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17 de novembro de 2021

É possível a inclusão de parcelas vincendas na execução de título extrajudicial de contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, desde que homogêneas, contínuas e da mesma natureza.

Processo

REsp 1.835.998-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 26/10/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Condomínio. Execução de título extrajudicial. Contribuições ordinárias ou extraordinárias. Inclusão de prestações vincendas no débito exequendo. Prestações homogêneas, contínuas e da mesma natureza. Possibilidade.

 

DESTAQUE

É possível a inclusão de parcelas vincendas na execução de título extrajudicial de contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, desde que homogêneas, contínuas e da mesma natureza.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Após o advento do CPC/2015, o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício - previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas - passou a ser expressamente considerado como título executivo extrajudicial, nos termos do art. 784, inciso X.

Nesses termos, com a comprovação dos requisitos do título executivo extrajudicial, mostra-se possível a inclusão, na execução, das parcelas vincendas no débito exequendo, até o cumprimento integral da obrigação do curso do processo, diante da exegese do art. 323 do CPC/2015, aplicável subsidiariamente ao processo de execução, conforme arts. 318 e 771, parágrafo único, do CPC/2015.

Somado a isso, estabelece o art. 780 do CPC/2015 que o exequente poderá "cumular várias execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, quando o executado for o mesmo e desde que para todas elas seja competente o mesmo juízo e idêntico o procedimento".

Em verdade, tal posicionamento imprime concretude aos princípios da efetividade e da economia processual, evitando o ajuizamento de novas execuções com base em uma mesma relação jurídica obrigacional.

No entanto, apenas as prestações homogêneas, contínuas e da mesma natureza comportam essa inclusão automática na execução.

Assim, em havendo modificação da natureza da prestação ou da sua homogeneidade, bem como de eventual ampliação do ato constritivo dela decorrente, deverá ser oportunizado ao devedor o direito de se defender, por meio de embargos, em relação a esse acréscimo e limitado ao referido conteúdo.


3 de maio de 2021

EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DO IMÓVEL GERADOR DOS DÉBITOS CONDOMINIAIS NO BOJO DE AÇÃO DE COBRANÇA NA QUAL A PROPRIETÁRIA DO BEM NÃO FIGUROU COMO PARTE. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PROPTER REM.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.829.663 - SP (2016/0174058-5) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DO IMÓVEL GERADOR DOS DÉBITOS CONDOMINIAIS NO BOJO DE AÇÃO DE COBRANÇA NA QUAL A PROPRIETÁRIA DO BEM NÃO FIGUROU COMO PARTE. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. 

1. Embargos de terceiro opostos pela proprietária do imóvel, por meio dos quais se insurge contra a penhora do bem, realizada nos autos de ação de cobrança de cotas condominiais, já em fase de cumprimento de sentença, ajuizada em face da locatária. 

2. Ação ajuizada em 22/03/2011. Recurso especial concluso ao gabinete em 30/06/2016. Julgamento: CPC/73. 

3. O propósito recursal é definir se a proprietária do imóvel gerador dos débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado no bojo de ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo, uma vez que ajuizada, em verdade, em face da então locatária do imóvel. 

4. Em se tratando a dívida de condomínio de obrigação propter rem e partindo-se da premissa de que o próprio imóvel gerador das despesas constitui garantia ao pagamento da dívida, o proprietário do imóvel pode ter seu bem penhorado no bojo de ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo. 

5. A solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para a realização do direito material. Afinal, se o débito condominial possui caráter ambulatório, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, o proprietário possa figurar no polo passivo do cumprimento de sentença. 

6. Em regra, deve prevalecer o interesse da coletividade dos condôminos, permitindo-se que o condomínio receba as despesas indispensáveis e inadiáveis à manutenção da coisa comum. 

7. Recurso especial conhecido e provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 05 de novembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI: Cuida-se de recurso especial interposto por CONDOMINIO DO EDIFICIO MOGI CENTER HOTEL, fundamentado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo TJ/SP. 

Recurso especial interposto em: 20/03/2015. Concluso ao Gabinete em: 30/06/2016. 

Ação: de embargos de terceiro, opostos por VALERIA GONCALVES DA CRUZ MONTEIRO (proprietária do imóvel), em desfavor do recorrente, por meio dos quais se insurge contra a penhora de imóvel de sua propriedade, realizada nos autos de ação de cobrança de cotas condominiais, já em fase de cumprimento de sentença, ajuizada em face da locatária (e-STJ fls. 1-7). 

Sentença: julgou improcedente o pedido (e-STJ fls. 99-102). 

Acórdão: deu provimento à apelação interposta pela recorrida, nos termos da seguinte ementa: 

Despesas de condomínio. Ação de cobrança em fase de cumprimento de sentença. Penhora dos imóveis geradores do débito condominial. Impossibilidade ante o limite subjetivo da coisa julgada. Ação que foi ajuizada em face da locatária dos imóveis. Proprietária que não participou da fase de conhecimento. Ausência de título executivo contra ela. Sentença reformada. Recurso provido (e-STJ fl. 155). 

Embargos de declaração: opostos pelo recorrente, foram rejeitados (e-STJ fls. 168-173). 

Recurso especial: alega violação dos arts. 1.336, I, do CC/02; e 4º da Lei 4.591/64, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta que: 

a) ante a característica propter rem da obrigação condominial, cada unidade imobiliária responde pelas despesas condominiais, independentemente de quem as originou ou da própria vontade do proprietário; 

b) em nenhum momento a execução foi direcionada a pessoa alheia à relação jurídica, tendo a recorrida sido intimada da penhora do imóvel de sua propriedade; e 

c) esgotados todos os meios para recebimento dos débitos condominiais e impedida a penhora da unidade condominial, ficam o condomínio e os demais condôminos claramente prejudicados, uma vez que os encargos serão entre eles rateados, enquanto a devedora continuará usufruindo de todos os serviços (e-STJ fls. 176-224). 

Prévio juízo de admissibilidade: o TJ/SP inadmitiu o recurso especial interposto pelo CONDOMINIO DO EDIFICIO MOGI CENTER HOTEL (e-STJ fls. 245-246), ensejando a interposição de agravo em recurso especial (e-STJ fls. 249-260), que foi provido e reautuado como recurso especial para melhor exame da matéria (e-STJ fl. 289). 

É o relatório. 

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (RELATOR): O propósito recursal é definir se a proprietária do imóvel gerador dos débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado no bojo de ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo, uma vez que ajuizada, em verdade, em face da então locatária do imóvel. 

Aplicação do Código de Processo Civil de 1973 – Enunciado Administrativo n. 2/STJ. 

1. DA NATUREZA JURÍDICA DA OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DAS DESPESAS CONDOMINIAIS 

Segundo o reiterado entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, respaldado em abalizada doutrina, a obrigação de pagamento das despesas condominiais é de natureza propter rem, ou seja, é obrigação “própria da coisa”, ou, melhor ainda, assumida “por causa da coisa”. 

Outrora, muito se discutiu se as obrigações ditas propter rem estariam contidas no universo dos direitos reais, ou se, por outro lado, seriam afetas ao universo dos direitos obrigacionais. Referida diferenciação, ao fim e ao cabo, restou suplantada pela constatação de que “a obrigação propter rem se encontra no terreno fronteiriço entre os direitos reais e os pessoais” (RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, Parte Geral: das Obrigações, 9ª ed., Saraiva, vol. II, p. 108); que se formam numa situação de imbricação entre os direitos reais e obrigacionais, assimilando características de ambos (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direitos reais, 14ª ed., JusPodivm, 2018, p. 56). 

SERPA LOPES, se aprofundando no estudo dessa espécie de obrigação, concluiu que ela se caracteriza por decorrer da titularidade de um direito real, impondo a satisfação de determinada prestação relativa à coisa. Assim, as obrigações propter rem “recaem sobre uma pessoa por força de um determinado direito real, com o qual se encontram numa vinculação tão estreita, que o seguem a título de acessórios, inseparáveis” (Curso de Direito Civil, Obrigações em Geral, 2ª ed, Freitas Bastos, vol. II, p. 66). 

Em outros termos, caracteriza-se a obrigação propter rem pela particularidade de a pessoa do devedor se individualizar única e exclusivamente pela titularidade do direito real, desvinculada de qualquer manifestação da vontade do sujeito. 

Por isso é que, em havendo transferência da titularidade, a obrigação é igualmente transmitida. 

Diz-se, então, que a obrigação propter rem é dotada de ambulatoriedade, ou, ainda, que se trata, ela mesma, de obrigação ambulatória. Assim, independentemente da vontade dos envolvidos, a obrigação de satisfazer determinadas prestações acompanha a coisa em todas as suas mutações subjetivas. 

Essa característica inerente às obrigações propter rem é bem pontuada por Antônio Junqueira de AZEVEDO, segundo o qual, “justamente no fato de que, nelas, o devedor somente é determinado pela sua condição de titular da propriedade; mudando a coisa de dono, muda a obrigação de devedor. Por isso, também se chamam obrigações ambulatórias; ambulant cum domino ou, como seria possível dizer, ambulant cum dominio” (Restrições Convencionais de Loteamento – Obrigações propter rem e suas Condições de Persistência. Revista dos Tribunais, nº 741, 1997, p. 116). 

Na mesma linha, é o entendimento majoritário da doutrina: 

“Não será preciso lembrar que existem obrigações que não resultam de uma avença entre pessoas, podendo o vínculo decorrer do fato de ser alguém titular de direito real. O titular desse direito real pode mudar, mas a obrigação acompanha a coisa. A titularidade do direito real define o sujeito passivo da obrigação. Por força dessa razão, esse tipo de obrigação se denomina ambulatória, propter rem, ou também obrigação real”. (LIRA, Ricardo Pereira. Elementos de direito urbanístico. Rio de janeiro: Renovar, 1997, p.189) 

“Desta maneira, conclui-se que, pelo fato da obrigação propter rem decorrer da titularidade de um direito real, é aquela dotada de sequela ou ambulatoriedade, isto é, o adimplemento de tal obrigação acompanha o bem aonde quer que ele se encontre, sendo sempre exigível em face do atual titular do direito de propriedade”. (CARVALHO, Fabrício. Direito das obrigações. Niterói: Impetus, 2010, p. 14) 

“Em regra, os direitos reais não criam obrigações positivas para terceiros, tão somente um dever genérico negativo, consistente na abstenção da prática de atos que possam cercear a substância do direito alheio. Por outro lado, as obrigações normalmente surgem de um negócio jurídico unilateral ou bilateral, cujo fundamento é a manifestação de vontade. Excepcionalmente, a mera titularidade de um direito real importará a assunção de obrigações desvinculadas de qualquer manifestação de vontade do sujeito. A obrigação propter rem está vinculada à titularidade do bem, sendo essa a razão pela qual será satisfeita determinada prestação positiva ou negativa, impondo-se a sua assunção a todos os que sucedam ao titular na posição transmitida” (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direitos reais, 14ª ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2018, p. 56-57). 

2. DA RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DE DESPESAS CONDOMINIAIS 

Outra questão comumente discutida no âmbito da obrigação de pagamento das despesas condominiais diz respeito à própria responsabilidade no adimplemento de tais despesas, dado, inclusive, o caráter propter rem da obrigação. Dito de outra forma, discute-se se tal obrigação encerra-se na pessoa que é proprietária do bem ou se ela se estende a outras pessoas que tenham uma relação jurídica vinculada ao imóvel – que não o vínculo de propriedade. 

Frisa-se que as obrigações propter rem recaem sobre determinada pessoa por força de determinado direito real, isto é, só existem em razão da situação jurídica do obrigado, de titular do domínio ou de detentor de determinada coisa (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 2 : teoria geral das obrigações. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 27). 

Como mesmo lembrado pelo renomado jurista, é o que ocorre, por exemplo, com a obrigação imposta aos proprietários e inquilinos de um prédio de não prejudicarem a segurança, o sossego e a saúde dos vizinhos (CC, art. 1.277). Por se transferir a eventuais novos ocupantes do imóvel, é também denominada obrigação ambulatória (GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. Cit., p. 27). 

Em julgamento de recurso repetitivo, a 2ª Seção desta Corte firmou a tese de que “o que define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais não é o registro do compromisso de compra e venda, mas a relação jurídica material com o imóvel, representada pela imissão na posse pelo promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto” (REsp 1.345.331/RS, 2ª Seção, DJe 20/04/2015). 

Na oportunidade, ressaltou o Min. Luis Felipe Salomão, relator dos autos, no corpo de seu voto, que as despesas condominiais, compreendidas como obrigações propter rem, são de responsabilidade daquele que detém a qualidade de proprietário da unidade imobiliária, ou ainda pelo titular de um dos aspectos da propriedade, tais como a posse, o gozo, a fruição, desde que esse tenha estabelecido relação jurídica direta com o condomínio. 

Não somente, a 4ª Turma desta Corte – ainda que analisando questão relativa à responsabilidade da promitente vendedora por despesas condominiais referentes ao período em que o bem esteve na pose do promitente comprador em razão de rescisão do contrato de promessa de compra e venda na qual foi reintegrada na posse do imóvel – ao interpretar o retrocitado precedente repetitivo da Segunda Seção, consignou que o Min. Relator teria reconhecido a faculdade do condomínio de propor a ação de cobrança de cotas condominiais contra aquele dentre os quais possuam liame jurídico com a unidade habitacional, sendo ele o proprietário, promissário comprador, adquirente, arrematante, ocupante do imóvel, etc., tendo em vista, exatamente, o intuito de fazer prevalecer o interesse da massa condominial, a fim de resgatar de maneira mais célere as despesas inadimplidas (AgInt no REsp 1.229.639/PR, 4ª Turma, DJe 20/10/2016). 

A corroborar com a linha de entendimento perfilhada por esta Corte, vale citar lição de abalizada doutrina: 

A força vinculante das obrigações propter rem manifesta-se conforme a situação do devedor ante uma coisa, seja como titular do domínio, seja como possuidor. Assim, nesse tipo de obrigação, o devedor é determinado de acordo com sua relação em face de uma coisa, que é conexa com o débito (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 2 : teoria geral das obrigações. 32 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 27) (grifos acrescentados). 

Nessa linha de raciocínio, no julgamento do REsp 1.704.498/SP (DJe 24/04/2018), esta 3ª Turma já decidiu pela possibilidade da arrendatária do imóvel – quem exerce a posse direta sobre o bem e quem, em realidade, usufrui dos serviços prestados pelo condomínio – figurar no polo passivo de ação de cobrança de despesas condominiais, não obstante não seja proprietária do mesmo. 

Especificamente no que concerne ao ajuizamento da ação de cobrança de cotas condominiais, tem-se, destarte, que o interesse prevalecente é o da coletividade de receber os recursos para o pagamento de despesas indispensáveis e inadiáveis, podendo o credor escolher o que mais prontamente poderá cumprir com a obrigação, ficando obviamente ressalvado o direito de regresso (CHAVES DE FARIAS, Cristiano. ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil. Vol. 5. 9ª ed. rev., ampl. e atual. Ed. Juspodivm: Bahia, 2013, p. 734). 

Nessa trilha, não é o bastante citar, também, a doutrina de Francisco Eduardo Loureiro: 

A natureza das despesas condominiais permite, mais, que a ação de cobrança seja ajuizada diretamente contra o locatário ou o comodatário, se assim for de interesse do condomínio (Código Civil comentado : doutrina e jurisprudência : Lei n. 10.406, de 10.01.2002 / coordenador Cezar Peluso. 8 ed. rev. e atual. São Paulo: Manole, 2014, p. 1.277). 

Conclui-se, pelo exposto, que a ação de cobrança de débitos condominiais pode ser proposta em face de qualquer um daqueles que tenha uma relação jurídica vinculada ao imóvel, o que mais prontamente possa cumprir com a obrigação. 

Vale lembrar que, por ocasião do julgamento do retrocitado recurso especial, como relatora dos autos, sublinhei que a admissão da arrendatária no polo passivo da ação de cobrança, não implicaria no reconhecimento de solidariedade entre proprietário e arrendatário no pagamento dos débitos condominiais em atraso, mas apenas no reconhecimento de que ambos poderiam figurar no polo passivo da obrigação, a fim de fazer prevalecer o interesse da coletividade dos condôminos, sempre resguardado o direito de regresso contra o real proprietário do bem. 

3. DA PENHORA DO IMÓVEL GERADOR DOS DÉBITOS CONDOMINIAIS NO BOJO DE AÇÃO DE COBRANÇA AJUIZADA EM FACE DA LOCATÁRIA DO BEM 

De início, reitera-se que, na hipótese ora sob exame, a ação de cobrança de cotas condominiais não foi ajuizada em face da proprietária do imóvel (ora recorrida), mas sim, em face da locatária. 

E, definido que ação de cobrança de despesas condominiais pode ser ajuizada em face daquele que, ainda que não seja proprietário do imóvel gerador dos débitos, tenha relação jurídica direta com o condomínio, em razão da titularidade de um dos aspectos da propriedade, resta analisar se o imóvel do próprio proprietário pode ser penhorado no bojo de ação de cobrança da qual não foi parte, ajuizada em face da locatária do bem. 

Urge salientar que a controvérsia posta a deslinde nos presentes autos é justamente a acima referida, pois os presentes embargos de terceiro foram opostos em razão da penhora de imóvel de propriedade da recorrida, realizada no bojo de ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não foi parte, uma vez que ajuizada unicamente em desfavor de Mogi Center Hotel Ltda., locatária do bem. 

Destaca-se que o TJ/SP reconheceu a impossibilidade da penhora do referido imóvel, sob o argumento de que é inviável redirecionar a execução à pessoa que não figurou na relação jurídica originária, em respeito aos limites subjetivos da coisa julgada, senão veja-se: 

Com efeito, o título executivo judicial a ser executado foi constituído em face de Mogi Center Hotel Ltda., na qualidade de devedora das despesas condominiais por exercer a posse direta dos referidos imóveis como locatária. No entanto, apenas na fase de cumprimento de sentença vem o condomínio exequente executar os imóveis geradores do débito condominial, cujos proprietários sequer participaram da fase de conhecimento, o que afronta o art. 472 do CPC, cuja redação determina que “A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. (...) (grifei). É certo que o pagamento das despesas condominiais, por se tratar de obrigação propter rem, acompanha o imóvel, estendendo a responsabilidade pelo pagamento a todo e qualquer adquirente da propriedade, em consonância ao determinado no art. 42, § 3º, do CPC. Ocorre que, no caso em comento, não houve a alteração do titular do direito de propriedade, visto que a embargante era proprietária dos imóveis em questão antes mesmo da ação de cobrança ter sido ajuizada pelo condomínio, conforme se observa das matrículas de fls. 54/60, não havendo como redirecionar a execução à pessoa que não figurou na relação jurídica originária, em respeito aos limites subjetivos da coisa julgada. (...) Logo, ausente título executivo contra a embargante, haja vista não ter feito parte da relação jurídico processual, esta não é parte legítima para ocupar o polo passivo da fase executiva, sendo de rigor a reforma da r. sentença (e-STJ fls. 157-158). 

Com efeito, é certo que, como regra, nos termos do art. 472 do CPC/73, à época vigente, os efeitos da coisa julgada apenas se operam inter partes, não beneficiando nem prejudicando estranhos à relação processual em que se formou. 

No entanto, essa regra não é absoluta e comporta exceções. Em determinadas hipóteses, a coisa julgada pode atingir, além das partes, terceiros que não participaram de sua formação. 

E, partindo da premissa de que, em última análise, o próprio imóvel gerador das despesas constitui garantia ao pagamento da dívida, dada a natureza propter rem da obrigação, deve-se admitir a inclusão do proprietário no cumprimento de sentença em curso. 

A solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para a realização do direito material. Afinal, se o débito condominial possui caráter ambulatório, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, o proprietário possa figurar no polo passivo do cumprimento de sentença. 

Não constitui demasia realçar que deve prevalecer o interesse da coletividade dos condôminos, permitindo que o condomínio receba as despesas indispensáveis e inadiáveis à manutenção da coisa comum. 

A fim de corroborar o real espírito da obrigação de adimplemento das despesas condominiais, cita-se recente precedente julgado por esta 3ª Turma, em que se admitiu a sucessão processual do antigo executado pelo arrematante do imóvel, que não participou da relação jurídica originária. O julgado foi assim ementado: 

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL (CPC/73). AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS CONDOMINIAIS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMÓVEL ARREMATADO EM HASTA PÚBLICA. INFORMAÇÃO NO EDITAL ACERCA DA EXISTÊNCIA DE DÉBITOS CONDOMINIAIS. CARÁTER 'PROPTER REM' DA OBRIGAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ARREMATANTE. SUCESSÃO NO POLO PASSIVO DA EXECUÇÃO. CABIMENTO. 1. Controvérsia em torno da possibilidade de inclusão do arrematante no polo passivo da ação de cobrança de cotas condominiais na fase cumprimento de sentença. 2. Em recurso especial não cabe invocar ofensa à norma constitucional. 3. Os arts. 204 e 206, § 5º, I, do CC não contêm comandos capazes de sustentar a tese recursal, atraindo o óbice da Súmula 284/STF. 4. Não há violação aos arts. 489, § 1º, IV e 1.022, II e § único, II, do CPC quando a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente. 5. Em se tratando a dívida de condomínio de obrigação "propter rem", constando do edital de praça a existência de ônus incidente sobre o imóvel, o arrematante é responsável pelo pagamento das despesas condominiais vencidas, ainda que estas sejam anteriores à arrematação, admitindo-se, inclusive, a sucessão processual do antigo executado pelo arrematante. 6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO (REsp 1.672.508/SP, 3ª Turma, DJe 01/08/2019). 

É bem verdade que, ainda que tratando de hipótese diversa da dos autos – uma vez que no bojo do referido recurso especial houve uma verdadeira transferência de titularidade do direito real sobre o imóvel –, o que se dessume do julgado é um real escopo de não esvaziar a própria tutela jurisdicional. 

Na oportunidade, destaca-se, proferi voto vogal ressaltando que: 

Em certa medida, essa disposição legal reflete a visão da moderna processualística brasileira no sentido de que a alteração da situação das partes no plano do direito material tem inegável influência sobre o processo, que não pode ser desconsiderada, sob pena de se esvaziar de eficácia a própria tutela jurisdicional. Com efeito, “a natureza instrumental do direito processual impõe sejam seus institutos concebidos em conformidade com as necessidades do direito substancial. Isto é, a eficácia do sistema processual será medida em função de sua utilidade para o ordenamento jurídico material e para a pacificação social” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo, 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 19). 

Sob esse espeque, devem ser julgados improcedentes os embargos de terceiro opostos pela recorrida. 

4. DA CONCLUSÃO 

Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial interposto pelo CONDOMINIO DO EDIFICIO MOGI CENTER HOTEL e DOU-LHE PROVIMENTO, a fim de restabelecer a sentença de fls. 99-102 (e-STJ), que julgou improcedentes os embargos de terceiro opostos pela recorrida. 

Filigrana doutrinária: Despesas condominiais

"A natureza das despesas condominiais permite, mais, que a ação de cobrança seja ajuizada diretamente contra o locatário ou o comodatário, se assim for de interesse do condomínio" 

Código Civil comentado : doutrina e jurisprudência : Lei n. 10.406, de 10.01.2002 / coordenador Cezar Peluso. 8 ed. rev. e atual. São Paulo: Manole, 2014, p. 1.277. 

27 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: Responsabilidade pelo débito condominial - João Batista Lopes

 “a responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais acompanha a pessoa do adquirente, que não pode eximir-se com alegação de que os encargos foram gerados anteriormente à aquisição do imóvel” 

LOPES, João Batista. Condomínio, 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 98. 

24 de abril de 2021

PENHORA DO IMÓVEL GERADOR DOS DÉBITOS CONDOMINIAIS NO BOJO DE AÇÃO DE COBRANÇA NA QUAL A PROPRIETÁRIA DO BEM NÃO FIGUROU COMO PARTE. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.683.419 - RJ (2017/0163137-0) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. PENHORA DO IMÓVEL GERADOR DOS DÉBITOS CONDOMINIAIS NO BOJO DE AÇÃO DE COBRANÇA NA QUAL A PROPRIETÁRIA DO BEM NÃO FIGUROU COMO PARTE. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 

1. Embargos de terceiro opostos em 28/04/2014. Recurso especial interposto em 17/05/2016 e concluso ao gabinete em 24/07/2017. Julgamento: CPC/2015. 

2. O propósito recursal consiste em definir se a proprietária do imóvel gerador dos débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado no bojo de ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo, uma vez que tramitou apenas em face de seu ex-companheiro. 

3. A ausência de decisão do Tribunal de origem acerca da questão suscitada pela recorrente – in casu, a preclusão – impede o conhecimento do recurso especial quanto ao tema, pois não satisfeito o requisito do prequestionamento. Aplicação da Súmula 211/STJ. 

4. Segundo o reiterado entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, a obrigação de pagamento das despesas condominiais é de natureza propter rem, ou seja, é obrigação “própria da coisa”, ou, ainda, assumida “por causa da coisa”. Por isso, a pessoa do devedor se individualiza exclusivamente pela titularidade do direito real, desvinculada de qualquer manifestação da vontade do sujeito. 

5. Em havendo mais de um proprietário do imóvel, como ordinariamente ocorre entre cônjuges ou companheiros, a responsabilidade pelo adimplemento das cotas condominiais é solidária, o que, todavia, não implica a existência de litisconsórcio necessário entre os co-proprietários, podendo o condomínio demandar contra qualquer um deles ou contra todos em conjunto, conforme melhor lhe aprouver. Precedente. 

6. Hipótese dos autos em que, à época da fase de conhecimento, o imóvel encontrava-se registrado em nome dos dois companheiros, mostrando-se válido e eficaz, portanto, o acordo firmado pelo ex-companheiro da recorrente com o condomínio. 

7. Descumprido o acordo e retomada a ação, e em não sendo efetuado o pagamento do débito, é viável a penhora do imóvel gerador das despesas, ainda que, nesse novo momento processual, esteja ele registrado apenas em nome da recorrente, que não participou da fase de conhecimento. 

8. Sob o enfoque do direito material, aplica-se a regra do art. 1.345 do CC/02, segundo o qual “o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multa e juros moratórios”. Por outro lado, no plano processual, a penhora do imóvel e a inclusão da proprietária no polo passivo da lide é viável ante o disposto no art. 109, § 3º, do CPC/15, no sentido de que os efeitos da sentença proferida entre as partes originárias se estendem ao adquirente ou cessionário. 

9. Ademais, a solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para a realização do direito material. Afinal, se o débito condominial possui caráter ambulatório, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, o proprietário possa figurar no polo passivo do cumprimento de sentença. 

10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido, com majoração de honorários advocatícios. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, negar-lhe provimento, com majoração de honorários advocatícios, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. 

Brasília (DF), 20 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recurso especial interposto por MARIA EVELINE LEITE DE OLIVEIRA, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional. 

Ação: embargos de terceiro, opostos pela recorrente em face do CONDOMINIO DO EDIFICIO MERLIN SUL, visando à preservação de sua posse e propriedade sobre imóvel que foi penhorado nos autos da ação de cobrança de cotas condominiais, em fase de cumprimento de sentença, proposta pelo CONDOMINIO em desfavor de Orcínio Cardoso Inácio, ex-companheiro da embargante. 

Na petição inicial, a embargante alegou, em síntese que: (i) 50% do imóvel já lhe pertencia e os outros 50% lhe foram doados por seu ex-companheiro, quando fora lavrada escritura pública de dissolução de sociedade de fato e outros pactos; (ii) o acordo firmado entre Orcínio e o CONDOMÍNIO na fase de conhecimento da ação de cobrança é fraudulento, pois ambos os contratantes tinham conhecimento da partilha amigável realizada em 2005; (iii) não pode ser atingida pela sentença, pois não participou da fase de conhecimento. 

Sentença: rejeitou os embargos de terceiro, determinando o prosseguimento da execução. 

Acórdão: por maioria, deu provimento à apelação interposta pela ora recorrente, para determinar o levantamento da penhora, nos termos da seguinte ementa (e-STJ fl. 256): 

"APELAÇÃO CÍVEL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. COTAS CONDOMINAIS. AÇÃO DE COBRANÇA PROPOSTA EM FACE DE UM DOS COPROPRIETÁRIOS. ACORDO FIRMADO EM SEDE DE AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO DEVIDAMENTE HOMOLOGADO PELO JUÍZO. DESCUMPRIMENTO QUE ENSEJOU O INÍCIO DA FASE EXECUTIVA. CERTIDÃO DO IMÓVEL QUE CONSTOU A TRANSFERÊNCIA DA TITULARIDADE DO IMÓVEL PARA O OUTRO COPROPRIETÁRIO, ORA EMBARGANTE, QUE NÃO PARTICIPOU DA FASE COGNITIVA. JUÍZO A QUO QUE DETERMINOU A RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO PARA FAZER CONSTAR SOMENTE A EMBARGANTE, SOB A PREMISSA DE QUE A NATUREZA DA DÍVIDA É PROPTER REM. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO ELEMENTO SUBJETIVO DA COISA JULGADA. DISCUSSÃO ACERCA DA NATUREZA DO DÉBITO QUE SE REVELA DESPICIENDA. NÃO SE PODE PRETENDER EXECUTAR IMÓVEL, NO BOJO DE PROCESSO QUE NÃO CONTOU COM A PARTICIPAÇÃO DE SUA PROPRIETÁRIA. NECESSIDADE DE SE OBSERVAR A CORRELAÇÃO ENTRE OS POLOS ATIVO E PASSIVO DA DEMANDA. PRECEDENTES DO COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO PARA JULGAR PROCEDENTES OS PEDIDOS E DETERMINAR O LEVANTAMENTO DA PENHORA DO IMÓVEL". 

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram acolhidos, para a inversão dos ônus da sucumbência. 

Embargos infringentes: opostos pelo condomínio recorrido, foram acolhidos, para fazer prevalecer o voto vencido, que confirmava a sentença e desprovia o recurso de apelação. O acórdão foi assim ementado (e-STJ fls. 321/322): 

"EMBARGOS INFRINGENTES - COBRANÇAS DE COTAS CONDOMINIAIS EM FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - PENHORA DO IMÓVEL - EMBARGOS DE TERCEIRO OPOSTOS PELA EX-COMPANHEIRA E COPROPRIETÁRIA - LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO - INEXISTÊNCIA – PRECEDENTES DO STJ - ESCRITURA DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE DE FATO E OUTROS PACTOS LAVRADA ANTES DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO, PORÉM NÃO REGISTRADA, NA QUAL COUBE A EMBARGADA A EXCLUSIVA TITULARIDADE DO IMÓVEL - INOPONIBILIDADE A TERCEIROS. 1. Cuida-se de embargos infringentes interpostos em face de v. acórdão que, por maioria de votos, deu provimento ao apelo da ora embargada, para reformando a sentença de 1º grau, julgar procedente o pedido contido nos embargos de terceiros por ela opostos, a fim de determinar o levantamento da constrição judicial de imóvel de sua propriedade. 2. Já decidiu o E. STJ que "os cônjuges, coproprietários de imóvel, respondem solidariamente pelas despesas de condomínio, mas esta responsabilidade não implica litisconsórcio necessário em razão da natureza pessoal da ação de cobrança de cotas condominiais (AgRg no AREsp 213.060/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/10/2012, DJe 06/11/2012). 3. No caso em tela, quando do ajuizamento da ação de cobrança de cotas condominiais, constava da certidão do RGI como sendo proprietários do imóvel a ora embargada e o seu ex-companheiro. 4. Deste modo, a ação poderia ser proposta ou mesmo prosseguir em face de ambos ou de apenas um deles, por não se enquadrar a hipótese na espécie de litisconsórcio passivo necessário. 5. A alegação da embargada de que o imóvel apenas lhe pertencia, diga-se, por força de escritura de dissolução de sociedade de fato e outros pactos lavrada já no ano de 2005, isto é, antes do ajuizamento da ação de cobrança, afigura-se sem qualquer substrato legal, porquanto é regra comezinha de Direito Civil, por determinação expressa do art. 1.245 do CC, que a transferência da propriedade imobiliária somente ocorre com o registro do título aquisitivo perante o Registro de Imóveis. 6. Não seria razoável a oponibilidade a terceiro, no caso o condomínio, de pacto celebrado entre os ex-conviventes e coproprietários do imóvel, ao qual não se havia dado publicidade através do competente registro no RGI, pois o interesse prevalente é o da coletividade de receber os recursos para o pagamento de despesas indispensáveis e inadiáveis. 7. Portanto, como bem pontuado no voto vencido, válido o acordo do Senhor Orcinio com o Condomínio, ajuste este que se não foi cumprido enseja o prosseguimento do feito, para execução do débito. DÁ-SE PROVIMENTO AO RECURSO". 

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram rejeitados. 

Recurso especial: alega violação dos arts. 506 e 507 do CPC/15, bem como dissídio jurisprudencial, sustentando que: (i) não é viável a inclusão da recorrente no polo passivo do cumprimento de sentença, eis que não participou da fase de conhecimento, que fora encerrada com homologação de acordo entre o condomínio recorrido e seu ex-companheiro, Orcínio; (ii) o condomínio tinha ciência de que a posse e propriedade sobre o imóvel eram exercidas exclusivamente pela recorrente porém, a despeito disso, optou por desistir da ação em relação a ela; (iii) o redirecionamento da execução contra a recorrente implica em violação dos princípios da ampla defesa e do contraditório, ante a ausência de oportunidade para questionar o débito exequendo; (iv) de todo modo, tal questão encontra-se preclusa, pois o condomínio não recorreu contra o acórdão do TJ/RJ que, nos autos da ação principal, excluiu a recorrente do polo passivo. 

Juízo de admissibilidade: o recurso foi admitido pelo TJ/RJ. 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): O propósito recursal consiste em definir se a proprietária do imóvel gerador dos débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado no bojo de ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo, uma vez que tramitou apenas em face de seu ex-companheiro. 

I. DA DELIMITAÇÃO FÁTICO-PROCESSUAL DA DEMANDA. 

1. Com vistas à melhor compreensão da controvérsia, convém pontuar brevemente os contornos fático-processuais da demanda, tais como delineados pelas instâncias ordinárias. 

2. As cotas condominiais que pleiteia o CONDOMINIO DO EDIFICIO MERLIN SUL venceram entre dezembro de 2006 e outubro de 2008, período em que o imóvel gerador das despesas encontrava-se registrado em nome da recorrente, MARIA EVELINE, e de seu ex-companheiro, ORCINIO, na proporção de 50% para cada um, em que pese a existência de escritura pública de partilha de bens lavrada em dezembro de 2005 – e à época não registrada –, atribuindo à MARIA EVELINE a integralidade da propriedade do imóvel. 

3. Embora inicialmente tenha o CONDOMÍNIO proposto a ação de cobrança apenas em face da recorrente, o juízo a quo determinou a inclusão de ORCINIO no polo passivo da demanda, ante a informação contida no registro imobiliário. Subsequentemente, houve a assinatura de acordo de pagamento entre o CONDOMÍNIO e ORCINIO, com a desistência da ação em relação à recorrente MARIA EVELINE, em especial porque restou infrutífera a tentativa de sua citação. 

4. Após, devido ao descumprimento do acordo firmado, o CONDOMÍNIO deflagrou o cumprimento de sentença e, não efetuado o pagamento da dívida por ORCINIO, foi determinada a penhora do imóvel. Ocorre que, nesse momento, já constava na matrícula do imóvel o registro da escritura pública de partilha de bens entre ORCINIO e MARIA EVELINE, razão pela qual o juízo determinou a retificação do polo passivo da demanda, a fim de fazer constar apenas a recorrente MARIA EVELINE, efetuando-se a penhora que é discutida nos presentes embargos de terceiro. 

II. DA AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. 

5. A recorrente alega que a questão relativa ao redirecionamento da execução em seu desfavor encontra-se preclusa, haja vista que o CONDOMÍNIO não apresentou recurso contra o acórdão do TJ/RJ que, nos autos do processo executivo, determinou sua exclusão do polo passivo. 

6. No entanto, da análise do presente processo, verifica-se que o Tribunal de origem não se manifestou quanto à alegação de preclusão, circunstância que impossibilita o exame da matéria por esta Corte, porquanto não satisfeito o requisito do prequestionamento. 

7. Tem aplicação na hipótese, destarte, o óbice da Súmula 211/STJ. 

III. DA NATUREZA JURÍDICA DA OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DAS DESPESAS CONDOMINIAIS. 

8. Segundo o reiterado entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, respaldado em abalizada doutrina, a obrigação de pagamento das despesas condominiais é de natureza propter rem, ou seja, é obrigação “própria da coisa”, ou, melhor ainda, assumida “por causa da coisa”. 

9. Outrora, muito se discutiu se as obrigações ditas propter rem estariam contidas no universo dos direitos reais, ou se, por outro lado, seriam afetas ao universo dos direitos obrigacionais. Referida diferenciação, ao fim e ao cabo, restou suplantada pela constatação de que “a obrigação propter rem se encontra no terreno fronteiriço entre os direitos reais e os pessoais” (RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, Parte Geral: das Obrigações, 9ª ed., Saraiva, vol. II, p. 108); que se formam numa situação de imbricação entre os direitos reais e obrigacionais, assimilando características de ambos (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direitos reais, 14ª ed., JusPodivm, 2018, p. 56). 

10. SERPA LOPES, se aprofundando no estudo dessa espécie de obrigação, concluiu que ela se caracteriza por decorrer da titularidade de um direito real, impondo a satisfação de determinada prestação relativa à coisa. Assim, as obrigações propter rem “recaem sobre uma pessoa por força de um determinado direito real, com o qual se encontram numa vinculação tão estreita, que o seguem a título de acessórios, inseparáveis” (Curso de Direito Civil, Obrigações em Geral, 2ª ed, Freitas Bastos, vol. II, p. 66). 

11. Em outros termos, caracteriza-se a obrigação propter rem pela particularidade de a pessoa do devedor se individualizar única e exclusivamente pela titularidade do direito real, desvinculada de qualquer manifestação da vontade do sujeito. 

12. Por isso é que, em havendo transferência da titularidade, a obrigação é igualmente transmitida. 

13. Diz-se, então, que a obrigação propter rem é dotada de ambulatoriedade, ou, ainda, que se trata, ela mesma, de obrigação ambulatória. Assim, independentemente da vontade dos envolvidos, a obrigação de satisfazer determinadas prestações acompanha a coisa em todas as suas mutações subjetivas. 

14. Essa característica inerente às obrigações propter rem é bem pontuada por Antônio Junqueira de AZEVEDO, segundo o qual, “justamente no fato de que, nelas, o devedor somente é determinado pela sua condição de titular da propriedade; mudando a coisa de dono, muda a obrigação de devedor. Por isso, também se chamam obrigações ambulatórias; ambulant cum domino ou, como seria possível dizer, ambulant cum dominio” (Restrições Convencionais de Loteamento – Obrigações propter rem e suas Condições de Persistência. Revista dos Tribunais, nº 741, 1997, p. 116). 

15. Especificamente no que concerne à obrigação dos condôminos de contribuir para a conservação da coisa comum, o caráter da ambulatoriedade é extraído do art. 1.345 do Código Civil de 2002, segundo o qual “o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multa e juros moratórios”. 

16. Conforme se depreende desse dispositivo legal, a transmissão da obrigação ocorre automaticamente, isto é, ainda que não seja essa a intenção do alienante e mesmo que o adquirente não queira assumi-la. Com efeito, “a responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais acompanha a pessoa do adquirente, que não pode eximir-se com alegação de que os encargos foram gerados anteriormente à aquisição do imóvel” (LOPES, João Batista. Condomínio, 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 98). 

17. O sentido dessa norma é intuitivo: fazer prevalecer o interesse da coletividade dos condôminos, permitindo que o condomínio receba, a despeito da transferência de titularidade do direito real sobre o imóvel, as despesas indispensáveis e inadiáveis à manutenção da coisa comum, impondo ao adquirente, para tanto, a responsabilidade, inclusive pelas cotas condominiais vencidas em período anterior à aquisição. 

18. Deveras, a disposição do art. 1.345 do CC/02 é indispensável para a própria subsistência do condomínio, “cuja saúde financeira não pode ficar à mercê das mudanças na titularidade dominial” (LOPES, op. cit.). 

19. Mais do que isso, conforme salientou a 4ª Turma por ocasião do julgamento do REsp 1.473.484/RS (DJe 23/08/2018), essa previsão legal intensifica a prevalência da "solidariedade condominial", a fim de que seja permitida a continuidade e manutenção do próprio condomínio, impedindo a ruptura da sua estabilidade econômico-financeira, que prejudicaria a todos os comunheiros. 

IV. DA RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS COTAS CONDOMINIAIS. 

20. Por se tratar de obrigação de natureza propter rem, ou seja, decorrente da titularidade de um direito real sobre a coisa, a responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais recai, por excelência, sobre o proprietário da unidade imobiliária, podendo ainda se estender a outros sujeitos que tenham relação jurídica material com o imóvel e que sobre ele exerçam algum dos aspectos da propriedade, a exemplo de promissórios compradores, locatários, arrendatários, dentre outros. 

21. Outrossim, em havendo mais de um proprietário do imóvel, como ordinariamente ocorre entre cônjuges ou companheiros, a responsabilidade pelo adimplemento das cotas condominiais é considerada solidária. Essa responsabilidade solidária, contudo, não implica a existência de litisconsórcio necessário entre os co-proprietários, podendo o condomínio, portanto, demandar contra qualquer um deles ou contra todos em conjunto, conforme melhor lhe aprouver. 

22. Nesse sentido se firmou a jurisprudência desta Corte, consoante se observa do seguinte precedente: 

“AÇÃO RESCISÓRIA. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ALEGAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE ERRO DE FATO E VIOLAÇÃO MANIFESTA A NORMA JURÍDICA. ARTS. 966, V E VIII, DO CPC/2015. AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS CONDOMINIAIS. EMBARGOS DE TERCEIRO OPOSTOS PELA COMPANHEIRA E MEEIRA. REGULAR INTIMAÇÃO DA PENHORA. FATO EXISTENTE. ALEGAÇÃO DE BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. EXCEÇÃO PREVISTA NO ART. 3º, IV, DA LEI 8.009/90. OBRIGAÇÕES "PROPTER REM". LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. DÍVIDA SOLIDÁRIA. DECISÃO RESCINDENDA EM DISSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. RESCISÃO DO JULGADO. PEDIDO RESCISÓRIO PROCEDENTE. 1. Pedido desconstitutivo de decisão desta Corte que, reformando acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conheceu do agravo para dar provimento ao recurso especial, reconhecendo como "bem de família a parte da meeira objeto de constrição e, por conseguinte, a impenhorabilidade do imóvel em sua totalidade". [...] 6. "Com relação à legitimidade passiva, observa-se que, em se tratando de obrigação 'propter rem', o pagamento de taxas condominiais deve ser exigido de quem consta na matrícula do imóvel como seu proprietário" (AgRg no REsp 1510419/PR, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/12/2016, DJe 19/12/2016). 7. "Os cônjuges, co-proprietários de imóvel, respondem solidariamente pelas despesas de condomínio, mas esta responsabilidade não implica litisconsórcio necessário em razão da natureza pessoal da ação de cobrança de cotas condominiais" (AgRg no AREsp 213.060/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/10/2012, DJe 06/11/2012). 8. DEMANDA RESCISÓRIA JULGADA PROCEDENTE PARA, EM JUÍZO RESCINDENDO, DESCONSTITUIR A DECISÃO PROFERIDA NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL N. 490.442/SP E, EM JUÍZO RESCISÓRIO, CONHECER DO AGRAVO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. (AR 5.931/SP, 2ª Seção, DJe 21/06/2018) 

V. DA RESPONSABILIDADE DA RECORRENTE QUANTO À DÍVIDA CONDOMINIAL SUB JUDICE. 

23. À luz das diretrizes anteriormente fixadas, verifica-se que, na hipótese dos autos, a responsabilidade da recorrente pelo pagamento da dívida condominial sub judice é inafastável. 

24. Ab initio, é de se ressaltar que a própria recorrente confessa que exerce a posse exclusiva do imóvel desde 2005, ou seja, antes mesmo do período em que se venceram as cotas condominiais pleiteadas, sendo, portanto, quem primariamente se beneficiou dos serviços de conservação da coisa. Dessa maneira, ainda que a fase de conhecimento da ação de cobrança tenha tramitado apenas em face de seu ex-companheiro ORCINIO – em razão da titularidade que à época constava no registro imobiliário –, não se pode perder de vista que a recorrente, de fato, é a devedora principal da dívida. 

25. Por outro lado, sob um enfoque formal, é certo que, apesar do acordo firmado entre ORCÍNIO e o CONDOMÍNIO, houve modificação da titularidade do domínio no curso do processo, passando a recorrente a deter 100% da propriedade do imóvel. 

26. Dessa maneira, ante a aquisição da titularidade plena da unidade condominial – o que se dá, frise-se, apenas com o ato do registro, na forma do art. 1.245 do CC/02 –, deve recair sobre a recorrente a responsabilidade pelo pagamento dos débitos sobre o imóvel, mesmo aqueles em nome do “alienante”. 

27. A propósito, convém pontuar que não há qualquer irregularidade no acordo firmado pelo CONDOMÍNIO, eis que, à época da fase de conhecimento, ORCINIO, na qualidade de proprietário de 50% do imóvel, tinha legitimidade passiva para a lide e podia transacionar sem qualquer restrição. 

28. Nesse passo, uma vez descumprido o acordo validamente firmado, mostra-se correta a retomada da ação em face de ORCÍNIO. E, ausente o pagamento voluntário do débito, a penhora do imóvel gerador das despesas é inexorável, ainda que conste, nesse novo momento processual, registro em nome de terceiro. 

29. Aliás, no que concerne à argumentação deduzida pela recorrente acerca dos limites da coisa julgada, impõe salientar que, realmente, nos termos do art. 506 do CPC/15, os efeitos da coisa julgada, como regra, apenas se operam inter partes, não beneficiando nem prejudicando estranhos à relação processual em que se formou. 

30. No entanto, essa regra não é absoluta e comporta exceções. Em determinadas hipóteses, a coisa julgada pode atingir, além das partes, terceiros que não participaram de sua formação. 

31. É o que ocorre, deveras, na hipótese de alienação da coisa ou do direito litigioso. 

32. A respeito, o art. 109, § 3º, do CPC/15 dispõe expressamente que “estendem-se os efeitos da sentença proferida entre as partes originárias ao adquirente ou cessionário”. 

33. Trata-se de previsão legal que, verdadeiramente, faz irradiar a terceiros os efeitos da coisa julgada, em virtude da modificação da situação jurídica da coisa ou bem litigioso. 

34. Em certa medida, essa disposição legal reflete a visão da moderna processualística brasileira no sentido de que a alteração da situação das partes no plano do direito material tem inegável influência sobre o processo, que não pode ser desconsiderada, sob pena de se esvaziar de eficácia a própria tutela jurisdicional. 

35. Nessa toada, na hipótese em julgamento, a conclusão que se alcança é que, sendo a recorrente responsável pelo pagamento das despesas condominiais pela aquisição da plena propriedade, não há necessidade de o CONDOMÍNIO promover nova ação contra ela, na medida em que a sentença prolatada na fase de conhecimento lhe é eficaz. 

36. Outrossim, não se vislumbra qualquer óbice na inclusão da recorrente no polo passivo do cumprimento de sentença em curso, em substituição a ORCÍNIO, ex-proprietário, pois, conquanto o disposto no art. 109, § 3º, do CPC/15 não implique automática sucessão processual, é certo que, por outro lado, não a impede. 

37. Aqui, novamente, a solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para a realização do direito material. Afinal, se a norma de direito material contida no art. 1.345 do CC/02 atribui ao débito condominial caráter ambulatório, impondo o pagamento ao adquirente do bem, inclusive das parcelas vencidas, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, se considere o adquirente o sucessor do anterior proprietário, com vistas à plena satisfação da dívida já consolidada. Não se pode olvidar que, em última análise, o próprio imóvel gerador das despesas constitui garantia ao pagamento da dívida, dada a natureza propter rem da obrigação. 

38. A fim de corroborar o real espírito da obrigação de adimplemento das despesas condominiais, cita-se recente precedente julgado por esta 3ª Turma, em que se admitiu a sucessão processual do antigo executado pelo arrematante do imóvel em hasta pública, que não participou da relação jurídica originária: 

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL (CPC/73). AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS CONDOMINIAIS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMÓVEL ARREMATADO EM HASTA PÚBLICA. INFORMAÇÃO NO EDITAL ACERCA DA EXISTÊNCIA DE DÉBITOS CONDOMINIAIS. CARÁTER 'PROPTER REM' DA OBRIGAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ARREMATANTE. SUCESSÃO NO POLO PASSIVO DA EXECUÇÃO. CABIMENTO. 1. Controvérsia em torno da possibilidade de inclusão do arrematante no polo passivo da ação de cobrança de cotas condominiais na fase cumprimento de sentença. 2. Em recurso especial não cabe invocar ofensa à norma constitucional. 3. Os arts. 204 e 206, § 5º, I, do CC não contêm comandos capazes de sustentar a tese recursal, atraindo o óbice da Súmula 284/STF. 4. Não há violação aos arts. 489, § 1º, IV e 1.022, II e § único, II, do CPC quando a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente. 5. Em se tratando a dívida de condomínio de obrigação "propter rem", constando do edital de praça a existência de ônus incidente sobre o imóvel, o arrematante é responsável pelo pagamento das despesas condominiais vencidas, ainda que estas sejam anteriores à arrematação, admitindo-se, inclusive, a sucessão processual do antigo executado pelo arrematante. 6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO (REsp 1.672.508/SP, 3ª Turma, DJe 01/08/2019). 

39. Sob esse espeque, a manutenção da improcedência dos embargos de terceiro é medida que se impõe. 

Forte nessas razões, CONHEÇO EM PARTE do recurso especial e, nessa extensão, NEGO-LHE PROVIMENTO. 

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/15, considerando o trabalho adicional imposto ao advogado da parte recorrida em virtude da interposição deste recurso, majoro os honorários fixados anteriormente em 10% sobre o valor da causa (e-STJ fl. 64) para 15%, observada a concessão da gratuidade de justiça à recorrente.