RECURSO ESPECIAL Nº 1.906.378 - MG (2020/0305039-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : EDILSON LUCAS DA SILVEIRA
RECORRIDO : JOSE MIGUEL DE CASTRO
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DAS
CUSTAS INICIAIS. CANCELAMENTO DA DISTRIBUIÇÃO. CITAÇÃO. INTIMAÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DO AUTOR PELO PAGAMENTO DOS
ÔNUS SUCUMBENCIAIS. AUSÊNCIA.
1- Recurso especial interposto em 14/08/2020 e concluso ao gabinete em
24/11/2020.
2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) nos termos do art. 290 do
CPC, o cancelamento da distribuição pelo não recolhimento das custas
iniciais exige a prévia citação ou intimação do réu; e b) o cancelamento da
distribuição impõe ao autor a obrigação de arcar com os ônus de
sucumbência.
3- O cancelamento da distribuição, a teor do art. 290 do CPC, prescinde da
citação ou intimação da parte ré, bastando a constatação da ausência do
recolhimento das custas iniciais e da inércia da parte autora, após intimada,
em regularizar o preparo.
4- A extinção do processo sem resolução do mérito com fundamento no art.
290 e no inciso IV do art. 485, ambos do CPC, em virtude do não
recolhimento das custas iniciais não implica a condenação do autor ao
pagamento dos ônus sucumbenciais, ainda que, por erro, haja sido
determinada a oitiva da outra parte.
5- Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial
nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso
Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram
com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 11 de maio de 2021(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO NANCY ANDRIGHI (Relator):
Cuida-se de recurso especial interposto por EDILSON LUCAS DA
SILVEIRA, fundamentado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional.
Recurso especial interposto em: 14/08/2020.
Concluso ao gabinete em: 24/11/2020.
Ação: de cobrança de comissão de corretagem imobiliária, ajuizada
pelo recorrente, em face de JOSE MIGUEL DE CASTRO, recorrido.
Sentença: extinguiu o processo sem resolução de mérito, em virtude
de ausência de pressuposto processual consubstanciado no recolhimento das
custas iniciais, nos termos do art. 485, IV, do CPC/15.
Acórdão: negou provimento à apelação interposta pelo recorrente,
nos termos da seguinte ementa:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA - INTIMAÇÃO PARA RECOLHIMENTO DAS CUSTAS - INÉRCIA - EXTINÇÃO DA AÇÃO – SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. - Se a parte autora não recolhe as custas quando intimada para tanto, o feito deve
ser extinto sem resolução de mérito. - A inércia do autor pode ser interpretada como pedido de desistência da ação, o
que enseja, por si só, a sua condenação ao pagamento das custas processuais e dos
honorários advocatícios de sucumbência.
Embargos de Declaração: opostos pelo recorrente, foram
rejeitados.
Recurso especial: aduz, além de dissídio jurisprudencial, violação aos arts. 85 e 290 do CPC/15, ao argumento de que: a) não é devida a citação da
parte ré no caso de cancelamento da distribuição por ausência de recolhimento
das custas iniciais; b) a extinção do processo em razão do cancelamento de sua
distribuição não implica a condenação do autor ao pagamento das custas
processuais e dos honorários advocatícios, pois o processo não existiu no mundo
jurídico, não havendo que se falar em lide ou em formação da relação jurídica
processual trilateral perante o juízo cível.
Prévio juízo de admissibilidade: o TJ/MG admitiu o recurso
especial interposto (fls. 290-292).
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO NANCY ANDRIGHI (Relator):
O propósito recursal consiste em dizer se: a) nos termos do art. 290
do CPC, o cancelamento da distribuição pelo não recolhimento das custas iniciais
exige a prévia citação ou intimação do réu; e b) o cancelamento da distribuição
impõe ao autor a obrigação de arcar com os ônus de sucumbência.
I. DO CANCELAMENTO DA DISTRIBUIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE
DE CITAÇÃO OU INTIMAÇÃO DA PARTE EX ADVERSA
1. Aduz a parte recorrente que não é devida a citação ou intimação da
parte ré no caso de cancelamento da distribuição por ausência de recolhimento
das custas iniciais.
2. A Corte de origem, não obstante, não vislumbrou qualquer vício na
determinação da oitiva da parte adversa - por meio do que denominou de citação
-, utilizando, ao revés, o referido ato processual como fundamento para a
condenação do autor ao pagamento dos ônus sucumbenciais, verbis:
Portanto, verifica-se que, uma vez não recolhidas as custas
inicias, o juiz julgou extinto o feito sem resolução do mérito, com fulcro no artigo
485, IV, do CPC, uma vez que a parte autora, apesar de devidamente intimada,
permaneceu inerte, em inobservância o comando judicial. Ora, ocorrendo a
hipótese mencionada, sob qualquer ângulo, o autor deverá arcar com os ônus
da sucumbência.
[...]
Ainda porque, a máquina do judiciário foi acionada e o advogado da parte ex adversa foi citado e se manifestou nos autos.
(fl. 245) [g.n.]
3. De início, importa consignar que o processo, como é de
conhecimento ordinário, a teor do novel art. 312 do CPC, tem início com o
protocolo da petição inicial. Desde então já há processo e litispendência,
expressão aqui empregada no sentido técnico de lide pendente.
4. Nesse momento, muito embora ainda não haja se perfectibilizado a
relação jurídica processual triangular ou angular, já existe relação jurídica
processual linear estabelecida entre autor e Estado-juiz (GRINOVER, Ada Pellegrini;
DINAMARCO, Cândido Rangel; CINTRA, Antonio Carlos de Araújo. Teoria Geral do
Processo. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 319).
5. O art. 290 do CPC, nesse contexto, dispõe que “será cancelada a
distribuição do feito se a parte, intimada na pessoa de seu advogado, não realizar o
pagamento das custas e despesas de ingresso em 15 (quinze) dias”.
6. Observa-se, desse modo, que o não recolhimento das custas iniciais – que representa importante pressuposto processual – conduz ao cancelamento
da distribuição.
7. Trata-se, a rigor, de hipótese de indeferimento da petição inicial em
virtude da incorreta propositura da demanda por ausência de preparo inicial do
processo em formação (Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Processo
Civil. v. III. 6. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 389 e 405).
8. Nesse contexto, ressalte-se que o cancelamento da distribuição
prescinde da citação da parte ré, bastando a constatação da ausência do
recolhimento das custas iniciais e da inércia da parte autora, após intimada, em
regularizar o preparo.
9. Não bastasse ser indevida a citação da parte adversa, é imperioso observar que, nesse momento procedimental, em regra, qualquer alusão à
intimação da outra parte revela-se tecnicamente imprecisa, ante a inexistência de
relação jurídica processual triangular ou angular: o réu ainda não integra o
processo.
10. A propósito, a doutrina, interpretando o art. 290 do CPC, menciona
existir verdadeiro comando para que o juiz não ordene a citação do réu antes de
efetuada a comprovação do recolhimento das custas, verbis:
O que há no dispositivo é um comando para que o juiz
não ordene a citação do réu antes de efetuado o pagamento das
custas. Logo, ao lhe ser distribuída a petição inicial, deverá o magistrado
verificar se houve o pagamento das custas de ingresso. Inexistente a
comprovação, deverá a parte ser intimada, na pessoa do advogado, para que,
em 15 (quinze) dias, efetue o pagamento. Não efetuado no prazo, a petição
inicial será indeferida, o processo extinto e a distribuição cancelada, nos exatos
termos do art. 290, CPC/2015.
(WAMBIER, Teresa Arruda Alvim...[et.al.]. Breves Comentários ao
Novo Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: RT, 2016)
11. Desse modo, constatada a ausência de recolhimento das custas
iniciais e quedando-se inerte o autor após intimado para regularizar o preparo,
deve o juiz, sem a oitiva da outra parte – que, em regra, sequer integra a relação
jurídica processual -, cancelar a distribuição do processo, extinguindo o feito sem
resolução do mérito.
12. Assim, ao contrário do que consignado pelo Tribunal a quo, a
determinação da oitiva da parte contrária, em hipóteses como a dos autos, é
absolutamente desnecessária, conflita com o disposto no art. 290 do CPC e
configura verdadeiro error in procedendo.
II. DO CANCELAMENTO DA DISTRIBUIÇÃO – RESPONSABILIDADE PELOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS
13. Sustenta o recorrente, ainda, que o cancelamento da distribuição
previsto no art. 290 do CPC não impõe ao autor a obrigação de arcar com os ônus
de sucumbência.
14. A Corte de origem, no entanto, consignou ao autor deveria ser
condenado a arcar com os ônus sucumbenciais, pois: a) a inércia autoral poderia
ser interpretada como um pedido de desistência; b) a máquina do Poder Judiciário
foi movimentada; c) a outra parte foi citada e se manifestou nos autos; d) a
sentença de extinção do processo sem resolução do mérito não desonera a parte
autora do pagamento dos ônus sucumbenciais; e e) deveria ser observado o
princípio da causalidade, verbis:
Cinge-se a controvérsia em verificar se a parte autora deverá ser
condenada ao pagamento dos ônus sucumbenciais em razão do cancelamento
da distribuição do feito.
É incontroverso nos autos que a parte autora, apesar de
intimada, não recolheu o pagamento das custas e despesas iniciais do processo.
Uma vez intimado para tanto, competiria ao autor recolher as
custas, sob pena de cancelamento da distribuição, nos exatos termos do artigo
290 do CPC, in verbis:
[...]
Portanto, verifica-se que, uma vez não recolhidas as custas
inicias, o juiz julgou extinto o feito sem resolução do mérito, com fulcro no artigo
485, IV, do CPC, uma vez que a parte autora, apesar de devidamente intimada,
permaneceu inerte, em inobservância ao comando judicial.
Ora, ocorrendo a hipótese mencionada, sob qualquer
ângulo, o autor deverá arcar com os ônus da sucumbência.
Inclusive, a sua inércia pode ser interpretada como
pedido de desistência da ação, o que enseja, por si só, a sua
condenação ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios de sucumbência.
Ainda porque, a máquina do judiciário foi acionada e o
advogado da parte ex adversa foi citado e se manifestou nos autos.
Ainda se assim não fosse, o simples fato de ter sido
prolatada sentença de extinção do processo, sem resolução do
mérito, não autoriza a desoneração da parte autora ao pagamento
dos ônus de sucumbência.
Destarte, deverá ser aplicado o princípio da causalidade, segundo o qual "aqueleque der causa à instauração da demanda ou do
incidente processual deve arcar com as despesas deles decorrentes".
(AgRg no AREsp 666.256/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA
TURMA, julgado em 28/04/2015, DJe 06/05/2015).
(fls. 244-245) [g.n.]
15. Nesse diapasão, importa consignar que, a rigor, o cancelamento da
distribuição previsto no art. 290 do CPC é efetivado por meio de sentença de
extinção do processo sem resolução do mérito.
16. De fato, nessas hipóteses incide o disposto no inciso IV do art. 485
do CPC segundo o qual o juiz não resolverá o mérito quando verificar a ausência de
pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo.
17. Menciona-se, a propósito, a lição de Cândido Rangel Dinamarco:
O cancelamento da distribuição (...) importa extinção do
processo sem julgamento do mérito, sendo indeferida a petição
inicial por falta de preparo. Cancelar a distribuição significa remover o
registro da propositura da demanda, para que ela não possa produzir efeito
algum além da prevenção do juízo para futura demanda que seja reprodução da
primeira.
(DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Processo Civil. v.
III. 6. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 389) [g.n.]
18. No mesmo sentido: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim...[et.al.].
Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: RT, 2016;
MACHADO, Mauro Conti In CARVALHO FILHO, Milton Paulo de...[et. al.] (Coords.).
Comentários ao Código de Processo Civil: perspectivas da magistratura. 2. ed. rev.
atual. e ampl. São Paulo: RT, 2020.
19. Nesse passo, não se olvida que a simples extinção do processo
sem resolução do mérito, em regra, não autoriza a desoneração do pagamento dos
ônus sucumbenciais.
20. No entanto, quando a extinção ocorre em virtude do não
recolhimento das custas iniciais, a solução deve ser diversa, notadamente porque para essa hipótese a legislação processual já prevê consequência específica
representada pelo próprio cancelamento da distribuição.
21. A propósito:
Outrossim, o cancelamento da distribuição não gera ônus
para o autor, visto que o valor das custas sequer pode ser inscrito
em dívida ativa, sob pena de gerar o enriquecimento ilícito do ente
estatal arrecadante. O dispositivo é, pois, de interpretação restritiva, sendo o
cancelamento da distribuição medida excepcional.
(WAMBIER, Teresa Arruda Alvim...[et.al.]. Breves Comentários ao
Novo Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: RT, 2016) [g.n.]
22. Em âmbito jurisprudencial, no julgamento do AREsp 1442134/SP,
julgado pela Primeira Turma em 17/11/2020, esta Corte Superior já teve a
oportunidade de fixar o entendimento de que não deve ser imposto ao autor os
ônus da sucumbência na hipótese em que este, antecipando-se ao cancelamento
da distribuição previsto no art. 290 do CPC, formula pedido desistência antes da
citação do réu.
23. Na oportunidade restou consignado que, se as despesas
processuais tem sua razão de existir nos custos referentes ao trabalho realizado
pelos serventuários da justiça, é indevida a sua cobrança na hipótese em que a
máquina estatal não é acionada sequer para a citação da outra parte, como ocorre
no caso do cancelamento da distribuição, verbis:
Ora, se o próprio conceito de despesas processuais, nas
quais se incluem as custas, está fulcrado nos custos referentes ao
trabalho realizado pelos serventuários da justiça, mostra-se
desarrazoada a cobrança destas (custas) nas hipóteses em que a
máquina estatal não houver sido movimentada sequer para as
diligências necessárias à citação da parte adversa.
[...]
Oportuno destacar, ainda, que a regra motriz para a
aplicação do instituto do cancelamento da distribuição encontra-se
centrada na não realização do pagamento das custas,
independentemente da forma em que o inadimplemento se
exteriorizar.
Tanto é assim, que o próprio texto normativo não se vale do termo "inércia" da parte desistente; logo, não podemos limitar a incidência do
art. 290 do CPC a tais hipóteses.
No caso dos autos, a bem da verdade, ao requerer a
desistência da ação, antes mesmo da citação da parte adversa, o
autor se antecipou ao próprio ato de cancelamento da distribuição,
visto que não opta pela inércia no recolhimento das custas – o que
denota plena sintonia com o princípio da cooperação preconizado pelo
art. 6º do Código de Processo Civil de 2015, in verbis: "Todos os sujeitos do
processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável,
decisão de mérito justa e efetiva."
A aplicação do regramento estabelecido pelo art. 90 do
CPC deve, portanto, comportar relativização para os casos de
desistência da demanda, manifestada antes da citação do réu. Isso
porque, tal ato consiste em verdadeira exteriorização da vontade do
autor em não pagar o valor das custas processuais, e o não
pagamento do encargo enseja o cancelamento da distribuição do
feito pelo magistrado, por força de disposição legal específica.
Não soa razoável, frise-se, restringir a incidência do art. 290 do
CPC à situação em que a parte simplesmente descumpre o prazo de 15 (quinze)
dias estabelecido para o recolhimento das custas e afastar a sua aplicação nos
casos em que a parte deixa de recolher o encargo e apresenta, voluntariamente,
pedido de desistência da ação, antes mesmo da citação do réu.
Destaco que, na hipótese, a desistência da ação foi motivada
justamente pela impossibilidade da autora em arcar com as custas processuais,
considerando que seu pedido de recolhimento diferido do encargo fora negado
pela instância primeira – o que, a meu ver, inviabilizou o próprio acesso à Justiça
por parte da empresa agravante.
[...]
Ainda sob o prisma da razoabilidade, e com foco na coesão do
sistema normativo, não me parece adequado que a lei processual, de um lado,
premie, com a isenção das custas processuais, o autor desistente da ação, em
que já concretizado o ato citatório, ante o julgamento da controvérsia originária
por instância superior em sede de recurso repetitivo, e, por outro lado, exija o
recolhimento do encargo daquele que desiste de demanda – em razão de plena
incapacidade financeira de arcar com as custas de processo – em que nem
sequer houve a citação da parte contrária.
(AREsp 1442134/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA
TURMA, julgado em 17/11/2020, DJe 17/12/2020) [g.n.]
24. Nessa linha de intelecção, importa consignar, ainda, que, na
hipótese de não recolhimento das custas iniciais, eventual determinação de oitiva
da outra parte, por consistir em inegável error in procedendo, não pode conduzir à
condenação do autor a arcar com os ônus sucumbenciais ao argumento de que houve a movimentação da máquina judiciária e a manifestação da parte contrária,
sob pena de se impor ao demandante a responsabilidade por erro perpetrado pelo
próprio Poder Judiciário.
25. Assim, é imperiosa a conclusão de que a extinção do processo sem
resolução do mérito com espeque no art. 290 e no inciso IV do art. 485, ambos do
CPC, em virtude do não recolhimento das custas iniciais não implica a condenação
do autor ao pagamento dos ônus sucumbenciais, ainda que, por erro, haja sido
determinada a oitiva da outra parte.
III. DO DESLINDE DA CONTROVÉRSIA
26. Na hipótese dos autos, o juiz determinou a intimação do autor
para recolher as custas iniciais sob pena de extinção do processo (fl. 114-115).
27. No entanto, ante a inércia do demandante, inadvertidamente,
determinou o juiz que o réu fosse “ouvido” no prazo de 10 (dez) dias, verbis:
Considerando que o despacho de ID 5679760 não foi cumprido
pelo autor, ouça-se o réu, no prazo de 10 (Dez) dias.
(fl. 119)
28. É de se observar, nesse diapasão, que o comando viola o disposto
no art. 290 do CPC, porquanto, conforme já destacado, na hipótese de
cancelamento da distribuição em virtude do não recolhimento das custas iniciais, é
indevida a citação ou intimação da outra parte, máxime quando o referido ato
processual é utilizado como fundamento para justificar a condenação do autor à
arcar com os ônus sucumbenciais.
29. Com efeito, a citação ou intimação da outra parte, bem como a
movimentação da chamada máquina judiciária, ocorreu por erro do juiz, de modo que, pelo princípio da causalidade, não pode o autor ser condenado a arcar com os
ônus da sucumbência.
30. Ademais, a condenação do autor ao pagamento dos ônus
sucumbenciais revelar-se-ia incoerente com a própria determinação de
cancelamento da distribuição por falta de pagamento das custas iniciais.
31. Por fim, mencione-se que, na espécie, o demandante, em nítido
prestígio aos princípios da cooperação e da lealdade processuais, após tomar
conhecimento da indevida determinação de oitiva da parte adversa, peticionou
nos autos requerendo a desistência da ação. Trata-se, na realidade, de
manifestação de vontade de não pagar as custas iniciais, resignando-se com o
cancelamento da distribuição.
32. Desse modo, não merece subsistir a condenação do autor ao
pagamento dos ônus sucumbenciais em virtude da extinção do processo sem
resolução do mérito por ausência de recolhimento das custas iniciais,
notadamente porque é indevida a citação ou intimação da parte ex adversa na
hipótese de cancelamento da distribuição prevista no art. 290 do CPC.
IV. CONCLUSÃO
33. Forte nessas razões, dou provimento ao recurso especial para
isentar a parte recorrente do pagamento dos ônus sucumbenciais em virtude do
cancelamento da distribuição do processo nos termos do art. 290 do CPC.
34. Deixo de fixar honorários em face do provimento do recurso
especial.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2020/0305039-0
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do
voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a).
Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente), Ricardo Villas Bôas Cueva,
Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.