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14 de janeiro de 2022

É indispensável a existência de prévia autorização judicial para a instauração de inquérito ou outro procedimento investigatório em face de autoridade com foro por prerrogativa de função em Tribunal de Justiça

 

PROCESSO PENAL - FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO

STF. 2ª Turma. HC 201965/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 30/11/2021 (Info 1040).

É indispensável a existência de prévia autorização judicial para a instauração de inquérito ou outro procedimento investigatório em face de autoridade com foro por prerrogativa de função em Tribunal de Justiça

COAF

Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF)

previsto nos arts. 14 e 15 da Lei nº 9.613/98 (Lei de Lavagem de Dinheiro)

órgão responsável por produzir e gerir informações de inteligência financeira para a prevenção e o combate à lavagem de dinheiro

recebe informações dos bancos, seguradoras, cartórios, joalherias, cruza os dados e produz relatórios de inteligência

não checa a veracidade das informações nem abre investigações.

A Lei nº 9.613/98 estabelece as hipóteses em que o COAF deve ser obrigatoriamente comunicado, que são aquelas que saem do normal do sistema financeiro, do sistema bancário

COAF produz relatórios, informações, não só para estabelecer na via administrativa e legislativa novos mecanismos de prevenção, mas também para punir quem eventualmente estiver praticando atividades ilícitas

não pode quebrar o sigilo bancário e fiscal por conta própria. Pode trabalhar a informação, produzir relatório, identificar a irregularidade e mandar para os demais órgãos, como a Receita a o Parquet.

RIF

Relatório de Inteligência Financeira

A Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei nº 12.683/98) determina, em seu art. 11, que as instituições financeiras e demais pessoas físicas e jurídicas que trabalhem com recursos financeiros, moeda estrangeira, títulos mobiliários etc. (art. 9º) comuniquem ao COAF qualquer movimentação financeira “suspeita” (“atípica”), ou seja, que ultrapasse determinado valor que é fixado pela autoridade administrativa.

COAF analisa a comunicação recebida com o objetivo de identificar se existe nela algum indício de lavagem de dinheiro, de financiamento do terrorismo ou de outros crimes

Essa análise é realizada por meio de uma metodologia que utiliza critérios objetivos, sendo utilizada a tecnologia de machine learning. Assim, o que determina se a operação financeira realizada será fichada em relatório é a combinação de fatores que compõem a classificação de risco e prioridade, que é realizada por um software de inteligência artificial.

identificado algum indício de crime, COAF elabora um RIF, que é encaminhado às autoridades competentes (Receita Federal, Polícia Federal, Ministério Público Federal).

Depois que o RIF é concluído, ele ainda passa por instâncias internas individuais e colegiadas antes que seja autorizada sua difusão para as autoridades competentes.

Sendo aprovado por essas instâncias internas do COAF, o relatório (RIF) é encaminhado à Receita Federal, Polícia Federal ou Ministério Público Federal, conforme seja o caso

COAF não faz investigações, mas apenas coleta, analisa e cruza dados, produzindo um relatório de inteligência (uma espécie de “alerta”), que será encaminhado aos órgãos de persecução penal.

Esse relatório tem natureza jurídica equivalente à de “peças de informação”.

“O Código de Processo Penal, genericamente, dá o nome de peças de informações a todo e qualquer conjunto indiciário resultante das atividades desenvolvidas fora do inquérito policial, a exemplo de um procedimento investigatório criminal presidido pelo próprio órgão ministerial, um relatório de comissão parlamentar de inquérito, etc.” (LIMA, Renato Brasileiro. Código de Processo Penal comentado. 2ª ed., Salvador: Juspodivm, 2017, p. 162).

Providências possíveis no MP após recebimento do RIF

o relatório de inteligência que é enviado ao Ministério Público deve receber o mesmo tratamento de qualquer peça de informação.

1) Oferecer denúncia – existência de indícios suficientes de autoria e materialidade e

2) instaurar procedimento de investigação criminal (PIC) ou requisitar inquérito policial para complementar as informações trazidas pelo relatório;

3) pedir o arquivamento dessas peças de informação, caso repute que o relatório de inteligência não contém indícios de crimes, nos termos do art. 28 do CPP

Compartilhamento de informações

STF. Plenário. RE 1055941/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 4/12/2019 (RG – Tema 990) (Info 962):

1. É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF (COAF) e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil (RFB), que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional

2. O compartilhamento pela UIF (COAF) e pela RFB, referente ao item anterior, deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios

Se o investigado tiver foro por prerrogativa de função no TJ, o MP deve requerer judicialmente a prévia instauração de investigação

15 de novembro de 2021

FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO Compete aos tribunais de justiça estaduais processar e julgar os delitos comuns, não relacionados com o cargo, em tese praticados por Promotores de Justiça

FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO Compete aos tribunais de justiça estaduais processar e julgar os delitos comuns, não relacionados com o cargo, em tese praticados por Promotores de Justiça 

Situação hipotética: João estava de passagem por Aracaju (SE) e ali praticou um crime. Vale ressaltar que João é Promotor de Justiça no Estado do Ceará. Importante também registrar que o delito por ele praticado não tem nenhuma relação com o cargo ocupado. O feito foi inicialmente distribuído ao Juízo de Direito da Vara Criminal de Aracaju (1ª instância da Justiça estadual de Sergipe). O juiz, contudo, reconheceu sua incompetência sob o fundamento de que, nos termos do art. 96, III, da CF/88, compete ao Tribunal de Justiça julgar os crimes praticados por Promotores de Justiça. O TJ/CE, entretanto, disse o seguinte: no julgamento da AP 937 QO/RJ, o STF conferiu nova interpretação (restritiva) ao art. 102, I, alíneas “b” e “c”, da CF/88, fixando a competência daquela Corte para julgar os membros do Congresso Nacional exclusivamente quanto aos crimes praticados no exercício e em razão da função pública exercida. Pelo princípio da simetria, esta interpretação restritiva do foro por prerrogativa de função deveria ser aplicada também pelo Tribunal de Justiça. Logo, como o crime praticado pelo Promotor de Justiça não foi cometido em razão da função pública por ele exercida, a competência seria do juiz de 1ª instância. O STJ afirmou que a competência é, de fato, do Tribunal de Justiça. A Corte Especial do STJ, no julgamento da QO na APN 878/DF reconheceu sua competência para julgar Desembargadores acusados da prática de crimes com ou sem relação ao cargo, não identificando simetria com o precedente do STF. Naquela oportunidade, firmou-se a compreensão de que se Desembargadores fossem julgados por Juízo de Primeiro Grau vinculado ao Tribunal ao qual ambos pertencem, criar-se-ia, em alguma medida, um embaraço ao Juiz de carreira responsável pelo julgamento do feito. Em resumo, o STJ apontou discrímen relativamente aos magistrados para manter interpretação ampla quanto ao foro por prerrogativa de função, aplicável para crimes com ou sem relação com o cargo, com fundamento na necessidade de o julgador desempenhar suas atividades judicantes de forma imparcial. Nesse contexto, considerando que a previsão da prerrogativa de foro da Magistratura e do Ministério Público encontra-se descrita no mesmo dispositivo constitucional (art. 96, III, da CF/88), seria desarrazoado conferir-lhes tratamento diferenciado. STJ. 3ª Seção. CC 177.100-CE, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 08/09/2021 (Info 708). 

DECISÃO DO STF RESTRINGINDO O FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO 

Em maio de 2018, o STF decidiu restringir o foro por prerrogativa de função dos Deputados Federais e Senadores. O art. 53, § 1º e o art. 102, I, “b”, da CF/88 preveem que, em caso de crimes comuns, os Deputados Federais e os Senadores serão julgados pelo STF. Ocorre que o Supremo conferiu uma interpretação restritiva a esses dispositivos e afirmou o seguinte: O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018 (Info 900). Em outras palavras, os Deputados Federais e Senadores somente serão julgados pelo STF se: • o crime tiver sido praticado durante o exercício do mandato de parlamentar federal; e • se estiver relacionado com essa função. 

O entendimento que restringe o foro por prerrogativa de função vale para outras hipóteses de foro privilegiado ou apenas para os Deputados Federais e Senadores? 

Vale para outros casos de foro por prerrogativa de função. Foi o que decidiu o próprio STF no julgamento do Inq 4703 QO/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12/06/2018, no qual afirmou que o entendimento vale também para Ministros de Estado. O STJ também decidiu que a restrição do foro deve alcançar Governadores e Conselheiros dos Tribunais de Contas estaduais. Explico. O art. 105, I, “a”, da CF/88 prevê que compete ao STJ julgar os crimes praticados por Governadores de Estado e por Conselheiros dos Tribunais de Contas dos Estados: 

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais; 

A Corte Especial do STJ, seguindo o mesmo raciocínio do STF, limitou a amplitude do art. 105, I, “a”, da CF/88 e decidiu que: 

O foro por prerrogativa de função no caso de Governadores e Conselheiros de Tribunais de Contas dos Estados deve ficar restrito aos fatos ocorridos durante o exercício do cargo e em razão deste. Assim, o STJ é competente para julgar os crimes praticados pelos Governadores e pelos Conselheiros de Tribunais de Contas somente se estes delitos tiverem sido praticados durante o exercício do cargo e em razão deste. STJ. Corte Especial. APn 857/DF, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 20/06/2018. STJ. Corte Especial. APn 866/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/06/2018. 

O STJ disse o seguinte: 

• O STF, ao analisar o art. 102, I, da CF/88 decidiu restringir o foro por prerrogativa de função para Deputados Federais e Senadores. Em seguida, restringiu também para Ministros de Estado. A partir dessa restrição, tais autoridades somente poderão ter foro no STF em caso de crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. 

• Diante dessa decisão do STF, eu (STJ) também irei restringir o foro por prerrogativa de função para as autoridades que estão listadas no art. 105, I, “a”, da CF/88, aplicando o mesmo raciocínio. 

• O fato de a regra de competência estar prevista no texto constitucional (art. 105 da CF/88) não pode representar óbice à análise, por este STJ, de sua própria competência, sob pena de se inviabilizar, nos casos como o dos autos, o exercício deste poder-dever básico de todo órgão julgador, impedindo o imprescindível exame deste importante pressuposto de admissibilidade do provimento jurisdicional. Em palavras mais simples, a restrição da competência do art. 105 da CF/88 passa por uma nova intepretação do texto constitucional. A função precípua de interpretação à Constituição Federal é do STF. No entanto, eu (STJ), assim como todo e qualquer magistrado, também tenho a prerrogativa de interpretar as normas jurídicas, inclusive a Constituição da República. 

• Além disso, todo juiz é competente para analisar a sua própria competência (“kompetenz-kompetenz”), de forma que eu (STJ) posso interpretar o art. 105 da CF/88 para dizer se sou ou não competente para julgar determinada autoridade, podendo, assim, adotar a mesma restrição construída pelo STF. 

• O foro especial no âmbito penal é prerrogativa destinada a assegurar a independência e o livre exercício de determinados cargos e funções de especial importância, isto é, não se trata de privilégio pessoal. O princípio republicano é condição essencial de existência do Estado de Direito e impõe a supressão dos privilégios, devendo ser afastados da interpretação constitucional os princípios e regras contrários à igualdade. 

• O art. 105, I, “a”, da CF/88 consubstancia exceção à regra geral de competência, de modo que, partindose do pressuposto de que a Constituição é una, sem regras contraditórias, deve ser realizada a interpretação restritiva das exceções, com base na análise sistemática e teleológica da norma. 

• As mesmas razões fundamentais (a mesma ratio decidendi) que levaram o STF, ao interpretar o art. 102, I, “b” e “c”, da CF/88, a restringir as hipóteses de foro por prerrogativa de função devem ser também aplicadas ao art. 105, I, “a”. 

• Assim, é de se conferir ao art. 105, I, “a”, da CF/88, o mesmo sentido e alcance atribuído pelo STF ao art. 102, I, “b” e “c”, restringindo-se, desse modo, as hipóteses de foro por prerrogativa de função perante o STJ àquelas em que o crime for praticado em razão e durante o exercício do cargo ou função. 

As hipóteses de foro por prerrogativa de função perante o STJ restringem-se àquelas em que o crime for praticado em razão e durante o exercício do cargo ou função. STJ. Corte Especial. AgRg na APn 866-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/06/2018 (Info 630). 

DECISÃO QUE RESTRINGE O FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO NÃO SE APLICA PARA DESEMBARGADORES 

O art. 105, I, “a”, da CF/88 prevê que os Desembargadores dos Tribunais de Justiça são julgados criminalmente pelo STJ. O entendimento acima exposto (que restringiu o foro para crimes relacionados com o cargo) é aplicado também para os Desembargadores dos Tribunais de Justiça? Se um Desembargador praticar crime que não esteja relacionado com o exercício de suas funções (ex: lesão corporal contra a esposa), ele será julgado pelo juízo de 1ª instância? NÃO. 

O Superior Tribunal de Justiça é o tribunal competente para o julgamento nas hipóteses em que, não fosse a prerrogativa de foro (art. 105, I, da Constituição Federal), o desembargador acusado houvesse de responder à ação penal perante juiz de primeiro grau vinculado ao mesmo tribunal. Assim, mesmo que o crime cometido pelo Desembargador não esteja relacionado com as suas funções, ele será julgado pelo STJ se a remessa para a 1ª instância significar que o réu seria julgado por um juiz de primeiro grau vinculado ao mesmo tribunal que o Desembargador. A manutenção do julgamento no STJ tem por objetivo preservar a isenção (imparcialidade e independência) do órgão julgador. STJ. Corte Especial. QO na APn 878-DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 21/11/2018 (Info 639). 

É uma espécie de “exceção” ao entendimento do STJ que restringe o foro por prerrogativa de função. O STJ entendeu que haveria um risco à imparcialidade caso o juiz de 1º instância julgasse um Desembargador (autoridade que, sob o aspecto administrativo, está em uma posição hierarquicamente superior ao juiz). 

DECISÃO QUE RESTRINGE O FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO NÃO SE APLICA PARA MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João estava de passagem por Aracaju (SE) e ali praticou um crime. Vale ressaltar que João é Promotor de Justiça no Estado do Ceará. Importante também registrar que o delito por ele praticado não tem nenhuma relação com o cargo ocupado. O feito foi inicialmente distribuído ao Juízo de Direito da Vara Criminal de Aracaju (1ª instância da Justiça estadual de Sergipe). O juiz, contudo, reconheceu sua incompetência sob o fundamento de que, nos termos do art. 96, III, da Constituição Federal, compete ao Tribunal de Justiça julgar os crimes praticados por Promotores de Justiça: 

Art. 96. Compete privativamente: (...) III - aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral. 

Diante disso, o juízo da Vara Criminal de Aracaju declinou da competência em favor do Tribunal de Justiça do Ceará. O TJ/CE, entretanto, disse o seguinte: - no julgamento da AP 937 QO/RJ (acima explicada), o STF conferiu nova interpretação (restritiva) ao art. 102, I, alíneas “b” e “c”, da CF/88, fixando a competência daquela Corte para708 julgar os membros do Congresso Nacional exclusivamente quanto aos crimes praticados no exercício e em razão da função pública exercida; - pelo princípio da simetria, esta interpretação restritiva do foro por prerrogativa de função deve ser aplicada também aqui pelo Tribunal de Justiça; - logo, como o crime praticado pelo Promotor de Justiça não foi cometido em razão da função pública por ele exercida, a competência seria do juiz de 1ª instância. - diante disso, o TJ/CE suscitou conflito de competência a ser dirimido pelo STJ, nos termos do art. 105, I, “d”, da CF/88: 

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: (...) d) os conflitos de competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, “o”, bem como entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos; 

O que decidiu o STJ? A competência para julgar o crime praticado pelo Promotor de Justiça é do juízo de 1ª instância ou do Tribunal de Justiça? Do Tribunal de Justiça. 

Compete aos tribunais de justiça estaduais processar e julgar os delitos comuns, não relacionados com o cargo, em tese praticados por Promotores de Justiça. STJ. 3ª Seção. CC 177.100-CE, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 08/09/2021 (Info 708). 

De fato, o STF restringiu sua competência para julgar membros do Congresso Nacional somente nas hipóteses de crimes praticados no exercício e em razão da função pública exercida. Todavia, para o Min. Joel Ilan Paciornik, o referido precedente analisou expressamente apenas o foro por prerrogativa de função referente a cargos eletivos, haja vista que o caso concreto tratava de ação penal ajuizada em face de Deputado Federal. A Corte Especial do STJ, no julgamento da QO na APN 878/DF reconheceu sua competência para julgar Desembargadores acusados da prática de crimes com ou sem relação ao cargo, não identificando simetria com o precedente do STF. Naquela oportunidade, firmou-se a compreensão de que se Desembargadores fossem julgados por Juízo de Primeiro Grau vinculado ao Tribunal ao qual ambos pertencem, criar-se-ia, em alguma medida, um embaraço ao Juiz de carreira responsável pelo julgamento do feito. Em resumo, o STJ apontou discrímen relativamente aos magistrados para manter interpretação ampla quanto ao foro por prerrogativa de função, aplicável para crimes com ou sem relação com o cargo, com fundamento na necessidade de o julgador desempenhar suas atividades judicantes de forma imparcial. Nesse contexto, considerando que a previsão da prerrogativa de foro da Magistratura e do Ministério Público encontra-se descrita no mesmo dispositivo constitucional (art. 96, III, da CF/88), seria desarrazoado conferir-lhes tratamento diferenciado. 

DOD PLUS – INFORMAÇÕES EXTRAS 

No caso hipotético acima narrado, o crime foi praticado em Aracaju (SE). Isso significa que João será julgado pelo Tribunal de Justiça de Sergipe? 

NÃO. Ele será julgado pelo Tribunal de Justiça do Ceará. Isso porque ele é membro do Ministério Público do Estado do Ceará. O Promotor de Justiça será julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado onde atua, mesmo que o crime tenha sido cometido em outro Estado. 

Se o Promotor de Justiça praticar um crime de competência da Justiça Federal, ele será julgado pelo Tribunal Regional Federal? NÃO. Será julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado onde atua. 

E se o Promotor de Justiça praticar um crime eleitoral? 

Aí, neste caso, ele será julgado pelo Tribunal Regional Eleitoral. Trata-se de exceção à regra segundo a qual o Promotor de Justiça é sempre julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado onde atua. Confira a excelente explicação de Leonardo Barreto sobre o tema: 

“No caso de cometimento de infração penal por parte de magistrados e membros do Ministério Público que atuem em primeiro grau, tais autoridades são sempre julgadas pelo Tribunal a que estão vinculados, ressalvada apenas a competência da Justiça Eleitoral (art. 96, III, CF), pouco importando a natureza do crime que cometem. Em outros termos, se um juiz de direito estadual ou membro do Ministério Público Estadual pratica infração penal, seja ela qual for, será sempre julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado em que atua, ainda que esta infração seja de competência da Justiça Federal (art. 109 CF) e independente do lugar em que ela ocorra. Assim, por exemplo, se um juiz de direito do Estado de Minas Gerais pratica crime que viola bem, serviço ou interesse da União no Estado da Bahia, será julgado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. De outro lado, se um juiz federal ou membro do Ministério Federal pratica infração penal, seja ela qual for, será sempre julgado pelo Tribunal Regional Federal a que está vinculado, no lugar em que atua, mesmo se a infração for de competência da Justiça Estadual. Por exemplo, se um juiz federal vinculado ao TRF1 e atuante em Brasília/DF pratica contravenção penal em Porto Alegre/RS, será julgado pelo TRF1 (e não pelo TRF4). Nessa esteira, tem-se que todas estas autoridades serão julgadas pelo respectivo foro por prerrogativa de função na hipótese de cometimento de crime doloso contra a vida, e não pelo Tribunal do Júri. Por força de ressalva constitucional, se, no entanto, cometerem crime eleitoral, serão julgados pelo TRE do respectivo Estado em que atuam.” (Manual de Processo Penal. Salvador: Juspodivm, 2021, p. 592-593)

9 de novembro de 2021

FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO - As constituições estaduais não podem instituir novas hipóteses de foro por prerrogativa de função além daquelas previstas na Constituição Federal

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-1026-stf.pdf


FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO - As constituições estaduais não podem instituir novas hipóteses de foro por prerrogativa de função além daquelas previstas na Constituição Federal 

É inconstitucional norma de constituição estadual que estende o foro por prerrogativa de função a autoridades não contempladas pela Constituição Federal de forma expressa ou por simetria. STF. Plenário. ADI 6501/PA, ADI 6508/RO, ADI 6515/AM e ADI 6516/AL, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 20/8/2021 (Info 1026). 

O que é foro por prerrogativa de função? 

Trata-se de uma prerrogativa prevista pela Constituição, segundo a qual as pessoas ocupantes de alguns cargos ou funções somente serão processadas e julgadas criminalmente (não engloba processos cíveis) por determinados Tribunais (TJ, TRF, STJ, STF). 

Razão de existência 

O foro por prerrogativa de função existe porque se entende que, em virtude de determinadas pessoas ocuparem cargos ou funções importantes e de destaque, somente podem ter um julgamento imparcial e livre de pressões se forem julgadas por órgãos colegiados que componham a cúpula do Poder Judiciário. 

Onde estão previstas as regras sobre o foro por prerrogativa de função? 

Em regra, os casos de foro por prerrogativa de função são previstos na Constituição Federal. Exs: art. 102, I, “b” e “c”; art. 105, I, “a”. As Constituições estaduais podem prever casos de foro por prerrogativa de função desde que seja respeitado o princípio da simetria com a Constituição Federal. Isso significa que a autoridade estadual que “receber” o foro por prerrogativa na Constituição Estadual deve ser equivalente a uma autoridade federal que tenha foro por prerrogativa de função na Constituição Federal. Essa autorização para que as Constituições Estaduais prevejam hipóteses de foro por prerrogativa de função no TJ existe por força do art. 125, § 1º, da CF/88: 

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição. § 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça. 

Assim, à luz do disposto no art. 125, § 1º, da Constituição Federal, o constituinte estadual possui legitimidade para fixar a competência do Tribunal de Justiça e, por conseguinte, estabelecer a prerrogativa de foro às autoridades que desempenham funções similares na esfera federal. O poder dos Estados-membros de definirem, em suas constituições, a competência dos tribunais de justiça está limitado pelos princípios da Constituição Federal (arts. 25, § 1º, e 125, § 1º). A autonomia dos estados para dispor sobre autoridades submetidas a foro privilegiado não é ilimitada, não pode ficar ao arbítrio político do constituinte estadual e deve seguir, por simetria, o modelo federal. 

A Constituição Estadual pode conferir foro por prerrogativa de função para Defensores Públicos e Procuradores do Estado? NÃO. 

É inconstitucional dispositivo de Constituição Estadual que confere foro por prerrogativa de função para Defensores Públicos e Procuradores do Estado. Isso porque a Constituição Federal não confere prerrogativa de função para Defensores Públicos nem para Procuradores do Estado. Logo, a Constituição Estadual não poderia ter estendido o foro por prerrogativa de função a essas autoridades. 

Prerrogativa de função é excepcional e deve ser interpretada restritivamente 

As normas que estabelecem o foro por prerrogativa de função são excepcionais e devem ser interpretadas restritivamente, não cabendo ao legislador constituinte estadual estabelecer foro por prerrogativa de função a autoridades diversas daquelas listadas na Constituição Federal, a qual não cita Defensores Públicos nem Procuradores. Em atenção ao princípio republicano, ao princípio do juiz natural e ao princípio da igualdade, a regra geral é que todos devem ser processados pelos mesmos órgãos jurisdicionais. Apenas a fim de assegurar a independência e o livre exercício de alguns cargos, admite-se a fixação do foro privilegiado. No mesmo sentido: 

A Constituição Federal estabelece, como regra, com base no princípio do juiz natural e no princípio da igualdade, que todos devem ser processados e julgados pelos mesmos órgãos jurisdicionais. Em caráter excepcional, o texto constitucional estabelece o chamado foro por prerrogativa de função com diferenciações em nível federal, estadual e municipal. Impossibilidade de a Constituição Estadual, de forma discricionária, estender o chamado foro por prerrogativa de função àqueles que não abarcados pelo legislador federal. STF. Plenário. ADI 2553, Rel. Gilmar Mendes, Relator p/ Acórdão: Alexandre de Moraes, julgado em 15/05/2019 (Info 940). 

Procuradores da ALE e Delegados de Polícia também não podem ter foro por prerrogativa de função 

É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que confere foro por prerrogativa de função, no Tribunal de Justiça, para Procuradores do Estado, Procuradores da ALE, Defensores Públicos e Delegados de Polícia. STF. Plenário. ADI 2553/MA, Rel. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 15/5/2019 (Info 940). 

É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que confere foro por prerrogativa de função, no Tribunal de Justiça, para Procuradores do Estado, Procuradores da ALE, Defensores Públicos e Delegados de Polícia. A CF/88, apenas excepcionalmente, conferiu prerrogativa de foro para as autoridades federais, estaduais e municipais. Assim, não se pode permitir que os Estados possam, livremente, criar novas hipóteses de foro por prerrogativa de função. STF. Plenário. ADI 2553/MA, Rel. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 15/5/2019 (Info 940). 

Em suma: É inconstitucional norma de constituição estadual que estende o foro por prerrogativa de função a autoridades não contempladas pela Constituição Federal de forma expressa ou por simetria. STF. Plenário. ADI 6501/PA, ADI 6508/RO, ADI 6515/AM e ADI 6516/AL, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 20/8/2021 (Info 1026).