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8 de agosto de 2021

Optando o adquirente pela resolução antecipada de contrato de compra e venda por atraso na obra, eventual valorização do imóvel não enseja indenização por perdas e danos

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/07/info-699-stj.pdf


PRÁTICAS COMERCIAIS (COMPRA DE IMÓVEIS) - Optando o adquirente pela resolução antecipada de contrato de compra e venda por atraso na obra, eventual valorização do imóvel não enseja indenização por perdas e danos 

De acordo com o art. 43, II, da Lei nº 4.591/64, o incorporador deve responder civilmente pela execução da incorporação, devendo indenizar os adquirentes dos prejuízos que a estes advierem do fato de não se concluir a edificação ou de se retardar injustificadamente a conclusão das obras. Eventual valorização do imóvel não se enquadra no conceito de perdas e danos. Não representa uma diminuição do patrimônio do adquirente, nem significa a perda de um ganho que se devesse legitimamente esperar. O suposto incremento do valor venal do imóvel não decorre, de forma direta e imediata, da inexecução do contrato, mas de fatores extrínsecos, de ordem eminentemente econômica. A frustração da expectativa de lucro pela suposta valorização não decorre de ato compulsório imposto pelo vendedor, mas da opção pela resolução antecipada do contrato livremente exercida pelo adquirente. Em outras palavras, o comprador deixou de experimentar esse lucro da valorização do imóvel porque escolheu o desfazimento do contrato. STJ. 3ª Turma. REsp 1.750.585-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 01/06/2021 (Info 699). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Em 2008, João celebrou contrato de promessa de compra e venda de um apartamento com uma incorporadora imobiliária. A cláusula quinta do pacto previa que a incorporadora entregaria o apartamento em setembro de 2010. No entanto, em abril de 2010, a incorporadora apresentou novo cronograma, fixando o mês de novembro de 2011 como novo termo final da obra. Diante disso, João, ainda em 2010, ajuizou ação de resolução contratual cumulada com restituição de quantia paga e indenização por lucros cessantes em virtude de atraso na entrega de imóvel. Em outras palavras, o promitente-comprador, em razão do enorme atraso, pediu o desfazimento do contrato, a devolução de todos os valores pagos e a condenação da incorporadora a pagar lucros cessantes. 

O juízo julgou os pedidos parcialmente procedentes, condenando a incorporadora a: 

• rescindir o contrato firmado entre as partes; 

• determinar a restituição dos valores até então pagos pelo adquirente; 

• pagar indenização ao autor por lucros cessantes correspondentes ao preço de mercado do aluguel da unidade compromissada durante o período em que o apartamento deveria ter sido entregue até a data da rescisão contratual. 

Ainda inconformado, João recorreu pedindo que a incorporadora também fosse condenada a pagar, a título de dano material, a quantia referente à valorização do imóvel no período compreendido entre a data da assinatura do contrato e a data prometida para a efetiva entrega do imóvel. Explicando melhor: o autor/recorrente afirmou que no momento em que comprou o imóvel o seu preço de mercado era R$ 500 mil. Ocorre que houve uma valorização do bairro e, em razão disso, no momento previsto para a entrega do apartamento, um imóvel similar na região já estava custando R$ 700 mil. Logo, ele queria receber esses R$ 200 mil relacionados com a valorização do bem, argumentando que deixou de ter esse ganho que receberia caso o imóvel tivesse sido entregue. João fundamentou seu pedido no art. 43 da Lei nº 4.591/64 (Lei de Incorporação) e no art. 475 do Código Civil, que preveem: 

Art. 43. Quando o incorporador contratar a entrega da unidade a prazo e preços certos, determinados ou determináveis, mesmo quando pessoa física, ser-lhe-ão impostas as seguintes normas: (...) II - responder civilmente pela execução da incorporação, devendo indenizar os adquirentes ou compromissários, dos prejuízos que a estes advierem do fato de não se concluir a edificação ou de se retardar injustificadamente a conclusão das obras, cabendo-lhe ação regressiva contra o construtor, se for o caso e se a este couber a culpa; 

Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. 

A questão chegou até o STJ. O pedido do autor/recorrente foi acolhido pelo Tribunal? 

NÃO. Para o STJ, a valorização do imóvel: 

- não tem relação direta com o inadimplemento do contrato pela incorporadora; e 

- não se enquadra no conceito de perdas e danos, já que não representa uma diminuição do patrimônio do adquirente, nem significa a perda de um ganho que se devesse, legitimamente, esperar. 

Valorização do imóvel não tem relação com o inadimplemento 

A valorização do imóvel não tem relação direta com o inadimplemento do contrato pela incorporadora imobiliária. Isso porque a valorização do imóvel é um fenômeno meramente econômico, não podendo ser identificada como fruto, produto do bem. Decorre da própria existência do imóvel no decorrer do tempo, conjugada a outros fatores, como sua localização, estado de conservação etc. (STJ. 3ª Turma. REsp nº 1.349.788/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/8/2014). Assim, não há relação de causalidade entre o prejuízo alegado (valorização do imóvel) e o comportamento da incorporadora (atraso na entrega das unidades imobiliárias), considerando que a valorização do bem é um evento de natureza secundária e meramente condicionante, incapaz de produzir o liame necessário à indução do dever de indenizar. 

Valorização do imóvel não se enquadra no conceito de perdas e danos 

No caso concreto, diante do atraso na obra, o comprador poderia ter optado por aguardar a sua conclusão. Nessa hipótese, ele teria direito ao recebimento de aluguéis durante todo o período, e, ao final, ficaria com o bem, incorporando ao seu patrimônio o eventual incremento do valor venal do imóvel. Veja o que diz a atual redação do § 2º do art. 43-A da Lei nº 4.591/64: 

Art. 43-A (...) § 2º Na hipótese de a entrega do imóvel estender-se por prazo superior àquele previsto no caput deste artigo, e não se tratar de resolução do contrato, será devida ao adquirente adimplente, por ocasião da entrega da unidade, indenização de 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso, pro rata die, corrigido monetariamente conforme índice estipulado em contrato. (Incluído pela Lei nº 13.786/2018) 

Ocorre que o comprador escolheu o desfazimento do negócio. Diante disso, presume-se que ele preferiu receber, desde logo, a integralidade dos valores pagos, devidamente atualizados, não tendo querido arriscar e aguardar uma eventual e incerta valorização futura do imóvel, pronto e acabado. Logo, como fez essa opção, a incorporadora não tem o dever de indenizar a valorização do bem. Confira o que estabelece a atual redação do § 1º do art. 43-A da Lei nº 4.591/64: 

Art. 43-A (...) § 1º Se a entrega do imóvel ultrapassar o prazo estabelecido no caput deste artigo, desde que o adquirente não tenha dado causa ao atraso, poderá ser promovida por este a resolução do contrato, sem prejuízo da devolução da integralidade de todos os valores pagos e da multa estabelecida, em até 60 (sessenta) dias corridos contados da resolução, corrigidos nos termos do § 8º do art. 67-A desta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.786/2018) 

Em suma: Eventual valorização do imóvel não se enquadra no conceito de perdas e danos. Não representa uma diminuição do patrimônio do adquirente, nem significa a perda de um ganho que se devesse legitimamente esperar. STJ. 3ª Turma. REsp 1.750.585-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 01/06/2021 (Info 699).