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21 de agosto de 2021

Termo inicial do prazo para oferecer contestação na hipótese de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/08/info-700-stj.pdf

 

IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - Qual é o termo inicial do prazo para oferecer contestação na hipótese de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015? 

O termo inicial do prazo para oferecer contestação na hipótese de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015 é a data da intimação que acolhe a impugnação. Art. 525 (...) § 1º Na impugnação, o executado poderá alegar: I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia. No caso de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015, o prazo para a apresentação de contestação se inicia somente na data em que houver a intimação da decisão do juiz que acolheu a impugnação. Esse prazo não se iniciou no momento em que o executado compareceu espontaneamente. O réu poderá esperar a decisão do juiz antes de apresentar a contestação. O art. 239, § 1º do CPC afirma que o prazo para a apresentação de contestação se inicia na data do comparecimento espontâneo do réu. Isso significa que o réu não deve ficar esperando a decisão do juiz, tendo em vista que seu prazo já começou a correr. Ocorre que o art. 239, § 1º do CPC é voltado para as hipóteses em que o réu toma conhecimento do processo ainda na sua fase de conhecimento. Esse dispositivo não se aplica para o caso em que o processo já está na fase de cumprimento de sentença. STJ. 3ª Turma. REsp 1.930.225-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 08/06/2021 (Info 700). 

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: 

GTC Ltda. ajuizou ação de cobrança em face da Supernow Ltda. Ocorre que a citação no processo de conhecimento não ocorreu no endereço correto da Supernow. Este equívoco não foi percebido durante a fase de conhecimento, tendo o processo corrido à revelia da empresa ré (art. 344 do CPC). Foi proferida sentença condenando a ré ao pagamento de determinada quantia em favor da autora. Houve o trânsito em julgado. 

Cumprimento de sentença 

A autora/credora ingressou com petição em juízo requerendo o cumprimento de sentença. O juiz determinou a intimação da Supernow para pagar a quantia em um prazo máximo de 15 dias. É necessária a intimação da devedora mesmo ela já tendo sido revel na fase de conhecimento? Sim. Mesmo que o devedor tenha sido revel, quando chegar a fase de cumprimento de sentença o juiz terá que determinar, sim, a sua intimação (STJ. 3ª Turma. REsp 1760914-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 02/06/2020). Como é feita essa intimação? Via postal, ou seja, por carta, com aviso de recebimento (AR), nos termos do art. 513, § 2º, II, do CPC. Foi expedida intimação via postal para a Supernow efetuar o pagamento da condenação. Contudo, a intimação foi encaminhada novamente para o endereço incorreto. 

Ingresso espontâneo da Supernow aos autos 

Em 02/02/2020, a Supernow soube da existência da execução por outros meios e ingressou nos autos apresentando impugnação na qual alegou apenas a nulidade da citação ocorrida ainda na fase de conhecimento. O fundamento invocado pela Supernow foi o art. 525, § 1º, I, do CPC: 

Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação. § 1º Na impugnação, o executado poderá alegar: I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia; (...) 

Vale ressaltar que a Supernow não apresentou qualquer defesa de mérito. Em 04/04/2020, o juiz acolheu o pedido e foi decretada a nulidade de citação e de todos os atos subsequentes. Diante disso, o magistrado determinou o retorno dos autos à fase de conhecimento, com a reabertura do prazo para a contestação. Em 10/04/2020, as partes foram intimadas dessa decisão. 

Agiu corretamente o juiz? 

SIM. A citação é indispensável à garantia do contraditório e da ampla defesa, sendo o vício de nulidade de citação o defeito processual mais grave no sistema processual civil brasileiro. Por essa razão, com exceção das hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido, é imperiosa a citação do réu ou do executado para a validade do processo (art. 239 do CPC/2015): 

Art. 239. Para a validade do processo é indispensável a citação do réu ou do executado, ressalvadas as hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido. 

O defeito ou inexistência da citação opera-se no plano da existência da sentença. Caracteriza-se como vício transrescisório que pode ser suscitado a qualquer tempo, inclusive após escoado o prazo para o ajuizamento da ação rescisória, mediante simples petição ou por meio de ação declaratória de nulidade (querela nullitatis). Assim, como a inexistência ou a nulidade do ato citatório é um vício muito grave, o réu poderá obter a desconstituição do título executivo tanto por meio de ação autônoma quanto incidentalmente, mediante a apresentação de impugnação. 

Qual é o termo inicial do prazo para que a ré ofereça a contestação? 

A data da intimação da decisão que acolheu a impugnação. 

O termo inicial do prazo para oferecer contestação na hipótese de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015 é a data da intimação que acolhe a impugnação. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.930.225-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 08/06/2021 (Info 700). 

Mas isso é diferente do que prevê o art. 239, § 1º do CPC... 

É verdade. Vamos verificar o que diz o art. 239, § 1º do CPC: 

Art. 239 (...) 

§ 1º O comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação, fluindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação ou de embargos à execução. 

• o que diz o art. 239, § 1º do CPC: o prazo para a apresentação de contestação se inicia na data do comparecimento espontâneo do réu. Isso significa que o réu não deve ficar esperando a decisão do juiz, tendo em vista que seu prazo já começou a correr. 

• o que disse o STJ: no caso de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015, o prazo para a apresentação de contestação se inicia somente na data em que houver a intimação da decisão do juiz que acolheu a impugnação. Esse prazo não se iniciou no momento em que o executado compareceu espontaneamente. Ele pode esperar a decisão do juiz. 

Por que o STJ não aplicou o art. 239, § 1º do CPC neste caso? 

Porque o art. 239, § 1º do CPC é voltado para as hipóteses em que o réu toma conhecimento do processo ainda na sua fase de conhecimento. Não se aplica para o caso em que já se está na fase de cumprimento de sentença. 

Mas o art. 239, § 1º fala em “comparecimento espontâneo do réu ou do executado” ... 

Quando ele fala em executado, está se referindo à execução de título extrajudicial. Isso porque na execução de título extrajudicial, o réu é citado. Por outro lado, no cumprimento de sentença, o réu é intimado (a citação já ocorreu, pelo menos em tese, na fase de conhecimento). Logo, ao tratar sobre a falta ou nulidade de citação do “executado”, deve-se entender que isso se refere apenas à execução de título extrajudicial, não abrangendo o cumprimento de sentença. 

Repito: o art. 239, § 1º do CPC não se aplica para a fase de cumprimento de sentença 

Tratando-se de sentença condenatória e instaurado o cumprimento de sentença, o executado é intimado para pagar o débito no prazo de 15 (quinze) dias (art. 523 do CPC/2015). Ao término desse lapso temporal, inicia-se o prazo para o oferecimento de impugnação ao cumprimento de sentença, independentemente de nova intimação (art. 525, caput, do CPC/2015; STJ. 3ª Turma. REsp 1761068/RS, DJe 18/12/2020). Dessa forma, o comparecimento espontâneo do executado na fase de cumprimento de sentença não supre a inexistência ou a nulidade da citação. Ao comparecer espontaneamente nessa etapa processual, o executado apenas está se dando por intimado do requerimento feito pelo credor para o cumprimento de sentença (ele não está suprindo a falta de citação da fase de conhecimento). A partir de sua entrada espontânea na fase de execução, terá início o prazo para o oferecimento de impugnação, na qual a parte poderá suscitar o vício de citação. 

Veja como ficou a conclusão do acórdão da Min. Nancy Andrighi, de acordo com a hipótese dos autos: 

“Na espécie, a ora recorrente apresentou impugnação ao cumprimento de sentença instaurado a requerimento da recorrida, mediante a qual suscitou nulidade da citação. A alegação foi acolhida pelo juízo de primeiro grau, que definiu novo prazo para oferecimento de contestação a contar da intimação dessa decisão. O Tribunal de origem, todavia, deu provimento ao recurso do recorrido, reconhecendo que o prazo para contestar iniciou a partir do comparecimento espontâneo do executado, nos termos do art. 239, § 1º, do CPC/2015. Assim, manteve a decretação da revelia. Diante da orientação definida acima, se o executado, revel na fase de conhecimento, apresentar impugnação com fundamento no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015 e esta for acolhida, o prazo para apresentar defesa inicia-se a partir da intimação dessa decisão, não se aplicando o dispositivo legal invocado no acórdão recorrido.” 

Desse modo, o STJ reformou o acórdão do Tribunal de origem e restabeleceu a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau. 

Não será necessário que o autor/credor faça qualquer ato novo pedindo a citação do réu 

Vale ressaltar, por fim, que, acolhida a impugnação feita pelo réu de que houve vício de citação, o prazo para oferecer contestação já se inicia, como vimos, a partir da intimação dessa decisão. Não é necessário, portanto, que o exequente promova a citação válida do réu. Isso com base nos princípios da instrumentalidade das formas e na ideia de duração razoável do processo. 

Em suma: O termo inicial do prazo para oferecer contestação na hipótese de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015 é a data da intimação que acolhe a impugnação. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.930.225-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 08/06/2021 (Info 700). 

7 de julho de 2021

O prazo de cumprimento da obrigação de fazer possui natureza processual, devendo ser contado em dias úteis

Processo

REsp 1.778.885-DF, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 15/06/2021, DJe de 21/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Cumprimento de sentença. Obrigação de fazer. Cômputo do prazo. Natureza processual. Dias úteis. Art. 219 do CPC.

 

Destaque

O prazo de cumprimento da obrigação de fazer possui natureza processual, devendo ser contado em dias úteis.

Informações do Inteiro Teor

O Superior Tribunal de Justiça, ao examinar a natureza do prazo fixado para o cumprimento das obrigações de pagar quantia certa, concluiu que "a intimação para o cumprimento de sentença, independentemente de quem seja o destinatário, tem como finalidade a prática de um ato processual, pois, além de estar previsto na própria legislação processual (CPC), também traz consequências para o processo, caso não seja adimplido o débito no prazo legal, tais como a incidência de multa, fixação de honorários advocatícios, possibilidade de penhora de bens e valores, início do prazo para impugnação ao cumprimento de sentença, dentre outras. E, sendo um ato processual, o respectivo prazo, por decorrência lógica, terá a mesma natureza jurídica, o que faz incidir a norma do art. 219 do CPC/2015, que determina a contagem em dias úteis" (REsp 1.708.348/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 25/6/2019, DJe 1º/8/2019).

A mesma ratio contida no precedente indicado acima deve ser aplicada ao momento a partir do qual se considera que houve o descumprimento das obrigações de fazer constantes do título judicial. Ainda que a prestação de fazer seja ato a ser praticado pela parte, não se pode desconsiderar a natureza processual do prazo judicial fixado para o cumprimento da sentença, o que atrai a incidência da regra contida no art. 219 do CPC.

Não se desconsidera que essa questão é controversa na doutrina. No entanto, a melhor interpretação é conferida por aqueles que defendem a contagem do prazo em dias úteis.



8 de junho de 2021

O termo inicial de contagem dos prazos processuais, em caso de duplicidade de intimações eletrônicas, dá-se com a realizada pelo portal eletrônico, que prevalece sobre a publicação no Diário da Justiça (DJe).

 EAREsp 1.663.952-RJ, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, por maioria, julgado em 19/05/2021.

Processo eletrônico. Lei n. 11.419/2006. Duplicidade de intimações. Contagem dos prazos processuais. Termo inicial. Portal Eletrônico. Prevalência.

O termo inicial de contagem dos prazos processuais, em caso de duplicidade de intimações eletrônicas, dá-se com a realizada pelo portal eletrônico, que prevalece sobre a publicação no Diário da Justiça (DJe).


A controvérsia cinge-se a aferir o termo inicial de contagem dos prazos processuais quando houver duplicidade das intimações eletrônicas previstas na Lei n. 11.419/2006 (Lei do Processo Eletrônico), mais especificamente as intimações ocorridas no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) e no Portal Eletrônico.

A respeito da temática, coexistem nesta Corte Superior três vertentes jurisprudenciais.

A corrente jurisprudencial defensora de que, se ambas as formas de intimações forem feitas em relação ao mesmo ato processual, deve prevalecer a realizada no Diário da Justiça Eletrônico, afirma que a própria Lei do Processo Eletrônico, no § 2º do art. 4º, estabelece que a publicação dos atos judiciais e administrativos, realizada no Diário da Justiça eletrônico, disponibilizado em sítio da rede mundial de computadores, substitui qualquer outro meio e publicação oficial, para quaisquer efeitos legais, exceto nos casos que, por lei, se exigir intimação ou vista pessoal.

A corrente jurisprudencial que defende deva prevalecer a intimação realizada pelo Portal Eletrônico salienta que, nos termos do art. 5º da Lei do Processo Eletrônico, as intimações feitas por meio eletrônico em portal próprio a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico. Argumenta-se, ademais, que o Novo Código de Processo Civil, no art. 270, prestigia o meio eletrônico, como forma preferencial de comunicação dos atos processuais, e que a intimação pela publicação em órgão oficial deve ser utilizada de forma subsidiária à intimação eletrônica em face do disposto no art. 272 do NCPC.

Por sua vez, a terceira corrente jurisprudencial, segundo a qual, havendo duplicidade de intimações, deve prevalecer a primeira validamente efetuada, alicerça-se no fundamento de que, para todos os efeitos, as partes e seus advogados tomam ciência do ato judicial ou administrativo logo na primeira intimação oficialmente realizada, que, normalmente, costuma ser a publicação da imprensa eletrônica, podendo a partir de então recorrer ou promover o ato processual adequado. Portanto, não é concebível que se aguarde a ultimação da outra intimação para se considerar devidamente cientificado.

Na sequência, convém diferenciar os dois tipos de comunicação dos atos processuais previstos na Lei do Processo Eletrônico, que aqui estão em debate - intimação pelo Portal Eletrônico e intimação pelo Diário da Justiça Eletrônico.

De um lado, a intimação pelo Diário Eletrônico de Justiça envolve a inserção da informação em diário publicado periodicamente. O servidor insere a informação no jornal eletrônico do Tribunal, o qual é disponibilizado, em regra, ao final do dia. Há regra específica segundo a qual a publicação do ato judicial é considerada no dia seguinte ao da disponibilização, marcando o começo dos prazos processuais. Os prazos são contados com a exclusão do dia do começo e com a inclusão do dia do término. Logo, o primeiro dia do prazo ocorre apenas no dia seguinte ao considerado como data da publicação.

De outro lado, a intimação pelo Portal Eletrônico implica o envio da comunicação por intermédio de um sistema eletrônico de controle de processos, cada vez mais utilizado no âmbito do Poder Judiciário. A comunicação do ato processual ocorre "por dentro" do sistema informatizado. O advogado, devidamente cadastrado, acessa o processo judicial eletrônico e é intimado. Há um prazo de dez (10) dias para acesso à informação. Após o envio da intimação pelo processo judicial eletrônico, a parte tem dez (10) dias para consultar o teor da informação. Caso consulte a informação dentro desse lapso temporal, o ato judicial será considerado publicado no dia da consulta, dando-se início ao cômputo do prazo a partir do primeiro dia subsequente. Caso não consulte nos dez (10) dias previstos, a intimação será automática, de maneira que será considerada realizada na data do término desse prazo, independentemente de consulta, iniciando-se, a seguir, a contagem do prazo processual.

A respeito desta modalidade de notificação dos atos judiciais, estabelece o aludido art. 5º da Lei do Processo Eletrônico que as intimações feitas por meio de Portal Eletrônico dispensam a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico.

Dito isso e partindo-se da premissa de que, diante de procedimento do próprio Poder Judiciário que cause dúvida, como no caso de duplicidade de intimações válidas, não pode a parte ser prejudicada - mormente porque, em tais circunstâncias, cria-se uma incerteza no tocante ao exato termo inicial para contagem dos prazos processuais -, considera-se que a melhor exegese é a que faz prevalecer a intimação no Portal Eletrônico em detrimento da tradicional intimação por Diário da Justiça, ainda que atualmente esta também seja eletrônica.

Com efeito, levando-se em consideração os princípios da boa-fé processual, da confiança e da não surpresa, atinentes ao Direito Processual, deve a norma ser interpretada da forma mais favorável à parte, a fim de se evitar prejuízo na contagem dos prazos processuais.

Se a própria Lei do Processo Eletrônico criou essa forma de intimação, dispensando qualquer outra, e tornou este mecanismo hábil a promover, inclusive, as intimações pessoais dos entes que possuem tal prerrogativa, não há como afastar a conclusão de que esta regerá o prazo naturalmente em relação ao advogado que esteja cadastrado no sistema eletrônico. Há, pois, uma presunção de validade, que leva a exigir do Poder Judiciário comportamento condizente com os ditames legais e com a boa-fé processual.

Desse modo, entende-se que sempre que a modalidade de intimação pelo Portal Eletrônico (art. 5º da Lei n. 11.419/2006) for prevista e aplicável em determinado Tribunal para os advogados devidamente cadastrados, deve esta prevalecer sobre a tradicional intimação pelo DJe.

8 de maio de 2021

REsp 1.770.863-PR: DOS PRAZOS PROCESSUAIS E SUAS CONSEQUÊNCIAS

Prazo é fração de tempo, situada entre dois termos, inicial e final, em que deve ser praticado um determinado ato. 

Sob o prisma dos elementos do processo (relação jurídica processual e procedimento), os prazos processuais destinam-se aos sujeitos envolvidos na relação jurídica correspondente, fixando faculdades e impondo-lhes, como consequência, ônus de atuação, cujo cumprimento ou descumprimento acarreta a sucessão das posições processuais. Com efeito, a prática ou a omissão de determinado ato processual dentro do prazo apropriado acarreta o fenômeno da preclusão temporal, definida por CARREIRA ALVIM como “fato impeditivo, destinado a garantir o avanço gradual do processo, evitando recuo a fases já superadas do procedimento” (Teoria Geral do Processo. 21ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2018, livro digital, sem destaque no original). 

O ponto nodal da caracterização de um prazo como processual é, pois, além de sua referência à relação jurídica processual – autônoma em relação à de direito material – sua estreita ligação com a preclusão e, por sua vez, com o procedimento e o princípio do impulso processual. Os prazos processuais se colocam, pois, à disposição da “regra segundo a qual a passagem de um ato processual para outro supõe o encerramento do anterior, de tal forma que os atos já praticados permaneçam firmes e inatacáveis” (CINTRA, Antônio Carlos Araújo (et. al.)., Op. cit., sem destaque no original). 

O prazo processual tem, portanto, sob a vertente objetiva, a consequência de a garantir o avanço progressivo da relação processual e a obstar ao seu recuo para as fases anteriores do procedimento, e sob a subjetiva, a aquisição ou perda, pela parte que tinha o ônus de praticar um determinado ato, de uma faculdade ou de um poder ou direito processual. Dessa forma, a natureza processual de um determinado prazo é determinada pela ocorrência de consequências endo-processuais do ato a ser praticado nos marcos temporais definidos, modificando a posição da parte na relação jurídica processual e impulsionando o procedimento à fase seguinte.

REsp 1.770.863-PR: DA DISTINÇÃO ENTRE PRAZOS MATERIAIS E PRAZOS PROCESSUAIS

DA DISTINÇÃO ENTRE PRAZOS MATERIAIS E PRAZOS PROCESSUAIS 

Após a vigência do CPC/15 e em decorrência da previsão do art. 219, parágrafo único, do citado diploma legal, esta Corte vem sendo instada a definir a natureza de determinados prazos, a fim de estabelecer como deve ser realizada sua contagem, se em dias corridos ou em dias úteis. 

Esse questionamento foi suscitado, por exemplo, quanto aos prazos de suspensão das ações executivas e para a apresentação do plano de recuperação judicial, previstos na Lei de Falências e Recuperações de Empresas – conforme decidido nos autos do REsp 1699528/MG, Quarta Turma, DJe 13/06/2018 – e ao prazo para o pagamento voluntário do débito no cumprimento de sentença – REsp 1708348/RJ, Terceira Turma, DJe 01/08/2019. 

Em referidas ocasiões, foi identificada uma dificuldade conceitual nos critérios para a distinção da natureza jurídica dos prazos, porquanto “não existi[ria] entendimento teórico satisfatório, com critério seguro e científico para tais discriminações” (REsp 1699528/MG, Quarta Turma, DJe 13/06/2018). 

1.1. DAS BALIZAS CONCEITUAIS OFERECIDAS PELA DOUTRINA 

A doutrina, especialmente a processual civil, tem, todavia, contribuído para o oferecimento de parâmetros para a definição da natureza jurídica instrumental ou substancial das normas e, por consequência, dos prazos nelas previstos. O principal fator citado por referida doutrina pode ser denominado ôntico-ontológico, haja vista estar relacionado à essência, às características fundamentais dos direitos regulamentados pelas normas. 

De fato, na linha de CARREIRA ALVIM, 

“normas materiais ou substanciais são aquelas que disciplinam diretamente as relações de vida, procurando compor conflitos de interesses entre os membros da comunidade social, bem como regular e organizar funções socialmente úteis” (Teoria Geral do Processo, Rio de Janeiro: Forense, 2015, livro digital). 

De outro lado, segundo o referido autor, as normas processuais regulamentariam apenas aspectos instrumentais, relacionados à uma atividade específica e eventual de uma particular relação jurídica autônoma à do direito material. Com efeito, “em sentido amplo, as normas processuais são todas aquelas que disciplinam a atividade do Estado-juiz e das partes litigantes, bem assim o modo como essa atividade se desenvolve no processo” (Idem, ibidem, sem destaque no original). 

Em acréscimo, com o propósito de caracterizar uma determinada norma como processual, e em aprofundamento da distinção, a doutrina processual civil oferece um segundo critério, agora teleológico. 

De fato, segundo NELSON NERY e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, um determinado prazo será processual se a “destinação [da norma se relacionar à] prática de ato processual, que é o que deve ser praticado no, em razão do ou para o processo” (Código de Processo Civil comentado. 17 ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 1.465, sem destaque no original)

AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA. ART. 3º, § 2º, DO DECRETO-LEI 911/69. PRAZO. NATUREZA JURÍDICA. CRITÉRIO. CONSEQUÊNCIAS ENDO-PROCESSUAIS. AUSÊNCIA. CONTAGEM. DIAS CORRIDOS. ART. 219, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/15

RECURSO ESPECIAL Nº 1.770.863 - PR (2018/0256845-9) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA. ART. 3º, § 2º, DO DECRETO-LEI 911/69. PRAZO. NATUREZA JURÍDICA. CRITÉRIO. CONSEQUÊNCIAS ENDO-PROCESSUAIS. AUSÊNCIA. CONTAGEM. DIAS CORRIDOS. ART. 219, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/15. 

1. Cuida-se de ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente, em razão da mora no pagamento das prestações do financiamento. 

2. Recurso especial interposto em: 28/02/2018; conclusos ao gabinete em: 25/10/2018. Aplicação do CPC/15. 

3. O propósito recursal consiste em determinar se o prazo de cinco dias previsto no art. 3º, § 2º, do Decreto-Lei 911/69 para pagamento a integralidade da dívida pendente pelo devedor possui natureza processual ou material, sendo, pois, sob a égide do CPC/15, contado em dias úteis ou corridos. 

4. A doutrina processual civil oferece dois principais critérios para a definição da natureza material ou processual das normas jurídicas: i) um primeiro ligado às características fundamentais dos direitos regulamentados pelas normas; ii) o segundo, ligado à finalidade com que o ato deve ser praticado. 

5. Pelo princípio da instrumentalidade do processo, o direito processual é, a um só tempo, um ramo jurídico autônomo, mas também um instrumento específico de atuação a serviço do direito material, haja vista que seus institutos básicos (jurisdição, ação, exceção, processo) são concebidos e se justificam para garantir a efetividade do direito substancial ou material. 

6. O processo se compõe de dois elementos: a) a relação processual, composta pelas inúmeras posições jurídicas ativas e passivas que se sucedem do início ao fim do processo; e b) o procedimento, caracterizado pela progressão e sucessão de eventos que constituam, modifiquem ou extingam situações jurídicas processuais. 

7. Sob esse prisma, os prazos processuais destinam-se aos sujeitos envolvidos na relação jurídica correspondente, fixando faculdades e impondo-lhes, como consequência, ônus de atuação, cujo cumprimento ou descumprimento acarreta a sucessão das posições e fases processuais, em decorrência da preclusão temporal. 

8. A natureza processual de um determinado prazo é determinada pela ocorrência de consequências endo-processuais do ato a ser praticado nos marcos temporais definidos, modificando a posição da parte na relação jurídica processual e impulsionando o procedimento à fase seguinte. 

9. Como o pedido da ação de busca e apreensão é (i) reipersecutório e (ii) declaratório da consolidação da propriedade (seja pela procedência, seja pela perda de objeto), o pagamento da integralidade da dívida, previsto no art. 3º, § 2º, do Decreto-Lei 911/69 é ato jurídico não processual, pois não se relaciona a ato que deve ser praticado no, em razão do ou para o processo, haja vista não interferir na relação processual ou mesmo na sucessão de fases do procedimento da ação de busca e apreensão. 

10. O prazo para pagamento art. 3º, § 2º, do Decreto-Lei 911/69 deve ser considerado de direito material, não se sujeitando, assim, à contagem em dias úteis, prevista no art. 219, caput, do CPC/15. 

11. Na hipótese concreta, o curso do prazo para pagamento integral teve início no dia 10/06/2016, tendo seu termo final ocorrido no dia 14/06/2016. O pedido reipersecutório da ação de busca e apreensão deve ser, pois, julgado procedente, em razão da consolidação da propriedade no nome da credora recorrente, ocorrida na citada data em que o prazo para pagamento veio a termo, sem a prática do ato de direito material correspondente 

12. Recurso especial provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 09 de junho de 2020(Data do Julgamento)

7 de maio de 2021

ANDAMENTO PROCESSUAL DISPONIBILIZADO PELA INTERNET. VENCIMENTO DO PRAZO RECURSAL INDICADO DE FORMA EQUIVOCADA NO ANDAMENTO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. ERRO ALHEIO À VONTADE DA PARTE. CONSIDERAÇÃO PARA FINS DA CONTAGEM DE PRAZO. POSSIBILIDADE. JUSTA CAUSA PARA PRORROGAÇÃO DO PRAZO RECURSAL. ART. 183, §§ 1º E 2º, DO CPC/1973. PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E DA CONFIANÇA.

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 688.615 - MS (2015/0072668-1) 

RELATOR : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3/STJ. ANDAMENTO PROCESSUAL DISPONIBILIZADO PELA INTERNET. VENCIMENTO DO PRAZO RECURSAL INDICADO DE FORMA EQUIVOCADA NO ANDAMENTO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. ERRO ALHEIO À VONTADE DA PARTE. CONSIDERAÇÃO PARA FINS DA CONTAGEM DE PRAZO. POSSIBILIDADE. JUSTA CAUSA PARA PRORROGAÇÃO DO PRAZO RECURSAL. ART. 183, §§ 1º E 2º, DO CPC/1973. PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E DA CONFIANÇA. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. 

1. A divulgação do andamento processual pelos Tribunais por meio da internet passou a representar a principal fonte de informação dos advogados em relação aos trâmites do feito. A jurisprudência deve acompanhar a realidade em que se insere, sendo impensável punir a parte que confiou nos dados assim fornecidos pelo próprio Judiciário. Ainda que não se afirme que o prazo correto é aquele erroneamente disponibilizado, desarrazoado frustrar a boa-fé que deve orientar a relação entre os litigantes e o Judiciário. Por essa razão o art. 183, §§ 1º e 2º, do CPC determina o afastamento do rigorismo na contagem dos prazos processuais quando o descumprimento decorrer de fato alheio à vontade da parte. (REsp 1324432/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 17/12/2012, DJe 10/05/2013). 

2. Embargos de divergência providos. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da CORTE ESPECIAL do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: "A Corte Especial, por unanimidade, conheceu dos embargos de divergência e deu-lhes provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. " Os Srs. Ministros Raul Araújo, Francisco Falcão, Nancy Andrighi, Laurita Vaz, Herman Benjamin, Jorge Mussi e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator. Impedido o Sr. Ministro Benedito Gonçalves. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Humberto Martins, Maria Thereza de Assis Moura, Napoleão Nunes Maia Filho, Og Fernandes e Paulo de Tarso Sanseverino. Licenciado o Sr. Ministro Felix Fischer. 

Brasília (DF), 04 de março de 2020.. 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator): Trata-se de embargos de divergência opostos por Maria Martins de Paula contra acórdão da Terceira Turma que, negando provimento ao agravo regimental, manteve a decisão proferida pela Presidência deste Tribunal e não conheceu do recurso especial por suposta intempestividade, cuja ementa é a seguinte: 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO CPC/73. SUSPENSÃO DOS PRAZOS PROCESSUAIS NO TRIBUNAL LOCAL. COMPROVAÇÃO POR DOCUMENTO IDÔNEO. AUSÊNCIA. TEMPESTIVIDADE NÃO EVIDENCIADA. CÓPIA EXTRAÍDA DA INTERNET. DADOS PROCESSUAIS. MERAMENTE INFORMATIVOS. DECISÃO MANTIDA. 1. Inaplicabilidade do NCPC a este julgamento ante os termos do Enunciado Administrativo nº 2 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, vigente à época do CPC/73, eventual suspensão do prazo recursal, decorrente de ausência de expediente ou de recesso forense, feriados locais, entre outros, nos Tribunais de Justiça, poderia ser comprovada em agravo, desde que por documento idôneo. 3. A simples juntada de cópia de informações extraídas da internet não tem o condão, por si só, de comprovar a interposição tempestiva do recurso. 4. Conforme a jurisprudência do STJ, os dados processuais disponibilizados pela internet são meramente informativos, de modo que eventuais omissões ou equívocos em relação ao andamento processual não configuram justa causa para devolução de prazos processuais, devendo o patrono da parte acompanhar as publicações oficiais. 5. Agravo regimental não provido. 

Sustenta-se, em síntese, que a perda do prazo processual ocorreu por "ato culposo do Tribunal a quo", pois 

em seu movimento processual disponibilizado em seu sítio virtual mantido junto à internet, o Tribunal a quo inseriu informação que o vencimento do prazo recursal para a interposição de recurso as Cortes Superiores se daria no dia 10/12/2014, e não no dia 09/012/2104. [...] a própria Corte Especial deste c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.324.432/SC, de relatoria do Min. Herman Benjamin, ocorrido em 17/12/2012, publicado no DJe de 10/05/2013 e na RDDP vol. 124, pág. 159 1, posicionou-se no sentido de que as informações sobre o “andamento processual” proveniente dos sites dos tribunal, por se tratar de fonte oficial, especialmente a partir da Lei nº 11.419/2006, não podem servir de meio para confundir ou punir as partes, levando-as a comportamentos equivocados e prejudiciais a seus interesses formais e materiais, conduzindo-as à perda de oportunidades processuais preclusivas. No caso analisado pela Corte Especial, fora afastada a intempestividade declarada nas instâncias inferiores de embargos à execução proposto pela parte segundo o prazo previsto no andamento processual disponibilizado pelo tribunal na rede mundial de computados, que se encontrava errada. 

Não foi apresentada impugnação. 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator): Inicialmente é necessário consignar que o presente recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo nº 3/STJ: "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC". 

Razão assiste à parte embargante. 

Anota a doutrina que o direito processual se ocupava dos registro escrito, feitos com "tinta escura e indelével" (art. 169, caput, do CPC/1973). As formas e atos processuais, no ambiente virtual, são percebidas diferentemente. "O modo de consultar e cotejar informações é diverso e, evidentemente, o modo como as informações são apreendidas pelo intérprete também o são [...]: o virtual, que não se opõe ao real, mas ao atual." (MEDINA, José Miguel Garcia. Curso de Direito Processual Civil Moderno. 4.ed. em e-book. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018). 

A prática e a comunicação oficial dos atos processuais por meios eletrônicos pode vir a representar na modernização do Poder Judiciário, "contribuindo, assim, para a diminuição da quantidade enorme de papéis, que, literalmente, abarrotam o fórum e dificultam, em muito, a agilidade da prestação da tutela jurisdicional" (ALVIM, Arruda. Manual de Direito Processual Civil. 2.ed. em e-book. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017). 

O acórdão ora embargado, proferido pela Terceira Turma, manteve a intempestividade do recurso especial alegando que as informações constantes do andamento processual, disponíveis no sítio eletrônico do Tribunal de origem, seriam meramente informativas, razão pela qual não poderiam ser utilizadas para prorrogação ou devolução do prazo recursal. Destacam-se os seguintes trechos do voto condutor do acórdão embargado (e-STJ fls. 358/360): 

Na hipótese, não foi colacionado documento hábil ou certidão do Tribunal de origem comprovando a alegada tempestividade do recurso. A simples juntada de cópia de informações extraídas da internet não tem o condão, por si só, de comprovar a interposição tempestiva do recurso. Sobre o tema, confiram-se os precedentes: [...] Outrossim, conforme a jurisprudência do STJ, os dados processuais disponibilizados pela internet são meramente informativos, de modo que eventuais omissões ou equívocos em relação ao andamento processual não configuram justa causa para devolução de prazos processuais, devendo o patrono da parte acompanhar as publicações oficiais. A propósito, seguem os precedentes: [...] Não se pode, pois, considerar comprovada a tempestividade do recurso especial. Verifica-se que o aresto recorrido foi publicado no DJe aos 14/11/2014 (segunda-feira, e-STJ, fl. 265). O recurso especial foi protocolado aos 10/12/2014 (quarta-feira - e-STJ, fl. 266), superando o prazo de 15 dias previsto no art. 508 do CPC/73, sendo, dessa forma, intempestiva a insurgência. 

Nos embargos de divergência, argui-se que 

o posicionamento adotado no julgado ora embargado, restou claro a existência de divergência em face de julgamento de outra composição deste c. Superior Tribunal de Justiça. Segundo o acórdão embargado, a informação errônea acerca do prazo final para a interposição de recurso contida no andamento do processo mantido em página virtual do próprio Tribunal a quo não serviria como meio de comprovar a justa causa para afastar a intempestividade do recurso, porque meramente informativa. Eventuais equívocos ou omissões no andamento virtual do processo mesmo que ocasionado pelo Tribunal de Justiça ou Regional responsável pelas informações inseridas não configuram justa causa a parte que, porventura, venha a interpor recurso além do prazo previsto. Entretanto, a própria Corte Especial deste c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.324.432/SC, de relatoria do Min. Herman Benjamin, ocorrido em 17/12/2012, publicado no DJe de 10/05/2013 e na RDDP vol. 124, pág. 159 1 , posicionou-se no sentido de que as informações sobre o “andamento processual” proveniente dos sites dos tribunal, por se tratar de fonte oficial, especialmente a partir da Lei nº 11.419/2006, não podem servir de meio para confundir ou punir as partes, levando-as a comportamentos equivocados e prejudiciais a seus interesses formais e materiais, conduzindo-as à perda de oportunidades processuais preclusivas. No caso analisado pela Corte Especial, fora afastada a intempestividade declarada nas instâncias inferiores de embargos à execução proposto pela parte segundo o prazo previsto no andamento processual disponibilizado pelo tribunal na rede mundial de computados, que se encontrava errada. 

O acórdão paradigma, proferido pela Corte Especial no REsp nº 1.324.432/SC, admitiu o uso das informações constantes do andamento processual disponíveis no sítio eletrônico do Tribunal de origem para aferição da tempestividade quando constatado erro na informação divulgada, hipótese em que se faz presente a justa causa para prorrogação do prazo, conforme regra prevista no art. 183, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, em homenagem aos princípios da boa-fé e da confiança. Destacam-se os seguintes trechos do voto condutor de referido acórdão (e-STJ fls. 383/386): 

Discute-se a tempestividade dos Embargos à Execução apresentados pelo Município. A sentença, mantida pelo TJ-SC, entendeu pela intempestividade, pois o mandado de citação foi juntado aos autos em 16.6.2010, de modo que o prazo de 30 dias terminou em 16.7.2010, mas a petição foi protocolada apenas em 20.7.2010 (fl. 50). O Município defende que deve ser considerada a data indicada no sistema de acompanhamento processual fornecido pelo próprio Judiciário estadual pela internet, segundo o qual o mandado teria sido juntado aos autos somente em 18.6.2010 (sexta-feira), de modo que o prazo de 30 dias teria se iniciado apenas em 21.6.2010 e terminado exatamente no dia do protocolo da petição de Embargos à Execução (20.7.2010). A Corte Estadual afastou a tese, afirmando que a disponibilização do prazo via internet tem caráter meramente informativo (fls. 50-51). O recorrente tem razão. A disponibilização do andamento processual pelos Tribunais por meio da internet passou a representar a principal fonte de informação dos advogados em relação aos trâmites do processo. A jurisprudência, coerentemente, deve acompanhar a realidade em que se insere, sendo impensável punir a parte que confiou nos dados assim fornecidos pelo próprio Judiciário. Ainda que não se afirme que o prazo correto é aquele erroneamente disponibilizado pela internet, não é razoável frustrar a boa-fé que deve orientar a relação entre os litigantes e o Judiciário. Por essa razão o art. 183, §§ 1º e 2º, do CPC, cuja aplicação foi implicitamente recusada pelo TJ-SC, determina o afastamento do rigorismo na contagem dos prazos processuais quando o descumprimento decorre de fato que não dependeu da vontade da parte: Art. 183. Decorrido o prazo, extingue-se, independentemente de declaração judicial, o direito de praticar o ato, ficando salvo, porém, à parte provar que o não realizou por justa causa. § 1º Reputa-se justa causa o evento imprevisto, alheio à vontade da parte, e que a impediu de praticar o ato por si ou por mandatário. § 2º Verificada a justa causa o juiz permitirá à parte a prática do ato no prazo que lhe assinar. No caso em discussão, é bom relembrar, o descumprimento não é alheio à vontade da parte, mas decorreu diretamente do aparente erro cometido pelo Judiciário. [...] Não desconheço os precedentes em sentido contrário da Corte Especial, que são adotados em julgados de outros colegiados do STJ, inclusive da Segunda Turma (v.g. AgRg no REsp 780.478/DF, de minha relatoria, j. 2.12.2008, DJe 13.3.2009; REsp 644.231/PA, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 9.9.2008, DJe 13.10.2008). Ocorre que o julgado mais recente da Corte Especial é de 29.6.2007 (AgRg EREsp 514.412/DF, rel. Min. Luiz Fux, DJ 20.8.2007), como consta do Comparativo de Jurisprudência do STJ. Parece-me que a ampliação constante do uso da internet pelos operadores do Direito, especialmente em relação aos sistemas informativos de andamento processual disponibilizados pelos Tribunais, sugere a revisão desse entendimento, em atenção à boa-fé objetiva que deve orientar a relação entre o Poder Público e os cidadãos, acolhida pela disposição do art. 183, §§ 1º e 2º, CPC. Ainda que os dados disponibilizados pela internet sejam "meramente informativos" e não substituam a publicação oficial (fundamento dos precedentes em contrário), isso não impede reconhecer que houve justa causa no descumprimento do prazo recursal pelo litigante (art. 183, caput, do CPC), induzido por erro cometido pelo próprio Tribunal. 

Eis a ementa do julgado: 

PROCESSUAL CIVIL. ANDAMENTO PROCESSUAL DISPONIBILIZADO PELA INTERNET. CONTAGEM DE PRAZO. BOA-FÉ. ART. 183, §§ 1º E 2º, DO CPC. APLICAÇÃO. 1. Hipótese em que as instâncias de origem entenderam que os Embargos à Execução são intempestivos, desconsiderando a data indicada no acompanhamento processual disponível na internet. 2. A divulgação do andamento processual pelos Tribunais por meio da internet passou a representar a principal fonte de informação dos advogados em relação aos trâmites do feito. A jurisprudência deve acompanhar a realidade em que se insere, sendo impensável punir a parte que confiou nos dados assim fornecidos pelo próprio Judiciário. 3. Ainda que não se afirme que o prazo correto é aquele erroneamente disponibilizado, desarrazoado frustrar a boa-fé que deve orientar a relação entre os litigantes e o Judiciário. Por essa razão o art. 183, §§ 1º e 2º, do CPC determina o afastamento do rigorismo na contagem dos prazos processuais quando o descumprimento decorrer de fato alheio à vontade da parte. 4. A Terceira Turma do STJ vem adotando essa orientação, com base não apenas no art. 183 do CPC, mas também na própria Lei do Processo Eletrônico (Lei 11.419/2006), por conta das "Informações processuais veiculadas na página eletrônica dos tribunais que, após o advento da Lei n.º 11.419/06, são consideradas oficiais" (trecho do voto condutor do Min. Paulo de Tarso Sanseverino, no REsp 960.280/RS, DJe 14.6.2011). 5. Não desconheço os precedentes em sentido contrário da Corte Especial que são adotados em julgados de outros colegiados do STJ, inclusive da Segunda Turma. 6. Ocorre que o julgado mais recente da Corte Especial é de 29.6.2007 (AgRg nos EREsp 514.412/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 20.8.2007), como consta do Comparativo de Jurisprudência do STJ. 7. Parece-me que a ampliação constante do uso da internet pelos operadores do Direito, especialmente em relação aos informativos de andamento processual colocados à disposição pelos Tribunais, sugere a revisão desse entendimento, em atenção à boa-fé objetiva que deve orientar a relação entre o Poder Público e os cidadãos, acolhida pela previsão do art. 183, §§ 1º e 2º, do CPC. 8. Ainda que os dados disponibilizados pela internet sejam "meramente informativos" e não substituam a publicação oficial (fundamento dos precedentes em contrário), isso não impede que se reconheça ter havido justa causa no descumprimento do prazo recursal pelo litigante (art. 183, caput, do CPC), induzido por erro cometido pelo próprio Tribunal. 9. Recurso Especial provido. (REsp 1324432/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 17/12/2012, DJe 10/05/2013). 

No presente caso, o acórdão proferido nos embargos de declaração foi publicado em 24/11/2014 (e-STJ fl. 265), iniciando-se o prazo para a interposição do recurso especial em 25/11/2014, com término no dia 09/12/2014. 

Entretanto, o Tribunal de origem indicou no andamento processual dos embargos de declaração o vencimento do prazo no dia 10/12/2014, conforme andamento juntado quando da interposição do agravo regimental e acostado às e-STJ fls. 335/336. 

Nota-se, pois, que a informação equivocadamente disponibilizada pelo Tribunal de origem pode ter induzido a erro a parte ora embargante, não sendo razoável que seja prejudicada por fato alheio a sua vontade. 

Logo, deve ser admitido, de forma excepcional, a informação constante do andamento processual disponibilizado pelo Tribunal de origem para aferição da tempestividade do recurso, em homenagem aos princípios da boa-fé e da confiança. 

Diante do exposto, dou provimento aos embargos de divergência para reconhecer a tempestividade do recurso especial interposto, determinando-se a devolução dos autos à Terceira Turma para prosseguimento na análise do recurso. 

É como voto. 

TEMPESTIVIDADE. PREVALÊNCIA DA INTIMAÇÃO ELETRÔNICA SOBRE A PUBLICAÇÃO NO DJE.

AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.330.052 - RJ (2018/0179952-1) 

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TEMPESTIVIDADE. PREVALÊNCIA DA INTIMAÇÃO ELETRÔNICA SOBRE A PUBLICAÇÃO NO DJE. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC/2015. RECONHECIMENTO. 

1. A Lei nº 11.419/2006 - que dispôs sobre a informatização do processo judicial - previu que as intimações serão realizadas por meio eletrônico em portal próprio, dispensando-se a publicação no órgão oficial. 

2. O Código de Processo Civil/2015 avançou ao delimitar o tema, prevendo, em seu artigo 272, que, quando não realizadas por meio eletrônico, consideram-se feitas as intimações pela publicação dos atos no órgão oficial. 

3. A partir da perquirição dos dispositivos legais que referenciam o tema, resta evidente que a mens legis pretendeu deixar claro que a regra em relação à comunicação dos atos processuais aos advogados ocorre mediante a intimação por via eletrônica, valorizando-se a informatização dos processos judiciais. 

4. Verifica-se que a melhor hermenêutica subsume-se à prevalência da intimação eletrônica sobre a publicação no Diário de Justiça, entendimento em sintonia com o novel Código de Processo Civil. 

5. A referida interpretação protege a confiança dos patronos e jurisdicionados aos atos praticados pelo Poder Judiciário, zelando pelo princípio da presunção de legalidade e da boa-fé processual, evitando, por fim, a indesejável surpresa na condução do processo. 

6. O teor da Resolução nº 234/2016 do CNJ não contradiz o CPC/2015, pois referencia apenas a possibilidade de a publicação no DJe substituir qualquer outra forma de publicação oficial. 

7. No caso concreto, não é admissível considerar intempestivo o presente agravo em recurso especial, notadamente porque o próprio Tribunal Estadual atestara que os advogados da recorrente foram tacitamente intimados por via eletrônica em 19.2.2018. Dessa forma, como o recurso foi interposto em 12.3.2018, dentro, portanto, do lapso temporal de 15 dias úteis, deve ser considerado tempestivo. 

8. O conhecimento do recurso especial exige a manifestação do Tribunal local acerca da tese de direito suscitada. Recusando-se a Corte de origem a apreciar a questão federal, fica obstaculizado o acesso à instância extrema, cabendo à parte vencida invocar, como no caso, a infringência aos arts. 489 e 1.022 do CPC, a fim de anular o acórdão recorrido, para que o Tribunal a quo supra a omissão existente. 

9. A Corte de origem rejeitou os aclaratórios sem tecer qualquer comentário, de forma específica e fundamentada, quanto às matérias suscitadas pela recorrente em sede de embargos de declaração, imprescindíveis para a composição da lide, razão pela qual os autos devem retornar à instância a quo, para que seja apreciada, novamente, a tese expendida. 

10. Agravo interno provido para afastar a intempestividade. Agravo nos próprios autos conhecido para dar provimento ao recurso especial. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, por unanimidade, dar provimento ao agravo interno e conhecer do agravo nos próprios autos para dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira (Presidente) e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília (DF), 26 de março de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator): 

1. Cuida-se de agravo interno interposto por PROEN PROJETOS ENGENHARIA COMÉRCIO E MONTAGENS LTDA - EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL contra a decisão da Presidência do STJ que não conheceu do agravo em recurso especial, ante sua intempestividade, não sendo comprovado qualquer feriado local no ato da interposição do recurso, conforme exigido pelo art. 1.003, § 6º, do NCPC. 

Nas presentes razões, a parte agravante sustenta que prevalece a intimação eletrônica sobre a publicação realizada via DJe, razão suficiente para considerar o agravo em recurso especial tempestivo, pois, "nos termos do art. 5º da Lei 11.419/2006, o dia do começo do prazo legal de 15 dias úteis para a sua interposição se deu no dia subsequente ao da intimação eletrônica dos patronos da ora Agravante, ou seja, em 20/02/2018 (cf. art. 231, V, CPC), vindo, portanto a encerrar-se somente em 14/03/2018 – data posterior ao protocolo realizado em 12/03/2018 –, haja vista a suspensão dos prazos processuais eletrônicos ocorrida no TJRJ em 07/03/2018 (Ato Executivo TJRJ nº 94/2018 – vide e-STJ fl. 162)" (fl. 212, grifo no original) 

Requer, ao final, a reconsideração ou a reforma da decisão pela Turma Julgadora. 

É o relatório. 

VOTO 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator): 

2. Compulsando os autos, observa-se que a recorrente foi considerada intimada na modalidade eletrônica em 19/2/2018, conforme atesta a certidão de fl. 145. 

Não obstante a realização da intimação eletrônica, a decisão recorrida foi ainda publicada no DJe, no dia 15.2.2018. 

Verifica-se, portanto, que ocorreu, na hipótese vertente, dupla intimação, uma realizada pela via eletrônica, outra pela publicação no DJe. 

Não se pode olvidar que esta Corte Superior vem albergando a tese de prevalência da intimação eletrônica sobre a publicação via DJe, nos casos de duplicidade de intimação. 

A propósito: 

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CPC/2015. INTIMAÇÃO ELETRÔNICA PRECEDIDA DE INTIMAÇÃO NO DJE. CONTAGEM DE PRAZO. PREVALÊNCIA DA INTIMAÇÃO ELETRÔNICA. EXEGESE DO ART. 5º DA LEI 11.419/2006. TEMPESTIVIDADE DO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. 1. Controvérsia acerca da contagem de prazo recursal na hipótese de duplicidade de intimações, um via DJe e outra por meio de portal eletrônico. 2. "As intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do art. 2º desta Lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico" (art. 5º, 'caput', Lei 11.419/2006, sem grifos no original). 3. Prevalência da intimação eletrônica sobre a intimação via DJe, na hipótese de duplicidade de intimações. Entendimento em sintonia com o CPC/2015. 4. Contagem do prazo recursal a partir da data em que se considera realizada a intimação eletrônica. 5. Tempestividade do recurso, na espécie. 6. AGRAVO INTERNO PROVIDO. (AgInt no AREsp 903.091/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/03/2017, DJe 27/03/2017) [g.n.] 

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RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. PORTAL ELETRÔNICO. DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO. INTIMAÇÕES POR AMBAS AS FORMAS. PREVALÊNCIA DA INTIMAÇÃO POR MEIO DE PORTAL. DIREITO EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CESSÃO DE CRÉDITOS. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. NÃO SUJEIÇÃO. 1. Controvérsia sobre o termo inicial do prazo recursal em caso de duplicidade de intimações eletrônicas realizadas na forma da Lei Federal n. 11.419/2006, sendo uma delas por meio do Diário da Justiça Eletrônico (art. 4º) e a outra pelo Portal Eletrônico (art. 5º). 2. A intimação efetivada por meio do portal previsto no art. 5º da Lei Federal n. 11.419/2006 prevalece sobre aquela realizada pelo Diário da Justiça eletrônico. Interpretação sistemática dos arts. 4º e 5º da lei de regência, à luz de dispositivos e princípios do CPC/2015. 3. No caso concreto, observado o decêndio previsto no art. 5º, § 3º, da lei de regência, o recurso especial é tempestivo. 4. Os créditos garantidos por cessão fiduciária de recebíveis não se sujeitam à recuperação judicial, a teor do que dispõe o art. 49, § 3º, da Lei n. 11.101/2005. Precedentes. 5. Recurso especial provido. (REsp 1653976/RJ, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), Rel. p/ Acórdão Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 08/05/2018, DJe 01/08/2018) [g.n.] 

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É oportuno, também, salientar a existência de decisões em sentido contrário, no sentido de reconhecer a prevalência da intimação via Diário da Justiça, citando, a título de exemplo: EDcl no AgInt no AREsp 1.229.542/RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; AgInt nos EDcl no AREsp 1.342.507/RJ. Rel. Minª Nancy Andrighi; AgRg no AREsp 1.381.136/RJ, Rel. Min. Felix Fischer; AgInt no AREsp 1.254.716/SP, Rel. Min. Og Fernandes) 

Além disso, algumas decisões em sentido contrário, lavradas no âmbito da Presidência do STJ (ex: AREsp nº 1.330.934), são fundamentadas em Resolução do Conselho Nacional de Justiça (Res. nº 234/2016) que referenciou o tema, com o desiderato de dar primazia à publicação no Diário de Justiça eletrônico. 

Com efeito, o art. 5º, § 1º, da referida Resolução assere: 

Art. 5º (omissis) § 1º A publicação no DJEN substitui qualquer outro meio de publicação oficial, para fins de intimação, à exceção dos casos em que a lei exija vista ou intimação pessoal. 

Nesse diapasão, torna-se imperioso concluir-se qual modalidade de intimação deverá ser considerada prevalecente, com o escopo de verificar a tempestividade do agravo em recurso especial interposto pela ora recorrente. 

Inicialmente, impende consignar que a Lei nº 11.419/2006 - que dispôs sobre a informatização do processo judicial - previu que as intimações serão realizadas por meio eletrônico em portal próprio, dispensando-se a publicação no órgão oficial. 

Transcreve-se, abaixo, a dicção legal: 

Lei nº 11.419/2006 

Art. 5º As intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do art. 2º desta Lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico. 

Veja-se que a lei em epígrafe - que também alterou alguns dispositivos do Código de Processo Civil de 1973 - trouxe relevante inovação quanto ao tema, permitindo a realização da intimação eletrônica. 

Na esteira da nupercitada novidade, o Código de Processo Civil avançou ao delimitar o tema, prevendo, em seu artigo 272, o seguinte: 

Art. 272. Quando não realizadas por meio eletrônico, consideram-se feitas as intimações pela publicação dos atos no órgão oficial. 

A partir da perquirição dos dispositivos legais acima, resta evidente que a mens legis pretendeu deixar claro que a regra em relação à comunicação dos atos processuais aos advogados ocorre mediante a intimação por via eletrônica, valorizando-se a informatização dos processos judiciais. 

Com efeito, tal exegese é compartilhada pela doutrina pátria, consoante se observa nos ensinamentos de Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Licastro Torres de Mello: 

O art. 272 do novo diploma foi elaborado pelo legislador visando a solucionar questões surgidas na interpretação do art. 236 do CPC em vigor, como, por exemplo, aquela do que se poderia considerar como sendo 'elementos suficientes' (expressão contida na lei) para fins de identificação das partes e advogados, nas intimações. 1.1. Além disso, o dispositivo deixa claro que a regra, em relação à comunicação dos advogados acerca dos atos processuais, passa a ser a da intimação por meio eletrônico, valorizando a informatização dos processos judiciais. (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et alli. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. 2ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 504) [g.n.] 

Em conformidade com os ensinos de Araken de Assis, Angélica Arruda Alvim, Eduardo Arruda Alvim e George Salomão Leite, as intimações se realizam, sempre que possível, por meio eletrônico: 

Já se afirmou que as intimações se realizam, sempre que possível, por meio eletrônico, na forma da lei. Há momentos em que a utilização do meio eletrônico para a realização de intimações aos advogados não pode se concretizar pelo fato de o sistema encontrar-se fora do ar por questões técnicas. Esta é a razão de o legislador ter considerado que a efetivação da intimação pelo meio eletrônico só será realizada quando possível. (ASSIS, Araken et alli. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 351) 

Induvidosamente, a forma preferencial de intimação é o meio eletrônico, admitindo-se, contudo, outra via de comunicação se tal meio for inviável no caso concreto, notadamente ante a existência de questões de índole técnicas, quando, por exemplo, o sistema encontrar-se fora do ar. 

Não se pode olvidar que a importância da intimação eletrônica é tanta que se aplica até mesmo para as autoridades com prerrogativa de intimação pessoal, consoante se observa, ilustrativamente, na Resolução STJ/GP nº 10, de 6 de outubro de 2015, que regulamentou o processo judicial eletrônico no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. 

Deveras, na Seção VII da referida Resolução, dedicada às intimações eletrônicas, há a previsão de que as comunicações processuais terão efeitos legais de vista pessoal do interessado. 

A propósito: 

Seção VII Das Intimações Eletrônicas Art. 21. No processo eletrônico, as intimações dos entes públicos que se credenciarem na forma prevista nesta resolução serão feitas por meio eletrônico no portal do STJ, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico. § 1º. As citações, intimações, notificações e remessas, que viabilizarão o acesso à íntegra do processo correspondente, terão efeitos legais de vista pessoal do interessado, nos termos do § 1º do art. 9º da Lei n. 11.419/2006. [g.n.] 

No caso concreto, observa-se, como salientado alhures, que houve a intimação pela via eletrônica e pela publicação no DJe. 

De fato, com fulcro nas considerações anteriores, verifica-se que a melhor hermenêutica subsume-se à prevalência da intimação eletrônica sobre a publicação no Diário de Justiça, entendimento em sintonia com o novel Código de Processo Civil. 

A referida interpretação protege a confiança dos patronos e jurisdicionados aos atos praticados pelo Poder Judiciário, zelando pelo princípio da presunção de legalidade e da boa-fé processual, evitando, por fim, a indesejável surpresa na condução do processo. 

Dentro do referido conceito, é relevante realizar processo de interpretação harmônico com o espírito do novo CPC, cujo objetivo, em matéria de comunicação de atos processuais, salta aos olhos com força tonitruante, cristalizando-se na primazia das intimações eletrônicas. 

Veja-se, a título de exemplo e em paralelismo com os fundamentos ora expendidos, que o art. 246, § 1º, do CPC 2015 assevera que as citações e intimações serão efetuadas preferencialmente por meio eletrônico: 

Art. 246. (omissis) § 1º Com exceção das microempresas e das empresas de pequeno porte, as empresas públicas e privadas são obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais serão efetuadas preferencialmente por esse meio. [g.n.] 

Registre-se, por fim, que a perquirição hermenêutica do processo civil moderno requer a subsunção dos fatos às normas, visando, como diretriz, aos critérios de racionalidade material, em prol da conotação excessivamente processualista. 

José Roberto dos Santos Bedaque, de forma perspícua, assevera: 

A ciência processual no Brasil encontra-se na fase de sua evolução que autorizada doutrina identifica como instrumentalista. É a conscientização de que a importância do processo está em seus resultados. O legislador constituinte percebeu essa circunstância fundamental e, em boa hora, estabeleceu considerável corpo de normas, que integram o direito processual constitucional, pois elevam garantias processuais ao nível máximo da hierarquia das leis, além de consagrar meios específicos para proteção de determinados direitos, com substancial ampliação da legitimidade para agir. Aliás, já notou a doutrina que as grandes matrizes do direito processual cada vez mais encontram-se disciplinadas em texto constitucional. A importância dessas inovações, como de outras verificadas ao nível infraconstitucional, reside principalmente na sua causa. Depois de longo período caracterizado por preocupações endoprocessuais, volta-se a ciência para os resultados pretendidos pelo direito processual. Trata-se, sem dúvida, de nova visão do fenômeno processual, instrumento cuja utilidade é medida em função dos benefícios que possa trazer para o titular de um interesse protegido pelo ordenamento jurídico material. A conscientização de que o processo vale não tanto pelo que ele é, mas fundamentalmente pelos resultados que produz, tem levado estudiosos a reexaminar os institutos processuais, a fim de sintonizá-los com a nova perspectiva metodológica da ciência. Parece imprescindível, pois, um retorno ao interior do sistema processual, com o objetivo de rever conceitos e princípios, adequando-os à nova visão desse ramo da ciência jurídica. É preciso 'revisitar' os institutos processuais, todos concebidos segundo a visão autonomista ou conceitual da ciência processual, a fim de conferir a eles nova feição, a partir das necessidades identificadas na fase instrumentalista. O tratamento dos institutos fundamentais de nossa ciência deve perder a conotação excessivamente processualista. A abordagem precisa levar em consideração critérios de racionalidade material, não apenas formal. A ciência processual tem-se preocupado com a criação de categorias e institutos, cuja elaboração precisa a transformou no ramo do Direito que mais se desenvolveu nos últimos anos. Por outro lado, passaram os processualistas a se dedicar tanto a conceitos, muitos de extrema sutileza, que as discussões sobre temas de direito processual acabaram por representar verdadeiro exercício de filosofia pura do Direito. Quando voltamos os olhos para a realidade, porém, verificamos que o processo se encontra muito distante dela. (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo. 3ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 15-17) [g.n.] 

Em outras palavras, o critério de racionalidade material deve ser conjugado com o princípio da boa-fé processual, que também é aplicado aos órgãos jurisdicionais, conforme bem pondera Fredie Didier Jr: 

Note que o destinatário da norma é "aquele que de qualquer forma participa do processo" (art. 5º, CPC), o que inclui, obviamente, não apenas as partes, mas também o órgão jurisdicional. [...] A vinculação do Estado-juiz ao dever de boa-fé nada mais é senão o reflexo do princípio de que o Estado, tout court, deve agir de acordo com a boa-fé e, pois, de maneira leal e com proteção à confiança. (DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. Vol. 1. 19ª ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 124-125) 

Assim, deve-se exigir dos órgãos jurisdicionais comportamento que respeita a boa-fé processual. Trazendo tais argumentos ao caso concreto, não é admissível considerar intempestivo o presente agravo em recurso especial, notadamente porque o próprio Tribunal Estadual atestara que os advogados da recorrente foram tacitamente intimados por via eletrônica em 19.2.2018. Dessa forma, como o recurso foi interposto em 12.3.2018, dentro, portanto, do lapso temporal de 15 dias úteis, deve ser considerado tempestivo. 

Interpretação divergente ocasionaria verdadeira absurdez no plano lógico-jurídico, acarretando efetivo prejuízo à parte recorrente, máxime porque a comunicação por via eletrônica partiu da própria Corte de origem, devendo os atos judiciais serem respeitados, ante a presunção de legalidade a eles imanente, de sorte a preservar os princípios da não-surpresa e da proteção da confiança. 

Por fim, verifica-se que o teor da Resolução nº 234/2016 do CNJ não contradiz, sequer, o CPC/2015, pois referencia apenas a possibilidade de a publicação no DJe substituir qualquer outra forma de publicação oficial. 

Em suma, considerando tempestivo o agravo em recurso especial, passo à análise do mérito. 

3. Cuida-se de agravo em recurso especial fundado no artigo 105, III, alínea "a", da Constituição Federal, interposto contra acórdão proferido pelo Eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DEFLAGRADO SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. ARTIGO 475-J. MULTA. TERMO A QUO. INTIMAÇÃO DO PROCURADOR. PARTE AGRAVADA QUE PROTOCOLIZOU PETIÇÃO REQUERENDO A PENHORA ON LINE ANTES DE ULTRAPASSADO O PRAZO DE CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. PROCESSO ENCAMINHADO A CONCLUSÃO NO CURSO DO PRAZO DO AGRAVANTE. EXECUTADO QUE TEM DIREITO À DEVOLUÇÃO DO PRAZO SE O SEU ACESSO AOS AUTOS FOI IMPOSSIBILITADO PORQUE O PROCESSO ESTAVA CONCLUSO AO JUIZ. DEVOLUÇÃO DO PRAZO QUE SE IMPUNHA. DISPONIBILIZAÇÃO DO PROCESSO OCORRIDA SOMEMTE EM 03.07.2014. DEPÓSITO DA CONDENAÇÃO EFETUADO EM 09.07.2014. NÃO INCIDÊNCIA DA MULTA QUE TRATA O ARTIGO 475-J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA. PROVIMENTO DO RECURSO. (fl. 56) 

Opostos embargos de declaração, foram parcialmente acolhidos, para fazer constar no acórdão o relatório. 

A recorrente, nas razões do recurso, aponta, preliminarmente, violação aos arts. 1.022, II, e 489, § 1º, IV, do CPC/2015, sustentando a existência de negativa de prestação jurisdicional. Sustenta, ainda, ofensa aos arts. 932, III, do CPC/2015; e 183, 185 e 475-J, todos do CPC/1973, sob os seguintes argumentos: a) houve violação ao princípio da dialeticidade, pois o recorrido não apresentou impugnação específica contra os fundamentos expendidos na decisão recorrida, limitando-se a repetir os argumentos outrora colacionados, sem questionar a decisão que os rejeitou; b) o devedor foi intimado por Diário Oficial a pagar o débito exequendo em 6.5.2014, mas como só efetuou o pagamento em 9.7.2014, não é possível desconstituir a multa de 10% sobre o valor da condenação pelo descumprimento do prazo de 15 dias para a satisfação da obrigação; e c) não poderia ter sido devolvido o prazo para o recorrido, tendo em vista que não houve prova da indisponibilidade dos autos, como também em nenhum momento este solicitou a devolução, tendo somente levantado a referida tese em 9.7.2014, isto é, vinte e nove dias após o prazo para o pagamento, que se encerrava em 10.6.2014. 

Certidão de transcurso in albis do prazo para o oferecimento de contrarrazões ao recurso especial à fl. 131. 

O recurso recebeu crivo negativo de admissibilidade na origem, ascendendo a esta Corte Superior por meio da interposição de agravo. 

4. Compulsando os autos, verifica-se, inicialmente, no que tange à admissibilidade do presente recurso por violação aos arts. 489 e 1.022, ambos do CPC, que, no ponto, houve negativa de prestação jurisdicional, máxime porque a Corte de origem não analisou as questões deduzidas pela recorrente. 

Com efeito, observa-se que a parte recorrente sustenta que a Corte de origem se omitiu ao analisar as seguintes teses expendidas na contraminuta ao agravo de instrumento e reiteradas nos embargos de declaração: a) houve violação ao princípio da dialeticidade, pois o recorrido repete, em sede de agravo de instrumento, os argumentos da impugnação, sem questionar a decisão que a rejeitou, deixando, portanto, de apresentar impugnação específica; b) as teses levantadas pelo recorrido não lhe geraram prejuízo para justificar a devolução de prazo (não há prova da indisponibilidade dos autos), além de estarem preclusas, não só porque a certificação de trânsito em julgado já havia sido juntada, como também pelo fato de o recorrido ter acesso imediato aos autos dois dias após a publicação do despacho que o intimara a pagar o saldo exequendo, consoante comprova certidão de vista dos autos; c) se o recorrido não concordava com o referido despacho, deveria ter apresentado a oposição cabível, e não descumprir a decisão e deixar para reclamar anos depois, quando a questão da multa já estava preclusa; e d) por mais que se alegue que os autos foram remetidos à conclusão em 4.6.2014 e que isso tenha, de alguma forma, prejudicado o recorrido, em momento nenhum solicitou a devolução do prazo, tendo somente levantado a tese da supressão em 9.7.2014, isto é, vinte e nove dias após o prazo para o pagamento, que se encerrava em 10.6.2014. 

Todavia, não obstante os argumentos expendidos em sede de embargos de declaração, a Corte de origem não apreciou as questões nupercitadas. 

Não se pode olvidar que o conhecimento do recurso especial exige a manifestação do Tribunal local acerca da tese de direito suscitada. Recusando-se a Corte de origem a se manifestar sobre a questão federal, fica obstaculizado o acesso à instância extrema, cabendo à parte vencida invocar, como no caso, a infringência ao art. 1.022 do CPC, a fim de anular o acórdão recorrido, para que o Tribunal a quo supra a omissão existente. 

Confiram-se, por oportuno, os seguintes precedentes: 

PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. CARACTERIZAÇÃO. OMISSÃO QUANTO A PONTO RELEVANTE PARA O DESLINDE DA CONTROVÉRSIA QUE, INCLUSIVE, NÃO PODE SER ANALISADO POR ESTA CORTE SUPERIOR POR ENVOLVER O CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 1. Mesmo após provocação das partes interessadas, a instância ordinária recusou-se a emitir juízo de valor sobre ponto importante e que, por dizer respeito ao próprio iter processual, merecia manifestação suficiente para viabilizar o próprio julgamento desta Corte Superior acerca da correção de seu provimento. 2. O Tribunal a quo sustentou ser necessária a produção de provas a fim de elucidar determinadas questões fáticas relativas à nulidade de ato administrativo. Ocorre que a parte que moveu a ação por mais de uma vez pleiteou o julgamento antecipado da lide, dispensando a fase probatória. 3. Sobre esse ponto levantado pela ora recorrente, cujo conhecimento pelo Superior Tribunal de Justiça é impossível, em razão da imprescindibilidade da análise do conjunto fático-probatório, não foi emitido qualquer provimento judicial. 4. Trata-se, como se pode observar facilmente, de questão essencial para o deslinde da controvérsia e que não foi apreciado pela instância ordinária, caracterizando verdadeira ausência de prestação jurisdicional. 5. Recurso especial provido, determinando-se o retorno dos autos à origem para que lá sejam analisados os argumentos lançados nos embargos de declaração de fls. 1.038/1.045. (REsp 769.831/SP, Relator o eminente Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES DJe 27.11.2009) 

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO INDENIZATÓRIA - DANOS MORAIS - DIVULGAÇÃO EM JORNAL DE RESPONSABILIDADE APURADA EM INQUÉRITO CIVIL - RECURSO ESPECIAL - ARTS. 75 e 159 DO CÓDIGO CIVIL - FALTA DE PREQUESTIONAMENTO - DIVERGÊNCIA PRETORIANA DESCONFIGURADA - NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. I - O prequestionamento é pressuposto inerente aos recursos de natureza excepcional. O termo "prequestionar", reflete, na realidade, a exigência de que a questão federal tenha sido previamente abordada na instância revisora de segundo grau, sendo inócuo o "prequestionamento" feito pela parte, em sua petição inicial, e demais peças processuais, sem que nada tenha sido decidido acerca da temática federal suscitada no apelo raro. II - Se o tribunal recorrido permanece silente, mesmo após a manifestação dos embargos declaratórios, é possível aventar, no recurso especial, a alegativa de ofensa ao art. 535, II do CPC; ao invés de se apontar como violados os dispositivos legais que não foram objeto do necessário prequestionamento. Aplicação, na espécie, da súmula 211/STJ. (...) IV - Recurso especial não conhecido. (REsp 242.128/SP, Relator o eminente Ministro WALDEMAR ZVEITER, DJ 18.09.2000). 

Ademais, observa-se a existência de violação ao art. 489 do CPC, notadamente porque a Corte de origem se quedou silente em relação às teses firmadas pela recorrente. 

A propósito: 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. OFENSA AOS ART. 1.022, II, E 489, § 1º, DO CPC/15. OMISSÕES. PREQUESTIONAMENTO FICTO. ART. 1.025 DO VIGENTE ESTATUTO PROCESSUAL. APLICABILIDADE RESTRITA A QUESTÕES DE DIREITO. AUSÊNCIA DE PRONUNCIAMENTO QUANTO A ASPECTOS ENVOLVENDO MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA RELEVANTE. DEVOLUÇÃO DOS AUTOS À ORIGEM. NECESSIDADE. PRECEDENTES. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - De acordo com o art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, cabe a oposição de embargos de declaração para: i) esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; ii) suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; e iii) corrigir erro material. III - A omissão, definida expressamente pela lei, ocorre na hipótese de a decisão deixar de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento. Considera-se omissa, ainda, a decisão que incorra em qualquer uma das condutas descritas no art. 489, § 1º, do CPC/15. IV - O vigente Estatuto Processual admite, no seu art. 1.025, o denominado prequestionamento ficto, é dizer, aquele que se consuma com a mera oposição de embargos de declaração, independentemente da efetiva manifestação da instância ordinária sobre as teses expostas. V - Se é correto que o novo Código de Processo Civil ampliou a possibilidade de reconhecer o prequestionamento nas situações que indica, não menos certo é que a exegese a ser dispensada ao seu art. 1.025 é aquela compatível com a missão constitucional atribuída ao Superior Tribunal de Justiça, isto é, a de uniformizar a interpretação das leis federais em grau recursal nas causas efetivamente decididas pelos Tribunais da República (CR, art. 105, III), não podendo, portanto, sofrer modificação por legislação infraconstitucional. Disso decorre, por conseguinte, que o comando contido no art. 1.025 do CPC/15 está adstrito à questão exclusivamente de direito, é dizer, aquela que não imponha a esta Corte a análise ou reexame de elementos fáticos-probatórios, providência que lhe permanece interditada, em virtude do delineamento constitucional de sua competência. Precedentes. VI - Extrai-se dos julgados deste Superior Tribunal sobre a matéria que o reconhecimento de eventual violação ao art. 1.022 do CPC/15 dependerá da presença concomitante das seguintes circunstâncias processuais: i) oposição de embargos de declaração, na origem, pela parte interessada; ii) alegação de ofensa a esse dispositivo, nas razões do recurso especial, de forma clara, objetiva e fundamentada, acerca da mesma questão suscitada nos aclaratórios; iii) publicação do acórdão dos embargos sob a vigência do CPC/15; e iv) os argumentos suscitados nos embargos declaratórios, alegadamente não examinados pela instância a quo, deverão: iv.i) ser capazes de, em tese, infirmar as conclusões do julgado; e iv.ii) versar questão envolvendo matéria fático-probatória essencial ao deslinde da controvérsia. VII - In casu, verifica-se a ausência de pronunciamento da Corte de origem a respeito de matéria fática relevante. VIII - Recurso especial provido para determinar o retorno dos autos à origem, nos termos da fundamentação. (REsp 1670149/PE, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/03/2018, DJe 22/03/2018) [g.n.] 

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. VALOR DE ALÇADA. CDA. AFERIÇÃO NO MOMENTO DA DISTRIBUIÇÃO DA AÇÃO. ATUALIZAÇÃO DO VALOR CONSTANTE DO TÍTULO. MATÉRIA ARGUÍDA E NÃO ENFRENTADA PELO TRIBUNAL. OMISSÃO CONFIGURADA. VÍCIO DE JULGAMENTO. VIOLAÇÃO AO ART. 489 DO CPC/2015. 1. Sustenta o recorrente violação ao art. 489 do CPC/2015, por omissão da decisão recorrida quanto à necessidade de o valor de alçada previsto no § 1º do art. 34 da LEF ser aferido mediante atualização da quantia constante da CDA na data da distribuição, e não por aquele constante do título representativo da dívida no momento da inscrição. 2. O acórdão a quo quedou-se silente sobre essa específica questão suscitada pela parte, embora provocado a apreciar pelo Agravo de fls. 43-48, e-STJ, e pelos Embargos de Declaração de fls. 68-76, e-STJ. 3. Por não ter o Tribunal de origem analisado questão apta, em tese, a infirmar a conclusão adotada, incorre em ofensa ao art. 489 do CPC/2015. 4. Recurso Especial provido, para anular o acórdão impugnado e determinar o retorno dos autos à origem para apreciação do ponto omitido. (REsp 1685549/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/09/2017, DJe 10/10/2017) [g.n.] 

Frise-se, ainda, que a questão é relevante para o futuro deslinde da controvérsia no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, pois, caso a Corte estadual confirme a decisão outrora expendida, delineando o enquadramento fático da questão, a envolver os reais contornos do caso concreto, a matéria em epígrafe cingirá o mérito propriamente dito do recurso especial, suscetível de apreciação, conforme consignado, por esta Corte Superior. 

Dessa forma, está caracterizada a ofensa aos artigos apontados como violados, em razão da omissão da Corte de origem em examinar as questões suscitadas pela recorrente, ficando prejudicada a análise das demais teses expendidas no apelo nobre. 

5. Ante o exposto, com fulcro nos fundamentos acima aduzidos, dou provimento ao presente agravo interno para afastar a intempestividade, conheço do agravo nos próprios autos para dar provimento ao recurso especial, impondo-se a remessa dos autos ao Eg. Tribunal de origem, para que, novamente, aprecie as teses firmadas pela ora recorrente como entender de direito, sanando os vícios alegados. 

É como voto. 

VOTO-VOGAL 

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO: Senhor Presidente, li o voto do eminente Ministro Luis Felipe Salomão, que teve a gentileza, e sempre tem, de nos enviar previamente. 

Acrescento apenas que, no meu entender, sempre que houver um equívoco do Judiciário a causar dúvida na parte, esta não pode ser prejudicada. Devemos sempre interpretar a norma da forma que seja mais favorável à parte prejudicada por um eventual equívoco do Judiciário, como aqui acontece. 

Estou acompanhando o voto de Sua Excelência, pois deve prevalecer a compreensão que mais favoreça a parte induzida a equívoco por falha do Judiciário. 

VOTO 

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Senhor Presidente, estou de acordo com o voto do eminente Relator. Com efeito, o advogado que está cadastrado para receber intimação por via eletrônica não pode ser prejudicado pela circunstância de que houve também intimação, em dia diferente, pelo Diário, notadamente em face dos termos da lei que rege a intimação eletrônica. 

Compartilho também do entendimento do Ministro Raul Araújo de que, havendo procedimento do Judiciário que cause dúvida, não pode a parte ser prejudicada. Recordo-me de jurisprudência desta Turma no sentido de que, quando há uma segunda publicação desnecessária, mesmo que se admita que seja desnecessária a segunda publicação, ela reabre prazo. E penso que aqui, com maior razão, não se trata de publicação desnecessária, mas de publicação eletrônica que tem disciplina legal, e a lei expressamente estabelece que essa publicação eletrônica é que regerá o prazo, naturalmente em relação ao advogado que está cadastrado para receber essa intimação eletrônica. 

Acompanho o voto do Relator. 

6 de maio de 2021

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO DEVEDOR PARA PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DO DÉBITO. ART. 523, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. PRAZO DE NATUREZA PROCESSUAL. CONTAGEM EM DIAS ÚTEIS, NA FORMA DO ART. 219 DO CPC/2015.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.708.348 - RJ (2017/0292104-9) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO DEVEDOR PARA PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DO DÉBITO. ART. 523, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. PRAZO DE NATUREZA PROCESSUAL. CONTAGEM EM DIAS ÚTEIS, NA FORMA DO ART. 219 DO CPC/2015. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO PROVIDO. 

1. Cinge-se a controvérsia a definir se o prazo para o cumprimento voluntário da obrigação, previsto no art. 523, caput, do Código de Processo Civil de 2015, possui natureza processual ou material, a fim de estabelecer se a sua contagem se dará, respectivamente, em dias úteis ou corridos, a teor do que dispõe o art. 219, caput e parágrafo único, do CPC/2015. 

2. O art. 523 do CPC/2015 estabelece que, "no caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver". 

3. Conquanto o pagamento seja ato a ser praticado pela parte, a intimação para o cumprimento voluntário da sentença ocorre, como regra, na pessoa do advogado constituído nos autos (CPC/2015, art. 513, § 2º, I), fato que, inevitavelmente, acarreta um ônus ao causídico, o qual deverá comunicar ao seu cliente não só o resultado desfavorável da demanda, como também as próprias consequências jurídicas da ausência de cumprimento da sentença no respectivo prazo legal. 

3.1. Ademais, nos termos do art. 525 do CPC/2015, "transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação". Assim, não seria razoável fazer a contagem dos primeiros 15 (quinze) dias para o pagamento voluntário do débito em dias corridos, se considerar o prazo de natureza material, e, após o transcurso desse prazo, contar os 15 (quinze) dias subsequentes, para a apresentação da impugnação, em dias úteis, por se tratar de prazo processual. 

3.2. Não se pode ignorar, ainda, que a intimação para o cumprimento de sentença, independentemente de quem seja o destinatário, tem como finalidade a prática de um ato processual, pois, além de estar previsto na própria legislação processual (CPC), também traz consequências para o processo, caso não seja adimplido o débito no prazo legal, tais como a incidência de multa, fixação de honorários advocatícios, possibilidade de penhora de bens e valores, início do prazo para impugnação ao cumprimento de sentença, dentre outras. E, sendo um ato processual, o respectivo prazo, por decorrência lógica, terá a mesma natureza jurídica, o que faz incidir a norma do art. 219 do CPC/2015, que determina a contagem em dias úteis. 

4. Em análise do tema, a I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF aprovou o Enunciado n. 89, de seguinte teor: "Conta-se em dias úteis o prazo do caput do art. 523 do CPC". 

5. Recurso especial provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 25 de junho de 2019 (data do julgamento). 

RELATÓRIO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: Maria Stella de Brito Oliveira, José Eustáquio dos Anjos, Valmir Tarciso Pizzutti, Renato Fernandes Tavares e Jucara Rodrigues Manzoni interpuseram agravo de instrumento contra a decisão do Juízo de primeiro grau que, em processo em fase de cumprimento de sentença, determinou, nos termos do art. 523 do CPC/2015, a intimação dos executados para pagarem o débito no prazo de 15 (quinze) dias corridos, sob pena de incidência de multa e honorários advocatícios. 

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou provimento ao recurso, em acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 61): 

Execução de sentença. Prazo para cumprimento voluntário. Divergência sobre a natureza do prazo de 15 dias estabelecido no art. 523, caput, do CPC-15. Precedentes deste Tribunal de Justiça adotando a natureza material. Incidência da regra prevista no art. 219, parágrafo único processual. Contagem contínua do prazo. Interpretação doutrinária predominante. Observância à uniformidade da jurisprudência. Decisão de primeiro grau que deu razoável interpretação aos dispositivos legais. Agravo de instrumento desprovido pelo relator. Decisão monocrática mantida. Agravo interno desprovido. 

Contra esse decisum, os recorrentes interpuseram o presente recurso especial, alegando, em síntese, que a interpretação dada pela Corte local violou os arts. 219 e 523, caput, do Código de Processo Civil de 2015. 

Sustentam que o prazo para cumprimento voluntário de sentença possui natureza processual e, portanto, deve ser contado em dias úteis. Isso porque "os prazos previstos em Lei, que não possuem natureza processual, são aqueles cuja contagem se opera independentemente da existência de uma relação processual. No caso do prazo previsto no art. 523 do CPC seus efeitos somente são produzidos se existir processo. Fora do processo este prazo não tem a menor utilidade" (e-STJ, fl. 84). 

Buscam, assim, o provimento do recurso especial para que seja reformado o acórdão recorrido, reconhecendo-se que o prazo previsto no art. 523 do CPC/2015 é de natureza processual, logo, deve ser contado em dias úteis, nos termos do art. 219, caput, do CPC/2015. 

É o relatório. 

VOTO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR): A controvérsia debatida neste recurso especial consiste em saber se o prazo para o cumprimento voluntário da obrigação, previsto no art. 523, caput, do Código de Processo Civil de 2015, possui natureza processual ou material, a fim de estabelecer se a sua contagem se dará, respectivamente, em dias úteis ou corridos, nos termos do que dispõe o art. 219, caput e parágrafo único, do CPC/2015. 

O Tribunal de origem, ao negar provimento ao agravo de instrumento das ora recorrentes, assentou que o referido prazo deveria ser contado em dias corridos, por ter natureza de direito material, aduzindo, para tanto, o seguinte: 

8. O cerne da questão está em estabelecer se o prazo previsto no art. 523, caput, do CPC-15 tem natureza processual ou material. A importância dessa natureza está na forma da contagem estabelecida pelo art. 219, caput e seu parágrafo único, do novo CPC. 9. Isso porque os prazos de natureza processual são contados em dias úteis (caput), enquanto os de natureza material em dias contínuos (parágrafo único do art. 219 do CPC-15). 10. Face à vigência recente do Lei Federal nº 13.105 (CPC-15), o Superior Tribunal de Justiça ainda não se manifestou sobre a questão. 11. Dessa forma, em nome da uniformização da jurisprudência, aplicam-se os precedentes deste Tribunal de Justiça, cujo entendimento dominante tem sido pela natureza material do prazo. 12. Nesse sentido, confiram-se os julgamentos dos agravos de instrumento n.s 0040168-83.2016.8.19.0000 e 0043099- 59.2016.8.19.0000, cuja ementa deste último é aqui transcrita, verbi: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO AGRAVADA QUE, NA FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA, DETERMINOU A INTIMAÇÃO DA DEVEDORA PARA PAGAR O DÉBITO NO PRAZO DE 15 DIAS CORRIDOS, POR ENTENDER SE TRATAR DE PRAZO DA PARTE, NÃO PROCESSUAL. - Analisando os autos, a questão gira em torno se o prazo de 15 dias da intimação do Executado para pagamento voluntário previsto no art. 523 do CPC/15, e realizado na forma do art. 513, § 2º do CPC/15, é de natureza processual ou material. - Há divergência doutrinária sobre o tema, e, enquanto não houver jurisprudência pacífica do STJ (via recurso repetitivo ou mesmo súmula), os juízes devem indicar expressamente em suas decisões se entendem que o prazo de pagamento é contado em dias úteis (prazo processual) ou corridos (prazo material). - Na presente hipótese, o Magistrado indicou que o prazo é de 15 dias corridos, por entender se tratar de prazo da parte, não processual. - Nota-se que o prazo do art. 523 do CPC/15 tem como destinatária a parte, que é quem deve praticar o ato para cumprimento da sentença (pagamento), em quinze dias. - Desse modo, o prazo para pagamento de quantia certa em cumprimento definitivo de sentença tem natureza material, devendo ser contado em dias corridos, conforme disposto no parágrafo único do artigo 219 do CPC/15, que excepciona a regra do caput do referido artigo. - Insta ressaltar que, no caso, o juiz estabeleceu expressamente no decisum recorrido o prazo de 15 dias corridos, ou seja, não houve surpresa para a parte devedora. - Agindo dessa forma, o Magistrado atuou como agente-colaborador do processo, observando o princípio da cooperação ou colaboração (previsto no artigo 6º do CPC/15), que dispõe, in verbis: - Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. - Precedente deste E. Tribunal de Justiça nesse sentido. - Ante o exposto, considerando-se tratar de um prazo material, deve ser observado o disposto no parágrafo único do art. 219 do CPC/15, que excepciona o estabelecido no Caput, para que a contagem se dê em dias corridos, de modo que deve ser mantida a decisão agravada. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (grifei) 13. Tal interpretação é corroborada por Daniel Amorim Assunção (in Manual de Direito Processual Civil – Volume Único. 8ª Edição – Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. p. 1.124.). Confiram-se suas lições sobre o art. 523, caput, verbi: Apesar de existir corrente doutrinária que defende tratar-se de um prazo processual (apud, Scarpinella Bueno, Manual, p. 402), em meu entendimento o prazo é material, porque o pagamento é ato a ser praticado pela parte e não pelo advogado, não se tratando, portanto, de ato postulatório. (grifei) 14. No mesmo sentido, são os ensinamentos de Guilherme Rizzo Amaral (in Comentários às alterações do novo CPC. Ed. Ver, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. p. 310), verbi: Ressalte-se, por fim, que a regra de contagem de prazos apenas em dias úteis aplica-se tão somente a prazos processuais. Isso significa que os prazos concedidos às partes para o cumprimento de sentença ou decisões interlocutórias que lhes imponham obrigações não contarão com o beneplácito do art. 219, contando-se de forma corrida igualmente em dias não úteis. (grifei) 15. Dessa forma, verifica-se que o magistrado de 1º grau deu razoável interpretação ao art. 523, caput, c/c art. 219, p. único do CPC-15. Até porque o julgador preveniu a parte do posicionamento adotado por ele, deixando clara a contagem do prazo em dias contínuos. 

Como visto, o fundamento central do acórdão recorrido é que o prazo do art. 523, caput, do CPC/2015 tem como destinatário a parte devedora, a quem compete realizar ou não o cumprimento voluntário da sentença (pagamento), não se demandando, em princípio, qualquer atividade técnica ou postulatória do advogado. 

A ratio essendi desse entendimento consiste no fato de que o novo Código de Processo Civil, ao inovar na ordem jurídica estabelecendo a contagem de prazos processuais em dias úteis, teve como objetivo dar maior tranquilidade aos advogados, possibilitando, por exemplo, que eles não tenham que trabalhar nos finais de semana, feriados ou recessos. Logo, se o cumprimento de sentença não demanda efetivo trabalho do causídico, pois o pagamento ou não é uma escolha apenas da parte devedora, não haveria razão na contagem do respectivo prazo em dias úteis. 

Não obstante os fundamentos declinados e a par da divergência doutrinária sobre o tema, entendo que deve ser dada outra interpretação ao dispositivo legal em análise. 

Isso porque, embora o pagamento seja, de fato, ato a ser praticado pela parte, não se pode olvidar que a intimação para o cumprimento voluntário da sentença, nos termos do art. 523 do CPC/2015, ocorre, como regra, na pessoa do advogado constituído nos autos. 

É o que determina o art. 513, § 2º, inciso I, do CPC/2015, in verbis: 

Art. 513. O cumprimento da sentença será feito segundo as regras deste Título, observando-se, no que couber e conforme a natureza da obrigação, o disposto no Livro II da Parte Especial deste Código. § 1º O cumprimento da sentença que reconhece o dever de pagar quantia, provisório ou definitivo, far-se-á a requerimento do exequente. § 2º O devedor será intimado para cumprir a sentença: I - pelo Diário da Justiça, na pessoa de seu advogado constituído nos autos; II - por carta com aviso de recebimento, quando representado pela Defensoria Pública ou quando não tiver procurador constituído nos autos, ressalvada a hipótese do inciso IV; III - por meio eletrônico, quando, no caso do § 1º do art. 246, não tiver procurador constituído nos autos IV - por edital, quando, citado na forma do art. 256, tiver sido revel na fase de conhecimento. 

Assim, considerando que a intimação para o cumprimento de sentença se dá na pessoa do advogado constituído, e não da parte devedora, tal fato acarretará, inevitavelmente, um ônus ao causídico, que deverá comunicar ao seu cliente não só o resultado desfavorável da demanda, como também as próprias consequências jurídicas da ausência de cumprimento voluntário da sentença, tais como a imposição de multa e fixação de honorários advocatícios, dentre outras. 

Vale destacar, ainda, que alguns Tribunais do país possuíam o entendimento de que o prazo em dobro - seja em razão da atuação da Defensoria Pública, seja pela existência de litisconsortes com diferentes procuradores - não se aplicava ao cumprimento de sentença (CPC/2015, art. 523) exatamente pelo mesmo fundamento, isto é, como o ato praticado (pagamento) é essencialmente dos devedores, não haveria razão para dobrar o respectivo prazo legal. 

Ocorre que esse entendimento foi rechaçado por esta Corte Superior, pelo menos em duas oportunidades, justamente por entender que a intimação para o cumprimento voluntário da sentença também gera um ônus ao advogado da parte, o que justificaria o prazo em dobro. 

Nesse sentido: 

RECURSO ESPECIAL - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - DEVEDOR REPRESENTADO POR DEFENSOR PÚBLICO - ADIMPLEMENTO PARCIAL DA OBRIGAÇÃO DECORRIDOS DEZENOVE DIAS - APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ARTIGO 475-J DO CPC/73 - TRIBUNAL A QUO QUE INDEFERIU A PRERROGATIVA DO ART. 5º, §5º DA LEI 1.060/50 AO CASO - INSURGÊNCIA DO RÉU. Hipótese: Cinge-se a controvérsia a decidir se deve ser contado em dobro o prazo para o cumprimento voluntário de sentença no caso de réu assistido pela Defensoria Pública. 1. O adimplemento parcial da obrigação implica imposição da multa prevista no 475-J do CPC/73 sobre o valor remanescente. Precedentes. 2. A intimação para o cumprimento da sentença gera ônus para o representante da parte vencida, que deverá comunicá-la do desfecho desfavorável da demanda e alertá-la de que a ausência de cumprimento voluntário implica imposição de sanção processual. 3. Conforme a jurisprudência do STJ, a prerrogativa da contagem em dobro dos prazos visa a compensar as peculiares condições enfrentadas pelos profissionais que atuam nos serviços de assistência judiciária do Estado, que "enfrentam deficiências de material, pessoal e grande volume de processos" (REsp 1.106.213/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi. Terceira Turma. julgado em 25/10/2011) 4. Em caso análogo, no qual se discutia o cumprimento, pela parte, de decisão judicial sobre purgação da mora, esta Corte superior decidiu ser cabível a contagem em dobro dos prazos para parte assistida pela Defensoria Pública. (REsp 249.788/RJ, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, SEXTA TURMA, julgado em 22/08/2000, DJ 11/09/2000) 5. Na hipótese de parte beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, a prerrogativa da contagem em dobro dos prazos, prevista no artigo 5º, § 5º, da Lei 1.060/50, aplica-se também ao lapso temporal previsto no art. 475-J do CPC/73, correspondente ao art. 523 caput e § 1º do CPC/15, sendo, portanto, tempestivo o cumprimento de sentença, ainda que parcial, quando realizado em menos de 30 (trinta) dias. 6. Recurso provido para afastar a incidência da multa prevista no art. 475-J sobre a parcela da dívida depositada no prazo calculado conforme a prerrogativa prevista no artigo 5º, § 5º da Lei 1.060/50. (REsp n. 1.261.856/DF, Relator o Ministro Marco Buzzi, DJe de 26/11/2016 - sem grifo no original) 

RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PRAZO PARA PAGAMENTO VOLUNTÁRIO. CÔMPUTO EM DOBRO EM CASO DE LITISCONSORTES COM PROCURADORES DISTINTOS. 1. O artigo 229 do CPC de 2015, aprimorando a norma disposta no artigo 191 do código revogado, determina que, apenas nos processos físicos, os litisconsortes que tiverem diferentes procuradores, de escritórios de advocacia distintos, terão prazos contados em dobro para todas as suas manifestações, em qualquer juízo ou tribunal, independentemente de requerimento. 2. A impossibilidade de acesso simultâneo aos autos físicos constitui a ratio essendi do prazo diferenciado para litisconsortes com procuradores distintos, tratando-se de norma processual que consagra o direito fundamental do acesso à justiça. 3. Tal regra de cômputo em dobro deve incidir, inclusive, no prazo de quinze dias úteis para o cumprimento voluntário da sentença, previsto no artigo 523 do CPC de 2015, cuja natureza é dúplice: cuida-se de ato a ser praticado pela própria parte, mas a fluência do lapso para pagamento inicia-se com a intimação do advogado pela imprensa oficial (inciso I do § 2º do artigo 513 do atual Codex), o que impõe ônus ao patrono, qual seja o dever de comunicar o devedor do desfecho desfavorável da demanda, alertando-o das consequências jurídicas da ausência do cumprimento voluntário. 4. Assim, uma vez constatada a hipótese de incidência da norma disposta no artigo 229 do Novo CPC (litisconsortes com procuradores diferentes), o prazo comum para pagamento espontâneo deverá ser computado em dobro, ou seja, trinta dias úteis. 5. No caso dos autos, o cumprimento de sentença tramita em autos físicos, revelando-se incontroverso que as sociedades empresárias executadas são representadas por patronos de escritórios de advocacia diversos, razão pela qual deveria ter sido computado em dobro o prazo para o cumprimento voluntário da obrigação pecuniária certificada na sentença transitada em julgado. 6. Ocorrido o pagamento tempestivo, porém parcial, da dívida executada, incide, à espécie, o § 2º do artigo 523 do CPC de 2015, devendo incidir a multa de dez por cento e os honorários advocatícios (no mesmo percentual) tão somente sobre o valor remanescente a ser pago por qualquer dos litisconsortes. 7. Recurso especial provido para, considerando tempestivo o depósito judicial realizado a menor por um dos litisconsortes passivos, determinar que a multa de dez por cento e os honorários advocatícios incidam apenas sobre o valor remanescente a ser pago. (REsp n. 1.693.784/DF, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, DJe de 5/2/2018 - sem grifo no original) 

Nesse último julgado, inclusive, não obstante a título de obiter dictum, a Quarta Turma reconheceu que o prazo para o cumprimento de sentença, previsto no art. 523, caput, do CPC/2015, deveria ser contado em dias úteis, por se tratar de prazo processual, em consonância com o entendimento aqui proposto. 

Outro ponto que merece destaque é que, diferentemente da sistemática do Código de Processo Civil de 1973, o novo diploma processual não condiciona mais a impugnação ao cumprimento de sentença à prévia garantia do juízo, cujo prazo, agora, inicia-se imediatamente após o transcurso do prazo para pagamento voluntário do débito. 

Em resumo, após a intimação do devedor para o cumprimento de sentença, nos termos do art. 523 do CPC/2015, abrem-se dois prazos sucessivos: i) 15 (quinze) dias para pagamento voluntário do débito; e, na sequência, ii) mais 15 (quinze) dias para a apresentação de impugnação ao cumprimento de sentença, independentemente de nova intimação ou penhora. 

É o que estabelece o art. 525, caput, do CPC/2015: Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação. 

Nessa linha de entendimento, considerando que o prazo para impugnação ao cumprimento de sentença é indiscutivelmente processual - logo, conta-se em dias úteis -, não seria razoável entender que os primeiros 15 (quinze) dias para pagamento voluntário do débito fossem contados em dias corridos, se considerarmos como prazo de natureza material, e os 15 (quinze) dias subsequentes, para a apresentação da impugnação ao cumprimento de sentença, fossem contados em dias úteis, por se tratar de prazo processual. 

Certamente não foi essa a intenção do legislador. 

Ademais, independentemente de quem seja o destinatário do prazo previsto no art. 523 do CPC/2015, se o devedor ou o advogado, bem como se há ou não a necessidade de realização de ato técnico ou postulatório pelo patrono da parte, ainda assim o respectivo prazo deve ser reconhecido como processual. 

Com efeito, não se pode ignorar que a intimação para o cumprimento de sentença tem como finalidade a prática de um ato processual, pois, além da norma correlata estar prevista na própria legislação processual - CPC/2015 -, também trará consequências para o processo, pois, caso não seja adimplido o débito no prazo legal, haverá a incidência de multa, fixação de honorários advocatícios, possibilidade de penhora de bens e valores, início do prazo para impugnação ao cumprimento de sentença, dentre outras. 

E, sendo um ato nitidamente processual, o respectivo prazo, por decorrência lógica, terá a mesma natureza jurídica, o que faz incidir a norma do art. 219 do CPC/2015, que determina a contagem em dias úteis. 

Nesse sentido, é a precisa lição de Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery, ao comentarem o referido art. 523 do CPC/2015: 

4. Pagamento. Prazo em dias úteis. O prazo fixado no texto ora comentado tem como destinatário a parte, que é quem deve praticar ato para o cumprimento da sentença (pagamento) em quinze dias. Trata-se de prazo fixado em lei, como exige o CPC 219 caput para que a contagem se dê em dias úteis. O segundo requisito legal para a aplicação do critério de contagem somente em dias úteis é a destinação da intimação: prática de ato processual, que é o que deve ser praticado no, em razão do ou para o processo. Cumprimento da sentença, portanto, é ato processual que deve ser praticado pela parte. Incide a regra da contagem de prazo prevista no CPC 219 caput e par. ún., de que os prazos previstos em lei ou designados pelo juiz fixados em dias, correm apenas em dias úteis. (Código de Processo Civil comentado. 17 ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 1.465 - sem grifo no original) 

Da mesma forma, José Miguel Garcia Medina proclama que "o pagamento, realizado em atenção ao art. 523 do CPC/2015, é ato processual, sendo de igual natureza o prazo respectivo; logo, deve-se lhe aplicar o disposto no art. 219 do CPC/2015, contando-se o prazo em dias úteis (Novo Código de Processo Civil comentado. 4 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 856 - sem grifo no original). 

Humberto Theodoro Júnior também segue a corrente doutrinária que entende que o prazo do art. 523 do CPC/2015 é processual, devendo ser contado em dias úteis, ao esclarecer que: 

Em regra, a intimação é feita na pessoa do advogado do executado, que deve contatar seu cliente e informá-lo sobre o prazo em curso para o pagamento (art. 513, § 2º, I). Ressalte-se que, segundo o novo Código, na contagem dos prazos processuais em dias, deverão ser computados apenas os dias úteis (art. 219). Essa é a regra geral, e que, segundo o histórico de sua inserção no NCPC, veio privilegiar o advogado, assegurando-lhe os dias úteis para a elaboração de suas peças, recursos, etc. Contudo, tratando-se de prazo para pagamento, existe entendimento doutrinário em torno do art. 523 que o afasta da aplicação da contagem em dias úteis, porque no cumprimento da intimação executiva 'não há atividade preponderantemente técnica ou postulatória a exigir a presença - indispensável - do advogado'. Tal prazo dependeria, para os que assim pensam, 'quase que exclusivamente da vontade ou situação do próprio executado'. Daí concluir Shimura que 'o prazo de 15 dias há de fluir de modo ininterrupto, e não apenas nos dias úteis'. No entanto, o prazo para impugnação ao cumprimento da sentença (art. 523), referindo-se a ato processual do advogado, por sua vez, terá de ser contado apenas em dias úteis, consoante a regra geral já mencionada. Para Medina, no entanto, o prazo de pagamento, no cumprimento da sentença, é sim prazo processual e, por isso, não se enquadra na ressalva do parágrafo único do art. 219 (prazos não processuais), devendo seguir a regra geral da contagem em dias úteis como determina o caput do mesmo artigo. Assim, também, entende Araken de Assis. De fato, parece-nos melhor esta última exegese, visto que o art. 219, ao instituir a contagem em dias úteis, não restringiu o critério legal aos prazos relativos apenas aos atos dos advogados, mas aos 'prazos processuais', genericamente (parágrafo único do art. 219). Ora, se o prazo de pagamento refere-se a um evento típico do processo de execução, melhor mesmo é considerá-lo 'prazo processual', e não 'prazo extraprocessual', como, por exemplo, seriam aqueles fixados em contrato. (Curso de Direito Processual Civil, volume 3. 52 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p 120 - sem grifo no original) 

Por fim, vale destacar que, em análise do tema, a I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF aprovou o Enunciado n. 89, cujo teor ficou assim redigido: Enunciado 89 - Conta-se em dias úteis o prazo do caput do art. 523 do CPC. 

Por essas razões, dou provimento ao recurso especial para, reformando o acórdão recorrido, reconhecer que o prazo previsto no art. 523, caput, do CPC/2015 é de natureza processual, devendo, por isso, ser contado em dias úteis. 

É o voto.