVIDADE DO PROCESSO, ECONOMIA PROCESSUAL E INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. OBRIGATORIEDADE DE A ALTERAÇÃO SE REALIZAR ANTES DO ESCOAMENTO DO BIÊNIO DA AÇÃO RESCISÓRIA, SOB PENA DE DECADÊNCIA. 

1- Ação proposta em 07/02/2014. Recursos especiais interpostos em 01/10/2015 e atribuídos à Relatora em 18/07/2017. 

2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deve ser ajuizada em face do espólio ou em face dos herdeiros; (ii) se é admissível a determinação judicial de emenda à petição inicial para correção do polo passivo após a contestação do réu na ação rescisória e após o escoamento do biênio para ajuizamento da ação rescisória. 

3- Por se tratar de ação de estado e de natureza pessoal, a ação de investigação de paternidade em que o pretenso genitor biológico é pré-morto deve ser ajuizada somente em face dos herdeiros do falecido e não de seu espólio, sendo irrelevante o fato de se tratar de rediscussão da matéria no âmbito de ação rescisória, para a qual igualmente são legitimados passivos os sucessores do pretenso genitor biológico, na medida em que são eles as pessoas aptas a suportar as pretensões rescindente e rescisória deduzidas pelos supostos filhos. 

4- Em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, é admissível a emenda à petição inicial para modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação do réu. Precedentes. 

5- No âmbito da ação rescisória, a admissibilidade de modificações no polo passivo, seja para inclusão de litisconsortes passivos necessários, seja para a substituição de parte ilegítima, deve ser realizada, obrigatoriamente, até o escoamento do prazo bienal para o ajuizamento da ação rescisória, sob pena de se operar a decadência. 

6- Recurso especial de GILMAR M conhecido e desprovido; recurso especial do espólio de JOÃO G conhecido e provido, para reconhecer a decadência do direito de rescindir a coisa julgada e julgar improcedente a ação rescisória. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial de GILMAR M e dar provimento ao recurso especial de JOÃO G, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Dr(a). TIAGO BECKERT ISFER, pela parte RECORRIDA: G M. 

Brasília (DF), 10 de setembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recursos especiais interpostos por GILMAR M, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, e por espólio de JOÃO G, também com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, ambos em face de acórdãos do TJ/PR que, por unanimidade, negaram provimento aos agravos internos por eles interpostos. 

Recursos especiais interpostos e m: 01/10/2015. Atribuídos ao gabinete e m: 26/03/2018. 

Ação: rescisória ajuizada por GILMAR M em face de espólio de JOÃO G, visando rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade por elas ajuizada, que julgou improcedente o pedido e que transitou em julgado em 08/02/2012. 

Decisão unipessoal: determinou a emenda da petição inicial da ação rescisória, a fim de que o espólio fosse substituído pelos herdeiros de JOÃO G. 

Acórdão: por unanimidade, negou-se provimento aos agravos internos interpostos pelos recorrentes, nos termos das seguintes ementas: 

AGRAVOS REGIMENTAIS. EMENDA À INICIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. INVESTIGADO FALECIDO. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS HERDEIROS. A ação rescisória que visa desconstituir sentença proferida em ação de investigação de paternidade, cujo réu é falecido, recai sobre os herdeiros, posto que a providência pretendida nesses autos tem o poder de implicar em alterações na esfera jurídica daqueles. (...) AGRAVOS REGIMENTAIS. EMENDA À INICIAL. POSSIBILIDADE. ECONOMIA PROCESSUAL E INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. ART. 284 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Embora a regra não seja a da emenda à petição inicial após a citação, a regularização processual pode ocorrer em casos específicos, em homenagem aos princípios da economia processual e da instrumentalidade, combinados com o art. 284 do Código de Processo Civil. 

Recurso especial de GILMAR M: alega-se violação aos arts. 12, V, e 472, ambos do CPC/73, ao fundamento de que a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deveria ser ajuizada em face do espólio ou, quando muito, em litisconsórcio passivo necessário entre espólio e herdeiros, razão pela qual deve ser reformada a decisão judicial que determinou fosse emendada a petição inicial (fls. 1.509/1.525, e-STJ). 

Recurso especial do espólio de JOÃO G: alega-se violação aos arts. 264, 267, VI, e 495, todos do CPC/73, ao fundamento de que seria inadmissível a ordem judicial de emenda à inicial, quer seja porque já teria havido contestação do réu e, consequentemente, estabilização subjetiva da lide, quer seja porque a emenda somente ocorreu após o escoamento do biênio da ação rescisória, tendo se operado a decadência (fls. 1.306/1.324, e-STJ). 

Ministério Público Federal: opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso especial de GILMAR M; e pelo conhecimento e provimento do recurso especial do espólio de JOÃO G (fls. 1.723/1.730, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se a ação rescisória em que se pretende rescindir sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deve ser ajuizada em face do espólio ou em face dos herdeiros; (ii) se é admissível a determinação judicial de emenda à petição inicial para correção do polo passivo após a contestação do réu na ação rescisória e após o escoamento do biênio para ajuizamento da ação rescisória. 

1. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO POR GILMAR M. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 12, V, E 472, AMBOS DO CPC/73. 

O recorrente GILMAR M sustenta inicialmente que seria correto o ajuizamento da ação rescisória em face do espólio de JOÃO G, na medida em que a ação investigatória de paternidade cuja sentença se pretende rescindir teria sido ajuizada exclusivamente em face dele enquanto vivo, de modo que não poderia haver a posterior substituição processual pelos herdeiros. 

Sustenta o recorrente ainda, em caráter subsidiário, que, se se entender pela legitimação passiva dos herdeiros, a hipótese seria de litisconsórcio passivo necessário desses com o espólio. 

Em se tratando especificamente de ação investigatória de paternidade, leciona Flávio Tartuce: 

Em regra, a ação será proposta contra o suposto pai ou suposta mãe, diante do seu caráter pessoal. Falecido este ou esta, a ação será proposta contra os herdeiros da pessoa investigada, não contra o espólio, justamente diante deste caráter pessoal. Lembre-se de que o espólio não tem personalidade jurídica, o que afasta a possibilidade de propositura da demanda contra este. (TARTUCE, Flávio. Direito Civil Vol. 5: direito de família. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 501). 

A questão é explorada mais profundamente por Rolf Madaleno: 

A legitimação passiva na ação de filiação é do ascendente investigado, no caso a suposta mãe, em sendo investigada a maternidade, ou o pai, no caminho oposto. Se o investigado já é falecido, serão réus os respectivos herdeiros, a serem individual e pessoalmente citados, tendo em vista ser uma ação de estado, não podendo ser representados pelo inventariante, acaso ainda tramitando o processo de inventário do investigado sucedido, mesmo se a pretensão judicial inserir pedido cumulativo e relativo ao quinhão hereditário do investigante. Isso porque a ação é de investigação de filiação, e visa ao reconhecimento da perfilhação. É uma ação declaratória de estado da pessoa e não guardar qualquer correlação com o resultado econômico oriundo da procedência da investigatória, e também implicará um resultado econômico se o extinto declarado genitor tiver deixado bens para inventariar e não estiver prescrita a ação de petição de herança. (MADALENO, Rolf. Direito de família. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 624/625). 

A jurisprudência desta Corte, de igual modo, fixou-se no sentido de que a ação de investigação de paternidade deve ser ajuizada em face dos herdeiros e não do espólio do falecido. 

Nesse sentido, confiram-se: REsp 5.280/RJ, 3ª Turma, DJ 11/11/1991; REsp 120.622/RS, 3ª Turma, DJ 25/02/1998; REsp 331.842/AL, 3ª Turma, DJ 10/06/2002. Nesse contexto, o fato de a sentença que se pretende rescindir ter sido proferida em ação investigatória de paternidade em que somente JOÃO G figurou como parte, o que sustentaria a tese recursal de que, após o seu falecimento, a ação rescisória deveria ser ajuizada em face do espólio, e não dos seus herdeiros, não modifica em absolutamente nada o entendimento acima mencionado. 

Com efeito, embora o CPC/73 não trate da legitimidade passiva para a ação rescisória (e, anote-se, que o CPC/15 também não examine esse tema), é correto afirmar que a regra do art. 487, I, do CPC revogado (idêntico ao art. 967, I, do novo CPC), que disciplina a legitimidade ativa e que informe que poderá propor a referida ação “quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular” deve se aplicar, por lógica, coerência e simetria, também à adequada configuração da legitimação passiva da ação rescisória. 

Por essa razão, o falecimento da parte após o trânsito em julgado da sentença a ser rescindida implica em sucessão processual não apenas no polo ativo, mas também no polo passivo. 

Tratando especificamente dessa matéria, leciona José Carlos Barbosa Moreira: 

Merece consideração especial a hipótese de sucessão intercorrente, quanto a alguma pessoa que, por haver sido parte no outro feito, devesse ser citada para a rescisória. Na sucessão causa mortis e na sucessão a título universal entre pessoas jurídicas (por exemplo: fusão ou incorporação de sociedades), não há dúvida de que a legitimação passiva se transfere aos sucessores. (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil – Vol. 5 – Arts. 476 a 565. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 174/175).

Como se sabe, a legitimidade passiva decorre de uma relação lógica e abstrata entre quem pede, o que se pede e contra quem se pede, devendo figurar no polo passivo a pessoa indicada pelo autor que possa ser compelida e reúna condições de satisfazer o pedido inicial. 

Tendo em mira essa premissa, conclui-se que, evidentemente, o espólio não é parte legítima para responder à ação rescisória em que se pleiteie a rescisão de sentença e o rejulgamento de ação investigatória de paternidade post mortem, seja como legitimado exclusivo, seja como litisconsorte passivo necessário, na medida em que, nessa ação, nada será pedido contra o espólio, que tão somente é um ente despersonalizado apto a titularizar a universalidade jurídica denominada herança até que se efetive a partilha dos bens. 

Sublinhe-se que as eventuais repercussões econômicas ou patrimoniais derivadas do reconhecimento, ou não, da filiação que se pretende alcançar por intermédio da ação investigatória de paternidade é que poderão, hipoteticamente, ser objeto de pretensões autônomas que serão deduzidas contra o espólio, como já se consignou em precedentes desta Corte em relação à petição de herança (AgRg no Ag 580.197/SP, 4ª Turma, DJe 04/05/2009) e à execução de dívidas do de cujus (REsp 1.559.791/PB, 3ª Turma, DJe 31/08/2018). 

Por tais razões, não há que se falar em violação aos arts. 12, V, e 472, ambos do CPC/73, motivo pelo qual o recurso especial interposto por GILMAR M deve ser desprovido. 

2. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELO ESPÓLIO DE JOÃO G. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 264, 267, VI, E 495, TODOS DO CPC/73. 

A primeira tese apresentada no recurso especial do espólio de JOÃO G é de que a consequência jurídica do reconhecimento de sua ilegitimidade passiva para responder a ação rescisória seria o indeferimento da petição inicial e, consequentemente, a extinção do processo sem resolução de mérito (art. 267, VI, combinado com art. 295, II, ambos do CPC/73), não havendo que se cogitar a possibilidade de emenda à petição inicial após a citação do recorrente (violação ao art. 264 do CPC/73). 

Não se pode olvidar, evidentemente, que há antigo precedente desta Corte que consignou que a ilegitimidade não pode ser concebida “como simples erro na petição inicial, passível de correção”, motivo pelo qual “iniciado o processo sob uma titularidade, a alteração no polo ativo, por meio de emenda, corresponderia a uma substituição processual, mormente quando é determinada após a citação, hipótese expressamente vedada, salvo exceções não presentes no caso, a teor do artigo 264 do Código de Processo Civil”. (REsp 758.622/RJ, 3ª Turma, DJ 10/10/2005). 

Ocorre que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, evoluiu no sentido de que é admissível a emenda à petição inicial para modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação. Nesse sentido: AgRg no REsp 1.362.921/MG, 2ª Turma, DJe 01/07/2013; AgInt no AREsp 921.282/PR, 4ª Turma, DJe 27/02/2018. 

Existe, inclusive, precedente específico da 3ª Turma desta Corte: 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU INCLUSÃO DE PARTE NO POLO PASSIVO DA AÇÃO APÓS A CITAÇÃO DO RÉU. INTERDITO PROIBITÓRIO. AUSÊNCIA DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 535 DO CPC. EMENDA DA INICIAL APÓS CITAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS E DA ECONOMIA PROCESSUAL. PECULIARIDADES DO CASO QUE JUSTIFICAM A RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO. INEXISTÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR OU PEDIDO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Não há violação do disposto no art 535 do CPC quando o aresto recorrido adota fundamentação suficiente para dirimir a controvérsia, sendo desnecessária a manifestação expressa sobre todos os argumentos apresentados. 2. Observados os princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, é possível a relativização das regras previstas no art. 264 do CPC para se admitir a emenda da inicial após a citação do réu desde que isso não acarrete alteração da causa de pedir ou do pedido. Precedentes. 3. Recurso especial não provido. (REsp 1.473.280/ES, 3ª Turma, DJe 14/12/2015. 

Por tais motivos, conclui-se que o acórdão recorrido não violou os arts. 264 e 267, VI, ambos do CPC/73, razão pela qual o recurso especial do espólio de JOÃO G não merece ser provido sob esse fundamento. 

É preciso examinar, contudo, a segunda tese deduzida no recurso especial do espólio de JOÃO G, segundo a qual teria havido violação ao art. 495 do CPC/73, na medida em que o recorrido GILMAR M teria decaído do direito de rescindir a sentença proferida na ação investigatória de paternidade em virtude de não ter havido a substituição do polo passivo antes do término do prazo bienal. 

A esse respeito, destaque-se desde logo precedente da Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça: 

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO RESCISÓRIA. PROPOSITURA APENAS EM FACE DE PARTE DOS INTEGRANTES DA RELAÇÃO ORIGINÁRIA. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. CORREÇÃO. DECADÊNCIA. 1. Nas ações rescisórias integrais devem participar, em litisconsórcio unitário, todos os que foram partes no processo cuja sentença é objeto de rescisão. 2. A propositura de ação rescisória sem a presença, no polo passivo, de litisconsorte necessário somente comporta correção até o prazo de dois anos disciplinado pelo art. 495 do CPC. Após essa data, a falta de citação do litisconsorte implica a decadência do direito de pleitear a rescisão, conduzindo à extinção do processo sem resolução do mérito. 3. Embargos de divergência conhecidos e providos. (EREsp 676.159/MT, Corte Especial, DJe 30/03/2011). 

Conquanto o precedente acima mencionado verse sobre complementação de polo passivo e a hipótese examinada neste recurso especial envolva substituição do polo passivo, colhe-se da ratio decidendi os fundamentos determinantes que justificam a aplicação da mesma solução jurídica já consolidada nesta Corte. 

Com efeito, o precedente se funda na existência de “falha do próprio autor da ação rescisória”, que “gerou graves inconvenientes”, como a surpresa causada a quem havia sido beneficiado pela coisa julgada e que repentinamente se encontra, muitos anos após, sob ameaça de rescisão e de ruptura da estabilidade e da segurança dela originada, motivo pelo qual a formação da relação jurídico-processual deve sempre observar o prazo decadencial bienal do art. 495 do CPC/73. 

Essas mesmas circunstâncias fáticas também se encontram, concreta ou potencialmente, presentes na hipótese em exame, na medida em que os herdeiros, somente agora, seriam surpreendidos e teriam ciência de nova ação ajuizada pelos pretensos filhos do de cujus, em que se visa rescindir coisa julgada formada em Fevereiro de 2012. 

Anote-se, ademais, que embora a inventariante do espólio de JOÃO G igualmente seja herdeira, há mais quatro herdeiros que eventualmente podem não ter ciência da presente ação rescisória, de modo que o elemento surpresa acima mencionado se fará presente em relação a eles. 

Além disso, registre-se que, ao tempo da propositura da ação rescisória, não existia sequer dúvida objetiva ou razoável acerca da legitimação do polo passivo na ação investigatória de paternidade, pois o primeiro julgado desta Corte que apontou a legitimação dos herdeiros, e não do espólio, está datado de 1991. 

Assim, a despeito de ser possível a modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação, com a substituição do réu pelo correto legitimado, essa alteração deverá ser realizada, obrigatoriamente, até o escoamento do prazo bienal decadencial da ação rescisória. 

Na hipótese, a sentença proferida na ação ajuizada pelo recorrente GILMAR M em face de JOÃO G e que julgou improcedente o pedido de reconhecimento da paternidade transitou em julgado em 08/02/2012 e a ação rescisória contra o espólio de JOÃO G foi ajuizada em 23/01/2014. 

Contudo, somente em 21/11/2014 houve a modificação do polo passivo para a substituição do espólio pelos herdeiros de JOÃO G, conforme se depreende da petição de fls. 1.301/1.303 (e-STJ), razão pela qual se operou a decadência na forma do art. 495 do CPC/73 que, pela fundamentação acima expendida, foi violado pelo acórdão recorrido. 

3. CONCLUSÃO. 

Forte nessas razões, CONHEÇO e NEGO PROVIMENTO ao recurso especial de GILMAR M; e CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso especial do espólio de JOÃO G, a fim de reconhecer a decadência do direito de rescindir a coisa julgada que se formou na ação investigatória de paternidade com base no art. 495 do CPC/73 e, consequentemente, julgar improcedente a ação rescisória com base no art. 269, IV, do CPC/73.