RECURSO ESPECIAL Nº 1.803.251 - SC (2018/0235823-3)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO AUTÔNOMA DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS PELO
PROCEDIMENTO COMUM. POSSIBILIDADE. PRETENSÃO QUE SE EXAURE NA
APRESENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS APONTADOS. INTERESSE E ADEQUAÇÃO
PROCESSUAIS. VERIFICAÇÃO. AÇÃO AUTÔNOMA DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS PELO
PROCEDIMENTO COMUM E PRODUÇÃO DE PROVA ANTECIPADA. COEXISTÊNCIA.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A controvérsia posta no presente recurso especial centra-se em saber se, a partir da
vigência do Código de Processo Civil de 2015, é possível o ajuizamento de ação autônoma
de exibição de documentos, sob o rito do procedimento comum (arts. 318 e seguintes), ou,
como compreenderam as instâncias ordinárias, a referida ação deve se sujeitar,
necessariamente, para efeito de adequação e interesse processual, ao disposto em relação
ao "procedimento" da "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes).
2. A partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, que não reproduziu, em seu
teor, o Livro III, afeto ao Processo Cautelar, então previsto no diploma processual de 1973,
adveio intenso debate no âmbito acadêmico e doutrinário, seguido da prolação de decisões
díspares nas instâncias ordinárias, quanto à subsistência da ação autônoma de exibição de
documentos, de natureza satisfativa (e eventualmente preparatória), sobretudo diante dos
novos institutos processuais que instrumentalizam o direito material à prova, entre eles, no
que importa à discussão em análise, a "produção antecipada de provas" (arts. 381 e
seguintes) e a "exibição incidental de documentos e coisa" (arts 496 e seguintes).
3. O Código de Processo Civil de 2015 buscou reproduzir, em seus termos, compreensão há
muito difundida entre os processualistas de que a prova, na verdade, tem como destinatário
imediato não apenas o juiz, mas também, diretamente, as partes envolvidas no litígio. Nesse
contexto, reconhecida a existência de um direito material à prova, autônomo em si — que não
se confunde com os fatos que ela se destina a demonstrar, tampouco com as consequências
jurídicas daí advindas a subsidiar (ou não) outra pretensão —, a lei adjetiva civil estabelece
instrumentos processuais para o seu exercício, o qual pode se dar incidentalmente, no bojo
de um processo já instaurado entre as partes, ou por meio de uma ação autônoma (ação
probatória lato sensu).
4. Para além das situações que revelem urgência e risco à prova, a pretensão posta na ação
probatória autônoma pode, eventualmente, se exaurir na produção antecipada de
determinada prova (meio de produção de prova) ou na apresentação/exibição de
determinado documento ou coisa (meio de prova ou meio de obtenção de prova — caráter
híbrido), a permitir que a parte demandante, diante da prova produzida ou do documento ou
coisa apresentada, avalie sobre a existência de um direito passível de tutela e, segundo um
juízo de conveniência, promova ou não a correlata ação.
4.1 Com vistas ao exercício do direito material à prova, consistente na produção antecipada
de determinada prova, o Código de Processo Civil de 2015 estabeleceu a possibilidade de se
promover ação probatória autônoma, com as finalidades devidamente especificadas no art.
381.
4.2 Revela-se possível, ainda, que o direito material à prova consista não propriamente na
produção antecipada de provas, mas no direito de exigir, em razão de lei ou de contrato, a exibição de documento ou coisa — já existente/já produzida — que se encontre na posse
Documento: 1849154 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 08/11/2019 Página 1 de 6
Superior Tribunal de Justiça
de outrem.
4.2.1 Para essa situação, afigura-se absolutamente viável — e tecnicamente mais adequado — o manejo de ação probatória autônoma de exibição de documento ou coisa, que, na falta
de regramento específico, há de observar o procedimento comum, nos termos do art. 318 do
novo Código de Processo Civil, aplicando-se, no que couber, pela especificidade, o disposto
nos arts. 396 e seguintes, que se reportam à exibição de documentos ou coisa
incidentalmente.
4.2.2 Também aqui não se exige o requisito da urgência, tampouco o
caráter preparatório a uma ação dita principal, possuindo caráter exclusivamente satisfativo,
tal como a jurisprudência e a doutrina nacional há muito reconheciam na postulação de tal
ação sob a égide do CPC/1973. A pretensão, como assinalado, exaure-se na apresentação
do documento ou coisa, sem nenhuma vinculação, ao menos imediata, com um dito pedido
principal, não havendo se falar, por isso, em presunção de veracidade na hipótese de não
exibição, preservada, contudo, a possibilidade de adoção de medidas coercitivas pelo juiz.
5. Reconhece-se, assim, que a ação de exibição de documentos subjacente, promovida pelo
rito comum, denota, por parte do demandante, a existência de interesse de agir, inclusive sob
a vertente adequação e utilidade da via eleita.
6. Registre-se que o cabimento da ação de exibição de documentos não impede o
ajuizamento de ação de produção de antecipação de provas.
7. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, dar provimento
ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Vencidos os Srs. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Boas
Cueva.
Votaram com o Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze os Srs. Ministros Moura
Ribeiro e Nancy Andrighi.
Brasília, 22 de outubro de 2019 (data do julgamento)
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:
Lucas Lima dos Santos interpõe recurso especial, fundado na alínea a do
permissivo constitucional, em contrariedade ao aresto prolatado pelo Tribunal de Justiça
do Estado de Santa Catarina.
Subjaz ao presente recurso especial ação de exibição de documentos
promovida, em outubro de 2016, por Lucas Lima dos Santos contra Banco do Brasil S.A.,
tendo por finalidade condenar o banco requerido a exibir o contrato de abertura de conta n.
7.594-9 (Agência n. 5390-2), bem como extrato de movimentação dos últimos 5 (cinco)
anos da referida conta, além de outros documentos relacionados à relação jurídica em
pauta, que estejam em seu poder (e-STJ, fls. 1-9).
A esse propósito, afirmou a parte autora que a exibição destina-se a
"averiguar se houve ou não cobranças indevidas ou excessiva" (e-STJ, fl. 2), tendo,
anteriormente, envidado notificação extrajudicial à instituição financeira para a
apresentação da aludida documentação, sem, todavia, obter êxito, não lhe restando outra
saída senão socorrer-se do Judiciário.
Especificamente sobre o cabimento da presente ação, o demandante
consignou que "no caso em apreço é cabível a ação de exibição de documento de forma
autônoma, uma vez que o objetivo único e exclusivo da mesma é a obtenção de
documento que está em poder da requerida, ou seja, a causa de pedir da ação de exibição
limita-se tão somente ao acesso do documento postulado, tendo a mesma caráter
plenamento satisfativo" (e-STJ, fl. 2).
Sustentou, outrossim, que "a presente demanda encontra respaldo legal no
art. 396 [e seguintes], do novo Código de Processo Civil o qual dispõe que o 'o juiz pode
ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder'" (e-STJ, fl.
4).
O juízo a quo reputou necessária a emenda da inicial (e-STJ, fls. 18-24), sob
o fundamento de que os arts. 396 e seguintes do CPC/2015, os quais fundamentam a presente ação, referem-se à exibição incidental de documentos, sem aplicação, portanto,
à ação que tem como única pretensão a exibição de documento ou coisa. Compreendeu,
assim, que, "na legislação processual em vigor — Lei n. 13.105/2015 —, a antiga ação
cautelar de exibição vem disciplinada nos artigos 381 e seguintes como a ação autônoma
de produção antecipada de provas" (e-STJ, fl. 19), razão pela qual o "requerente deve fazer
as adequações que entender pertinentes ao prosseguimento da ação de produção
antecipada de provas" (e-STJ, fl. 22).
Ato contínuo, o demandante requereu a reconsideração do despacho que
determinou a emenda da inicial para adequação e seguimento como ação de produção
antecipada de provas, a fim de que a presente ação siga, tal como postulada, como ação
autônoma de exibição de documentos (arts. 396 a 404 do CPC/2015), sob o procedimento
comum (art. 318 do CPC/2015), na esfera da obrigação de fazer (e-STJ, fls. 27-39).
Para tanto, argumentou não se afigurar viável, para o caso em apreço,
transmutar a pretensão de exibição de documento em ação de produção antecipada de
provas, uma vez que não se trata aqui de produção/elaboração de prova perecível, mas
sim a simples apresentação de um documento já existente em posse da instituição
financeira, em que se objetiva apenas a sua exibição. Sustentou, ainda, que, nos termos
do § 2º do art. 382 do CPC/2015, no procedimento de produção antecipada de provas, "o
juiz não poderá se manifestar sobre a inocorrência do fato, nem sobre respectivas
consequências jurídicas", a ensejar a descabida conclusão de que, "no caso de inércia da
parte requerida na apresentação da documentação quando solicitada, nada poderá ser
feito para forçar a exibição" (e-STJ, fl. 29).
O Juízo de primeira instância entendeu por bem indeferir a petição inicial (art.
321, CPC/2015) e, por consequência, extinguir o processo sem resolução de mérito, com
fundamento no art. 485, I, do CPC/2015.
Irresignado, o demandante interpôs recurso de apelação, ao qual o Tribunal
de Justiça do Estado de Santa Catarina conferiu parcial provimento, apenas para deferir o
benefício da gratuidade de justiça, em acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 124):
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE
DOCUMENTOS. SENTENÇA QUE INDEFERIU A INICIAL.
INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. MÉRITO. AÇÃO AJUIZADA SOB A
ÉGIDE DO CPC/15 PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE EXTRATOS E
CONTRATO BANCÁRIO. ALEGAÇÃO DE CABIMENTO DO PROCESSAMENTO PELOS ART.396 E SEGUINTES DO CPC.
IMPOSSIBILIDADE. VIA PROCESSUAL INADEQUADA.
ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E VÍCIO. DESPACHO DE EMENDA À
INICIAL, DETERMINANDO A ADEQUAÇÃO AO MEIO PROCESSUAL
(PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS). INDEFERIMENTO QUE SE
IMPUNHA. ART. 321 DO CPC. JUSTIÇA GRATUITA. CONJUNTO
PROBATÓRIO APTO. RENDIMENTOS MENSAIS QUE JUSTIFICAM A
CONDIÇÃO HIPOSSUFICIENTE. DEFERIMENTO. ART. 98 DO CPC.
Recurso conhecido e parcialmente provido.
Opostos embargos de declaração (e-STJ, fls. 132-144), estes foram
rejeitados (e-STJ, fls. 164-168).
Nas razões do presente recurso especial, Lucas Lima dos Santos sustenta,
em suma, que o acórdão recorrido incorreu em violação dos arts. 318 e 497 do CPC/2015.
Anota que, ainda sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, a ação
de exibição destinada à apresentação de contratos e extratos bancários já assumia nítido
caráter de ação de obrigação de fazer, em que a tutela requerida limitava-se a mera
obtenção do documento de maneira satisfativa, a despeito de a lei processual inseri-la em
capítulo afeto a procedimento preparatório.
Argumenta que o Código de Processo Civil de 2015, em que pese tenha
extinguido o processo cautelar do ordenamento, não impede a utilização de ação
autônoma de exibição de documentos, tendo por propósito a apresentação de contratos e
extratos bancários (obrigação de fazer), cuja pretensão se exaure em si mesma (natureza
satisfativa).
Defende, no caso, a inaplicabilidade do art. 381, III, do CPC/2015, que trata
do procedimento de produção antecipada de prova, pois não se pugna pela "produção" de
nenhuma prova, até porque ela já está produzida; "o direito a ser tutelado, deste modo, é o
de mera obtenção do documento e não o de produção dele" (e-STJ, fl. 177).
Sustenta, assim, não ser correta a assertiva de que o CPC/2015 teria
substituído a ação de exibição de documento (satisfativa em si e, portanto, autônoma) pela
"produção antecipada de prova".
Pondera que, se a antiga cautelar de exibição de documentos nada tinha de
cautelar, porque como antes exposto lhe faltava a urgência (perigo de dano ao direito ou ao
próprio processo), não há óbice, então, que, na vigência do CPC/2015, a pretensão de
exibição dos documentos bancários possa ser realizada pela via da ação autônoma (procedimento comum art. 318) na esfera de obrigação de fazer (obrigação de fazer art.
497), sendo prescindível a via do rito especial da produção antecipada de prova (e-STJ, fls.
178-179).
A parte adversa apresentou contrarrazões às fls. 222-229 (e-STJ).
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR):
A controvérsia posta no presente recurso especial centra-se em saber se, a
partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, é possível o ajuizamento de ação
autônoma de exibição de documentos, sob o rito do procedimento comum (arts. 318
e seguintes), ou, como compreenderam as instâncias ordinárias, a referida ação deve se
sujeitar, necessariamente, para efeito de adequação e interesse processual, ao disposto
em relação ao "procedimento" da "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes).
Impende registrar, de início, que esta questão, recentemente, foi objeto de
enfrentamento pela Quarta Turma do STJ, por ocasião do julgamento do REsp
1.774.987/SP (da relatoria do Ministra Maria Isabel Gallotti, julgado em 8/11/2018, DJe
13/11/2018), inexistindo, até o presente momento, deliberação da Terceira Turma sobre a
matéria, razão pela qual se reputou oportuno submetê-la a este Colegiado.
A propósito, consigna-se que a Quarta Turma do STJ, ao enfrentar o tema,
compreendeu afigurar-se possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de
documentos pelo procedimento comum, nos termos da seguinte ementa:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXIBIÇÃO DE
DOCUMENTO. AÇÃO AUTÔNOMA. PROCEDIMENTO COMUM. AÇÃO
DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA.
INTERESSE E ADEQUAÇÃO.
1. Admite-se o ajuizamento de ação autônoma para a exibição de
documento, com base nos arts. 381 e 396 e seguintes do CPC, ou até
mesmo pelo procedimento comum, previsto nos arts. 318 e seguintes
do CPC. Entendimento apoiado nos enunciados n. 119 e 129 da II
Jornada de Direito Processual Civil.
2. Recurso especial provido.
(REsp 1774987/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA
TURMA, julgado em 08/11/2018, DJe 13/11/2018)
A tal conclusão adere esta relatoria integralmente, com o acréscimo de
fundamentação a seguir expendida.
Segundo o entendimento adotado pelo Tribunal de origem — que manteve a
extinção do feito, sem julgamento de mérito, ante a inadequação da via eleita (e, por conseguinte, ante a ausência de interesse processual da parte demandante) —, o Código
de Processo Civil de 2015 teria substituído a antiga ação cautelar de exibição de
documentos, de caráter satisfativo, pela "ação de produção antecipada de provas", regida
pelos arts. 381 e seguintes. Assim, a partir da nova sistemática processual, a pretensão
de exibir documentos somente poderia ser veiculada, autonomamente, por meio da ação
de produção antecipada de provas, ou, incidentalmente, nos termos dos arts. 496 e
seguintes.
Destaca-se, a esse propósito, os fundamentos constantes no acórdão
recorrido (e-STJ, fls. 126-128):
O requerente pediu a exibição de extratos e do contrato bancário, a
fim de verificar se havia irregularidades de cobrança de encargos
ilegais.
[...]
Nesse viés, discute-se qual o procedimento adequado para este
requerimento, uma vez que há procedimentos com finalidades
diferentes.
Do novo Código de Processo, se extrai a possibilidade da
exibição de documentos por via de Ação de Antecipação de
Provas (arts. 381 e ss) ou, ainda, a Exibição de Documento
(arts. 396 e ss).
Acontece que cada ação apresenta efeitos jurídicos diversos, sendo
sua utilização condicionada a um determinado fato jurídico. Por isso,
necessário analisar cada ação a fim de verificar qual seria mais
apropriada para a presente demanda.
O pedido de Tutela Cautelar antecedente se utiliza naqueles casos em
que há perigo ao resultado útil da ação, mas não existe o acervo
probatório necessário para embasar o pedido principal, que deverá
ser interposto no prazo de 30 dias após efetivada a tutela cautelar.
Sendo, assim, de caráter dependente, não merece maiores
explicações neste momento, visto não condizer com o interesse do
autor nesta demanda.
Na vigência do Código passado, a Ação Cautelar de Exibição de
Documento de ocupava de trazer aos autos o documento
almejado, sendo regulada no capítulo de procedimentos
especiais. Contudo, com a modificação trazida pela legislação
atual, a previsão do procedimento especial se extinguiu, tendo
como mesmo destino a interpretação sobre o assunto.
Atualmente, a Ação de Antecipação de Provas, a priori, é a que
melhor coaduna para substituir a antiga Ação de Exibição de
Documentos, por se tratar de ação autônoma e cujo objeto é
colher provas antecipadamente, isto é, beneficiar as partes
acerca de qualquer meio de prova, justificada pela urgência da
colheita de provas; para ensejar a autocomposição; ou tão
somente para reconhecimento prévio dos fatos (art. 381,
incisos I a III do CPC).
Já a Exibição de Documentos possui sua existência pautada na determinação de obrigar a parte adversa a juntar aos autos
determinado documento, observando os requisitos do art. 397
do CPC. Assim, sua natureza cautelar foi extinta e posta como
meio incidental, retirando a característica autônoma que
possuía.
[...]
Nota-se que a disposição da exibição de documento na legislação
anterior tinha duas acepções: era disciplinada como procedimento
especial - preparatória - e como incidente no Capítulo das Provas.
Enquanto, atualmente, é disciplinado somente como incidente nos
arts. 396 e ss., da Seção VI, Capítulo VI - Das Provas.
Pela interpretação histórico-sistemática, percebe-se que o
legislador optou por retirar da Ação de Exibição de
Documentos o caráter preparatório e amplificar as hipóteses
de cabimento da ação de produção antecipada de provas,
restando à parte a opção de ajuizar esta última somente com o
intuito de analisar os documentos almejados.
Para o referido caso, o mais adequado, portanto, seria a ação
de produção antecipada de provas (com fundamento nos
incisos II ou III do art. 381 do CPC), em razão da exibição de
documentos se tratar agora de pedido incidental, deixando de
apresentar o caráter autônomo que possuía na legislação
anterior (sem grifos no original).
Conforme já adiantado, conquanto a compreensão adotada na origem
encontre respaldo em respeitável corrente doutrinária (citada, inclusive, no acórdão
recorrido: Teresa Arruda Alvim Wambier, Primeiros Comentários ao Novo Código de
Processo Civil artigo por artigo, 2ª edição. Revista dos Tribunais, 2015, p. 756), filio-me à
vertente doutrinária, de igual quilate, que reconhece, atenta às particularidades de cada
qual, a coexistência harmônica entre a ação autônoma de exibição de documentos pelo
rito comum e os "novos" institutos processuais afetos à "produção antecipada de provas"
(arts. 381 e seguintes) e à "exibição incidental de documentos e coisa" (arts 496 e
seguintes).
Efetivamente, a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, que
não reproduziu, em seu teor, o Livro III, afeto ao Processo Cautelar, então previsto no
diploma processual de 1973, adveio intenso debate no âmbito acadêmico e doutrinário,
seguido da prolação de decisões díspares nas instâncias ordinárias, quanto à subsistência
da ação autônoma de exibição de documentos, de natureza satisfativa (e eventualmente
preparatória), sobretudo diante dos novos institutos processuais que instrumentalizam o
direito material à prova, entre eles, no que importa à discussão em análise, a "produção
antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes) e a "exibição incidental de documentos e coisa" (arts 496 e seguintes).
Relevante, no ponto, consignar que o Código de Processo Civil de 2015
buscou reproduzir, em seus termos, compreensão há muito difundida entre os
processualistas de que a prova, na verdade, tem como destinatário imediato não apenas o
juiz, mas também, diretamente, as partes envolvidas no litígio.
Reconhece-se, assim, à parte o direito material à prova, cuja tutela pode se
referir tanto ao modo de produção de determinada prova (produção antecipada de prova,
prova emprestada e a prova 'fora da terra'), como ao meio de prova propriamente
concebido (ata notarial, depoimento pessoal, confissão, exibição de documentos ou coisa,
documentos, testemunhas, perícia e inspeção judicial).
Nesse contexto, reconhecida a existência de um direito material à prova,
autônomo em si — que não se confunde com os fatos que ela se destina a demonstrar
(objeto da prova), tampouco com as consequências jurídicas daí advindas, podendo (ou
não) subsidiar outra pretensão —, a lei adjetiva civil estabelece instrumentos processuais
para o seu exercício, que pode se dar incidentalmente, no bojo de um processo já
instaurado entre as partes, ou por meio de uma ação autônoma (ação probatória lato
sensu).
Nesse último caso, para além das situações que revelem urgência e risco à
prova, a pretensão posta na ação probatória autônoma pode, eventualmente, se exaurir na
produção antecipada de determinada prova (meio de produção de prova) ou na
apresentação/exibição de determinado documento ou coisa (meio de prova ou meio de
obtenção de prova — caráter híbrido), a permitir que a parte demandante, diante da prova
produzida ou do documento ou coisa apresentada, avalie sobre a existência de um direito
passível de tutela e, segundo um juízo de conveniência, promova ou não a correlata ação.
Com vistas ao exercício do direito material à prova, consistente na produção
antecipada de determinada prova, o Código de Processo Civil de 2015 estabeleceu a
possibilidade de se promover ação probatória autônoma, com as finalidades devidamente
especificadas no art. 381, in verbis:
Art. 381. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em
que:
I - haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito
difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação;
II - a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de
conflito;
III - o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o
ajuizamento de ação.
Como anotado, esta ação probatória autônoma não exige, necessariamente,
que a produção da prova se apresente em situação de risco, podendo ser utilizada,
inclusive, para evitar o ajuizamento de uma futura ação, seja pela constatação, a partir da
prova produzida, da ausência de direito passível de tutela, seja para viabilizar a
composição entre as partes.
Afigura-se possível, ainda, que o direito material à prova consista não
propriamente na produção antecipada de provas, mas no direito de exigir, em razão de lei
ou de contrato, a exibição de documento ou coisa — já existente/já produzida — que se
encontre na posse de outrem.
Para essa situação, afigura-se absolutamente viável — e tecnicamente mais
adequado — o manejo de ação probatória autônoma de exibição de documento ou coisa,
que, na falta de regramento específico, há de observar o procedimento comum, nos
termos do art. 318 do novo Código de Processo Civil, aplicando-se, no que couber, pela
especificidade, o disposto nos arts. 396 e seguintes, que se reportam à exibição de
documentos ou coisa incidentalmente.
Também aqui não se exige o requisito da urgência, tampouco o caráter
preparatório a uma ação dita principal, possuindo caráter exclusivamente satisfativo,
tal como a jurisprudência e a doutrina nacional há muito reconheciam na postulação de tal
ação sob a égide do CPC/1973. A pretensão, como assinalado, exaure-se na
apresentação do documento ou coisa, sem nenhuma vinculação, ao menos imediata, com
um dito pedido principal, não havendo se falar, por isso, em presunção de veracidade na
hipótese de não exibição, preservada, contudo, a possibilidade de adoção de medidas
coercitivas pelo juiz.
Ao ensejo, cabe transcrever os dispositivos legais do CPC/2015 que regem
a subjacente ação autônoma de exibição de documentos
Art. 318. Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo
disposição em contrário deste Código ou de lei.
Parágrafo único. O procedimento comum aplica-se subsidiariamente
aos demais procedimentos especiais e ao processo de execução.
[...] Da Exibição de Documento ou Coisa
Art. 396. O juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa
que se encontre em seu poder.
Art. 397. O pedido formulado pela parte conterá:
I - a individuação, tão completa quanto possível, do documento ou da
coisa;
II - a finalidade da prova, indicando os fatos que se relacionam com o
documento ou com a coisa;
III - as circunstâncias em que se funda o requerente para afirmar que
o documento ou a coisa existe e se acha em poder da parte contrária.
Art. 398. [não aplicação]
Art. 399. O juiz não admitirá a recusa se:
I - o requerido tiver obrigação legal de exibir;
II - o requerido tiver aludido ao documento ou à coisa, no processo,
com o intuito de constituir prova;
III - o documento, por seu conteúdo, for comum às partes.
Art. 400. [não aplicação]
Art. 401. Quando o documento ou a coisa estiver em poder de
terceiro, o juiz ordenará sua citação para responder no prazo de 15
(quinze) dias.
Art. 402. Se o terceiro negar a obrigação de exibir ou a posse do
documento ou da coisa, o juiz designará audiência especial,
tomando-lhe o depoimento, bem como o das partes e, se necessário,
o de testemunhas, e em seguida proferirá decisão.
Art. 403. Se o terceiro, sem justo motivo, se recusar a efetuar a
exibição, o juiz ordenar-lhe-á que proceda ao respectivo depósito em
cartório ou em outro lugar designado, no prazo de 5 (cinco) dias,
impondo ao requerente que o ressarça pelas despesas que tiver.
Parágrafo único. Se o terceiro descumprir a ordem, o juiz expedirá
mandado de apreensão, requisitando, se necessário, força policial,
sem prejuízo da responsabilidade por crime de desobediência,
pagamento de multa e outras medidas indutivas, coercitivas,
mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar a
efetivação da decisão.
Art. 404. A parte e o terceiro se escusam de exibir, em juízo, o
documento ou a coisa se:
I - concernente a negócios da própria vida da família;
II - sua apresentação puder violar dever de honra;
III - sua publicidade redundar em desonra à parte ou ao terceiro, bem
como a seus parentes consanguíneos ou afins até o terceiro grau, ou
lhes representar perigo de ação penal;
IV - sua exibição acarretar a divulgação de fatos a cujo respeito, por
estado ou profissão, devam guardar segredo;
V - subsistirem outros motivos graves que, segundo o prudente
arbítrio do juiz, justifiquem a recusa da exibição;
VI - houver disposição legal que justifique a recusa da exibição.
Parágrafo único. Se os motivos de que tratam os incisos I a VI do
caput disserem respeito a apenas uma parcela do documento, a parte
ou o terceiro exibirá a outra em cartório, para dela ser extraída cópia
reprográfica, de tudo sendo lavrado auto circunstanciado.
Com essa compreensão, de grande relevância citar o escólio de Cássio
Scarpinella Bueno, que, após bem tecer um traço distintivo entre as pretensões
relacionadas ao direito à prova (meio de prova e meio de obtenção de prova), reconhece a
possibilidade de ajuizamento de ação autônoma de exibição de documento ou coisa,
inclusive como o instrumento mais técnico para tal propósito:
Na normalidade dos casos, a própria parte apresenta, em juízo,
os documentos ou quaisquer outros suportes materiais de
prova que tenha em seu poder. Pode ocorrer, contudo, que,
por qualquer razão, tais substratos materiais estejam em poder
da parte contrária e, até mesmo de terceiros, isto é, com
pessoas estranhas ao processo. É para disciplinar esses casos
que se voltam os arts. 396 a 404 do Código de Processo Civil, sob a
denominação de exibição de documentou ou coisa. Didática a
propósito a regra do art. 396: "O juiz pode ordenar que a parte exiba
documento ou coisa que se encontre em seu poder".
A exibição de documento ou coisa, tal qual disciplinada pelo
Código de Processo Civil, é, ao mesmo tempo, meio de
(produção de) prova [...] e meio de obtenção de prova.
Com relação a esta última observação, o Código de Processo
Civil parece ter dado ouvido aos reclamos de parcela da
doutrina de que era fundamental compreender o instituto de
viés híbrido. Isso porque se mostra inócuo querer presumir,
em todo e qualquer caso, indistintamente, verdadeiro o fato
resultante da não exibição do documento ou coisa pela singela
razão de que, sem o documento ou coisa, pode ocorrer de não
haver condições mínimas para se saber sequer a informação
essencial para o exercício de uma pretensão. Tratava-se,
outrossim, de forma de dar máximo aproveitamento para o que,
para o Código de Processo Civil de 1973, era (mais um)
procedimento cautelar específico, previsto nos seus arts. 844 e
845, não por acaso intitulado "exibição".
[...]
Sobre a abolição — sempre compreendida no sentido de
desformalização — da dicotomia constante do CPC de 1973,
entre a exibição como meio de prova e a exibição como
"cautelar preparatória (arts. 844 e 845 do CPC de 1973), surge
uma questão importante. O que fazer nos casos em que a
exibição de documentos ou coisa precisar anteceder o início
do processo?
Há três respostas possíveis.
A primeira se inclina à utilização dos procedimentos da tutela
provisória antecedente constantes dos arts. 303 e 304 ou 305 a
310, cuja escolha deverá levara em conta o maior ou o menor viés
satisfativo do pedido a ser apresentado pelo autor, respectivamente.
A segunda é no sentido de o interessado lançar mão do
procedimento relativo à "produção antecipada de prova", [...]
justificando sua necessidade, inclusive com base em urgência, nos
muito bem desenhados incisos do art. 381. A terceira entende que a parte deve se valer do procedimento
reservado pelos arts. 397 a 400 ou 401 e 402 para a exibição
pretendida contra a parte e em face do terceiro,
respectivamente, sendo indiferente que se trate de pedido
que anteceda o processo.
Dentre as alternativas, a terceira é preferível pela
especificidade da hipótese. Afinal, são aqueles artigos — e não
os relativos à tutela provisória e à produção antecipada de
provas — que conseguirão atender ao desiderato do
interessado.
A única adaptação que se faz necessária reside no caput do art. 398.
Mais do que a intimação lá prevista, a parte contrária deverá ser
citada, a exemplo, aliás, do que, para o terceiro, exige (e
pertinentemente) o art. 401, tanto quanto os arts. 303, § 1º, II, e 306,
quando trata da tutela provisória antecedente, sendo indiferente para
os fins da exposição que seu viés seja (predominantemente)
satisfativo ou acautelatório.
Para os casos em que ficar demonstrado, concretamente, que o
tempo necessário ao prévio contraditório (citação) tem o condão de
macular a pretensão relativa à exibição, o arsenal da "tutela
provisória" será suficientemente amplo para os devidos fins, inclusive
com relação à necessária postergação do contraditório. (Bueno,
Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil:
Vol. 2. Procedimento Comum, Processos nos Tribunais e Recursos. 8ª
Edição. São Paulo: Saraiva. 2019. p. 248-249) - sem grifo no original.
Assim, nas situações em que a parte postulante possuir o direito material de
obter a exibição de documento ou coisa, em razão de lei ou de contrato, cuja prestação da
parte adversa consiste em obrigação de fazer, afigura-se possível o ajuizamento de ação
autônoma de exibição de documentos, sob o rito comum, nos termos do art. 318 novo do
Código de Processo Civil, aplicando-se, no que couber, pela especificidade, o disposto nos
arts. 401 e seguintes, que se reportam à exibição de documentos ou coisa incidentalmente
(em poder de terceiro).
Em comentário ao art. 396 do CPC/2015 — que trata da exibição incidental
de documento ou coisa —, José Miguel Garcia Medina também reafirma a possibilidade de
ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito comum, com
ênfase na pretensão fundada em direito material à exibição da parte, exercitada contra
quem possui o dever, legal ou contratual, de apresentar o documento ou a coisa
(obrigação de fazer), nos seguintes termos:
I. Exibição forçada do documento. A prova documental, como regra, é
produzida espontaneamente pela parte [...]. Pode suceder, no
entanto, que seja necessário obter documento que se encontra com a
outra parte ou com terceiro. Neste caso, pode a parte se valor do
procedimento referido nos arts. 396 ss. do CPC/2015. II. Exibição incidental ou em ação autônoma. A exibição será
incidental quando tiver por fim propiciar a produção de provas
em processo já em curso. No caso, a exibição pode ser pedido
por uma das partes do processo contra a outra, bem como
contra terceiros. Poderá, também, ser determinada ex officio, nos termos do art. 370 do CPC/2015.
[...]
Mas a exibição de documentos ou coisa também pode ser
pedida em ação autônoma (ação exibitória) voltada
exclusivamente à exibição de documento ou da coisa, ajuizada
por uma parte contra a outra, muitas vezes antes da ação em
que se discutirá o fato objeto de prova, mas, também, com o
intuito de apenas ver a coisa ou o documento exibidos, com o
intuito de satisfazer direito material à exibição, constante de lei
ou de contrato (aplica-se ao caso o disposto nos arts. 497 do
CPC/2015, já que exibir é fazer) (Medina, José Miguel Garcia. Novo
Código de Processo Civil Comentado: com remissões e notas
comparativas ao CPC/1973. 4ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais. 2016. p. 691-692)
Na mesma linha de entendimento, reproduz-se a compreensão de Arruda
Alvim:
Embora não haja previsão expressa, no CPC/2015, de ação
autônoma de exibição de documento ou coisa, nada obsta a
que referida exibição seja requerida autonomamente, por meio
de tutela provisória antecipada que, quando já pendente o
processo principal, dizendo-se, então, que é incidente, ou
antes do processo principal. Por igual, é possível que seja
requerida em sede de produção antecipada de provas.
A exibição antecedente ao processo principal não deve ser
considerada necessariamente como preventiva e, ainda, num
sentido rigoroso, sequer preparatória. É perfeitamente
possível que a exibição satisfaça plenamente o requerente e
que até mesmo desaconselhe qualquer providência ulterior. Se
a finalidade da exibição está relacionada com a possível
finalidade da prova, ou com o relacionamento do documento ou
da coisa com os fatos probandos (v., nesse sentido, o art. 397,
II, aplicável, por analogia, à ação autônoma), segue-se que esta
medida se pode exaurir em si mesma. Ademais, havemos de ter
presente que, nos casos de produção antecipada de prova sem o
requisito da urgência, sequer é necessária a indicação da demanda
que se pretende ajuizar (v. art. 381, incs. II e III, do CPC/2015, bem
como o que foi dito sobre a produção antecipada de provas). Isso,
porque a razão de ser da medida antecipada é, dentre outras,
viabilizar uma possível conciliação (art. 381, II) ou mesmo evitar o
ajuizamento da ação (381, III).
Conquanto a ratio essendi da exibição seja indiscutivelmente de
ordem pública, há, também, que se compatibilizar o direito à exibição
com o direito exercitado contra quem se exiba o documento, de não
ser este último, em todos os casos, inexoravelmente constrangido a produzir prova contra si (v. 25.4.18, infra, sobre os limites da ação de
exibição de documento ou coisa) (Alvim, Arruda. Manual de Direito
Processual Civil: Teoria Geral do Processo, Processo de
Conhecimento, Recursos, Precedentes. 18ª Edição. São Paulo:
Thomson Reuters Brasil. 2019. p. 979-980)
Na hipótese dos autos, a exordial é suficientemente clara quanto à pretensão
posta, satisfativa em si, para que a instituição financeira, com quem o demandante
estabeleceu contrato de abertura de conta-corrente, exiba o contrato e o extrato dos
últimos 5 (cinco) anos referente à aludida conta, a fim de avaliar se houve ou não a
cobrança de encargos indevidos, e, num juízo de conveniência, promover ou não futura
ação ressarcitória, ressaltando que não obteve êxito na apresentação da referida
documentação pela via administrativa.
Como anotado, a jurisprudência desta Corte de Justiça, sob a égide do
CPC/1973, reconhecia, em tal situação, a existência de interesse de agir do correntista,
afigurando-se a ação de exibição de documentos, de natureza unicamente satisfativa (em
que pese sob a rubrica de medida cautelar), a via processual adequada para esse fim,
conforme dão conta os seguintes precedentes:
RECURSO ESPECIAL. MEDIDA CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE
EXTRATOS DE CADERNETA DE POUPANÇA. NATUREZA
SATISFATIVA. "FUMUS BONI IURIS" E "PERICULUM IN MORA".
DEMONSTRAÇÃO. DESNECESSIDADE.
1. Natureza satisfativa da medida cautelar de exibição de documentos.
2. Desnecessidade de demonstração do "fumus boni iuris" e do
"periculum in mora", bastando a afirmação pela parte requerente do
direito de obter a exibição, o que, no caso, decorre do caráter comum
dos documentos, nos termos do art. 844, II, do CPC.
3. Doutrina e jurisprudência do STJ em casos similares.
4. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(REsp 1197056/ES, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO,
TERCEIRA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 28/06/2013)
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
PROCESSO CIVIL.
EXIBIÇÃO DE EXTRATOS BANCÁRIOS. INTERESSE DE AGIR.
PEDIDO PRÉVIO À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E PAGAMENTO DO
CUSTO DO SERVIÇO. NECESSIDADE.
REQUERIMENTO VÁLIDO. AUSÊNCIA. REEXAME. SÚMULA N. 7/STJ.
NÃO PROVIMENTO.
1. "A propositura de ação cautelar de exibição de documentos
bancários (cópias e segunda via de documentos) é cabível como
medida preparatória a fim de instruir a ação principal, bastando a
demonstração da existência de relação jurídica entre as partes, a
comprovação de prévio pedido à instituição financeira não atendido
em prazo razoável, e o pagamento do custo do serviço conforme previsão contratual e normatização da autoridade monetária." (REsp
1.349.453/MS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção,
julgado em 10/12/2014, DJe 2/2/2015) 2. Concluindo o Tribunal de
origem que o requerimento apresentado não estava acompanhado de
procuração do titular do interesse, de modo que não houve pedido
administrativo válido, a questão é imune ao crivo do recurso especial,
haja vista as disposições do enunciado n. 7 da Súmula desta Corte.
3. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 1020471/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI,
QUARTA TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 27/10/2017)
De acordo com a fundamentação acima exposta, o advento do Código de
Processo Civil de 2015 não altera a compreensão de se afigurar possível o ajuizamento de
ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito comum, nos termos do art. 318 do
CPC/2015, aplicando-se, no que couber, pela especificidade, o disposto nos arts. 396 e
seguintes, que se reportam à exibição de documentos ou coisa incidentalmente.
Esse entendimento, como assinalado, reconhece a coexistência harmônica
entre a ação autônoma de exibição de documentos pelo rito comum e os "novos" institutos
processuais afetos à "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes) e à "exibição
incidental de documentos e coisa" (arts 496 e seguintes), consideradas as particularidades
de cada qual.
É de se reconhecer, assim, que a ação de exibição de documentos
subjacente, promovida pelo rito comum, denota, por parte do demandante, a existência de
interesse de agir, inclusive sob a vertente adequação e utilidade da via eleita.
Registre-se, por fim, que o cabimento da ação de exibição de documentos
não impede, em si, o ajuizamento de ação de produção de antecipação de provas.
Em arremate, a partir dos fundamentos acima delineados, dou provimento
ao recurso especial para reconhecer a adequação da via eleita pela parte demandante,
determinando-se, pois, o retorno dos autos à origem, para o prosseguimento do feito, na
esteira do devido processo legal.
É o voto.
VOTO-VISTA
O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO:
Eminentes colegas. Pedi vista dos autos na sessão de 13/08/2019 para
apreciar com mais cuidado a controvérsia acerca do cabimento de ação
autônoma de exibição na vigência do CPC/2015, pois essa delicada questão
processual também foi suscitada, como preliminar, num dos representativos do
Tema 1000/STJ, de minha relatoria, relativo ao cabimento de astreintes na
exibição de documentos.
Relembre-se que o caso subjacente ao presente recurso diz respeito a um
pedido de exibição do contrato de abertura da Conta Corrente n. 7.594-9, Ag.
5390-2, do banco ora recorrido, bem como dos extratos bancários dos cinco
anos anteriores ao ajuizamento da ação.
O juízo e o Tribunal de origem entenderam que seria descabido o
ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos na vigência do
CPC/2015, e, ante a inércia do autor da demanda em emendar a petição inicial
para formular pedido de produção antecipada de provas, julgaram extinto o
processo sem resolução do mérito, dando ensejo ao presente recurso especial.
Na sessão de 13/08/2019, o relator, Min. MARCO AURÉLIO
BELLIZZE, proferiu voto no sentido de dar provimento ao recurso especial
para determinar o prosseguimento do feito como ação autônoma na origem.
Feito esse breve relato dos autos, peço as mais respeitosas vênias ao
eminente relator para abrir divergência, negando provimento ao recurso especial, pelos fundamentos que passo a declinar.
No CPC/2015, o procedimento da exibição de documentos encontra-se
disciplinado nos arts. 396 a 404 do CPC/2015, quando requerida de modo
incidental, sendo pertinente a transcrição do enunciado normativo dos arts. 400
e 403, abaixo transcritos, litteris:
Art. 400. Ao decidir o pedido, o juiz admitirá como verdadeiros os fatos
que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar se:
I - o requerido não efetuar a exibição nem fizer nenhuma declaração no
prazo do art. 398 ;
II - a recusa for havida por ilegítima.
Parágrafo único. Sendo necessário, o juiz pode adotar medidas
indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para que o
documento seja exibido.
........................................................ Art. 403. Se o terceiro, sem justo motivo, se recusar a efetuar a
exibição, o juiz ordenar-lhe-á que proceda ao respectivo depósito em
cartório ou em outro lugar designado, no prazo de 5 (cinco) dias,
impondo ao requerente que o ressarça pelas despesas que tiver.
Parágrafo único. Se o terceiro descumprir a ordem, o juiz expedirá
mandado de apreensão, requisitando, se necessário, força policial, sem
prejuízo da responsabilidade por crime de desobediência, pagamento de
multa e outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou
sub-rogatórias necessárias para assegurar a efetivação da decisão. (sem
grifos no original)
A exibição também pode ser requerida como produção antecipada de
provas, segundo o procedimento descrito nos arts. 381 e 382 do CPC/2015,
abaixo transcritos:
Art. 381. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em
que:
I - haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito
difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação;
II - a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a
autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito;
III - o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o
ajuizamento de ação.
§ 1º O arrolamento de bens observará o disposto nesta Seção quando tiver por finalidade apenas a realização de documentação e não a
prática de atos de apreensão.
§ 2º A produção antecipada da prova é da competência do juízo do foro
onde esta deva ser produzida ou do foro de domicílio do réu.
§ 3º A produção antecipada da prova não previne a competência do
juízo para a ação que venha a ser proposta.
§ 4º O juízo estadual tem competência para produção antecipada de
prova requerida em face da União, de entidade autárquica ou de
empresa pública federal se, na localidade, não houver vara federal.
§ 5º Aplica-se o disposto nesta Seção àquele que pretender justificar a
existência de algum fato ou relação jurídica para simples documento e
sem caráter contencioso, que exporá, em petição circunstanciada, a sua
intenção.
Art. 382. Na petição, o requerente apresentará as razões que justificam
a necessidade de antecipação da prova e mencionará com precisão os
fatos sobre os quais a prova há de recair.
§ 1º O juiz determinará, de ofício ou a requerimento da parte, a citação
de interessados na produção da prova ou no fato a ser provado, salvo
se inexistente caráter contencioso.
§ 2º O juiz não se pronunciará sobre a ocorrência ou a inocorrência do
fato, nem sobre as respectivas consequências jurídicas.
§ 3º Os interessados poderão requerer a produção de qualquer prova no
mesmo procedimento, desde que relacionada ao mesmo fato, salvo se a
sua produção conjunta acarretar excessiva demora.
§ 4º Neste procedimento, não se admitirá defesa ou recurso, salvo
contra decisão que indeferir totalmente a produção da prova pleiteada
pelo requerente originário.
A exibição como ação autônoma, fundada no direito material à exibição,
por sua vez, não foi prevista no CPC/2015, estando revogada a ação cautelar
de exibição de documentos regulada CPC/1973 (art. 844).
Esse silêncio eloquente do CPC/2015 acerca da ação autônoma de
exibição tem suscitado controvérsia na doutrina.
O eminente relator, na linha do entendimento de CASSIO
SCARPINELLA BUENO e JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA, votou no
sentido de se admitir a ação autônoma de exibição "nas situações em que a
parte postulante possuir o direito material de obter a exibição de documento ou coisa, em razão de lei ou de contrato".
Embora seja bastante pertinente essa distinção entre o direito à exibição
como direito material e como direito probatório autônomo, entendo não ser
suficiente para justificar a possibilidade de ajuizamento de uma ação autônoma
de exibição pelo procedimento comum, fundada no direito material à exibição,
pois tal pretensão pode ser alcançada pelo procedimento da ação probatória
autônoma do art. 381.
Nesse sentido, manifestou-se o Tribunal de origem, com base em
entendimento consignado na obra da autoria coletiva de TERESA A. A.
WAMBIER, MARIA L. L. CONCEIÇÃO, LEONARDO F. DA S. RIBEIRO
E ROGÉRIO L. T. DE MELLO, como também na obra de CRISTIANO
IMHOF.
Confira-se, a propósito, a seguinte passagem do acórdão recorrido:
Na vigência do Código passado, a Ação Cautelar de Exibição de
Documento de ocupava de trazer aos autos o documento almejado,
sendo regulada no capítulo de procedimentos especiais. Contudo, com a
modificação trazida pela legislação atual, a previsão do procedimento
especial se extinguiu, tendo como mesmo destino a interpretação sobre
o assunto.
Atualmente, a Ação de Antecipação de Provas, a priori, é a que melhor
coaduna para substituir a antiga Ação de Exibição de Documentos, por
se tratar de ação autônoma e cujo objeto é colher provas
antecipadamente, isto é, beneficiar as partes acerca de qualquer meio
de prova, justificada pela urgência da colheita de provas; para ensejar
a autocomposição; ou tão somente para reconhecimento prévio dos
fatos (art. 381, incisos I a III do CPC).
Já a Exibição de Documentos possui sua existência pautada na
determinação de obrigar a parte adversa a juntar aos autos
determinado documento, observando os requisitos do art. 397 do CPC.
Assim, sua natureza cautelar foi extinta e posta como meio incidental,
retirando a característica autônoma que possuía.
A respeito da matéria, Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins
Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Liscastro Torres de Mello lecionam:
"(...) Para a exibição de documento ou coisa que se encontre na
posse da parte contrária, o procedimento previsto é o incidente de
exibição de documento que coisa regulado nos arts. 396 a 400 do
NCPC, que terá lugar se já houver uma ação em andamento. Caso
não haja, a parte poderá lançar mão de ação probatória
autônoma, com fundamento no art. 381 do NCPC (...)"
(Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil artigo
por artigo, 2ª ed., ed. Revista dos Tribunais, 2015, p. 756).
E, também, Cristiano Imhof:
"O objetivo do processo, efetivamente, não é a produção da prova,
mas sim a solução do conflito. Todavia, em determinados casos, a
prova traduz a meta primordial do processo, vez que o conflito
estabelece-se em torno dela mesma, hipótese em que ocorrem as
denominadas "ações probatórias". Nessas ações, reconhece-se que
as partes têm direito a produzir a prova antecipadamente e sem
necessariamente depender de um processo posterior. Mas, em casos
de processos que sejam subsequentes à ação probatória, a
finalidade da produção antecipada de prova, como o próprio nome
já indica, é a de produzir determinada prova antes do momento
processual em que ordinariamente seria produzida, em razão de
alguma circunstância que leve a crer que não será possível
aguardar a sua realização no curso do processo." (Novo código de
processo civil comentado. 2ª ed. Ed. São Paulo: BookLaw, 2016.
P. 607).
Nota-se que a disposição da exibição de documento na legislação
anterior tinha duas acepções: era disciplinada como procedimento
especial - preparatória - e como incidente no Capítulo das Provas.
Enquanto, atualmente, é disciplinado somente como incidente nos arts.
396 e ss., da Seção VI, Capítulo VI - Das Provas.
Pela interpretação histórico-sistemática, percebe-se que o legislador
optou por retirar da Ação de Exibição de Documentos o caráter
preparatório e amplificar as hipóteses de cabimento da ação de
produção antecipada de provas, restando à parte a opção de ajuizar
esta última somente com o intuito de analisar os documentos almejados
Para o referido caso, o mais adequado, portanto, seria a ação de
produção antecipada de provas (com fundamento nos incisos II ou III
do art. 381 do CPC), em razão da exibição de documentos se tratar
agora de pedido incidental, deixando de apresentar o caráter autônomo
que possuía na legislação anterior. (fls. 127/9)
No caso dos autos, a parte demandante foi intimada a emendar a petição
inicial a fim de adequar o pedido ao rito da ação probatória autônoma do art.
381 do CPC/2015 (fl. 40), mas preferiu insistir no processamento do pedido
exibitório pelo procedimento comum, levando o juízo de origem a indeferir a
inicial, em decisão mantida pelo Tribunal a quo, com base nos fundamentos
acima transcritos, aos quais este relator manifesta adesão no presente voto.
Sob outra ótica, relembre-se que a ação cautelar de exibição, regulada no
CPC/1973, como demanda de massa, passou a ser usada de forma abusiva,
mediante o ajuizamento de lides artificialmente forjadas, com o objetivo único
de gerar honorários advocatícios em duplicidade ao advogado da parte
demandante, ou seja, honorários na ação de exibição e honorários na demanda
principal.
Talvez seja essa a explicação para o silêncio eloquente do legislador no
CPC de 2015 em não regular a exibição de documentos como ação autônoma.
Veio efetivamente em boa hora, portanto, a mudança implementada pelo
novo Código de Processo Civil, estatuindo um procedimento autônomo, não
litigioso, de produção probatória (arts. 381/3)
À luz desses fundamentos, renovando as vênias ao eminente relator,
entendo que não merece reforma o acórdão recorrido.
Ante o exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao
recurso especial.
Deixo de majorar os honorários advocatícios por não terem sido
arbitrados na origem (fl. 41).
É o voto.